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sábado, 16 de dezembro de 2017

Sim, o Advento é um Tempo Penitencial

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Por Gregory DiPippo / New Liturgical Movement
Tradução e adaptação: Daniel Pereira Volpato / Salvem a Liturgia!

O começo de todo novo ano litúrgico traz pelo menos um artigo nas partes católicas da web “explicando” que o Advento não é um tempo penitencial. O Código de Direito Canônico é geralmente citado, uma vez que o Advento não é incluído na lista “oficial” de dias e tempos penitenciais, juntamente com a Instrução Geral sobre o Missal Romano, que o descreve como um período de “piedosa e alegre expectativa” (NdT: Normas Universais sobre o Ano Litúrgico e o Calendário, n. 39), sem menção à penitência.

A realidade desta matéria é mais complexa.  As tradições da Igreja não são determinadas compreensivamente ou resumidas em um Código de Direito Canônico, tampouco em um Missal ou outro livro litúrgico. É verdade que o Advento não é um tempo de jejum, e não tem sido assim no Ocidente há muito tempo. Por outro lado, na Quaresma, o jejum, o mais antigo e universal sinal da natureza penitencial daquele tempo, foi reduzido a risíveis dois dias, e as muitas referencias à “jejum” foram ou removidas ou alteradas para “abstinência” nas orações e hinos da Liturgia quaresmal. E, ainda assim, ninguém afirma que a Quaresma não é, portanto, um tempo penitencial.

Domingo Gaudete na Igreja de Nossa Senhora do Rosário, Blackfen, Inglaterra, 2013
Em sua história, Advento e Quaresma têm liturgicamente muita coisa em comum, e, na verdade, isso não mudou muito no rito pós-conciliar. As cores litúrgicas destes tempos, o roxo e o rosa, permanecem as mesmas. (Mais sobre isso abaixo.) Desde tempos muito antigos, as vestimentas que simbolizam a alegria de um dia festivo, a dalmática e a tunicela, eram substituídas em ambos os tempos por casulas plicadas, as quais foram (inexplicavelmente) abolidas tout court, não apenas no Advento. (Nas igrejas que não as possuíam, o diácono e o subdiácono usavam a alva, e o primeiro também a estola.) No novo rito, a dalmática pode ser dispensada “por necessidade ou em celebrações menos  solenes” (IGMR, n. 338). Como não há indicação do que constitui “celebrações menos solenes”, é-se perfeitamente livre para tratar os Domingos do Advento como menos solenes do que as festividades do Tempo do Natal, e deixar a dalmática de fora. (Esta rubrica é tão vaga que conduziu, infelizmente e inevitavelmente, em certos lugares, ao abuso de diáconos nunca utilizarem a dalmática, e sim o arranjo penitencial de alva e estola, mesmo nas grandes solenidades.)

Na Missa, o Gloria in excelsis é omitido aos Domingos em ambas as Formas do Rito Romano. Nos dias feriais do Advento, o Aleluia é tradicionalmente omitido antes do Evangelho; embora opcional no Novus Ordo, é um modo perfeitamente lícito de continuar a observância de um costume histórico da Igreja. Tradicionalmente, Advento e Quaresma também são ambos marcados pela remoção das flores do altar e pelo silêncio do órgão. Isso foi levemente modificado na liturgia pós-conciliar: flores e órgão são proibidos na Quaresma (não apenas desencorajados), mas podem ser usados no Advento “com moderação tal que convenha à índole desse tempo” (IGMR 305 e 313). Novamente, a imprecisão das rubricas permite que eles sejam deixados completamente de lado.

A exceção à regra tradicional da supressão das flores e música do órgão dá-se nos Domingos Gaudete e Laetare, quando seu uso é permitido da mesma forma que em outros domingos e festas juntamente com as características vestimentas rosa, criadas como uma mitigação do violeta penitencial. A permanência do Domingo Gaudete no meio do Advento é o sinal mais claro de que o caráter penitencial deste tempo persiste.

E Se Não Fosse, Deveria Ser

Deixando tudo isso de lado, quando chegar a hora da Reforma da Reforma (e ela certamente chegará, embora não saibamos nem o dia nem a hora), deve-se admitir que a “piedosa e alegre expectativa” tem sido um fracasso e deve ser reparada.  Não parece ter alcançado nada no tocante a refrear a orgia do consumismo que atravessa o Natal em boa parte do mundo. A restauração de algum grau de jejum e penitência no Advento, algo já praticado por muitos a nível pessoal, seria uma poderosa declaração católica das razões para este tempo.

Pessoalmente, acho triste como muitas árvores de Natal são desmontadas já na noite do dia 26. Este é um dos muitos sinais de que, ao invés de ser tido como um tempo de expectativa e alegria, o Advento tornou-se, em muitos lugares, uma versão ao contrário das oitavas do Natal e da Epifania. Pastoralmente, a Igreja deveria encorajar os fiéis a testemunhar a importância do nascimento de Cristo mantendo o todo do tempo do Natal, com as muito antigas e importantes festas litúrgicas que se seguem, como a grande e prolongada festa que tradicionalmente era; reestabelecer o caráter formalmente penitencial do Advento certamente ajudaria nisso, da mesma forma que a Quaresma faz para a Páscoa.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

Novidades no "Inspirado no Gregoriano": Graduale Simplex e mais

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Um dos grandes projetos relacionados ao canto sacro em português foi retomado com todo vigor nos últimos meses. Trata-se do "Inspirado no Gregoriano", que já divulgamos aqui anteriormente.



Lincoln Haas Hein, seu autor, retomou o trabalho de adaptação ao português de melodias gregorianas, agora com uma novidade: além das partituras, estão sendo disponibilizados vídeos de algumas das peças.

Durante o ano passado foram publicadas algumas adaptações, como o Ofício de Trevas da Quinta-feira Santa, o responsório O Vos omnes (Canto de Verônica) e o Pai Nosso.

A partir do Advento, contudo, Lincoln começou a adaptar as antífonas de entrada, ofertório e comunhão do Graduale Simplex, mais simples do que o Gradual Romano, e, portanto, com possibilidade mais ampla de uso da parte dos fiéis com pouco contato com o gregoriano.

Ofício da Quinta-feira Santa


Missa de Angelis


Adaptação do Roráte Caeli


Não deixem de acompanhar o projeto pelo site e também pelo Facebook.



quinta-feira, 13 de outubro de 2016

quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Como devem ser as velas do Altar e o arranjo beneditino?

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Neste vídeo, o cavaleiro Michel Pagiossi Silva, membro e preceptor da Milícia de Santa Maria, e autor da série de livros "Entrarei no Altar de Deusexplica esta questão baseando-se nos documentos oficiais da Igreja, seja da Forma Ordinária como da Forma Extraordinária do Rito Romano.


Assista o vídeo de como devem ser as velas do altar e o arranjo beneditino.


terça-feira, 30 de agosto de 2016

Como devem ser as toalhas do Altar?

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Post original - http://www.movimentoliturgico.org/como-devem-ser-toalhas-altar/ 

Segundo vídeo do canal da Academia Internacional de Estudos Litúrgicos “São Gregório Magno” com uma resposta dada a pergunta de um leitor: “Como devem ser as toalhas do Altar?”.



Nele, o cavaleiro Michel Pagiossi Silva, explica a questão a partir dos documentos da Igreja na Forma Ordinária e Extraordinária do Rito Romano!




segunda-feira, 8 de agosto de 2016

É possível a celebração versus Deum?

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`Post original: http://www.movimentoliturgico.org/e-possivel-celebracao-versus-deum/

Neste vídeo, o cavaleiro Michel Pagiossi Silva, membro e preceptor da Milícia de Santa Maria, e autor da série de livros "Entrarei no Altar de Deus", explica a questão da própria celebração versus Deum, iniciando o vídeo dizendo que não é necessário se esperar o primeiro Domingo do Advento para se iniciar esta forma de celebração, pois ela pode ser iniciada já! 



sábado, 23 de julho de 2016

Da suposta inovação na Festa de Santa Maria Madalena

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Alexander A. Ivanov - Aparição de Jesus Cristo a Maria Madalena (1835)
Ontem (22) celebramos a festa litúrgica de Santa Maria Madalena, que passou recentemente por alterações em sua classificação litúrgica. A respeito desta mudança e da suposta inovação que ela representaria, traduzo trechos de um artigo de Gregory DiPippo publicado no New Liturgical Movement:
"[..] um decreto da Congregação para o Culto Divino, que eleva a festa de Santa Maria Madalena, na Forma Ordinária, do grau de Memória Obrigatória para Festa, o mesmo grau em que se situam os Apóstolos, com exceção da Solenidade de São Pedro e São Paulo. Um novo prefácio foi adicionado a sua Missa, cujo restante permanece inalterado. [..] Seu Ofício será atualizado de forma mais perceptível, uma vez que agora deve haver salmos e antífonas próprias para o Ofício das Leituras, e Terça, Sexta e Nona não devem mais ser as da féria, como no caso das Memórias. Nenhuma referência foi feita à Forma Extraordinária, cuja festa permanece como de 3ª Classe; talvez a comissão Ecclesia Dei considerará elevá-la a 2ª Classe, por analogia ao novo decreto."
Comentando a balbúrdia gerada pelo fato do Papa Francisco elevar a festa de uma mulher para um grau em sua maioria ocupado pelos apóstolos, DiPippo esclarece:
"Não apenas isto não é uma novidade, é um retorno parcial a uma prática histórica do Rito Tridentino. No Breviário de São Pio V, que precede seu Missal em dois anos (1568), havia apenas três graus de festas: Duplex, Semiduplex e Simplex. A festa de Santa Maria Madalena era Duplex, ou seja, ela tinha duas Vésperas, antífonas dobradas nas horas maiores, nove leituras nas Matinas, precedência sobre Domingos comuns, e tinha que ser transferida caso impedida. É verdade que, mais tarde, quando as festas Duplex foram subdivididas em quatro categorias, ela permaneceu na mais baixa delas (juntamento com todos os Doutores, dentre outros). No entanto, os privilégios de seu grau litúrgico somente começaram a ser reduzidos no final do reinando do Papa Leão XIII, já no fim do século XIX.

"Como fiz perceber em 2014, num artigo sobre seu dia festivo, o Credo era tradicionalmente rezado na Missa de Santa Maria Madalena, em reconhecimento ao fato de que foi ela quem primeiro anunciou a Ressurreição aos Apóstolos. (Este aprazível costume foi removido do Missal Romano sem motivo discernível em 1955.) É por isso também que ela é chamada de "Apóstola de Apóstolos" em muitos textos litúrgicos medievais, como cantado pelos Beneditinos na antífona do Benedictus do seu Ofício:
"O mundi lampas, et margaríta praefúlgida, quae resurrectiónem Christi nuntiando, Apostolórum Apóstola fíeri meruisti! María Magdaléna, semper pia exoratrix pro nobis adsis ad Deum, qui te elégit."
Que Santa Maria Madalena interceda por todos nós.

sábado, 16 de julho de 2016

Uma opinião sobre as declarações do cardeal Sarah

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Neste vídeo, o cavaleiro Michel Pagiossi Silva, membro e preceptor da Milícia de Santa Maria, e autor da série de livros "Entrarei no Altar de Deus", sobre a questão levantada pelo cardeal Sarah no Congresso Sacra Liturgia 2016 sobre a celebração versus Deum e, em seguida, à resposta do padre Lombardi.


quinta-feira, 14 de julho de 2016

10 elementos de Renovação da Liturgia segundo Dom Schneider

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Trnscrevemos um excelente texto de Michel Pagiossi do site Movimento Litúrgico e autor do livro Entrarei no Altar de Deus com 10 elementos apontados por Dom Athanasius Schneider de Astana que são fundamentais para a renovação litúrgica. 


Texto original: http://www.movimentoliturgico.org/10-elementos-de-renovacao-da-liturgia/





  1. O tabernáculo, onde Jesus Cristo, o Deus encarnado, está realmente presente sob as espécies do pão deve ser colocado no centro do santuário, porque em nenhum outro sinal nesta terra é Deus, o Emmanuel, portanto, realmente presente e tão perto do homem como no tabernáculo. O tabernáculo é o sinal que indica e que contém a Presença Real de Cristo e, portanto, deve estar mais perto do altar e constituir com ele o sinal central, indicando o Mistério Eucarístico. O Sacramento do Tabernáculo e do Sacrifício do Altar não devem, portanto, estar em oposição ou separados, mas ambos em lugar central e juntos no Santuário (Presbitério). Toda a atenção daqueles que entram numa igreja deve espontaneamente ser direcionada para o tabernáculo e para o altar.
  1. Durante a Liturgia Eucarística – pelo menos durante a oração eucarística – quando Cristo, o Cordeiro de Deus é imolado, o rosto do padre não deve ser visto pelos fiéis. Mesmo os serafins cobrem seus rostos (Isaías 6, 2) quando adorando a Deus. Em vez disso, o rosto do padre deve ser voltada para a cruz, o ícone do Deus crucificado.
  1. Durante a liturgia, deve-se haver mais sinais de adoração – especificamente genuflexões – especialmente cada vez que o sacerdote toca a hóstia consagrada.

  1. Os fiéis que se aproximam para receber o Cordeiro de Deus na Sagrada Comunhão deve saudá-lo e recebê-lo com um ato de adoração, de joelhos. Que momento na vida dos fiéis é mais sagrado do que este momento de encontro com o Senhor?
  1. Deve haver mais espaço para o silêncio durante a liturgia, especialmente durante os momentos que expressam mais plenamente o mistério da redenção. Especialmente quando o Sacrifício da Cruz torna-se presente durante a oração eucarística.

  1. Deve haver mais sinais exteriores que expressem a dependência do sacerdote de Cristo, o Sumo Sacerdote, e mostrar mais claramente que as palavras que o sacerdote pronuncia (ie., “Dominus Vobiscum“) e as bênçãos que ele oferece aos fiéis dependem e fluem de Cristo, Sumo Sacerdote, não dele, a pessoa privada. Não “Saúdo-vos” ou “eu te abençoo”, mas “eu, o Senhor” faço essas coisas. Cristo. Esses sinais podem ser (como foi praticado por séculos) o beijo do altar antes de cumprimentar as pessoas para indicar que esse amor não flui do sacerdote, mas a partir do altar; e também diante de bênção, para beijar o altar, e depois abençoar as pessoas. (Isto foi praticado por milênio, e, infelizmente, no Novo Rito foi abolido). Além disso, curvando-se em direção à cruz do altar, para indicar que Cristo é mais importante do que o sacerdote. Muitas vezes na liturgia – no Rito Antigo – quando um sacerdote expressava o nome de Jesus, ele teria que voltar-se para a cruz e fazer uma reverência para mostrar que a atenção deve estar em Cristo, e não ele.

  1. Deve haver mais sinais que expressem o mistério insondável da redenção. Isto poderia ser alcançado através do véu dos objetos litúrgicos, porque o uso do véu é um ato da liturgia dos anjos. Velar o cálice, velar a patena com o véu umeral, o velamento do corporal, velar as mãos do bispo quando celebra-se uma solenidade, o uso de mesas de comunhão, também, para velar o altar. Também sinais – sinais da cruz pelo sacerdote e os fiéis. O sacerdote fazer sinais da cruz durante a oração eucarística e pelos fiéis durante outros momentos da liturgia; quando estamos benzendo-nos com a cruz é um sinal de bênção. Na antiga liturgia, três vezes durante a Gloria, o Credo, e o Sanctus, os fiéis faziam o sinal da cruz. Estas são expressões do mistério.
  1. Deve haver um sinal constante que expressa o mistério também por meio da linguagem humana – isto é, o latim é uma língua sagrada exigida pelo Concílio Vaticano II na celebração de cada Santa Missa e em cada lugar uma parte da oração eucarística deveria sempre ser dito em latim.

  1. Todos aqueles que exercem um papel ativo na liturgia, como leitores, ou aqueles que rezam a oração dos fiéis, devem estar sempre vestidos com paramentos litúrgicos; e somente os homens, sem as mulheres, porque este é um exercício no Santuário, próximo ao do sacerdócio. Mesmo ler o lecionário é direcionado à liturgia onde estamos a celebrar a Cristo. E, portanto, somente homens vestidos com vestes litúrgicas devem estar no santuário.
  1. A música e as canções durante a liturgia devem mais verdadeiramente refletir o caráter sagrado e devem se parecer com o canto dos anjos, como o Sanctus, a fim de serem realmente mais capazes de cantar a uma só voz com os anjos. Não só o Sanctus, mas toda a Santa Missa. Seria necessário que o coração, a mente e a voz do sacerdote e dos fiéis sejam direcionada para o Senhor. E que este seria manifestada por sinais e gestos exteriores também.
Para ler o artigo completo clique aqui

domingo, 29 de maio de 2016

"Prefeito da Liturgia" pronuncia exortação à celebração ad orientem

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Missa versus deum rezada na Church of the Holy Ghost, em Tiverton, Rhode Island
Fonte: iPadre



O Cardeal Robert Sarah pronunciou recentemente um forte encorajamento à celebração ad orientem da Santa Missa. Nas palavras dele, leitor e assembléia devem estar voltados um para o outro durante a Liturgia da Palavra, "mas assim que chega o momento em que se dirigem a Deus - do Ofertório em diante -, é essencial que o padre e os fiéis olham juntos para o oriente. Isto corresponde exatamente ao desejado pelos Padres Conciliares".

A leitura na íntegra do artigo original encontra-se no Catholic Herald, e uma tradução ao português no Sensus Fidei.

Não é a primeira vez que o Prefeito da Congregação para o Culto Divino e Disciplina dos Sacramentos trata da celebração versus deum - veja tradução de seu artigo publicado no L'Osservatore Romano aqui.

Esperamos que o Cardeal, enquanto prefeito do dicastério encarregado da Liturgia, consiga implementar este importante passo da reforma da reforma.

segunda-feira, 21 de março de 2016

Tecnologia e Liturgia

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Por: Prof. Carlos Ramalhete.

A liturgia é, como a Fé e demais graças, um presente de Deus. E, como fazemos com as graças, temos a tendência de estragar tudo, de trocar nossa progenitura por um prato de lentilhas e a Eternidade por uma alegriazinha boba qualquer agora. Para piorar a situação, os avanços tecnológicos exacerbaram a tentação de atrapalhar a liturgia. E quando à natureza humana e à sua amplificação — para o bem e para o mal — pela tecnologia se junta a crise litúrgica que seguiu o Concílio Vaticano II, com invencionices delirantes tomando o lugar do que manda a Igreja e maus hábitos se instalando e sendo tratados como a regra, a situação fica realmente difícil.

igreja moderna
Ensinou-nos o Santo Padre Bento XVI que, das más modas que seguiram a reforma litúrgica paulina, a mais grave é a celebração da Santa Missa com o padre virado ao contrário, enfiado atrás do altar e olhando para as pessoas, substituindo a multidão que se dirige a Deus por um círculo fechado em si mesmo.

“Círculo fechado em si mesmo” é exatamente o que o Pecado Original faz de cada um de nós. Adão, que antes da Queda referia-se a Eva como “carne da minha carne, sangue do meu sangue”, imediatamente após a Queda tratou-a como “a mulher que pusestes ao meu lado”. Ele se afastou dela, fechou-se em si mesmo. E a liturgia, decididamente, não pode ser algo fechado. Ao contrário, ela é e tem que ser percebida como a maior de todas as aberturas: a abertura do temporal ao Eterno, do humano ao divino, do finito ao Infinito.

Os outros erros e problemas litúrgicos são, em enorme medida, frutos do erro tão bem apontado por Sua Santidade o Papa. É quando o padre, enfiado atrás do altar, vê-se olhando para o povo que a humaníssima tentação de agradar a todos, de dar atenção às pessoas em detrimento de Deus, torna-se ainda mais forte. É quando o padre vê diante de si aquela multidão, que tanto parece uma platéia, que lhe parece evidente que eles devem ser capazes de ouvir o que ele tem a dizer, de — pior ainda — ouvir sua voz. Ora, a voz que deve ser ouvida é a da Igreja, a de Deus, certamente não a do padre (ou do comentarista, ou da Pastoral Litúrgica, ou de quem quer que seja que tenha uma voz particular). E, finalmente, é por se formar este estranho círculo que surge a tentação de “equilibrá-lo”, forçando a assembleia a um protagonismo exagerado em que das respostas passa-se a gestos (“balançar folhetinhos”, etc.) e dos gestos a, quase, coreografias. Ao mesmo tempo, o presbitério nega seu nome e se enche de leigos, “equilibrando” os dois lados dos estranhos parênteses de gente dentro dos quais jaz uma mesa, usada à guisa de altar e apontando para as pessoas em volta ao invés de para Deus.

Vejamos, então, como a tecnologia moderna literalmente amplia e ilumina estas tentações, afastando ainda mais a liturgia do seu verdadeiro espírito e tornando ainda mais difícil a participação real e frutuosa, que ocorre não quando nos mexemos muito, mas quando nos unimos ao Sacrifício Redentor, ali tornado novamente presente de forma incruenta para nossa santificação.

Para isso, convém dar uma régua de medição. A mais perfeita, claro, é a que o próprio Espírito Santo suscitou na Igreja ao longo dos séculos: a tecnologia da arquitetura sacra clássica, perfeitamente adequada à liturgia e a seu espírito.

Quando visitamos uma igreja pré-moderna, vemos alguns elementos arquitetônicos comuns, perfeitamente adequados à liturgia. O primeiro deles é a posição do altar. O altar-mor, em uma igreja clássica, é o ponto focal de toda a edificação; quando entramos na igreja o nosso olhar imediatamente é atraído para a extremidade oposta à da porta, em que o altar-mor, como uma imensa escada, aponta o caminho do Céu. No primeiro degrau, o túmulo dos mártires (dentro da pedra do altar há sempre relíquias de mártires); no segundo, o próprio Senhor Sacramentado, descido dos Céus, para nos “puxar para cima”; nos demais degraus, os focos de luz das velas apontando sempre para cima, até encontrarmos, no lugar para onde somos chamados a ir, a imagem de alguém que, nas palavras de São Paulo, “venceu a corrida”: um Santo, que um dia esteve como nós diante do altar e hoje, pela graça de Deus, está sobre ele.

Recuando deste ponto focal absoluto, que é o altar-mor, descemos três degraus “humanos”; assim como os “degraus” gigantescos do altar que só as almas sobem, os três degrauzinhos do presbitério, que o corpo do padre agindo na Pessoa de Cristo sobe e desce durante a Missa, fazem parte desta escalada do profano ao Sagrado, do transitório ao Permanente, do finito ao Infinito. O padre sobe os degraus como um ser humano que se aproxima de Deus, e os desce como Deus que se aproxima dos homens; fala a Deus e fala aos homens, virando-se para o altar ou para a assembleia.

Recuando ainda um pouco, encontramos a Mesa de Comunhão, em que ocorre para nós o mais íntimo e (quando percebemos o que realmente ocorre) apavorante encontro do humano com o Divino: a recepção do Corpo e Sangue do próprio Senhor, do mesmíssimo Corpo que nasceu da Virgem Maria e foi elevado na Cruz. A Mesa de Comunhão parece uma cerca, mas não é. Na verdade, ela é uma rampa de lançamento, verdadeiro degrau inicial daquela mesma escada. Ela separa a nave da igreja, lugar onde fica o profano que busca o Sagrado, do presbitério, lugar do Sagrado que vem ao encontro do profano. Ao mesmo tempo, quando nos ajoelhamos junto a ela para receber o próprio Senhor sacramentado, somos elevados pela graça divina e escalamos, puxados por Deus, aquela escada mística de Jacó cuja figura nos contempla do altar-mor.

Aquém da Mesa de Comunhão, estamos na nave da Igreja: um amplo e altíssimo espaço vazio (a adição de bancos e cadeiras é muito recente), coberto apenas de luz e de cor. Dos lados, abaixo dos vitrais, outros altares, versões pequenas do altar-mor, servem para que o Santo Sacrifício possa ser oferecido simultaneamente por vários sacerdotes; neles, ainda, a Missa de um padre solitário não interfere na meditação de quem esteja a rezar sozinho ou a adorar o Santíssimo Sacramento. Cada fiel é livre para participar de uma das várias Missas, cada uma em um ponto da liturgia, ou para ir de Consagração em Consagração, ou ainda para ignorá-las todas, ou mesmo participar à distância de todas. Não há nem pode haver ali nenhum círculo fechado; ao contrário, cada fiel está aberto para todos os lados, e vários focos de abertura do temporal ao Eterno — em cada altar lateral — brilham simultaneamente. É um lugar de encontro, um “parlatório” múltiplo e variegado dos muitos homens e o único Deus, em que cada homem não deixa de ser homem, mas não faz nem de si mesmo nem dos demais homens o foco de sua atenção.

Acima de todos a luz do sol entra, filtrada e colorida pelas imagens sacras dos vitrais. A luz serve para que possamos enxergar. Mas numa igreja clássica há dois tipos de luz: a que Deus faz, que entra pelos vitrais, e a que o homem faz para Deus, concentrada no altar, na forma de velas. A luz de Deus é mais forte e mais bela, mas a Igreja, na sua sabedoria, a filtra em cores. Os vidros são todos coloridos, porque a luz nua do sol ilumina demais. Não convém haver tanta luz, porque a igreja não é tanto lugar de apreciação sensível quanto de apreciação mística: o que acontece de mais importante ali é invisível, e a beleza das luzes coloridas dos vitrais só faz sublinhar o Mistério maior que ocorre sobre o altar, ao emoldurá-lo em cores. Do mesmo modo, as paredes de uma igreja clássica muitas vezes são revestidas de pinturas coloridas, que se unem à luz dos vitrais para nos dar ao mesmo tempo uma verdadeira aula — pois cada figura que ali vemos tem seu sentido e sua simbologia — e um banho de beleza em estado bruto. A vista da nave da igreja, a vista do lugar de onde nós, leigos profanos, nos aproximamos do Infinito e Sagrado, é a mais bela vista do mundo. Na verdade, a beleza é bem maior vista da nave que do próprio presbitério, de onde praticamente só se pode ver o próprio altar, aquela escada altíssima que lembra ao humano sacerdote o quanto ele tem que subir, o quanto lhe falta escalar para alcançar a santidade daquele outro servo de Deus cuja imagem está no mais alto dos degraus.

Na própria nave, vemos ainda dois púlpitos, um de cada lado. São balcõezinhos altos, para uma só pessoa, donde o sacerdote pode falar e ser ouvido, por estar acima das cabeças dos presentes. O som do púlpito alcança a igreja inteira, e se a multidão estiver — como deve estar — silenciosa, cada palavra dita dali é ouvida sem dificuldade por todos os presentes.

Por cima da porta principal, com a mesma tecnologia do púlpito, o coro ao mesmo tempo esconde as faces e eleva as vozes dos cantores e organista: a música parece vir de toda parte e de lugar nenhum ao mesmo tempo. Dos lados do coro, mas fora da nave e muito mais altos, os sinos das torres levam para o mundo lá fora a mensagem de salvação da Igreja.

Vejamos agora como a tecnologia moderna perverteu aquilo que o Espírito Santo, ao longo dos séculos, suscitou na Igreja.

A tecnologia mais problemática para a liturgia é a eletricidade. Costumo dizer que se acabasse a eletricidade, a imensa maioria dos problemas litúrgicos desapareceria instantaneamente; quem nunca passou pela experiência de ir à Missa e, devido a um blecaute, ter a deliciosa surpresa de participar de uma Missa infinitamente mais adorável e santificante, celebrada sem eletricidade para atrapalhar?

A eletricidade tem duas maneiras principais de estragar a liturgia, amplificando as tentações até o ponto em que elas escondem a liturgia e fazem crer que outra coisa, completamente diversa, esteja a acontecer ali. 

A primeira delas é a amplificação sonora. Os efeitos da amplificação sonora sobre a liturgia são devastadores. Como vimos anteriormente, as soluções da tecnologia clássica da Igreja fazem com que — havendo silêncio da assembleia — a voz do sacerdote falando do púlpito, bem como as vozes do coro e do órgão, cheguem sem problemas a todos os ouvidos. Não é, todavia, audível o que o padre diz quando está diante do altar. O próprio Concílio de Trento anatemizou quem dissesse que estas palavras deveriam ser audíveis pela assembleia, porque não se trata de um detalhe irrelevante, mas de um ponto de teologia importantíssimo: o que o padre diz junto ao altar não é para nossos ouvidos; ele está se dirigindo a Deus, não a nós. Ele fala, sim, em nosso nome, mas as palavras que enuncia são as palavras da Igreja, que temos no Missal. Ele não diz outra coisa, não inventa nem pode inventar nada, e, aliás, por que o faria, se é só Deus quem o ouve? Quem quer saber o que ele diz pode e deve abrir o Missal e ler, sem ter como cair na tentação de achar que é para si que fala o sacerdote.

Já, por outro lado, as palavras de Deus para o homem, na Liturgia da Palavra e na homilia, são e devem ser audíveis: para isso serve a posição elevada do púlpito, que ao mesmo tempo faz chegar a voz do sacerdote a toda a igreja e força a assembleia ao silêncio.

Quando a voz do sacerdote é amplificada, desaparece completamente a distinção que já se tornara difícil de perceber com a estranha moda de colocar o padre atrás do altar, eliminando a clareza de seus atos ao não mais fazê-lo, como manda o Missal, voltar-se para a assembleia ou para o altar. Tudo o que o sacerdote diz passa a ser enorme, altíssimo, tonitruante e, pior de tudo, aparentemente voltado aos fiéis. É como se ele estivesse falando com eles todo o tempo, quando na verdade ele é o intermediário entre eles e Deus, e ora fala pela Igreja a Deus, ora fala por Deus a Seu povo. Com um microfone, a tendência é desaparecer o sacerdote — que age na Pessoa de Nosso Senhor Jesus Cristo — e surgir a pessoa do padre Fulano, que deveria desaparecer completamente durante a Santa Missa para dar lugar ao Cristo.

Um frade já idoso uma vez comentou comigo o quanto lhe agastava ver que nas fotos dos convites das raras ordenações de sua congregação nunca o novo padre aparecia com o Cálix, como se costumava fazer. Ao contrário, disse-me ele, todos posam para a foto com um microfone na mão Poucas coisas são tão representativas da nossa sociedade do espetáculo quanto o fetiche do microfone; as pessoas gostam de ver-se fotografadas segurando um microfone à frente dos lábios, e dar ao vulgo um microfone é incitá-lo a falar. O mesmo ocorre, é claro, com os sacerdotes, que são seres humanos como todos nós, mas que sofrem tentações muito mais fortes por serem troféus muito maiores para os demônios. O microfone é uma tentação enorme, que muitas vezes se disfarça e se desculpa. E aí temos o padre que manda um exército de ministros extraordinários ilicitamente distribuir o Santíssimo em tempo recorde nas Missas dominicais, para em seguida sentar-se e ficar por vinte minutos falando platitudes ao microfone, convencido pela própria vaidade e pelo demônio de estar ajudando na ação de graças dos fiéis. Ora, ele está calando a voz do Senhor ao encher a nave com a própria voz, e está pregando novamente na cruz as mãos do Senhor ao substituir ilicitamente suas mãos sacerdotais, ungidas pela Igreja para distribuir a graça divina, pelas mãos profanas de leigos, com a desculpa do tempo gasto… que ele mesmo gasta com seu discurso vazio ao microfone logo em seguida.

Do mesmo modo, com a voz amplificada é facílimo e comuníssimo que o padre invente, parafraseie e improvise ao longo de toda a liturgia. De um inútil e desrespeitoso “bom-dia” no início da Missa a longas elucubrações e paráfrases em cada um dos já demasiados “ad libitum” da liturgia paulina, o prazer de ouvir a própria voz leva o padre a cair na tentação de calar a Igreja para falar pessoalmente, de negar o Cristo para ele mesmo crescer na atenção da assembleia, substituindo e adicionando suas palavras todo o tempo.

A amplificação ainda apresenta outro fator tremendamente perturbante: o som — como o do coro na tecnologia litúrgica clássica — vem de todos os lugares e de lugar nenhum. Todos ouvem a voz tonitruante que sai de inúmeras caixas de som, mas descobrir de onde ela vem originalmente, onde está a pessoinha que fala ao microfone, demanda atenção. Com isso, a liturgia — já desprovida dos marcadores visuais e auditivos mais evidentes, como mencionei acima — torna-se algo ainda mais confuso. O som amplificado é um nevoeiro auditivo, que obnubila qualquer direcionamento da atenção ao fazer com que toda voz venha de todos os lados ao mesmo tempo.

Em uma situação moderna normal em que haja amplificação — um espetáculo musical, por exemplo — é normalmente claro de onde vem o som, por se tratar de um monólogo completamente natural. É uma pessoa, ou uma banda, que dirige a uma plateia o som que produz. Já na liturgia, como vimos, o som só deveria ser dirigido do altar à assembleia parte do tempo; o sacerdote é, ele também, membro da assembleia, e é em nome dela que ele se dirige ao altar. O distante sussurro do sacerdote junto ao altar, com uma assembleia perfeitamente silenciosa diante do magno Mistério que ali se torna presente, deveria ser para todos nós ocasião de unirmo-nos em oração a ele, de, nós também, virarmos para o altar e rezar. Do mesmo modo, a voz dele vindo do púlpito deveria nos levar a prestar atenção e fazer silêncio.

Mas quando o que temos é uma voz tonitruante que vem de todos os lados ao mesmo tempo, a tendência humana é, ao contrário, diminuir a atenção; a voz se torna um ruído ambiente, não uma voz que fala conosco. Afinal, quem fala conosco se dirige a nós, e a incorporeidade daquela voz a torna impessoal.

Quando diminuímos a atenção, fatalmente surgem conversas paralelas, que por sua vez levam a aumentar ainda mais o volume daquela voz que vem de todos os lados ao mesmo tempo, tornando-a ainda mais confusa pela soma de dezenas de cochichos paralelos igreja afora.

Vejam que armadilha demoníaca: para o padre, o microfone tenta a aumentar-se e diminuir ao Cristo, a fazer da liturgia um seu espetáculo pessoal; já para a assembleia, a amplificação faz com que o padre desapareça e com que o que ele diz seja algo a que se presta menos atenção.

E a amplificação artificial, para piorar a situação, não se restringe ao sacerdote. Do mesmo não-lugar de que vem a voz do padre, vêm as vozes, violões e percussões da bandinha de música, que igualmente cai na tentação de se achar em um espetáculo, que já vitimara o padre. E tome cantor falando platitudes ao microfone com a desculpa (para si mesmo) de estar ajudando as pessoas a fazer ação de graças, e tome tocador de violão a fazer arpejos durante a Consagração para “criar um climinha”, como se ele fosse um pianista de cinema mudo. E tome invencionices melódicas, rítmicas e harmônicas, normalmente ainda pioradas quando, por qualquer razão que seja, a bandinha está em um lugar em que ela esteja à vista da assembleia. A tentação de ser a estrela, de dar um espetáculo, é uma tentação demasiadamente presente para que possamos nos dar ao luxo de ignorá-la como vem sido feito na maior parte das paróquias.

E, finalmente, ainda há as outras vítimas do microfone: as pessoas que são levadas, por razões pseudo-pastorais, a ir lá na frente falar alguma coisa (leituras, comentários, avisos, tanto faz), numa espécie de contraponto geralmente forçado, constrangido e tímido aos espetáculos em competição do padre e da bandinha. Estes falam longe do microfone ou falam alto demais, usam enunciações e prosódias estranhas, e fazem, em geral, com que se perca ainda mais o senso de sacralidade da liturgia. Já é ruim que haja o que foi descrito acima; quando se tem regularmente breves interrupções em que alguém tem que aprender em pleno voo como se usa o microfone, a pouca fluidez litúrgica que ainda sobrava em geral desaparece completamente, fazendo com que recrudesçam os papos paralelos (tornados possíveis pelo volume da amplificação) e diminua ainda mais a atenção geral ao que realmente está acontecendo ali.

Finalmente, a eletricidade ainda tem efeitos sonoros decorrentes não da amplificação, mas do uso de aparelhos de ar condicionado e ventilador. Estes aparelhos produzem um ruído a que se chama “ruído branco”, que consiste em um ruído contínuo e aleatório que se distribui por um amplo espectro. O ruído branco tem a propriedade de fazer desaparecer, por mistura, a clareza dos demais sons. É por isso que é dificílimo ouvir o que dizem na mesa ao lado em um restaurante lotado, por exemplo: o ruído branco resultante da soma de todas as conversações faz com que aquela voz a um metro de distância, que ouviríamos perfeitamente em um ambiente silencioso, simplesmente desapareça. Na igreja, o ruído branco dos ventiladores ou ar condicionado faz com que as conversas cochichadas sejam inaudíveis, e não atrapalhem individualmente quem está ao redor. Ora, isso faz com que haja mais e mais conversas cochichadas, o que aumenta ainda mais o volume do ruído branco, pela soma dos cochichos ao ruído das máquinas, e mistura mais ainda o som do microfone, levando os técnicos a aumentá-lo ainda mais, o que por sua vez leva as pessoas a ter ainda menos pejo de conversar, etc., num ciclo vicioso anti-litúrgico verdadeiramente demoníaco. Comparem isso com uma igreja forçada ao silêncio para ouvir a voz em amplificação que vem do púlpito, e fica fácil entender do que estou falando.

A outra maneira pela qual a eletricidade estraga a liturgia é pela iluminação elétrica. A tecnologia luminosa clássica da Igreja consiste, como vimos anteriormente, na combinação da luz branca e nua, porém pequena, das velas com a luz forte, porém matizada e colorida dos vitrais. As velas atraem a atenção para o altar, enquanto as imagens dos vitrais suscitam a meditação em quem as contemplar, enquanto inundam a igreja de uma luz que — como o som do coro — é suave e parece vir de todos os lados ao mesmo tempo.

Já a iluminação elétrica que hoje encontramos na maior parte das paróquias é extremamente semelhante à que vemos, por exemplo, em agências bancárias: uma luz forte, branca, dura e brutal, que ilumina tudo por igual e a tudo faz igual. A nave da igreja torna-se igual ao presbitério, que se torna igual ao altar (aliás desaparecido na forma de uma mesa, muitas vezes difícil de encontrar). As velas desaparecem, com seu brilho muitas vezes ofuscado até mesmo pelos reflexos da luzes fortíssimas do teto nos seus próprios candelabros, por exemplo. Todo o simbolismo das velas se perde, toda a riqueza das mensagens de luz dos vitrais desaparece, e a igreja toda se vê igualada, toda ela perfeitamente iluminada e perfeitamente indigna de atenção, como uma agência de banco. Cada sujeirinha do chão é visível, mas o altar é algo que se precisa procurar (mormente quando o som também vem de todos os lados ao mesmo tempo!). As roupas das pessoas da assembleia aparecem plenamente, com suas cores e texturas a despertar curiosidade, à luz brutalista da eletricidade, mas as vestes litúrgicas — que numa igreja clássica refletiriam sozinhas as luzes das velas e atrairiam a atenção de todos — parecem uma decoração de um canto da igreja; um espetáculo de teatro teria uma diferença de iluminação entre o palco e a plateia, mas nas paróquias de hoje o presbitério e a nave são banhados pela mesma luz dura e feia, sem que se saiba o que é o quê.

A luz elétrica, assim, como a amplificação artificial do som, mistura tudo e elimina as diferenças, trabalhando ativamente para frustrar a liturgia da Igreja. Se temos consciência destas tentações que venho de descrever, fica mais fácil tentar vencê-las. Se não tivermos, todavia — e não a ter é a regra hoje em dia — a tendência é cairmos cada vez mais fundo nelas.

Que São Gregório Magno, São Pio V e São Pio X nos ajudem a vencê-las, sempre!

Publicação original disponível em: medium.com


quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Da conveniência de uma Liturgia Universal, por Jorge Ferraz

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Liturgia universal catolicismo inculturação simbolismo significado mistagogia mistério


Não é a primeira vez que recomendo algum artigo do Deus lo Vult! E, sinceramente, espero não ser a última. Desta vez, Jorge Ferraz nos brinda com uma excelente reflexão sobre a universalidade da Liturgia.

É um tema fora de moda, eu sei. Há uma certa tendência por aí de querer adaptar a Liturgia aos gostos particulares de cada comunidade dizendo se tratar de inculturação. Esta infeliz tendência - muito em voga no Brasil, infelizmente - é fruto de uma concepção errônea de inculturação e, pior ainda, do que é a Liturgia em si.

Veja o que Jorge diz:
Eu entendo o argumento de que o Evangelho não é uma cultura pronta e acabada mas, ao contrário, uma força capaz de orientar para Cristo tudo aquilo que é verdadeiramente humano — e, portanto, tem em Si próprio a força de elevar a Deus qualquer cultura. Mas disso não me parece decorrer que o culto a Deus deva reproduzir as particularidades de cada povo, de cada grupo social, de cada costume local (ainda que legítimo). Ao contrário: penso que, no que diz respeito à Sagrada Liturgia, a catolicidade da Igreja deve se sobrepôr à legítima particularidade dos fiéis que do culto divino tomam parte em um momento histórico específico e em um lugar determinado do globo terrestre.
A seguir ele enumera três razões que fundamentam este seu pensamento, que resumo da seguinte forma:
  1. O simbolismo contido na Liturgia e o significado que ela carrega. A Liturgia em todos os seus aspectos deve ser mistagógica, deve comunicar o Mistério de um Deus que entregou Seu Filho por tamanho amor a cada um dos homens (Jo 3,16). Este ato sublime de amor torna-se presente através da Liturgia da Missa que, por isso, deve comunicar este caráter sagrado, extraordinário.
  2. A passividade da cultura no processo de inculturação. Ou seja, é o Evangelho o agente transformador aqui, e este age modificando uma determinada cultura humana presente num determinado momento histórico. Embora as culturas possam contribuir para o ethos católico, uma dita Cultura Católica, por assim dizer, esta influência sempre será muito menor do que a influência que o Evangelho e a Igreja devem exercer numa cultura.
  3. A universalidade da Liturgia, que não deve se contrapor ao seu caráter sagrado. Dito de outro modo: embora a Liturgia deva nos comunicar o Mistério, a sua forma e a execução do rito não nos devem causar estranhamento.
O texto na íntegra, cuja leitura recomendo fortemente, pode ser encontrado em "Da conveniência de uma Liturgia Universal".

domingo, 7 de fevereiro de 2016

Proibida a comunhão na mão em diocese boliviana

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O indulto que autoriza a comunhão na mão foi suprimido na Diocese de Oruru, Bolívia. O decreto promulgado por Dom Bialasik estabelece que, devido às profanações que têm ocorrido naquela diocese, os fiéis deverão comungar somente na boca, a práxis tradicional da Igreja.

A justificativa dada por Dom Bialasik poderia facilmente ser aplicada em praticamente todas as dioceses brasileiras. Sabemos que a crença na Presença Real de Nosso Senhor na Eucaristia tem-se enfraquecido, e que mesmo em muitos daqueles que crêem falta a noção de que as pequenas partículas que por ventura restem em suas mãos ao comungar ainda são o Seu Sacratíssimo Corpo e não devem ser perdidas. Que mais bispos tenham a coragem de Dom Bialasik!

O decreto, que traduzimos ao português, pode ser lido abaixo.

***
Decreto Comunhão na Boca - Dom Bialasik, Oruro, Bolívia

DECRETO SOBRE A RECEPÇÃO DA SANTA COMUNHÃO NA BOCA

Nº 001/16

DOM KRZYSZTOF J. BIALASIK

PELA GRAÇA DE DEUS E DA SANTA SÉ APOSTÓLICA

BISPO DA DIOCESE DE ORURO - BOLÍVIA

CONSIDERANDO, que a Lei da Igreja estabelece:
  1. Que receber a comunhão na boca é a lei universal da Igreja, tal e como nos recorda a Instrução Memoriale Domini e Immensae Caritatis (29 de maio de 1968: AAS 61, 1969, 541-546; 29 de janeiro de 1973: AAS 65, 1973, 264-271; cf. também a instrução Redemptionis Sacramentum, sobre algumas coisas que se devem observar e evitar acerca da Santíssima Eucaristia, emitida em 25 de março de 2004, n. 92; cf. Missale Romanum, Institutio Generalis, n. 161.), onde se consagra como regra geral a forma tradicional de distribuição na boca, e o faz "não somente porque se funda numa tradição de muitos séculos, mas sobretudo porque exprime e significa a reverência dos fiéis para com a Eucaristia" (par. 8), mas também porque "é mais eficazmente assegurado que a Sagrada Comunhão seja distribuída com a reverência, o decoro e a dignidade devidos; que seja evitado todo perigo de profanação das espécies eucarísticas" (par. 10).
  2. Que a comunhão na mão é permitida somente como um indulto a tal lei universal, que a Santa Sé pode outorgar caso-a-caso a uma Conferência Episcopal quando ela o pede (Congregação para o Culto Divino, prot. N. 720/85: Notificação acerca da comunhão na mão, de 3-IV-1985).
  3. Que a ordenação da sagrada liturgia depende exclusivamente da autoridade da Igreja, que em cada diocese é exercida pelo Bispo diocesano (cânon 838, par. 1, Código de Direito Canônico), a quem corresponde dar normas obrigatórias em matéria litúrgica para todos os fiéis da porção da Igreja a ele confiada (cânon 838, par. 3, Código de Direito Canônico; cfr. Instrução Redemptoris Sacramentum, n. 19), atendendo às necessidades concretas da mesma e ao bem das almas.
  4. Que tanto a Instrução Redemptoris Sacramentum (n. 92) como a Sagrada Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos (dubium: notitiae 35 (1999) pp. 160-161.) insistem em que "se existe perigo de profanação, não se distribua aos fiéis a Comunhão na mão".
  5. VISTO que insistir na prática geral da comunhão na boca é mais conveniente nesta Diocese, não apenas por ajudar na recepção mais devota da Eucaristia e sustentar a fé na presença real e substancial de Jesus Cristo na mesma, senão também por evitar as profanações do Corpo de Cristo, posto que se tem notado ultimamente que há pessoas que não consomem a Sagrada Forma no momento de recebê-la e desejam levá-La para fora do templo com fins desconhecidos (cf. minha homilia da missa de 16 de agosto de 2015).

DECRETO

REAFIRMAMOS PARA A DIOCESE DE ORURO A OBRIGAÇÃO DE SEGUIR A LEI GERAL DA IGREJA DE RECEBER A COMUNHÃO NA BOCA, NÃO SENDO APLICÁVEL O INDULTO DE PODER COMUNGAR NA MÃO.

Comunique-se e publique-se a quem se faz necessário, e seja arquivado. Dado na Sede Episcopal, na Solenidade da Epifania do Senhor, em 06 de janeiro do Ano do Senhor de 2016.

Revmo. Pe. Ludgardo Carlos Ortíz
Chanceler da Diocese de Oruro

Dom Krzysztof Janusz Bialasik, SVD
Bispo da Diocese de Oruro

terça-feira, 3 de novembro de 2015

Reforma da reforma e Semana Santa

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Introdução

Continuando nossa série sobre uma futura unificação do rito romano, teço breves linhas sobre a unificação do rito romano quanto à Semana Santa, falando das cerimônias da Semana Santa pré-1955, aa reforma de Pio XII e do Novus Ordo.

Quero propor aqui um brainstorming, mencionando os três usos de Semana Santa no rito romano: pré-1955, reforma de Pio XII em 1955 continuada pelo Beato João XXIII em 1962 (hoje, rito tridentino/forma extraordinária) e reforma de Paulo VI em 1969 (hoje rito moderno/forma ordinária), salientando aspectos positivos e negativos de cada etapa, e o que poderia compor, de modo natural e orgânico, uma eventual e futura unificação litúrgica em nosso rito.

O que era positivo pré-1955 e deveria ter sido mantido e não foi? O que era negativo e, graças a Deus, foi reformado em 1955, permanecendo no rito de 1962? E o que era negativo em 1955-1962 que foi reformado em 1969 e o que era positivo e não poderia ter sido recusado?

Muito das cerimônias anteriores à reforma de Pio XII, em 1955, era duplicação desnecessária, barroquismo demasiado, e o próprio deslocamento dos horários naturais era um absurdo (Vigília Pascal na manhã do Santo Santo, Missa In Coena Domini na manhã de Quinta-feira Santa… “CEIA” de manhã? “VIGÍLIA” de manhã?). Todavia, muito do que foi reformado em Pio XII, até mais do que em Paulo VI, talvez, também foi fruto de exageros.

Vou usar as siglas OHS 1955/MR 1962 para a Semana Santa reformada por Pio XII em 1955 e mantida no Missal de João XXIII de 1962; MR 1952 para a Semana Santa pré-1955, constante no Missal de 1952; e MR 1969 para o Missal reformado por Paulo VI.

Irei nos basear em diversas fontes, sobretudo nas memórias do Cardeal Ferdinando Antonelli, OFM, da comissão responsável pela reforma da Semana Santa e, após o Vaticano II, do Consilium ad exsequendam Constitucionem de Sacra Liturgia.

Bibliografia indicada:

ANTONELLI, Ferdinando. Il ripristino della solenne Veglia Pasquale. Lezioni di Liturgia, in ALV, pp. 1-20
___. Progetto per la revisione dei riti del Sabato Santo nella eventualità di un ripristino della vigilia di Pasqua, 1951, SRC Sect. Hist., in SCCS, pp. 1-30
___. Questioni intorno alla Veglia Pasquale, 1953, in SCCS, pp. 1-4
___. Annotazioni intorno alla riforma della Domenica delle Palme, 1954, in SCCS, pp. 1-20
___. Intorno alla Settimana Santa, 1954, in SCCS, pp. 1-2
___. Storia dei Riti del Triduo Sacro, RAI, 1965, in SCCS, pp. 1-9
___. Promemoria sulla revisione dei libri liturgici in esecuzione della Costituzione Conc. della S. Liturgia, 1963, in SCCS, pp. 1-9
SAGRADA CONGREGAÇÃO DOS RITOS. De Sollemni Vigilia Paschali Instauranda. Decretum et Rubricae si Vigilia Paschalis Instaurata Peragitur, 1951
___. Memoria sulla riforma liturgica, 1951
___. Ordo Sabbati Sancti, 1951
___. De Instaurationi Liturgica Maioris Hebdomadae, 1955
___. Maxima Redemptionis Nostrae Mysteria, 1955
GIAMPIETRO, Nicola. The development of the liturgical reforma. As seen by Cardinal Ferdinando Antonelli  from 1948 to 1970, Fort Collins, 2009: Roman Catholic Books
GODDARD, Philip. Festa Paschalia: A history of the Holy Week liturgy in the Roman Rite, Leominster, 2011: Gracewing

Domingo de Ramos da Paixão do Senhor

Comecemos com o Domingo de Ramos. O que havia no rito pré-1955? Deste rito, o que foi mudado em 1955? Das mudanças, o que foi positivo e o que foi negativo? Noutras palavras, o que Pio XII fez de bom ao reformar o Domingo de Ramos e o que, em minha opinião, não deveria ter sido reformado?

O OHS 1955 (mantido pelo MR 1962) introduziu o pluvial vermelho para a procissão, mantendo o roxo para a casula da Missa. O MR 1969 fez tudo ficar vermelho. Penso que o vermelho para a casula, como em 1969, rompe com todos os séculos de tradição litúrgica romana que viram no Domingo de Ramos também uma comemoração da Paixão. De fato, é a preparação próxima para a Paixão, inauguração da Semana Santa. O roxo é mais adequado para a Missa e não o vermelho. Surge, entretanto, a pergunta: é certo que o MR 1969 foi longe demais em prescrever vermelho para a Missa de Ramos, e o roxo deveria continuar como sempre, mas a procissão também deveria ser com pluvial roxo, como no MR 1952 (ou seja, pré-1955), ou foi uma inovação positiva e um desenvolvimento sadio a adoção do vermelho para o pluvial da procissão no OHS 1955/MR 1962?

Conforme comentário do leitor Marcio Braga, em conversa nas redes sociais:

"Eu considero interessante a mudança das cores dos paramentos no Domingo de Ramos em nome da catequese visual. No início da Missa o sacerdote usa vermelho, cor que normalmente é vista pelo povo nas celebrações de memórias dos Mártires e Apóstolos, além de Pentecostes. Ou seja, em ocasiões festivas. Aqui o povo canta hosanas na procissão vendo o sacerdote trazer uma cor das comemorações. Ao entrar na Igreja (vale lembrar o antigo costume do acólito que traz a cruz bater três vezes com ela na porta da Igreja, simbolizando o acesso que temos por meio da Cruz, que aliás será lembrado na Proclamação da Paixão), o sacerdote passa a usar roxo e o povo é surpreendido com essa cor penitencial. Vale lembrar que não é comum a troca de cores durante a Missa, exceto nas celebrações deste Tempo Santo da Paixão. Logo da troca das cores é colocado na boca do povo o doloroso "Crucifica-o", que dizemos com aperto no peito. Isso tudo motiva a reflexão das vezes em que o aclamamos Rei e Senhor de nossas vidas e o entregamos ao sofrimento na sequência, por meio de nossos pecados."

Um pastor anglicano High Church usando pluvial roxo na procissão de ramos,
conforme o uso mais tradicional, pré-1955.

O vermelho foi utilizado, a partir da OHS 1955/MR 1962, como símbolo de realeza, como a "púrpura real", e por isso só para a procissão de Ramos (em que se honrava Cristo Rei). Ocorre que essa não é a simbologia do vermelho no rito romano. A cor das festas cristológicas é o branco ou, mais propriamente, o dourado. O vermelho não indica realeza em toda a história do rito romano, e se constituiu em uma novidade. De qualquer modo, penso que até se poderia conceder que a procissão fosse vermelha e que a cor tivesse esse caráter, mas a troca do roxo até da Missa, em 1969, me parece abusiva demais. Quanto às cores de Ramos no rito novo, tenho opinião formada: sou contra. Quanto às cores de Ramos entre 1955 e 1969, ainda estou na dúvida. Até 1955, a cor exclusiva do Domingo de Ramos era o roxo penitencial, e da Sexta-feira Santa o preto em luto. Entre 1955 e 1969, o Domingo de Ramos passou a ter duas cores: vermelho na procissão e roxo na Missa, e a Sexta Santa continuou com o preto. Só em 1969, adotou-se o vermelho para ambas. O vermelho para a Missa de Ramos e para a Sexta-feira Santa é completamente destoante da tradição romana. Para mim, é fora de questão que o arranjo de 1955/1962 é melhor do que o de 1969. Mas estou em dúvidas se o arranjo de 1955/1962 é melhor ou pior, no quesito cor litúrgica, do que o de 1952 (e anterior).

Seguindo o rito de 1955/1962, o sacerdote usa o pluvial vermelho na procissão de ramos, exatamente como no rito reformado por Paulo VI em 1969.

Outro ponto, ainda sobre Ramos: a abolição, para os diáconos e subdiáconos, na Missa Solene, da casula plicada ou dobrada e dos estolões, no OHS 1955/MR 1962, a meu ver foi um desnecessário simplismo e um jogar fora toda uma rica tradição. E uma tradição nada estéril. Tinha significado. O uso da casula dobrada pelo diácono e pelo subdiácono (ao invés da dalmática e da túnica) e do estolão pelo diácono lembravam a profunda tristeza da Igreja na Semana Santa, que se refletia até mesmo nas vestes "rasgadas", além de ser um dos costumes mais antigos, pré-medievais. Nisso, tenho posição convicta: nem 1969 nem 1955/1962, mas a forma pré-1955 era melhor. Em uma eventual reforma da reforma que contemple a unificação do rito romano, não basta retornar a 1955/1962: é preciso retroceder mais e resgatar o uso tradicional e milenar, tal qual no MR 1952.

Aqui se vê, ao centro, o celebrante (anglicano, aliás) 
com uma casula romana comum, e nos lados, o diácono e o subdiácono 
com as casulas romanas dobradas.

Aqui um subdiácono com casula gótica dobrada.


O estolão, que o diácono colocava, ao tirar a casula dobrada, 
para ler o Evangelho e para suas funções mais ativas, 
na Missa Solene em tempos penitenciais.

Outra foto de um diácono (anglicano) com estolão.


Já um terceiro ponto acho que foi positivo na reforma de Pio XII (OHS 1955/MR 1962): a simplificação do rito da bênção dos ramos. No MR 1952, pré-1955, portanto, havia uma Missa Seca, com Epístola, Gradual, Evangelho, Prefácio e até Sanctus, tudo no altar e versus Deum. Isso tornava o conjunto Procissão-Missa excessivamente longo. Que a Vigília Pascal seja longa se entende, pois é a noite das noites e a mãe de todas as vigílias, a festa cristã por excelência. Mas Ramos?

Com uma "Missa" dentro da Missa, há uma multiplicação de símbolos que deixam o fiel até perdido, além de demorar demais. Lembremos que a ausência de sinais é um erro, mas o excesso deles também: tanto a ausência quanto o excesso nos deixam perdidos e sem referência. A eliminação pelo OHS 1955/MR 1962 dessa cerimônia demasiado complexa e sua troca por um rito mais simples, com a leitura do Evangelho da Entrada Triunfal, e uma mera bênção das palmas, versus populum, é positiva, a meu ver. Um único detalhe poderia ser mantido dos ritos pré-1955: ao menos uma parte do prefácio que falava da realeza de Cristo, dado que ela é a tônica da procissão. Poder-se-ia, então, para uma unificação do rito, no futuro, adotar o modo simples e reformado em 1955/1962 - não muito diferente da forma ordinária em 1969 -, acrescentando-se o prefácio da bênção do MR 1952 ou parte dele. Com a simplificação do rito da bênção dos ramos, ademais, deu-se ênfase à procissão em honra a Cristo Rei, com uma maior realidade do evento que se celebra, a entrada triunfal de Cristo em Jerusalém. Essa ênfase na procissão pelo Reinado de Cristo foi positiva, e é ainda mais forte pela inserção da rubrica que manda cantar na procissão, além do Gloria Laus, o Christus Vincit - um hino tipicamente relacionado à realeza do Senhor.

Outro ponto positivo é a supressão das orações "de exorcismo" das palmas. Não que tenhamos que negar seu poder sacramental, seu símbolo contra o mal. Nada disso. Mas a tônica de Ramos NÃO é a guerra espiritual. As palmas abençoadas como sacramentais são consequência, são acidentais, não a essência das cerimônias desse dia. É bem verdade, contudo, que nem só de essência vive a liturgia e muitos acidentes são importantes. Não julgo, entretanto, que esse acidente das orações imprecatórias seja um deles. Andou bem Pio XII, o OHS 1955, João XXIII e o MR 1962, pois.

Interessante notar que o costume do acólito bater com a cruz por três vezes na porta, embora feito pelos que usam a forma extraordinária (OHS 1955/MR 1962) NÃO consta da reforma de Pio XII/João XXIII. Ela constava antes, nos ritos pré-1955, i.e., no MR 1952. Mas mesmo a reforma piana não conseguiu apagar o antigo costume: ainda que não constasse nas rubricas, se continuou a proceder assim. Acho interessantíssimo esse bater na porta com a cruz, que simboliza a resistência do povo judeu a Cristo, e a abertura não só de Jerusalém para a entrada triunfal, mas da Jerusalém Celeste, o Céu: e o céu foi aberto justamente pela cruz! Aliás, o próprio João XXIII não estava de todo contente com o OHS 1955, ainda que o tenha preservado no MR 1962, pois celebrou suas Semanas Santas com alguns costumes e mesmo hinos e observância de rubricas advindas dos ritos pré-1955. Enfim, o costume de bater com a cruz na porta, embora ausente no OHS 1955/MR 1962 e no subsequente MR 1969, continua a ser feito amplamente em todas as Semanas Santas celebradas de acordo com o Proprium de 1962 e até mesmo em alguns lugares que usam o Proprium de 1969.

Mesmo não constando nas rubricas do OHS 1955/MR 1962, o padre, ao utilizar a forma extraordinária, mantém o costume de bater na porta da igreja com a cruz.

Após a procissão e a entrada na igreja, o OHS 1955/MR 1962 introduziu uma oração conclusiva, para encerrar as cerimônias e dar início à Missa. Embora bela e piedosa, alguns admitem que foi uma introdução desnecessária e que cria uma ruptura, uma solução de continuidade entre a procissão e a Missa. Além disso, não consta em toda a tradição anterior. O próprio Pe. Carlos Braga, um dos responsáveis pela reforma de Pio XII e colaborador estreito do Mons. Bugnini, admitiu, anos mais tardes, que a criação e introdução dessa oração foi uma escolha infeliz: "O elemento que está fora de lugar no novo Ordo é o discurso de encerramento da procissão, que interrompe o unidade da celebração." (BRAGA, Carlos. Maxima Redemptionis Nostrae Mysteria: 50 anni dopo (1955-2005), in Ecclesia Orans, n. 23, 2006, p. 25) Todavia, ser algo novo não parece ser um argumento absolutamente convincente. Do contrário, ainda estaríamos celebrando como na Jerusalém do séc. I, sem nenhum desenvolvimento. A pergunta não deve ser feita quanto à novidade de uma cerimônia, mas sim se essa novidade se constitui um desenvolvimento HARMÔNICO ou artificial. Não sou perito e não saberia responder. Agradeço aos leitores se puderem comentar a respeito.

Enfim, pelas rubricas pré-1955, ao terminar a procissão e entrar na igreja, começando propriamente a Missa, o sacerdote deveria recitar as orações ao pé do altar. Com o OHS 1955, houve a supressão dessas orações para a Missa de Ramos que segue a procissão, inovação mantida no MR 1962 (nem se fale no MR 1969, onde as orações ao pé do altar foram suprimidas de todas as Missas). Ora, parece que o desejo de simplificação, justo em alguns pontos, não encontra freio. Aqui não há nenhuma razão plausível de ordem pastoral ou teológica para omitir as orações ao pé do altar, bem como fere toda a tradição do rito romano. A Missa, antecedida ou não por uma procissão, não deve ter justamente a preparação ao sacrifício que são as orações ao pé do altar, suprimidas. Nem o Asperges dominical faz as orações ao pé do altar desaparecem, por que a procissão de Ramos o faria?

Também no Missal pré-1955, portanto MR 1952, o canto da Paixão não substitui o Evangelho. São duas coisas distintas, ainda que as cerimônias sejam uma subsequente à outra. Primeiro, com três diáconos, como até hoje, no OHS 1955/MR 1962 e no MR 1969, se canta a Paixão. Imediatamente ao término da Paixão, o diácono da Missa apenas segue cantando o Evangelho, em outro tom, auxiliado pelo subdiácono e pelo acólito, como em qualquer Proclamação do Evangelho nas Missas normais. Havia uma pequena pausa entre a Paixão e o Evangelho, e o silêncio para a troca de cerimônias representava o luto de toda a Criação e da Igreja pela morte do Senhor. O incenso se usava no Evangelho, mas não na Paixão. Com o OHS 1955/MR 1962, Paixão e Evangelho se tornam uma coisa só, com as três vozes seguindo no trecho que antes era do Evangelho, e no mesmo tom. Alguns criticam tal decisão da Comissão, afirmando que a Missa se viu privada do Evangelho, além do rito anterior à reforma de 1955 ser mais representativo - e, obviamente, mais tradicional e de acordo com o legítimo costume ancestral romano.

Aliás, antes da Paixão, que é antes do Evangelho, no MR 1952, havia a leitura de um segundo trecho do Evangelho (terceiro, se contarmos a Procissão), que narra a Instituição da Eucaristia na Última Ceia. O sentido era claro: ligar a Ceia à Cruz, a Eucaristia à Paixão, pois Ceia, Cruz e Missa são uma coisa só. A Missa é a renovação da Cruz e a Ceia sua antecipação. Ao eliminar esse trecho evangélico no OHS 1955/MR 1962, não só uma importante cerimônia tradicional foi retirada, como se perdeu algo de catequético e profundamente espiritual. O MR 1969 manteve a retirada do OHS 1955/MR 1962.

Segunda-feira Santa, Terça-feira Santa e Quarta-feira Santa

No MR 1952, a Missa de Segunda-feira Santa continha uma oração Contra Persecutores Ecclesiae e uma Oração pelo Papa. O OHS 1955/MR 1962 a removeu, e o MR 1969 não a fez retornar. Além de ser uma supressão de uma cerimônia tradicional no rito romano, o que não se pode fazer sem graves razões, penso que essa omissão a partir de 1955 representa a adoção de uma mentalidade irenista, que não quer explicitar que a Igreja tem perseguidores e inimigos. Isso é lamentável. Na Grande Semana, onde os poderes das trevas tentam destruir a obra do Senhor, mais clara deve se manifestar a doutrina da guerra espiritual que movemos contra os inimigos espirituais e materiais da Igreja de Cristo.

Na Terça-feira Santa e na Quarta-feira Santa, as Missas tinham as leituras da Paixão, conforme São Marcos e São Lucas. O OHS 1955/MR 1962 manteve essas leituras da Paixão, mas as encurtou, o que não faz sentido algum. Já a reforma de Paulo VI, com o MR 1969, foi além e desfigurou completamente a Liturgia da Palavra dessas Missas, trazendo prejuízos até mesmo para comentários espirituais de santos e de padres sobre a Semana Santa que, refletindo nas perícopes das Missas do dia, alimentaram centenas de gerações ao longo dos anos.

Um ponto positivo da reforma de Paulo VI, em 1969, foi a recomendação de que, na Semana Santa, especialmente na Segunda-feira Santa, Terça-feira Santa e Quarta-feira Santa se fizessem comemorar nas igrejas e oratórios  as chamadas Celebrações da Penitência, que constam do Ritual Romano ou da separata Ritual da Penitência, preparando o povo para a confissão auricular.

Missa Chrismatis e Quinta-feira Santa In Coena Domini

O arranjo de 1955 para a Quinta-feira Santa, continuado em 1962, com o Missal do Beato João XXIII, consistiu em mudanças de menor envergadura. Uma delas foi a observância do princípio da veritas horarium, com a restauração do horário da Missa In Coena Domini ao para a tardinha, seu horário natural. Esse era o horário original desta Missa, para melhor simbolizar que se tratava da comemoração da Última Ceia, feita por Cristo e os Apóstolos justamente ao cair da noite. Primitivamente, havia essa Missa em todas as paróquias, à tardinha ou começo da noite, e uma outra Missa, a Missa Chrismatis, presidida pelo Bispo na Catedral com a presença do seu clero, na manhã da mesma Quinta-feira Santa. Com o tempo, multiplicou-se o costume de se celebrar a Missa In Coena Domini na própria manhã, e isso resultou na perda de uma melhor observância do sentido da Última Ceia, bem como a eliminação da Missa Chrismatis - e a consagração dos óleos passou a ser feita na Missa In Coena Domini catedralícia.

 Missa Chrismatis pelo rito de 1962, em Campos, RJ

A restauração do horário natural melhor acomodou a Missa In Coena Domini e permitiu o reaparecimento da Missa Chrismatis. Ambas foram consequências positivas, e mantidas não só no Missal de 1962 como no oriundo da reforma de Paulo VI, em 1969.

Todavia, a Missa Crismal não era celebrada há séculos. Teve a comissão litúrgica da Santa Sé, encarregada da reforma da Semana Santa, que buscar os ritos da Idade Média, conforme os sacramentários e missais mais antigos, para compor o Próprio dessa Missa. A Missa Chrismatis já era celebrada no séc. IV, presidida pelo Bispo, com todo o seu presbitério em concelebração sacramental, e com a consagração dos óleos, o que sempre foi observado por outros ritos, como o armênio. Havia uma outra Missa, de caráter penitencial, preparando os fiéis à Páscoa. Essa Missa penitencial desapareceu, e só se unificou a Crismal com a Missa In Coena Domini quando o costume tornou todas as Missas obrigatórias no período da manhã. Também a concelebração sacramental se tornou uma mera concelebração ritual ou cerimonial, com os padres de casula, mas não consagrando, quando a concelebração não foi mais permitida no rito romano.

Outra mudança de 1955 foi o deslocamento do Mandatum (o rito do lava-pés) do fim da Missa para depois da homilia, antes do Ofertório. O que nos causa estranheza foi que o princípio da veritas horarium, invocado para que a In Coena Domini passasse a ser celebradas à tardinha, não foi observado aqui. Ora, o horário natural para o lava-pés é depois da Missa, pois Nosso Senhor lavou os pés dos Apóstolos depois de haver ceado, ou seja, depois de celebrar a Eucaristia. A ordem cronológica Missa-Mandatum que era observada e estava correta pelo veritas horarium, é violada. Mas não foi a veritas horarium que deslocou a Missa da manhã para a tardinha? Por que no caso do Mandatum o princípio não vale? Além disso, o lava-pés depois da homilia interrompe a Missa, o que poderia ser justificado na sábia decisão de 1967 de assim fazer quando o Batismo, o Matrimônio ou a Confirmação fossem celebrados com Missa, dado que são sacramentos e não ficaria mau que se os celebrassem dentro do próprio Santo Sacrifício. Porém, um rito bonito, simbólico, mas que não é sacramento, interromper a Missa poderia parecer demais.

Procurou-se justificar o lava-pés após a homilia pois como era feito antes, depois do desnudamento dos altares, o luto tomaria conta da igreja e se passaria à adoração eucarística no monumento ou altar da reposição. Ora, então que se o deslocasse para o período compreendido entre a transladação do Santíssimo Sacramento e o desnudamento dos altares, e não para dentro da celebração eucarística.

Outra justificativa do lava-pés após a homilia, segundo o Cardeal Antonelli, um dos responsáveis pela reforma da Semana Santa, seria tornar a cerimônia mais conhecida pelos fiéis, de vez que feita na própria Missa, em um lugar central. Ademais, o Evangelho da Missa fala justamente do lava-pés e é bem simbólico que, após sua leitura, se proceda a esse ato narrado nas santas páginas. Por outro lado, não se trataria de uma interrupção da Missa, pois a cerimônia faz parte do Próprio do dia, afastando-se, então, o argumento de uma ruptura. O argumento do nobre Purpurado, sem embargo, não enfrenta o problema de não ser mais observado o veritas horarium que orientou as decisões de reforma - exceto neste ponto.

Aliás, o Mandatum, em 1955, passou a ser feito no coro ou no presbitério, e isso prejudica a sacralidade, permitindo que, mais uma vez, leigos ingressem no santuário. É certo que há ocasiões em que eles já adentravam a tão sagrado recinto, mas não vejo com bons olhos criar mais uma situação para isso. Fazer, como no MR 1952, o rito na nave é o mais adequado, como sempre se fez.

Já a supressão de um terceiro Confiteor, antes da Comunhão do diácono, foi positiva, a meu ver. Simplificação correta, pois se tratava de um acréscimo sem fundamento claro. Se for por conta de manifestar a própria indignidade antes de Comungar, o Confiteor já recitado é suficiente, e se um ou dois não o são, não será o terceiro que o será, e nunca bastarão recitações de Confiteor.

O Agnus Dei, com o OHS 1955/MR 1962, passa a não ter na terceira resposta o Dona nobis pacem, mudada pelo Miserere nobis, uma vez que a paz (simbolizada pelo beijo da paz logo após o Agnus) não é dada em função da traição de Judas (também com um beijo). Trata-se de uma novidade, mas plenamente justificada e com muito sentido. Infelizmente, o MR 1969 não manteve essa novidade - logo ele, que abraçou tudo o que era novo na OHS 1955/MR 1962, rechaçando muito do que era antigo. A opção do MR 1969, pelo retorno ao MR 1952 foi infeliz. A nosso ver, a escolha do OHS 1955/MR 1962 é a mais correta em um futuro rito unificado.

Enfim, uma outra mudança é a retirada também da cruz e dos castiçais do altar quando do seu desnudamento. Ainda que a cruz seja um elemento próprio da Sexta-feira Santa que em breve começa, sua retirada do altar, com os respectivos castiçais, dá mais visibilidade ao desnudamento dos altares. Não apenas as flores e alfaias são retirados, conforme era no MR 1952, mas, segundo o OHS 1955/MR 1962, tudo o que está sobre o altar. O altar fica realmente nu, e isso demonstra com mais dramaticidade e compreensão plástica, uma catequese bem visível, a realidade do luto da Igreja. Se o aleluia e o Glória cessam na Septuagésima, se o comer mais fartamente é impedido e as flores são retiradas na Quaresma, se as cruzes e as imagens são veladas no I Domingo da Paixão (chamado de V Domingo da Quaresma no MR 1969), nada mais terrível e, por isso, tremendamente simbólico, do que haver um desnudamento do altar de forma radical. Nem mesmo a cruz é deixada, em sinal de luto extremo. Isso dá margem, igualmente, à cerimônia do retorno da cruz em forma triunfal da sacristia, na Sexta-feira Santa, tema do qual nos ocuparemos abaixo, mostrando que a Cruz de Cristo é morte do Senhor, mas é triunfo da graça sobre o pecado. Penso, então, ser positivo esse avanço no desnudamento do altar, agora de modo total.

O altar completamente nu após a Missa In Coena Domini.

Sabemos, enfim, que liturgia não é apenas a Missa. A Liturgia das Horas, ou Ofício Divino, condensada no livro denominado tradicionalmente breviário, é parte das ações litúrgicas da Santa Igreja. Pois bem, no Triduum, a recitação das Matinas (hoje denominadas estranha e totalmente contra a tradição litúrgica como Ofício de Leituras, na forma ordinária) e das Laudes, adquirem um colorido todo especial. De tal sorte, ambas as horas canônicas são unidas no que se chama de Ofício de Trevas, ou Tenebrae. Há o Tenebrae de Quinta-feira Santa, o de Sexta-feira Santa e o do Sábado Santo. Como são Matinas e Laudes, são ofícios próprios para a manhã de quinta, sexta e sábado. Tradicionalmente, porém, o de Quinta-feira Santa era celebrado na noite de Quarta-feira Santa, uma vez que a manhã da quinta era dedicada à Missa In Coena Domini, visto que antes de 1955, não tinha esta retornado ao seu horário natural à tardinha.

Com a reforma de Pio XII, acomodando a Missa da Ceia do Senhor segundo o veritas horarium, a manhã de Quinta-feira Santa pôde, então, ter seu Tenebrae celebrado no próprio dia, sem antecipar para o dia anterior. Corrigiu-se, pois, uma outra imperfeição lógica dos ritos de Semana Santa pré-1955, voltando à natureza das coisas, tal qual era séculos antes.O Ofício de Trevas da Quinta-feira Santa é, pois, celebrado na manhã da própria Quinta-feira Santa e não na noite da quarta. Uma exceção foi permitida pelas rubricas: nas Catedrais, como há, na manhã da quinta a Missa Chrismatis, o Tenebrae é celebrado na noite da quarta, exatamente como antes. Isso porque o motivo que autorizava, antes de 1955, o Ofício de Trevas da quinta ser celebrado na noite de Quarta-feira Santa, permanece, qual seja a Missa na manhã da quinta-feira.

Alguns argumentam contra esse tema do Tenebrae que celebrar à noite dá mais profundidade espiritual ao drama narrado no ofício, por conta das trevas, das luzes que se apagam. Ora, mas se fossem para ser celebrados à noite ou tardinha anterior seriam Completas ou, no mínimo, Vésperas. E são Matinas - oração da madrugada - e Laudes - oração da manhã. Ademais, o período para celebrar o Tenebrae não é necessariamente o dia claro, como se Laudes ou até Tércia fosse: é possível fazê-lo de manhã bem cedo, madrugada, sem o sol ter nascido, e até mesmo após a meia-noite, pois o dia litúrgico começa e termina nesse horário. Meia-noite já não é mais Quarta-feira Santa, mas Quinta-feira Santa, e a escuridão própria para o Tenebrae é a mesma da noite de quarta. Pode-se, pois, mesmo com o OHS 1955/MR 1962, celebrar-se o Ofício de Trevas "no escuro": não na noite de Quarta-feira Santa, e sim após a meia-noite, sendo já Quinta-feira Santa.

Obviamente, estamos falando do Ofício de Trevas litúrgico, não de celebrações para-litúrgicas inspiradas no Tenebrae. Assim, se um grupo de pessoas, um convento, ou uma igreja que não seja catedral, desejam celebrar o Tenebrae de Quinta-feira Santa, devem fazê-lo no próprio dia de quinta (ou seja, após a meia-noite, seja na madrugada, seja na manhã), não podendo antecipar para a quarta. Só o Tenebrae de quinta da Catedral pode ser celebrado na Quarta-feira Santa à noite. Isso na forma ordinária, de 1969, ou na forma extraordinária, de 1962. Já as ações devocionais inspiradas no Tenebrae, e que só levam esse nome por conta da inspiração mesma, podem ser celebrados em qualquer dia da Semana Santa.

Sexta-feira Santa da Paixão do Senhor, ou Parasceve

A primeira mudança do MR 1952 para o OHS 1955/MR 1962 é a do nome oficial que consta do Missal. Anteriormente à reforma de 1955, o culto litúrgico principal de Sexta-feira Santa se chamava "Missa dos Pré-santificados", enquanto depois passou a se chamar "Solene Ação Litúrgica", termo mantido no MR 1969.

Realmente, não se trata de uma Missa, de modo que Ação Litúrgica é teologicamente mais adequado. Isso ajudaria, em tese, a desfazer no povo a impressão de que se trata de um sacrifício, o que não é. Sexta-feira Santa não tem sacrifício, não tem Missa.

Várias outras mudanças do OHS 1955/MR 1962 na liturgia da Sexta-feira Santa da Paixão do Senhor tiveram por motivação exatamente desfazer qualquer equívoco no povo de que pudesse ser essa ação solene uma Missa. Aliás, as primeiras versões da liturgia de Sexta-feira Santa no rito romano, ao menos até o séc. XII, não traziam elementos sacrificais. O MR 1952 chega a mandar que se reze o Orate Fratres, o que não guarda nenhum sentido de vez que não há sacrifício sendo oferecido. Nesse sentido, o OHS 1955/MR 1962 é melhor: "purifica" o rito e ainda retorna ao cerimonial medieval, sem prejuízo e sem radicalismos. Foi, a meu ver, uma mudança oportuna a supressão de elementos claramente sacrificais em uma liturgia que não é sacrifical. Já o nome "Missa dos Pré-santificados" poderia ter sido mantido, de vez que, embora tradicionalmente associemos "Missa" com o sacrifício eucarístico, a palavra, por si só, não é sacrifical. No Oriente, é comum que, quando não há Missa, haja uma Divina Liturgia (i.e., Missa) chamada também de "dos Pré-santificados". Embora "Missa" possa se prestar a confusões de que é um sacrifício, a expressão completa, com o "dos Pré-santificados", indicando que as espécies foram consagradas em Missa anterior, já desfaz eventuais equívocos.

No rito pré-1955, o padre vestia a casula preta desde o início da celebração, como se fosse uma Missa. Após 1955, passou a usar alva, cíngulo, amito e estola preta durante a Liturgia dos Catecúmenos, envergando o manípulo e a casula apenas após o sermão, na Liturgia dos Fiéis. Em 1969, Paulo VI, retoma o antigo dispositivo de o padre iniciar toda a Ação Litúrgica já de casula - todavia, troca a cor preta pela vermelha, lamentavelmente.

Também até 1955, a celebração iniciava com uma única toalha - e não três - sobre o altar, que era colocada pelos acólitos enquanto o padre se prostrava. Já em no OHS 1955/MR 1962, o altar permanecia nu até que, na Liturgia dos Fiéis, fosse coberto com as três toalhas. Penso que, nesse sentido andou bem a reforma de Paulo VI, com o MR 1969, mandando que o altar permanecesse nu, como no OHS 1955/MR 1962, mas mandando que se colocasse um único pano, como a tradição litúrgica romana, guardada até o MR 1952, dispunha, e não três.

As preces da Oração Universal pouco mudaram do MR 1952 para o OHS 1955/MR 1962, embora o título da oração pela conversão dos hereges e cismáticos tenha se convertido em Pro Unitate Ecclesiae, o que não é mau e cuja alteração é meramente circunstancial.

Já vimos que a cruz permanece no altar, pelas rubricas do MR 1952, mesmo depois do seu desnudamento na Quinta-feira Santa, e isso foi sabiamente mudado no OHS 1955/MR 1962. Então, como no OHS 1955/MR 1962 o altar está realmente nu, sem nem mesmo a cruz, nesse ponto os reformadores, para a adoração ao Senhor Crucificado, reintroduziram uma Procissão com a Cruz que vem triunfalmente da sacristia. Isso foi inspirado no relato famoso da peregrina Egéria que narra os ritos da Semana Santa na Jerusalém dos primeiros séculos. O MR 1969 mantém essa procissão, e a mim parece uma "novidade" boa, que se insere no sadio desenvolvimento litúrgico de modo harmônico.

Outra procissão teve mudança. No MR 1952, assim como o Santíssimo Sacramento saiu solenemente do altar-mor para o monumento onde foi adorado após a Missa de Quinta-feira Santa, ou seja, na noite anterior, Ele deve voltar, com a mesma solenidade para o altar-mor antes de ser feita a Comunhão do celebrante, diáconos e subdiácono, e distribuída aos acólitos e ao povo. O OHS 1955/MR 1962 minimizou essa procissão, fazendo apenas uma procissão simples com o Santíssimo sendo trazido pelo subdiácono como nas Missas solenes comuns em que o Cristo, eventualmente, não esteja no tabernáculo do altar-mor. Em 1969, o disposto em 55/62 foi mantido. Uma futura reforma da reforma poderia recuperar o rito anterior a 1955. Se é perfeitamente possível criar a procissão da Cruz é perfeitamente possível também manter a procissão solene do Sacramento, para mostrar os dois movimentos: o de sumida do Senhor na Quinta-feira Santa, e Sua volta na Sexta-feira Santa, o que, aliás, vem de séculos anteriores. A supressão da incensação à hóstia consagrada, no OHS 1955/MR 1962, foi também, a meu ver, uma perda: pode-se e deve-se fazer luto na Sexta-feira Santa, mas não a ponto de deixar de prestar as devidas honras ao Senhor realmente presente no Sacramento da Eucaristia.

Também o OHS 1955/MR 1962 foi pioneiro em deixar que, na Sexta-feira Santa, o Pater Noster pudesse ser recitado pelo povo junto com o padre, o que não é nada errado, e andou bem a Comissão nesse sentido.

Sábado Santo

De vez que na manhã do Sábado Santo não mais se celebra a Solene Vigília Pascal, transferida para seu horário normal, à noite, para que entre Páscoa adentro, o dia todo do sábado pôde ser consagrado ao silêncio junto ao Cristo que desceu aos infernos. É uma espécie de santo velório o clima desse dia, não mais um "Sábado de Aleluia", mas um sábado de espera.

O breviário do Sábado Santo era recitado na Sexta-feira Santa (outro ponto obtuso) em razão de o sábado, em si, estar dedicado na manhã à Vigília, e o dia de sexta estar livre, uma vez que a Cerimônia da Paixão era feita pela manhã. Com a transferência da Vigília, então, se recuperou plenamente não só os horários naturais, como o sentido do Sábado Santo, com seu Ofício sendo recitado no dia próprio. A tarde de sexta, sem obrigação do Ofício de Sábado Santo antecipado, pôde ser consagrada às devoções populares tão caras às almas do fiéis, como a Via Sacra, a Procissão do Senhor dos Passos etc. A liturgia observante do veritas horarium, longe de instaurar o pernicioso liturgicismo, deu mais força à espiritualidade privada também.

Um ponto que aparentemente é negativo, mas que foi necessário e, portanto, se revela na verdade positivo, é a criação das Vésperas do Sábado Santo, com a consequente supressão das I Vésperas da Páscoa. Poderia soar negativamente que a solenidade mais importante da Cristandade seja a única a não ter I Vésperas. Todavia, pensemos: se o dia litúrgico começa com as I Vésperas, então, ao manter esse ofício, a Páscoa começaria antes da Solene Vigília Pascal. Isso porque, lembremos, a Vigília foi deslocada para seu horário natural, em atenção ao princípio do veritas horarium. Nos missais anteriores à reforma de Pio XII, a Solene Vigília Pascal é celebrada na manhã do Sábado Santo - daí ser conhecido como Sábado de Aleluia, até em um contrassenso com a Páscoa da Ressurreição que só ocorre no Domingo. Ora, se é celebrada pela manhã, então o Sábado Santo já é pascal e nada mais justo do que as Vésperas celebradas no sábado à tarde sejam as I Vésperas do Domingo da Páscoa. Ocorre que com a restauração piana da Vigília Pascal para a noite do Sábado Santo, manter as Vésperas do sábado como I Vésperas da Páscoa implicaria em começar a celebração pascal antes da própria Páscoa (que inicia na Vigília), diminuindo até mesmo o sentido da Vigília Pascal.

Assim, andou bem e de modo coerente o reformador de 1955, pois tal era consequência obrigatória da fixação da Solene Vigília Pascal à noite.

Domingo de Páscoa

A mudança do horário da Solene Vigília Pascal entrou antes do OHS 1955. Começou em 1951 com sua vigência em caráter experimental, culminando com a reforma de toda a Semana Santa em 1955. De toda a forma, a Vigília Pascal passa a ser o primeiro ato do Domingo de Páscoa e não mais um rito do Sábado Santo. A menção a "santa noite", "noite abençoada", "esplendor da  noite", expressão constantes no rito da Vigília Pascal, soava absurdamente descompassada em uma celebração diurna. Voltar à tradição medieval de se celebrar à noite era imperativo. Ademais, muitos trabalhavam no sábado pela manhã, visto que nem todos os países o adotam como feriado: a participação dos fiéis nessa Vigília tão importante seria facilitada com a transferência. Razões de ordem histórica, litúrgico-teológicas e mesmo pastorais moveram Pio XII a transferir a Vigília Pascal para seu horário original e mais adequado: a noite.

Bênção do fogo novo no rito tradicional

Até a reforma do Sábado Santo, em 1951, o canto Exsultet era usado para a bênção do Círio Pascal. Isso a partir da Idade Moderna. Nos missais, ele era realmente intitulado Benedictio Cerei. Entretanto, a oração específica para essa bênção, analisando-se o seu conteúdo e compulsando os sacramentários mais antigos, deveria ser o Veniat, o qual, por sua vez, ainda nos ritos pré-reforma de Pio XII, era usado, todavia, como bênção dos grãos de incenso a serem colocados no Círio, a Benedictio Granorum. Facilmente se constata que o tempo trouxe uma confusão das cerimônias: o texto da Proclamação da Páscoa, o Exsultet, se tornou, equivocadamente, de uso para a bênção do Círio Pascal, e a bênção do Círio - o Veniat - se tornou a bênção dos grãos de incenso. Além da nítida inobservância do significado dos textos e da irrealidade das cerimônias, notemos que os grãos de incenso são sempre os mesmos, todos os anos, o que nos leva a indagar da necessidade de anualmente os abençoar (ainda mais com um texto que, de fato, abençoa o Círio). Andou bem Pio XII, portanto.

Urge, sem embargo, recuperar a opção do uso do trikirion, como nos ritos pré-1955, abolido por Pio XII. Uma notável influência bizantina que se acomodou tranquilamente à liturgia romana. A abolição do trikirion foi feita para que não este e sim o Círio fosse levado em procissão. No uso do MR 1952, era o trikirion que se carregava em procissão e com ele o Círio, que permanecia junto ao presbitério, era aceso. Pio XII quis dar destaque ao Círio. Contudo, isso tornou obsoleta uma tradição secular e aposentou os triplos candelabros, que tinham até relação com o triplo canto do Lumen Christi... Uma boa saída na reforma da reforma seria um uso ad libitum pelo celebrante de quais velas levar na procissão, o Círio ou o trikirion.

Trikirion romano segundo o uso anterior à reforma de Pio XII, usado em procissão para acender o Círio

Quanto às leituras, antes de 1951, havia doze profecias na Vigília, e a Epístola e o Evangelho na Missa, totalizando quatorze lições. Em 1951 ad experimentum, mantido em 1955 por Pio XII e em 1952 pelo Beato João XXIII, mudou-se para quatro profecias, mantendo-se também a Epístola e o Evangelho, com seis leituras no total. Um visível retrocesso. A boa intenção da simplificação dos ritos não pode anular o sentido profundo que cada uma das profecias indicava. A Vigília pretende contar a história da salvação, apontando-a para Cristo Ressuscitado. A diminuição das leituras no OHS 1955/MR 1962, foi uma mutilação. Já em 1969, Paulo VI, vendo que isso era negativo, trouxe algumas profecias de volta, e de seis leituras da forma extraordinária ficamos com nove na forma ordinária (sete profecias, a Epístola e o Evangelho). O rito de 1969 é, pois, mais completo e tradicional, nesse ponto, do que o rito de Pio XII e João XXIII. Porém, não suficiente. Em uma reforma da reforma, com tendência à unificação do rito romano, faz-se necessário retomar o esquema antigo, das doze profecias: ou seja, aumenta-se o que já temos hoje no rito moderno, e não se retrocede ao rito tridentino de 1962, mas ao pré-1955.

Depois das profecias, ainda na Vigília, e antes da Missa em sentido estrito, havia, pré-1951, uma bênção da água batismal, eventuais batismos e o canto da ladainha de todos os santos. O Batismo e a bênção da água são tradicionais na Páscoa, data em que, desde os tempos mais antigos, se celebrava esse sacramento para os catecúmenos admitidos na Quaresma (ritos, aliás, perdidos com o tempo e sabiamente revigorados pela reforma de Paulo VI, MR 1969, com seu Rito da Iniciação Cristã de Adultos). Mudou-se o esquema dessas cerimônias com Pio XII e novamente com Paulo VI. Para melhor entendimento de nossa proposta, vejamos como era a ordem em cada um dos ritos:

ANTES DA REFORMA DE PIO XII EM 1951
- Bênção da água batismal
- Batismo
- Ladainha, durante a qual o padre, o diácono e o subdiácono vão à sacristia mudar os paramentos de roxos para brancos

REFORMA DO SÁBADO SANTO EM 1951 (OHS 1955/MR 1962)
- 1ª parte da Ladainha
- Bênção da água batismal
- Batismo
- Renovação das promessas do Batismo
- 2ª parte da Ladainha, durante a qual o padre, o diácono e o subdiácono vão à sacristia mudar os paramentos de roxos para brancos

REFORMA LITÚRGICA DE PAULO VI (MR 1969)
- Ladainha
- Bênção da água batismal
- Batismo
- Renovação das promessas do Batismo

Não há motivo algum para que, no na reforma da Vigília em 1951, portanto na OHS 1955/MR 1962, a ladainha seja abruptamente cortada em duas partes. Muito menos para, no MR 1969, ela ser deslocada para antes da bênção da água batismal e do Batismo. O lugar tradicional era depois dessa bênção e desse Batismo, como súplica pelos recém-batizados e por toda a Igreja. Antonelli informa que, em tempos imemoriais, os Batismos na Vigília eram acompanhados pela ladainha que iniciava antes do sacramento, era interrompida, e continuava após o Batismo. Todavia, pensamos que a unificação da ladainha é algo mais natural e essa unificação processou-se pelo princípio do desenvolvimento harmônico da liturgia. Uma eventual e futura reforma da reforma deve restaurar o uso antigo, pré-1951, nesse aspecto: ladainha como última cerimônia, e durante a qual se mudam os paramentos.

A introdução da Renovação das Promessas do Batismo, embora novidade, parece ser um desenvolvimento harmônico, de vez que não conflita com o espírito da celebração e não se trata de algo artificial. A Páscoa é a festa do Batismo. Nela se benzem a água lustral, se fazem batismos, se lembra a Ressurreição de Cristo - e o Batismo de cada um é uma participação nessa Páscoa do Senhor. Nada mais justo do que renovar nossos votos batismais exatamente na Páscoa. Foi bem o OHS 1955/MR 1962 que criou a cerimônia, e o MR 1969 que a manteve.

Para que, visualmente, tenhamos bem clara a nossa proposta, compare o leitor os esquemas acima com o que pensamos:

REFORMA DA REFORMA
- Bênção da água batismal
- Batismo
- Renovação das promessas do Batismo
- Ladainha, durante a qual o padre, o diácono e o subdiácono vão à sacristia mudar os paramentos de roxos para brancos

Na prática, é o rito anterior a 1951 com a introdução da Renovação das Promessas do Batismo, entre o próprio Batismo e a ladainha.

A Bênção da Pia Batismal, antes de 1951/1955/1952, era feita no batistério, onde fica a própria pia. O OHS 1955/MR 1962 moveu o local para a presbitério. Já o MR 1969 restaurou a bênção no batistério, ao menos como opção. Não faz sentido benzer a pia sem pia - trocando-a por um balde, jarra ou outro recipiente. Faz-se necessário retornar aos ritos pré-1951.

Até 1951, como vimos, a Solene Vigília Pascal era celebrada na manhã do Sábado Santo. Assim, após a Vigília em sentido estrito, havia a Missa, e, por fim, antes do Ite Missa Est, as I Vésperas da Páscoa, reduzidas (salmo com sua antífona, e Magnificat com sua antífona). Isso porque Vésperas são rezadas à tarde, sendo pois a primeira hora maior após a Missa da Solene Vigília Pascal. Com a mudança desta para seu veritas horarium, tornou-se inconcebível que após a Missa se rezassem Vésperas. A hora maior correspondente ao fim da Missa no novo horário seria Laudes. Assim, à ordem anterior - Vigília, Missa, Vésperas -, substituiu-se um novo esquema: Vigília, Missa, Laudes. E Laudes reduzidas, como Vésperas anteriormente: salmo com sua antífona, e Benedictus com sua antífona: o salmo, aliás, foi mantido, e as antífonas também, só sendo mudado o Cântico Evangélico, que é específico de cada hora. O texto, então, é o mesmo, apenas com mudança do Cântico. As Matinas se tornaram dispensadas por quem celebra ou assiste a Solene Vigília Pascal, pois ocupa seu mesmo horário.

A crítica à falta de I Vésperas justamente na Páscoa, a festa das festas, já foi por nós enfrentada acima. Resta a crítica à falta do Te Deum, ocasionada pela não celebração das Matinas por quem assiste ou celebra a Vigília Pascal. O Te Deum ou Hino Ambrosiano é cantado ou recitado em todos os Domingos, exceto da Quaresma e em todas as festas e solenidades (antigamente, festas de segundo e primeiro grau). Ora, se a Páscoa é a solenidade das solenidades e além disso é dominical, acabar com o Te Deum nela é terrível! Até porque o Te Deum permanece para aqueles que, não tendo celebrado ou assistido a Solene Vigília Pascal, rezam as Matinas no breviário. Todavia, o alegado impasse é fácil de resolver: introduza-se o Te Deum ao fim da Missa, seja antes ou depois das Laudes.

Assim, nossa proposta para um rito romano unificado no tocante à Solene Vigília Pascal seria: horário como no atualmente em qualquer das duas formas, ordinária ou extraordinária (visto que o OHS 1955/MR 1962 e o MR 1969 coincidem nisso); paramentos e suas cores como no rito tradicional (ou seja, os mesmos tanto no MR 1952, quando na reforma ad experimentum de 1951 e mantida na OHS 1955/MR 1962); doze profecias como no MR 1952 (melhor do que as seis do MR 1969 e bem melhor do que as quatro do OHS 1955/MR 1962); esquema batismal do rito do MR 1952, com a introdução da Renovação das Promessas do Batismo do OHS 1955/MR 1962 e MR 1969 (resultando em Bênção da Água Batismal, Batismo, Renovação das Promessas do Batismo, Ladainha, durante a qual o padre, o diácono e o subdiácono vão à sacristia mudar os paramentos de roxos para brancos); introdução do Te Deum no fim da Missa; Laudes.

São meras sugestões, mas servem para iniciarmos um diálogo acerca dessa semana tão importante no calendário cristão e remodelá-la com a preservação das reformas de Pio XII e Paulo VI resgatando o uso anterior de séculos.

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