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domingo, 13 de abril de 2014

Uma breve reflexão sobre os Ramos no Domingo de Ramos

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Chegados mais uma vez ao Domingo de Ramos, achei pertinente visar, para uma pequena reflexão, um – se não o - elemento proeminente dos santos mistérios deste dia. Creio que o seu significado, talvez devido à familiaridade, seja ignorado por muitos Católicos. Refiro-me, obviamente, aos ramos, que são abençoados e distribuídos neste dia.


Donde a presença dos ramos neste dia? Ora, encontramo-los no Novo Testamento, dirão com certeza, e estão presentes na entrada de Jesus em Jerusalém dias antes da Sua Paixão. Mas a pergunta que coloco aqui é: por que ramos, especificamente? Olhemos para as perícopes da entrada, em especial para aquelas que mencionam a existência de ramos – São Mateus, São Marcos, e São João. Porque nos falam os evangelistas da presença de ramos? Olhemos, não com familiaridade para estes textos, mas com olhos “novos”, de quem os lê (ou melhor, ouve) pela primeira vez. Convido a encarar este texto, não como um Católico do séc. XXI, mas como um Judeu do séc. I. O que a nós poderá passar despercebido como um “mero detalhe” que dá origem a um sacramental neste dia, para um judeu contemporâneo de Jesus encerava um significado profundo. Creio que conhecendo o seu significado para um judeu nos ajudará a entrar mais profundamente nos santos mistérios deste domingo.

A existência de ramos e gritos de Hosanna remetem-nos para o festival de Sucot, geralmente referido como Festa das/dos Tendas/Tabernáculos no Novo Testamento.

A observância de Sucot, cuja duração é uma oitava, foi estabelecida por Deus aquando do estabelecimento da Aliança com Israel no Monte Sinai, sendo uma das três festas de peregrinação obrigatória a Jerusalém. A festa era, grosso modo, uma festa de natureza agrícola, pois calhava na época da colheita (cf. Ex 23,16; 34,22); mas como toda a festa agrícola judaica, estava revestida de significado religioso também. Servia para “fazer memória” do tempo em que Israel vagueou pelo deserto, vivendo em tendas, antes de entrar na Terra Prometida, quando Deus os fez sair da casa do Egito:
«Habitareis nas tendas durante sete dias; todos os que nasceram em Israel deverão habitar em tendas, para que os vossos descendentes saibam que fiz habitar em tendas os filhos de Israel, quando os fiz sair da terra do Egipto.»
Estava prescrito a leitura da Lei durante a festa a cada sete anos: 
«Ao fim de sete anos, na Assembleia do Ano da remissão, pela festa das Tendas, quando todo o Israel comparecer diante do SENHOR, teu Deus, no lugar que Ele tiver escolhido, farás a proclamação desta Lei a todo o Israel. Reunirás o povo, homens, mulheres e crianças, e o estrangeiro que estiver nas tuas cidades, a fim de que escutem, aprendam e reverenciem o SENHOR, vosso Deus, e cumpram todas as palavras desta Lei. Os filhos deles, que ainda não conhecem, ouvirão e aprenderão a reverenciar o SENHOR, vosso Deus, enquanto viverdes na terra de que ides tomar posse, depois de passardes o Jordão.» 
Era também uma festa que prefigurava/antecipava a “colheita final” de Israel, quando este reuniria todas as nações em Deus. Dada a grandiosidade da festa, e da alegria a ela associada, começou a ter ligações à linhagem real: por exemplo, durante esta festa Salomão dedicou o Templo (1 Rs 8). Após o regresso do exílio na Babilônia, e com a ausência dum rei, a festa foi ganhando conotações messiânicas. Já o profeta Zacarias nos fala do dia em que as nações haverão de vir celebrar o Sucot a Jerusalém:
Os que restarem de todas as nações, que tiverem marchado contra Jerusalém, irão todos os anos adorar o Rei, o Senhor do universo, e celebrar a festa das Tendas. 
Era uma festa caracterizada por: alegria, “tendas”, ofertas, e ramos. São estes últimos que nos interessam hoje. 
No primeiro dia, apanhareis belos frutos, ramos de palmeira, ramos de árvores frondosas e dos salgueiros do rio; e regozijar-vos-eis na presença do SENHOR, vosso Deus, durante sete dias.
Os ramos – lulav, em hebraico – seriam de tamareira, e teriam murta e salgueiro atados juntamente. Crê-se que estas plantas serviriam de recordação do tempo passado no deserto, uma vez que correspondem a espécies comuns nesse ambiente. O lulav deveria ser apresentado pelos fiéis no Templo todos os sete dias que durava a celebração de Sucot, e as crianças eram obrigadas a levá-lo a partir do momento em que já conseguissem abaná-lo. Durante as celebrações no Templo (cujos símbolos Jesus identificou consigo mesmo em São João), o coro cantaria os salmos de Hallel (de louvor) – os Salmos 113 a 118. Quando eram cantados os Hosannas no Salmo 118 toda a assembleia abanava os seus ramos em direção ao altar.

Como já referi, na época de Jesus, esta festa já não estava associada ao rei “atual”, da casa de Davi, mas ao Filho de Davi que haveria de vir. Sucot haveria de ser a única festa que perduraria no final dos tempos, após a vinda do Messias; a grande festa de louvor em que Israel finalmente consumaria as núpcias com o Seu Senhor. Não é por acaso que no livro do Apocalipse nos surge a imagem da multidão composta por pessoas de todas as nações diante do trono do Cordeiro, com ramos nas mãos: 
Depois disto, apareceu na visão uma multidão enorme que ninguém podia contar, de todas as nações, tribos, povos e línguas. Estavam de pé com túnicas brancas diante do trono e diante do Cordeiro, e com palmas na mão.
Todo este simbolismo estaria presente na mente dum judeu do primeiro século. A presença destes sinais na entrada triunfal não implica a celebração da festa, mas o reconhecimento por parte do povo israelita, em quem estas imagens estariam bem presentes, de que o Filho de Davi tinha chegado, e que se iniciava o Sucot derradeiro (tal como São Pedro perguntou se deveria montar tendas aquando da Transfiguração).

Chegado ao fim desta breve exposição histórica, o que são para nós, então, os ramos que recebemos no Domingo de Ramos, que levamos em nossas mãos em procissão, e que eventualmente levaremos para casa? Estes ramos são testemunhos da nossa fé no Messias. São sinal de que o Filho de Davi salva. São reconhecimento do Cristo Rei. A liturgia bracarense demonstra isto duma forma sutil na procissão, através da cruz processional. Enquanto que no rito romano tradicional a cruz está velada, uma vez que nos encontramos já dentro do tempo litúrgico conhecido como "Tempo da Paixão", no rito bracarense a cruz é desvelada para a procissão, demonstrando que esta é uma entrada triunfal, de alegria. Estes ramos são uma lembrança de que, apesar de dentro de alguns dias o Senhor sofrer a Sua Paixão, “Christus vincit, Christus regnat, Christus imperat”. São sinais escatológicos na medida em que revelam a nossa fé e esperança no Rei dos Reis que há de vir no fim dos tempos, para consumar as núpcias com a Sua Noiva, a Igreja,  enxugando as nossas lágrimas.


sexta-feira, 7 de março de 2014

A "Velatio" das Imagens na Quaresma

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Do ponto de vista espiritual, o costume da velatio foi interpretado como sinal da penitência à qual todos os fiéis são chamados como sinal da antecipação do luto da Igreja pela morte do seu Esposo e da humilhação de Cristo, que teve de esconder-se para escapar da ameaça de morte. (Cf.: Jo 8,59).

O motivo principal para a orientação de COBRIR AS IMAGENS NAS IGREJAS, COM VÉUS ROXOS, é para que os fiéis não "se distraiam" com os Santos e que a sua devoção deve estar fundamentada no Mistério Pascal de Cristo, ou seja, na Sua paixão, morte e ressurreição.

Assim, cobrindo-se todas as imagens dos Santos e os crucifixos, surge com maior evidência o que há de essencial nas igrejas: o altar, onde se opera e atualiza o Mistério Pascal de Cristo, por seu Sacrifício incruento.

A rubrica no Missal Romano, 2ª edição típica, no sábado da IV semana da Quaresma (pág. 211, em português) e também a contida na Paschalis Sollemnitatis: A Preparação e Celebração das Festas Pascais, nº 26, nos ensina que: 
“o uso (costume) de cobrir as cruzes e as imagens na igreja, desde o V Domingo da Quaresma, pode ser conservado segundo a disposição da Conferência Episcopal. As cruzes permanecem cobertas até ao término da celebração da Paixão do Senhor na Sexta-feira Santa; as imagens até ao início da Vigília Pascal”.
A grande diferença entre as rubricas dos dois Missais (de Trento e do Vaticano II) consiste no seguinte: no primeiro, cobrir as Cruzes e Imagens era obrigatório (“cobrem-se...”); No segundo, deixou de sê-lo (“pode ser conservado...”). 

Com os sinais externos da penitência, do recolhimento, da purificação da visão e do coração, de tudo o que é secundário ou mesmo supérfluo, poderemos concentrar o nosso sentir, pensar e agir no Cristo Crucificado. Com os olhos fixos no Senhor, percorrendo com Ele a Via Dolorosa, chegaremos às núpcias do Cordeiro Redivivo, à Páscoa da Ressurreição.

(Compilação de diversas fontes, com atualizações e adaptações).

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

A origem e o sentido das Vestes Litúrgicas no Rito Latino

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Texto originalmente publicado na página pessoal no Facebook de Dom Henrique Soares da Costa, Bispo Auxiliar de Aracaju-SE. 

As roupas utilizadas pelos ministros sagrados nas celebrações litúrgicas são derivadas das vestimentas gregas e romanas. Nos primeiros séculos, a forma de vestir das pessoas de uma determinada classe social (os honestiores) foi também adotada para o culto cristão, e esta prática foi mantida na Igreja, mesmo após a paz de Constantino. Como contado por alguns escritores eclesiásticos, os ministros sagrados usavam suas melhores roupas, provavelmente reservadas para a ocasião.

Enquanto que na antiguidade cristã as vestimentas litúrgicas diferiam das de uso cotidiano não pela forma particular, mas apenas pela qualidade dos tecidos e decoração particular, no curso das invasões bárbaras, os costumes, e com eles também a forma de vestir dos novos povos, foram introduzidos no Ocidente, levando a mudanças na moda profana. A Igreja, ao contrário, manteve essencialmente inalteradas as roupas usadas pelos sacerdotes nos cultos públicos; foi assim que as vestimentas de uso cotidiano acabaram por se diferenciar das de uso litúrgico. Na época carolíngia, finalmente, os paramentos próprios de cada grau do sacramento da ordem foram definitivamente definidos, assumindo a aparência que conhecemos hoje.

Além das circunstâncias históricas, os paramentos sacros têm uma função importante nas celebrações litúrgicas: primeiramente, o fato deles não serem usados no cotidiano, tendo assim um caráter cultual, ajuda-nos a romper com o cotidiano e suas preocupações, no momento da celebração do culto divino. Além disso, as formas largas das vestimentas, como por exemplo da casula, põem em segundo plano a individualidade de quem as veste, enfatizando seu papel litúrgico. Pode-se dizer que a “ocultação” do corpo do ministro sob as vestes, em certo sentido, despersonaliza-o, removendo o ministro celebrante do centro, para revelar o verdadeiro Protagonista da ação litúrgica: Cristo. A forma das vestes, portanto, lembra-nos que a liturgia é celebrada in persona Christi, e não em próprio nome.

Aquele que exerce uma função de culto não atua como indivíduo por si mesmo, mas como ministro da Igreja e como instrumento nas mãos de Jesus Cristo. O caráter sagrado dos paramentos provém também do fato de que são vestidos conforme prescreve o Ritual Romano.

1) À lavagem das mãos se segue a vestidura propriamente dita.

2) Inicia-se com o amito, um pano retangular de linho dotado de duas fitas, que repousa sobre os ombros junto ao pescoço. O amito destina-se a cobrir, ao redor do pescoço, a vestimenta utilizada diariamente, ainda que se trate do hábito do sacerdote. Nesse sentido, é preciso lembrar que o amito também é usado quando se está vestido com roupas de estilo moderno, que muitas vezes não apresentam uma grande abertura em torno do pescoço. De qualquer forma, portanto, as roupas comuns permanecem visíveis e por isso é preciso cobri-las também, nestes casos, com o amito.


No Rito Romano, o amito é vestido antes da alva (túnica). Ao vesti-lo, o sacerdote recita a seguinte oração:


Impone, Domine, capiti meo galeam salutis, ad expugnandos diabolicos incursus.


(Colocai, Senhor, na minha cabeça o elmo da salvação para que possa repelir os golpes de Satanás)


Com referência à carta de São Paulo aos Ef 6,17, o amito é interpretado como "o elmo da salvação”, que deve proteger o portador das tentações do demônio, em especial de pensamentos e desejos malévolos durante a celebração litúrgica. Este simbolismo é ainda mais evidente no costume seguido desde a Idade Média pelos monges beneditinos, franciscanos e dominicanos, entre os quais o amito era posicionado sobre a cabeça e deixado recair sobre a casula ou a dalmática.

3) A alva consiste na veste longa e branca utilizada por todos os ministros sagrados, e que representa a nova veste imaculada que todo cristão recebe mediante o batismo. A alva é portanto um símbolo da graça santificante recebida no primeiro sacramento, e é considerada também um símbolo da pureza de coração necessária para o ingresso na graça eterna da contemplação de Deus no céu (cf. Mt 5,8). Isso é expresso na oração recitada pelo sacerdote enquanto veste a peça, oração que se refere ao Ap 7,14:

Dealba me, Domine, et munda cor meum; ut, in sanguine Agni dealbatus, 
gaudiis perfruar sempiternis.


(Revesti-me, Senhor, com a túnica de pureza, e limpai o meu coração, para que, banhado no Sangue do Cordeiro, mereça gozar das alegrias eternas).

4) Sobre as vestes, na altura da cintura, é colocado o cíngulo, um cordão de lã ou outro material apropriado, que é usado como cinto.

Todos os oficiantes que portam a alva devem também portar o cíngulo (esta prática tradicional é hoje frequentemente ignorada).


Para diáconos, sacerdotes e bispos, o cíngulo pode ser de cores diferentes, de acordo com o tempo litúrgico ou a memória do dia. No simbolismo das vestes litúrgicas, o cíngulo representa a virtude do auto-controle, que São Paulo enumera entre os frutos do Espírito (cf. Gl 5,22). A oração correspondente, como na 1Pd 1,13 diz:


Praecinge me, Domine, cingulo puritatis, et exstingue in lumbis meis humorem libidinis; ut maneat in me virtus continentiae et castitatis.


(Cingi-me, Senhor, com o cíngulo da pureza, e extingui nos meus rins o fogo da paixão, para que resida em mim a virtude da continência e da castidade)

5) O manípulo é um paramento litúrgico usado nas celebrações da Santa Missa segundo a forma extraordinária do Rito Romano; caiu em desuso nos anos da reforma litúrgica, embora não tenha sido abolido. É semelhante à estola, mas de menor comprimento, inferior a um metro, e é fixado por meio de presilhas ou fitas como as da casula. Durante a Santa Missa em sua forma extraordinária, o celebrante, o diácono e subdiácono o portam sobre o antebraço esquerdo. É possível que este paramento derive de um lenço (mappula) utilizado pelos romanos amarrado ao braço esquerdo. Uma vez que era utilizado para enxugar as lágrimas e o suor da face, escritores eclesiásticos medievais atribuíram ao manípulo um simbolismo associado às fadigas do sacerdócio. Esta leitura também está presente na oração de sua vestidura:

Merear, Domine, portare manipulum fletus et doloris; 
ut cum exsultatione recipiam mercedem laboris.


(Fazei, Senhor, que mereça trazer o manípulo do pranto e da dor, para que receba com alegria a recompensa do meu trabalho).


Como se vê, no início da oração mencionam-se as lágrimas e a dor que acompanham o ministério sacerdotal, mas a segunda parte do texto refere-se aos frutos do próprio trabalho. Não será fora de propósito recordar a passagem de um salmo que pode ter inspirado esta segunda simbologia referente ao manípulo, visto que a Vulgata assim apresentava o Sl 125,5-6: " Qui seminant in lacrimis in exultatione metent; euntes ibant et flebant portantes semina sua, venientes autem venient inexultatione portantes manipulos suos".

6) A estola é o elemento distintivo de um ministro ordenado e é sempre usada na celebração dos sacramentos e sacramentais. É uma faixa de tecido, em geral bordado, cuja cor varia de acordo com o tempo litúrgico ou o dia santo. Ao vesti-la, o sacerdote recita a seguinte oração:

Redde mihi, Domine, stolam immortalitatis, quam perdidi in praevaricatione primi parentis; et, quamvis indignus accedo ad tuum sacrum mysterium, merear tamen gaudium sempiternum.


(Restitui-me, Senhor, a estola da imortalidade, que perdi na prevaricação do primeiro pai, e, ainda que não seja digno de me abeirar dos Vossos sagrados mistérios, fazei que mereça alcançar as alegrias eternas).


Dado que a estola é um paramento de suma importância, indicando mais do que qualquer outro a condição de ministro ordenado, não se pode deixar de lamentar o abuso, já largamente difundido, por parte de alguns sacerdotes, que não a usam em conjunto com a casula.

7) Finalmente, veste-se a casula ou planeta, a vestimenta característica daqueles que celebram a Santa Missa. Os livros litúrgicos usavam as duas palavras, em latim casula e planeta, como sinônimos. Enquanto o nome planeta foi usado em particular em Roma e acabou por permanecer na Itália, o nome casula deriva da forma típica da vestimenta, que originalmente circundava todo o corpo do ministro sagrado que a portava. O uso da palavra “casula” também é encontrado em outros idiomas: "Casulla”, em espanhol, “Chasuble” em francês e em Inglês, "Kasel" em alemão. Oração para vestidura da casula remete ao convite de Cl 3,14: “Sobretudo, revesti-vos do amor, que une a todos na perfeição”. E, de fato, a oração com a qual se veste a casula cita as palavras do Senhor contidas em Mt 11,30:

Domine, qui dixisti: Iugum meum suave est, et onus meum leve: fac, ut istud portare sic valeam, quod consequar tuam gratiam. Amen.


(Senhor, que dissestes: O meu jugo é suave e o meu peso é leve, fazei que o suporte de maneira a alcançar a Vossa graça. Amém).


"Em conclusão, espera-se que a redescoberta do simbolismo associado aos paramentos e suas orações incentive os sacerdotes a retomar a prática da oração durante a vestição, de modo a se preparar com o devido recolhimento à celebração litúrgica. Se é verdade que é possível rezar com diferentes orações, ou ainda simplesmente elevando a mente a Deus, por outro lado, os textos da oração de vestição trazem a brevidade, a precisão de linguagem, a inspiração da espiritualidade bíblica e o fato de que são rezados pelos séculos por um número incontável de ministros sagrados. Estas orações são recomendadas ainda hoje, para a preparação da celebração litúrgica, e também realizadas de acordo com a forma ordinária do Rito Romano".

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Livro-chave da Reforma da Reforma agora em tradução brasileira

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O clássico da Reforma da Reforma, "Introdução ao Espírito da Liturgia", foi finalmente publicado em tradução brasileira.

O famoso livro do então Cardeal Ratzinger (Papa Bento XVI) - já foi citado diversas vezes em nosso site - é certamente o livro-base do novo movimento litúrgico iniciado pelo Papa Bento XVI.

Esperamos que esta tradução, publicada pelas Edições Loyola, sane alguns problemas de tradução da edição portuguesa.

Mais informações no site da editora.






segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Série de aulas ao vivo sobre o missal de Paulo VI, por Pe. Paulo Ricardo

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O Pe. Paulo Ricardo vêm realizando uma série de aulas ao vivo a respeito do Missal de Paulo VI. Trata-se de uma análise séria, crítica é verdade, mas com o propósito de colaborar com a reforma da reforma do Papa Bento XVI.

Pretendo fazer alguns comentários sobre estas aulas em breve. Deixo, por ora, os links para as aulas que já aconteceram.


A primeira delas teve como tema "O missal de Paulo VI e a reforma da reforma litúrgica de Bento XVI", com a seguinte descrição:
O pontificado de Bento XVI deu uma atenção especial à chamada “reforma da reforma”. O foco era corrigir as imprecisões e aberturas do Missal de Paulo VI, que dão espaço a interpretações protestantes da Celebração Eucarística. Mas quais são essas aberturas e como elas surgiram? E qual deve ser a posição dos católicos frente a esses problemas?
Semana passada (27 de agosto) ocorreu a segunda aula desta série, intitulada "O Missal de Paulo VI e a hermenêutica da continuidade":
Após o programa da semana passada, muitas pessoas questionaram se havia alguma solução válida para coibir os abusos litúrgicos, decorrentes de uma interpretação protestante do Missal de Paulo VI. Para Bento XVI, sim, há uma solução: a hermenêutica da continuidade.
As aulas vêm ocorrendo nas noites de terça-feira, a princípio semanalmente. Mais informações no site do Pe. Paulo Ricardo.

***

Atualização (03/09/2013):

O Pe. Paulo Ricardo publicou a seguinte carta, com o intuito de tornar mais clara sua posição sobre o Missal de Paulo VI e sanar eventuais dúvidas e mesmo manipulações de suas palavras:

Várzea Grande, 3 de setembro de 2013.
Salve Maria!
Alguns alunos pediram o costumeiro resumo dos conteúdos de meus dois programas ao vivo a respeito de O Missal de Paulo VI e a "reforma da reforma". Decidi fazê-lo pessoalmente para evitar quaisquer equívocos, devido à delicadeza da matéria.
Os dois vídeos são fruto de uma longa reflexão pessoal, que iniciou com a leitura do livro Introdução ao Espírito da Liturgia, do então Cardeal Ratzinger. É de conhecimento comum que o referido livro desencadeou um movimento litúrgico no mundo inteiro. O providencial pontificado do Papa Bento XVI aumentou ainda mais a amplitude e profundidade de seu alcance.
De forma brevíssima poderíamos resumir assim os dois vídeos:
  1. Vídeo 1 – O conteúdo do Missal de Paulo VI é católico, mas, por causa de sua linguagem ecumênica, não toma as precauções que impediriam a manipulação de uma leitura protestante. No século XVI, este tipo de manobra conduziu a Igreja da Inglaterra à perda da fé na Eucaristia.
  2. Vídeo 2 – O tipo de artimanha descrita no vídeo anterior tem feito um mal imenso à Igreja graças à militância de maus teólogos. Devemos seguir o exemplo de Bento XVI e usar as possibilidades que o Missal de Paulo VI nos dá de celebrá-lo de uma forma mais tradicional. Ao mesmo tempo, a liturgia antiga deve ser possibilitada amplamente. Ao Espírito Santo caberá nos conduzir e determinar o futuro do Rito Romano.
Penso que estes dois curtos parágrafos transmitem com fidelidade a substância do que eu desejei transmitir através dos programas.
Espero que isto também seja um instrumento para desmascarar a distorção sensacionalista de alguns resumos que circulam pela internet e que gostariam de interpretar estes dois programas como se fossem uma condenação do Missal de Paulo VI e do Concílio Vaticano II. A estas pessoas eu gostaria de responder com as palavras usadas pelo próprio Cardeal Ratzinger para defender o movimento litúrgico que desejava iniciar:
[Que] se crie a impressão de que nada no Missal jamais poderá ser mudado, como se qualquer reflexão a respeito de possíveis reformas futuras fosse necessariamente um ataque ao Concílio – a uma tal ideia eu só poderia dar o nome de absurda.
(Cardeal Joseph Ratzinger, "Réponse du Cardinal Ratzinger au Père Gy". in La Maison-Dieu 230.2 (2002) 113-20).
Peço aos amigos que divulguem amplamente estes resumos. É um auxílio ao debate sadio das ideias ali enunciadas e uma caridade para com algumas pessoas que não têm tempo ou disposição para assistir os dois longos vídeos. Algumas delas, aliás, de forma imprudente, não se abstém de opinar levianamente a respeito de um assunto sobre o qual não se deram o trabalho de sequer colher as informações preliminares (pedir a estas pessoas uma meditação séria e uma honesta busca da verdade é querer colher uvas de um espinheiro...).
Devido à importância da matéria, pediria também aos sacerdotes e aspirantes ao sacerdócio que acolhessem estas minhas reflexões como um convite ao estudo e ao desapaixonado e objetivo debate do tema.
Peço a Deus que este modesto serviço sirva para o crescimento de sua Santa Igreja, da qual me confirmo filho devotado e obediente,
In Iesu et Maria,
Padre Paulo Ricardo

quinta-feira, 2 de maio de 2013

Espiritualidade pagã e espiritualidade cristã

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Todos nós conhecemos as críticas de Nosso Senhor Jesus Cristo aos fariseus por tratarem muitas vezes a observância da Lei cerimonial do Antigo Testamento de forma ritualista, supervalorizando o exterior e descuidando do interior. Creio eu que essa espiritualidade exterior possa ter sido influenciada pelo paganismo. Mas para isso, é necessário retrocedermos um pouco...

Em finais do século V a. C., o profeta Malaquias anunciava a indignação de Deus com relação ao desleixo dos sacerdotes judeus com o culto do Templo de Jerusalém (ofereciam pães profanados, animais coxos, enfermos ou com ossos quebrados, contrariando as prescrições levíticas do Pentateuco mosaico).  Logo após a repreensão, o Senhor anuncia, pela boca de Malaquias, uma nova e pura oblação. Os Padres da Igreja interpretaram essa oblação pura anunciada (a ser oferecida do nascer ao por do Sol em todo o lugar) como a Celebração Eucarística, a Santa Missa. Não é nosso objetivo nesse momento analisar a superioridade e plenitude do Sacrifício eucarístico da Nova Aliança com os sacrifícios da Lei antiga. O erro condenado por Deus na Profecia de Malaquias refere-se ao desleixo nos aspectos exteriores do culto, que muitas vezes torna-se reflexo do desleixo interior ou de uma compreensão errada da Misericórdia Divina e do dever de se fazer as coisas com empenho. Esse delito recorda-nos as banais oferendas de frutos de Caim, diferentes de Abel que buscava oferecer a Deus os melhores cordeiros de seu rebanho. A Deus devemos oferecer o que temos de melhor, sendo as pequenas coisas e as coisas exteriores reflexos de uma adoração interior.


Nos tempos de Jesus, ao que parece, o desleixo litúrgico havia decaído, sobrando talvez como centelha deste fenômeno apenas o comércio e câmbio monetário dentro dos átrios do Templo de Jerusalém. Flávio Josefo relata como o povo e os sacerdotes conservavam o silêncio durante os sacrifícios. No mundo pagão sob o Império de Roma, as coisas não pareciam estar tão diferentes: na passagem do séc. I a.C. para o I d.C. Otaviano César Augusto havia reformado a liturgia dos sacrifícios, restaurando os usos da tradição do povo romano, apoiando-se no caráter ritualista. O culto dos gregos e romanos (e de muitos povos idólatras com quem os judeus tiveram contato no Antigo Testamento) era ritualista, ou seja, baseava-se unicamente na perfeita execução dos elementos exteriores, dos ritos, nos seus mínimos detalhes (um único erro invalidava o sacrifício, tornando necessária sua completa repetição desde o início). Para isso é necessário que entendamos que na religião greco-romana a relação do home com a divindade era em sua essência uma relação de troca: o homem busacava agradar os deuses com sacrifícios, oferendas, libações, jogos, etc em troca de favores. A moral e as normas de conduta não integravam a religião, tendo sido objeto de reflexão dos filósofos e suas escolas. A religião era apenas mais um dos diversos departamentos da vida, tendo um aspecto doméstico (os deuses e ancestrais protetores da família e da casa) e o público (os deuses do universo, responsáveis pelo funcionamento do universo e de vários aspectos da vida). A religião pública era considerada um dos componentes das autoridades e magistrados, que legislavam sobre os ritos e sacrifícios, além de auxiliar materialmente a construção e preservação dos templos, santuários e altares públicos.

 
A mentalidade religiosa pagã pode ter penetrado com maior força entre os judeus sob o reinado de Herodes, o Grande. Herodes era filho de mãe judia e pai idumeu (os idumeus eram uma tribo árabe que havia sido submetida ao judaísmo sob a dinastia dos reis Asomneus) e parece não ter sido extamanete o que chamaríamos de um judeu convicto: quando esteve em Roma e recebeu a coroa da Judeia das mãos do triúnviro romano Marco Antônio, Herodes subiu ao templo do Monte Capitólio onde ofereceu um sacrifício a Júpiter. Embora Herodes tenha eliminado grande parte da aristocracia judaica que compunha o Sinédrio, conseguiu controlar o cargo de Sumo Sacerdote do Templo judaico o que fizeram também depois os governadores nomeados por Roma. Assim, a aristocracia do Templo era bastante influenciada pelos pagãos. Por outro lado, os fariseus buscavam acentuar a identidade judaica, pregando uma observância rigorista da Lei mosaica. Trata-se, naturalmente, do segundo erro extremo concernente ao culto: a supervalorização dos elementos exteriores em detrimento da vida interior. Opondo-se a isso, Nosso Senhor fala da verdadeira adoração como sendo "em espírito e verdade". A adoração deve refletir uma vida de santidade. 

A Lei mosaica era composta de dois elementos: prescrições morais (princípios de conduta com relação a Deus e ao próximo, do qual o centro é o Decálogo, os 10 mandamentos) e prescrições cerimoniais (alguns costumes, hábitos e formas de celebrar o Culto). Contudo, o historiador Paul Veyne aponta que o Cristianismo fora recebido no mundo romano com um certo ar de novidade ao combinar uma religião (relação homem-Deus, culto) com uma filosofia de vida (moral, normas de conduta). Tal fato pode nos levar a corroborar a veracidade das críticas de Jesus aos fariseus, corrente predominante nas diversas comunidades judaicas então espalhadas pelo Império. Ao mundo romano, a observância farisaica da Lei pode ter sido visto de forma muito semelhante a sua forma ritualista de encarar a religião. Basta lembrarmos que os Césares ordenavam oferecer em seu nome ocasionalmente sacrifícios no Templo de Jerusalém.

A liturgia deve estar unida a nossa vida: os ritos exteriores devem ser executados com amor e cuidado, mas sendo esse amor e cuidado um gesto de amor e carinho para com Deus, tal como um filho que prepara com toda dedicação um presente para seus pais, ainda que dentro de suas limitações. Tal como as nossas boas obras obras devem ser reflexo de uma Fé reta, a celebração da Sagrada Liturgia da Igreja deve ser um reflexo de uma vida santa de seus membros. No Ofertório da Missa, oferecemos nossos trabalhos, obras, orações, sacrifícios, afetos, intenções e nosso ser por inteiro juntamente com o Sacrifício de Cristo que se torna presente debaixo das aparências do Pão e do Vinho eucarístico
s. São Josemaría Escrivá escreveu que deveríamos amar a Santa Missa como sendo o centro de nosso dia, onde oferecêssemos nosso trabalho, apostolado, obras, intenções e ações de graças e onde nos muniríamos das graças necessárias para continuar nossos afazeres e dar testemunho cristão durante o dia, de forma que o dia tornasse um prolongamento da Missa celebrada. Tal pensamento vale igualmente para os que assistem missa diária quanto para os que assistem somenta a missa dominical.


Porventura não agem às vezes muitos cristãos como os maus sacerdotes do Antigo Testamento, desprezando o aspecto exterior do culto? Não agem outros no extremo contrário, achando que rendas e brocados e o barroco em larga escala converterão o mundo? Em nossas orações e participação da Missa não agimos muitas vezes com uma mentalidade de troca? Não estão em muitas almas as devoções corrompidas por essa barganha pagã? Que façamos essas perguntas em nosso exame de consciência e possamos cada vez mais ao participarmos da Liturgia unirmo-nos às intenções de toda a Igreja, buscando como Jesus no jardim das oliveiras aquele desejo de que "faça-se a Tua vontade e não a minha". E que esse participação ativa seja também frutuosa, refletindo em uma santificação de todas as nossas atividades cotidianas e de nossa relação com o próximo.


sexta-feira, 19 de abril de 2013

Manifesto Pelo Novo Movimento Litúrgico

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A História da Sagrada Liturgia tem nos mostrado que, na imensa maioria das  vezes, são os Sumo Pontífices que iniciam os processos de adaptação e reforma ritual da  Igreja. Foi assim com a compilação que mandou fazer o papa Gregório Magno dos  textos até então usados, foi assim com os textos litúrgicos que foram levados e  difundidos ao Norte dos Alpes pelos francos, também o foi assim quando o Concílio de  Trento quis que os ritos de menos de duzentos anos de uso comprovado fossem postos de lados ou quando o Rito Romano consolidou-se, cristalizou-se, com o Missale  Romanum, promulgado por São Pio V.

Também vieram dos pontífices, por exemplo, a ideia que o Cardeal Quignonez colocou em ordem: resumir o Breviário Romano e adaptá-lo para um uso mais ligeiro  dos sacerdotes. Uma ideia que, felizmente, foi abandonada assim que se percebeu o  tamanho do problema que se havia criado, simplificando o rito litúrgico para se adaptar  a realidade da Idade Moderna.

No século XIX há um movimento que, de certa forma, atinge a Igreja, mas que  não vem dela, chamado Positivismo. De maneira geral, é por causa dele que,  atualmente, temos as Ciências em formas tão variadas, mas também de forma bastante estanques, quase como que compartimentadas e, infelizmente, algumas vezes sem que  uma interaja com a outra. É do século XIX, nas Ciências Humanas principalmente, que  nasce o desejo pela redescoberta e catalogação de fontes históricas, especialmente  documentos régios e burocráticos, que não apenas acrescentassem pontos novos à  História e ao pesquisador, mas que também acabassem por legitimar o ambiente social  da época. 

Vastas bibliotecas de manuscritos foram catalogadas e expostas à luz do dia  depois de centenas (alguns, milhares) de anos. Foram lidos e datilografados, depois  publicados em vastas bibliotecas de fontes ainda hoje existentes e de extrema  importância para qualquer pesquisador sério. A Ciência Histórica conseguiu, talvez  mais que em qualquer momento antes ou depois em sua trajetória, atingir uma crescente  onda de novas produções e de novas interpretações graças a esses documentos.

Também a Igreja não passaria imune por essa fase histórica, ainda que sofrendo  indiretamente seus efeitos. A começar que o século XIX, ainda que tenha sido um  século de grandes papas, um Concílio Ecumênico, uma definição dogmática e várias  aparições famosas e importantes de Nossa Santa Mãe, também foi o século que  começou mergulhado nas sombras do Iluminismo de Napoleão, de um crescente  Racionalismo antirreligioso, de uma arte que passa a valorizar a sensualidade, de  anticlericalismo destacado e apoiado por vastos estados e, por fim, com a unificação da  Itália e o papa que se faz prisioneiro do Vaticano. A Igreja ainda não saíra de todo de uma crise no século XVIII. O galicanismo  permeava grande parte das igrejas francesas, com padres e bispos apoiando doutrinas  contrárias ao que pedia Roma, inclusive o conciliarismo e teses ligadas a independência da Igreja católica francesa de Roma. Para piorar, a época foi de certa confusão doutrinal  e moral, pois muitos padres “galicanos” afastavam os fiéis da Santíssima Eucaristia,  julgando que a maioria deles era, simplesmente, de segunda classe e que, com toda  certeza, o ato de receber Nosso Senhor Eucarístico seria um sacrilégio. Um dos padres  da época chegou a proclamar: “Orgulho-me em dizer que este domingo não houve  nenhuma Comunhão sacrílega em minha igreja, porque nenhum dos fiéis comungou”.

Eram momento difíceis para a Igreja que precisava lidar com a Revolução burguesa, os  ideias liberais e com crises internas. Porém, mesmo nos momentos mais escuros, nasce  a luz. Foi na França que o remédio para o próprio Galicanismo nasceu. E veio de um  mosteiro e de um monge. Era dom Gueranger, no século XIX, que é conhecido, antes de  qualquer coisa, como o incentivador e renovador do canto gregoriano em sua abadia,  São Pedro de Solesmes. Porém, para além do incentivo ao santo gregoriano, o abade  trabalho em grande programa de explicação, difusão e incentivo do calendário romano  (e que tornou-se seu famoso “O ano litúrgico”), com uma forma de se voltar França à  Roma. Como? Levando o povo de volta à própria Liturgia romana e dando a esta seu  devido lugar na vida dos fiéis.

Os historiadores da Liturgia têm o costume de colocar Dom Prosper Gueranger  como o iniciador do “Movimento Litúrgico”. Esse Movimento, não muito depois de  Dom Prosper, também se aproximou das fontes principais da própria liturgia que,  devagar, iam sendo publicadas. Era de entendimento geral que a Liturgia não deveria,  simplesmente, ser um mundo arcano e afastado das realidades dos fiéis. Os fiéis deveriam ser conduzidos à Liturgia e levados a um profundo conhecimento e amor por  ela. A religião não deveria ser apenas uma sequência de preceitos, mas de um amor  grande pelo Senhor e centralizar a vida dos fiéis na Santíssima Eucaristia, Nosso Senhor  Jesus Cristo presente no pão e no vinho em Seu Corpo, Sangue, Alma e Divindade.

Durante todo a segunda metade século XIX e a primeira do século XX houve um  movimento gradativo, mas bastante forte, para tornar a Liturgia central na vida dos fiéis.  Apareceram os primeiros missais para aproximar os leigos do ritual, livros sobre a  vivência dos diversos tempos do ano litúrgico, além de dezenas de eventos dentro do  âmbito acadêmico voltado ao estudo da Liturgia. Parecia ser uma primavera litúrgica na  Igreja, trazendo o Cristo para o centro dos olhares e atenções dos fiéis. Porém, nem tudo foram luzes no “Movimento Litúrgico”. Foi depois da II  Guerra Mundial que algo mudou dentro dele. Os clamores por “simplificações” e  “adaptações ao espírito do homem moderno” começaram a ser ouvidos mais altos.

Surgiram teorias sérias que diziam que a liturgia estava degradada e, consequentemente,  precisava ser refeita. E o “Movimento Litúrgico”, ainda que ganhando cada vez mais  força, perdeu seu rumo original. Se a questão original era melhor formar o homem à  Liturgia, a partir desta segunda fase dele há uma mudança de rumo e clama-se para que  a Liturgia se adapte ao homem.

O Concílio Vaticano II, talvez o mais importante evento da Igreja do século XX,  dá centralidade à Santa Missa, à Liturgia, respondendo aos apelos dos peritos do  “Movimento Litúrgico”, inclusive muitos deles estando presentes no próprio evento. E é  dele que sai a Liturgia Reformada pelo papa Paulo VI que chamaremos aqui de “Novus  Ordo”.  O período que segue o Concílio, ainda que se esperasse um período de nova  primavera para a Igreja, liturgicamente foi de quase total e completo caos, sendo também um período complicado, não apenas fora, mas dentro da Igreja. A mídia cria  um Concílio que não é o mesmo Concílio da Igreja. O Concílio da mídia é aquele que  interpretou os documentos eclesiais como bem lhe aprouve, querendo adaptar a Igreja  ao homem moderno e não a linguagem da doutrina de sempre para a sociedade atual.

Explodiu a experimentação dentro da Liturgia, porque o homem moderno é dado a  novidades. O que era anterior ao Concílio, muitas vezes, foi considerado menor, errado  ou estragado, doutrina que, infelizmente, ainda hoje é ouvida por muitas pessoas e  pregada por tantas outras. Muitos homens da Igreja apaixonaram-se pela novidade. O  Missal promulgado pelo papa Paulo VI tantas vezes foi esquecido, tornando-se apenas o  lugar para as orações próprias do dia, todo o resto da Santa Missa, muitas vezes, foi  diminuído ou esquecido. Pululou o invencionismo. Pululou o relativismo. A Igreja sempre manteve a vigilância sobre a Santa Liturgia, mas poucas vezes foi ouvida.  Porém, algo novo aconteceu após o Concílio. Também os leigos entraram na luta pela Santa Liturgia. Frente ao complicado espetáculo que, algumas vezes, se delineava  em certas igrejas, foram também os leigos que pediram fidelidade às normas litúrgicas.  Surgiram, assim, movimentos devotados à correta celebração da Santa Liturgia vindo de  sacerdotes e de leigos. Com o beato papa João Paulo II vimos grandes documentos sobre a Eucaristia e  instruções de como bem celebrar a missa, mas, talvez, o ápice deste movimento foi o pontificado do papa Bento XVI, já no começo do século XXI. O papa Bento XVI não  foi um legislador sobre a Liturgia, nem um legislador sobre nenhuma outra matéria  dentro da Igreja. Legislou sobre a Liturgia, sim, porém uma única vez. Basta nos  voltarmos ao Motu Proprio “Summorum Pontificum” que delineia as normas para o uso  do Missale Romanum do beato papa João XXIII e que chamaremos de “Usus  Antiquior”. 

Mas, com toda certeza, a imagem do santo padre estará, sempre, associada à  Santa Liturgia. Não apenas por ter sido sempre um grande apaixonado pela Santa  Liturgia, devotando muitas páginas sobre o assunto, como o seu já clássico livro  “Introdução ao Espírito da Liturgia”, mas também porque ele deu-nos o exemplo, com  celebrações solenes e dignas. Também foi ele a dizer que não devemos interpretar o  Concílio de forma errônea e, igualmente, apontar-nos que precisamos de um novo  movimento litúrgico. Porém, este novo Movimento Litúrgico não deve sair de seu  âmbito, assomando a si as ferramentas para julgar e mudar a Liturgia. Isso é  experimentalismo e nem mesmo a Igreja tem feito isso com a Liturgia. O novo  Movimento Litúrgico, antes de mais nada, deve ser a ferramenta de transformação do  homem para bem viver a Santa Liturgia, muitas vezes tirando o próprio homem do centro da celebração e colocando nela Jesus, o Verbo de Deus. Além disso, deve ser base desse novo Movimento Litúrgico a fidelidade às normas e às especificações do  Magistério, cuidando para que os desvios litúrgicos não sejam mais realizados.

O amor pela Santa Liturgia do santo padre Bento XVI contagiou muitas pessoas. Aqui é importante pensarmos que precisamos salvar a liturgia para salvar o mundo. A  Liturgia não é uma sequência de normas dispostas a esmo, como também não é um  mundo sem norma alguma. A Liturgia é o espaço privilegiado de encontro com o  Senhor que vem, do Emanuel Deus Conosco, que se faz presente no meio dos seus. É na  Liturgia que o Esposo vem visitar a Esposa em um encontro íntimo, tão íntimo que nas  antigas igrejas se poderia separar a nave do presbitério no momento da Consagração por uma cortina, fazendo com que os fiéis não vissem o Esposo apresentando-se a esposa.  Salvar a Liturgia dos excessos, dos experimentalismos, dos gostos pessoais, é colocá-la  em seu lugar de direito: como centro da vida dos fiéis, é respeitar suas normas e promover a restituição de sentido do sagrado do mundo. 

Porém, já nos deveria ser claro que o papa Bento XVI não seria papa para  sempre e que aquele que o sucedesse no Trono de Pedro poderia ter outras obrigações e  planos que não a continuação das propostas litúrgicas de Bento XVI. Isso não leva os papas a serem melhores sou piores, mas nos leva a agradecer aos Céus por termos pessoas diferentes em tempos diferentes e que governam a Igreja segundo as suas necessidades. Assim, chegou a hora de o Movimento Litúrgico que vimos delineando-se no pontificado do papa Bento XVI deixar a internet que, até agora, tem sido também seu  campo privilegiado. Sim, há muita gente que trabalha arduamente para que haja o  desenvolvimento e aplicação das normas na Liturgia e de sua correta celebração, porém, um grande celeiro de conhecedores da Liturgia está no meio virtual. Chegou a hora de deixarmos os teclados de lado e arregaçarmos as mangas, usando, sim, do meio virtual para evangelizar e discutir, mas também precisamos de mãos para trabalhar. Cada uma de nossas igrejas, por menores que sejam, contam agora com nossas mãos. O pouco que temos, bem aplicado, tornar-se-á muito.

Neste espírito, abaixo, sugerimos algumas das possíveis linhas de ação a serem seguidas pelo Novo Movimento Litúrgico. São de fáceis aplicações e, igualmente,  pensadas para serem bastante práticas.
1. Os beneditinos, assim também a Milícia de Santa Maria, não desenvolvem votos de pobreza ou de obediência ao santo padre, mas são obrigados ao voto de “Conversão dos costumes” (conversatio morum) ao entrarem nos mosteiros (ou assumirem a Associação como parte de suas vidas). Trabalhar em prol da Liturgia é muito mais do que criticar a posição das mãos deste sacerdote ou dizer que tais objetos são mais dignos que outros para a Santa Missa. A conversão dos costumes é a base de todo apostolado. Ninguém que queira seguir adiante com o menor apostolado católico  deve se esquecer que a ação, sem a oração, é e será sempre infrutífera, ou pelo menos  efêmera. Se quisermos lutar pela Santa Liturgia, devemos procurar todos os meios possíveis para nossa santificação: buscarmos um bom diretor de consciências, rezar o santo rosário, participar dignamente dos Santos Mistérios, ter uma vida de oração e buscar sempre o Sacramento da Reconciliação. Porém, devemos nos entregar ao Senhor totalmente, esperando que Ele faça de nós seus instrumentos. Sem a conversão de  nossos costumes, o sincero desejo de sermos verdadeiramente santos como o Pai é santo, podemos cair não apenas nas ações vazias, mas em fazer ações que seriam boas tornarem-se más pela nossa soberba. Sem dobrar os joelhos em fervorosa oração, o  Novo Movimento Litúrgico tenderá a falhar desde seu início e a conduzir aqueles que dele tomarem parte a um fim bastante ruim.
2. Não se ama o que não se conhece e, infelizmente, atualmente as pessoas tendem a serem mais espertas que outras. Infelizmente, certos grupos tomam o lugar onde o discurso é feito e discursam qualquer coisa que não o correto, passando-o pelo correto. Devemos retomar o lugar do discurso sobre a Liturgia, ensinando e repetindo o que ensina a Igreja. Assim, a próxima ação é promover o estudo da liturgia, em sua forma mais geral. Não apenas as normas, mas seu sentido, sua teologia e sua espiritualidade. Os mitos devem ser desfeitos e a clareza da Igreja deve brilhar. O material ruim deve dar lugar ao bom material de estudo litúrgico. Opiniões pessoais devem estar em seus devidos lugares e não parecer que estas são as ações em si. A promoção pode ser feita de várias maneiras, a começar pela própria internet, mas também em reuniões em grupos de amigos e paroquianos.

3. Igualmente, caberá a todos nós promover e incentivar o canto sacro. Por definição, o canto sacro católico é o gregoriano, porém a Igreja nunca desprezou outros estilos musicais. Devemos retornar as nossas fontes identitárias em relação à música. O canto gregoriano é simples, ainda que melodioso; austero, ainda que espiritual; leve, ainda que profundo. É tempo de retomarmos nossas fontes e de nos despirmos dos preconceitos contra as formas cantuais tradicionais da Igreja. A volta do gregoriano, e da polifonia sacra, será uma forma de se recoroar o órgão como rei dos instrumentos musicais e das nossas celebrações litúrgicas. Igualmente, a busca por uma melhora constante no canto sacro, levará a criação de novas peças melhores que as atuais (e livres de, por um lado, canto de militância e, por outro, do canto sentimental extremado que gera individualismo).
4. Também, nos caberá promover o Novus Ordo bem celebrado, sem invenções, dentro do espirito característico do Rito Romano que é conhecido pela sua sobriedade. Devemos nos esforçar para que a forma comum de nossas celebrações seja primada não apenas pela sobriedade, mas por grande reverência dos fiéis. Todos aqueles que tomam parte em sua celebração devem primar pelo zelo litúrgico e amor a Nosso Senhor Sacramentado como, igualmente, os sacerdotes devem primar pela sua ars celebrandi. Que os paramentos e objetos sejam dignos, ajudando a elevar os corações  dos fieis ao alto, porém, que eles não sejam a parede ou a muleta onde escora-se a celebração. A Santa Missa bem celebrada pode, ou não, ter bons paramentos, mas terá devoção, boa homilia, zelo litúrgico, acolhida... Ainda que paramentos belos realcem o valor sagrado da Eucaristia, não poucas vezes eles podem transformar-se em uma muleta que leva os olhos ao espetáculo, mas mantem os corações vazios.
5. Igualmente, devemos promover, dando a conhecer e ajudando a desmistificar, o Usus Antiquior. Não devemos opor o anterior ao posterior do Concílio. Da mesma forma, devemos dar a conhecer o Uso Antigo do Rito Romano que foi instrumento de santificação de milhões de fiéis antes do nosso Novus Ordo. Nosso apostolado pode ocorrer de dezenas de formas, na internet com a divulgação de fotos, vídeos e textos. Igualmente, devemos dar a conhecer esta forma litúrgica aos sacerdotes e grupos de fiéis fora da internet. Não de forma abrupta e desrespeitosa, mas com amor e caridade. Os mitos que se desenvolveram em torno do Uso Antigo devem ser desfeitos com calma e caridade. Os grupos de fiéis que, por graça e benção de Deus, já celebramno devem empenhar-se na solenização do mesmo, que as Santas Missas na Forma Extraordinária do Rito Romano resplandeçam pela beleza, sobriedade e profundidade espiritual, tudo favorecendo para elevar o nosso coração ao Senhor.
6. Sabemos que enfrentaremos oposição, como também sabemos que, infelizmente, a situação da Forma Ordinária do Rito Romano em muitas igrejas pelo Brasil e o mundo não é boa, pois abundam a “criatividade” e certo subjetivismo. Então, aqueles que têm os documentos devem chegar e revolucionar o lugar? Ainda que pareça certo, isso é pastoralmente incorreto. A ideia aqui é transbordar o mal com excesso de bem, ou seja, muitos erros que parecem entranhados na comunidade, apenas são considerados certos porque foram ensinados como tal. As pessoas não cometeram erros por hipocrisia, mas pensam que fazem o certo porque foram ensinadas assim. Cabe-nos, com amor, paciência e formação, transbordar esse mal e esse erro em bem e que, antes de tudo, possamos fazer, em proporção, o bem muito mais que a quantidade de mal. Por fim, ficamos com a doutrina da Igreja que diz que dar bom conselho e corrigir o errado, dentro da caridade, são partes dos atos corporais de misericórdia.
7. Por fim, cabe lembrar que a base de todo movimento é a organização. Assim, deve-se organizar-se grupos coesos e com práticas de piedade. Os grupos ajudam a desenvolver a ideia de coesão, pode-se haver líderes e, por exemplo, vários grupos podem juntar-se em organizações maiores e, quiçá, organizarem até eventos de estudo e demonstração. A coesão e a relativa organização são necessárias para que o próprio Novo Movimento possa ser ouvido. Deve-se evitar que os grupos desenvolvam rivalidades, mas que haja um interessante e profícuo convívio fraterno entre eles. Por fim, que os membros de cada grupo lembrem-se que, antes de estudiosos ou acadêmicos, são católicos e como católicos devem se preocupar com suas almas, assim, grupos que não rezam e não entregam seus trabalhos para a maior glória de Deus devem reformar-se. Se cada membro do grupo rezar e o grupo, como unidade, rezar, com toda certeza o trabalho será santificado e irá encontrar um bom caminho.
8. Porém, como leigos, devemos lembrar sempre que, por mais sábios, acadêmicos ou estudiosos que somos, fazemos parte da Igreja discente. Não ensinamos, mas nos resumimos a repetir o que diz a Igreja. São apenas os bispos, pela sua dignidade, que podem ensinar. Assim, devemos buscar apoio eclesiástico, não apenas entre os bispos, mas também entre os sacerdotes, diáconos e religiosos e religiosas. Quanto mais apoios eclesiásticos o Novo Movimento Litúrgico conseguir, mais facilmente ele conseguirá penetrar na Igreja, retirando o que for danoso e, com caridade, consertá-lo, difundindo a todos a Santa Liturgia bem celebrada.
9. Ao contrário de certos expoentes do primeiro Movimento Litúrgico, não devemos nos entender apenas como sábios, mas como católicos que precisam da Igreja para a Salvação. Assim, é nosso dever, sempre e em todo momento, ser fiel ao Magistério da Igreja. Devemos conhecer e pregar a Sã Doutrina e, igualmente, acatar com amor os possíveis documentos que venham a juntar-se ao campo litúrgico. Não devemos, nunca, sermos rebeldes à Igreja, mas deixarmos nossa soberba e orgulhos de lado e sermos fiéis servos e filhos da Igreja.
10. Por fim, entendendo que o grande idealizador e incentivador do Novo Movimento Litúrgico foi o papa Bento XVI, o último passo, será sempre recordar e estudar o legado do papa Bento XVI. Dessa forma, teremos sempre em nossos corações o que este grande papa fez pela Santa Igreja em seus muitos anos de serviço e ministério, também ajudando a difundirmos a boa teologia realizada por ele.São medidas simples e que não são pensadas como um plano de ação fechado em si mesmo ou sem falhas. Linhas de ação delineiam planos e, se bem realizados, esses planos nos levam a metas cumpridas. Não pensem que escrevi sem pensar ou querendo colocar o jugo sobre os ombros alheios, reconheço que devo ser o primeiro a colocar essas atitudes em ação e, igualmente, começar com a minha conversatio morumpessoal. Mas, são pequenos passos dentro do tempo de Deus, que farão o novo Movimento Litúrgico caminhar segundo a vontade d'Ele.
Assim, nesta Páscoa do ano do Senhor de 2013, entrego esses planos nas Doces Mãos marcadas com as chagas de Nosso Senhor pelas Mãos de nossa Santíssima Mãe e Suserana, a Bem-aventura Sempre Virgem Maria. Que Ela, como mulher Eucarística, possa acompanhar a Igreja do Senhor e interceder por todos aqueles que buscam a sacralização da Santa Liturgia, porque é nela que o Filho se nos torna presente, deixando o homem de lado e ensinando que, na Santa Liturgia, devemos ser não como Lúcifer que quis ser como Deus, mas como Santa Maria e são João Batista que disse (Ioh 3,30): "Illum oportet crescere, me autem minui", a mim importa diminuir para o Cristo aparecer.

São Paulo, 31 de março de 2013.

Solenidade da Páscoa do Senhor.

Michel Pagiossi Silva.
Freire d´Armas da
Militia Sanctae Mariae

sábado, 30 de março de 2013

O "Exsultet" - A Proclamação da Páscoa ou Precônio Pascal

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É o hino em louvor do círio pascal cantado por um diácono no Sábado Santo. No Missal o título do hino é "Præconium", como aparece na fórmula usada da bênção dada ao diácono: "ut digne et competenter annunties suum Paschale præconium". [Até os Missais da década de 20 (edição pio-beneditina) o nome era grafado como Exultet (sem o 's').] Fora de Roma, o uso do círio pascal parece ter sido muito antigo na Itália, na Gália e na Espanha, e talvez, pela referência de Santo Agostinho (Cidade de Deus, XV, 22), na África. O Liber Pontificalis atribui sua introdução na Igreja Romana local pelo Papa Zózimo. A fórmula usada para o "Præconium" não foi sempre o "Exsultet", embora talvez seja verdade dizer que esta fórmula sobreviveu, onde outras fórmulas contemporâneas desapareceram. No "Liber Ordinum", por exemplo, a fórmula é de natureza de uma bênção, e o Sacramentário Gelasiano traz a oração "Deus mundi conditor", não encontrada em outro lugar, mas contendo o notável "louvor da abelha" - possivelmente uma reminiscência - que é encontrado com algumas modificações em todos os textos do "Præconium" até o dia de hoje.

A regularidade do cursus métrico do "Exsultet" levar-nos-ia a datar sua composição talvez entre o início do séc. V e o fim do séc. VII, não após. Os mais antigos manuscritos em que ele aparece são dos três Sacramentários Galicanos: o Missal de Bobbio (séc. VII), o Missale Gothicum e o Missale Gallicanum Vetus (ambos do séc. VIII). O manuscrito mais antigo do Sacramentário Gregoriano (Vat. Reg. 337) não contém o "Exsultet", mas foi inserido no suplemento do que livremente foi chamado de Sacramentário de Adriano, e provavelmente elaborado sob a direção de Alcuíno.

Na liturgia, pode ser comparado com outras duas formas: a Bênção de Ramos e a Bênção da Fonte Batismal. Brevemente, a ordem dele é:

- Um convite a que os presentes se unam ao diácono na invocação da bênção de Deus, para que os louvores do círio sejam dignamente celebrados. Este convite, que carece nas duas bênçãos mencionadas, pode ser considerado como um "Orate fratres" ampliado, e sua antiguidade é atestada pela sua presença na forma Ambrosiana, que difere em algo da Romana. Esta seção termina com "Per omnia sæcula sæculorum", levando para o...

- "Dominus vobiscum" etc, "Sursum" etc, "Gratias agamus" etc. Esta seção, expressa na forma eucarística para enfatizar sua solenidade, serve como introdução ao corpo do "Præconium".

- O "Præconium" propriamente dito, é de natureza de um Prefácio, ou, como chamado no Missale Gallicanum Vetus, uma contestatio. Primeiro, um paralelo é traçado entre a Páscoa da Antiga e da Nova Aliança, sendo o círio uma espécie de Coluna de Fogo. E aqui a linguagem da liturgia se eleva a um grau que dificilmente é encontrado em qualquer outro texto na literatura cristã. Passamos de uma fria afirmação dogmática para o calor do mais profundo misticismo, para a região onde, à luz do paraíso, até o pecado de Adão é considerado verdadeiramente necessário e chamado de culpa feliz. Segundo, o próprio círio é oferecido como um holocausto, um tipo de Cristo, marcado com os grão de incenso como com as cinco chagas gloriosas da sua Paixão. E, por fim, o Præconium termina com uma intercessão geral pelos presentes, pelo clero, pelo papa, e por todos os governantes cristãos. [O texto rezava pelo governante do Sacro Império Romano. Como em 1804 o Imperador Francisco II da Áustria resignou a estas prerrogativas, por conta das Guerras Napoleônicas, a oração deixou de ser feita até o Papa Pio XII, em 1955, alterar o texto, para que se rezasse por todos os governantes em geral. Esta oração permanece apenas no Exsultet para a Forma Extraordinária do Rito Romano.]

São notáveis três acessórios do "Exsultet": o cerimonial que se desenrola; a música a ser cantada e os "Rolos do Exsultet" ou simplesmente os "Exsultet", que eram rolos em que o texto estava outrora escrito. O diácono veste uma dalmática branca, enquanto o restantes dos ministros sagrados está de roxo. A colocação dos cinco grãos de incenso às palavras incensi huius sacrificium provavelmente se originou de um equívoco na interpretação do texto. O acender do círio é seguido da iluminação de todas as lâmpadas e velas da Igreja, apagadas desde o fim das Matinas. O canto é normalmente uma forma elaborada do bem conhecido recitativo do Prefácio. Em alguns lugares uma longa bravura [=passagem musical que exige grande técnica e agilidade] era introduzida com a palavra accendit, para preencher a pausa que ocorreria para se acender o círio. Na Itália o Præconium era cantado a partir de longas tiras de pergaminho, gradualmente desenrolados ao passo em que o diácono ia cantando. Estes "rolos do Exsultet" eram decorados com iluminuras e com retratos dos soberanos que reinavam no tempo, cujos nomes eram mencionados no decorrer do "Præconium". O uso destes rolos, como se sabe atualmente, ficou restrito à Itália. Os melhores exemplos datam dos séc. X e XI.

[Na falta de um diácono, e se o sacerdote celebrante não o pode cantar ou não é apto para isto, um leigo pode fazê-lo.]

Fonte: Walker, Charlton. "Exultet." The Catholic Encyclopedia. Vol. 5. New York: Robert Appleton Company, 1909.
Tradução: Luis Augusto, ARS.





sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

A mão estendida durante a epiclese a consagração

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Um leitor de língua italiana apresentou a seguinte pergunta ao padre Edward McNamara, LC*:

Gostaria de um esclarecimento sobre a mão estendida na concelebração durante a epiclese na eucaristia e nas palavras da consagração do pão e do vinho. Todos os sacerdotes estendem a mão (com a palma para baixo) durante a epiclese sobre as ofertas, mas nem todos os concelebrantes estendem a mão como na epiclese durante as palavras da consagração. Muitos estendem a mão só de modo indicativo para as ofertas. As motivações são várias até mesmo dizer que durante as palavras da consagração se poderia tão somente repetir as palavras da consagração sem nem sequer estender a mão. Chega-se a dizer que a verdadeira transubstanciação acontece durante a epiclese e não ao pronunciar as palavras: "Este é o meu corpo. Este é o meu Sangue ". Qual das duas escolas deve ser seguida? - E.W.V., Suíça

Padre McNamara responde da seguinte maneira: Esta pergunta reflete um antigo debate sobre este gesto, que até agora derramou rios de tinta entre os liturgistas, sem realmente esclarecer ou resolver nada.

Em primeiro lugar, gostaria de salientar que, ao contrário de quando se pronuncia as palavras da consagração, o gesto de estender a mão neste momento também pode ser omitido, e não é necessário para a validade da celebração dos concelebrantes.

A verdadeira questão do debate é a de estabelecer se o gesto de estender a mão é meramente indicativo - uma indicação das sagradas espécies – ou se, ao contrário, é um sinal direto do poder de consagração dos concelebrantes.

O que mais se aproxima a uma declaração oficial a este respeito é a nota de rodapé nº 79 no Cerimonial dos Bispos que afirma: "Na consagração a palma da mão direita esteja voltada para o lado".

Isso parece colocar um fim ao debate em favor da posição lateral. No entanto, alguns especialistas apontam que a fonte desta nota é uma resposta de 1965 da Notitiae, órgão oficial da Congregação vaticana encarregada da reforma litúrgica. A Congregação tinha respondido afirmativamente à seguinte pergunta:

"Se é permitido interpretar a rubrica do Ritus concelebrationis Missae n º 39, c: "As palavras da consagração, com a mão direita... voltada para o pão e o vinho, "de modo que a palma da mão estivesse virada para a esquerda (não para a terra), de modo que o gesto da mão seria entendida como um gesto demonstrativo e de acordo com as palavras:" Isto é ... »?"

Uma coisa é permitir isso como uma interpretação, outra é dizer que ela é a única interpretação possível.

Além disso, em Notitiae 1 (1965) e 2 (1966), o aviso em questão está localizado sobre as respostas: uma solução proposta não assume nenhum caráter oficial. Somente tem um valor de orientação; soluções serão publicadas oficialmente, se o caso o justificar, pela autoridade competente nas Acta Apostolicae Sedis.

Dado que essa resposta nunca foi oficialmente sancionada continua a ser uma opinião válida e respeitável.

Entre aqueles que pensam diferente, foi o falecido estudioso beneditino Cipriano Vagaggini, que realmente contribuiu para a elaboração do novo rito da concelebração. Ele defendeu o gesto epiclético (invocador) das palmas voltadas para baixo da mesma forma que fazem todos os sacerdotes no início do rito da consagração, quando estendem as duas mãos e invocam o Espírito Santo para transformar o pão e o vinho no corpo e no sangue de Cristo.

Depois de alguns anos tornou-se claro que a discussão não estava indo a lugar nenhum e, na ausência de uma declaração oficial e última da Santa Sé, todos mais ou menos discordam.

Na prática, no entanto, o gesto voltado para o lado parece cada vez mais se tornar mais ou menos a prática normal.

Isso não significa que quando alguns padres agem de um modo ou de outro modo expressam um profundo desacordo teológico. Provavelmente não reflete nada mais do que a opinião de quem ensinou liturgia no seminário.

Finalmente, em relação à hipótese teológica de uma consagração gradual ou uma consagração durante a epiclese: para usar um eufemismo, esta posição parece aumentar as conclusões de algumas contribuições válidas na teologia eucarística, que procuraram sublinhar o benefício de considerar a oração eucarística no seu conjunto, ao invés de limitar a sua atenção na fórmula da consagração, a fim de alcançar um conceito mais completo e mais rico do mistério eucarístico.

A concentração no momento da consagração tende a privilegiar sobretudo o aspecto da presença real, enquanto que tendo em conta toda a oração eucarística, mostra especialmente outros aspectos, tais como: a Eucaristia como memorial do sacrifício de Cristo, a sua ressurreição e ascensão, o papel do Espírito Santo, o aspecto da mediação, o seu papel na construção da Igreja, etc. Em muitos aspectos, é o procedimento usado pelo Beato Papa João Paulo II, em sua encíclica Ecclesia de Eucharistia.

O uso deste método, no entanto, não contradiz a teologia tradicional católica segundo a qual existe um momento específico em que o pão e o vinho se transformam no corpo e sangue de Cristo durante a consagração (cf. Catecismo, n° 1348-1355, 1376-1377). Não podem haver fases no mistério eucarístico: ou é pão ou é Cristo, não há um meio termo.

Esta verdade também é indicada pelas rubricas da Missa que afirmam explicitamente que o sacerdote se ajoelhe em adoração depois de ter consagrado o pão e de novo depois da consagração do vinho. Não há nenhuma indicação assim depois da epiclese.

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*Legionário de Cristo e professor de Liturgia na Pontifícia Universidade Regina Apostolorum, em Roma.
 
Fonte: Zenit.
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