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segunda-feira, 26 de novembro de 2018

Curso NOÇÕES BÁSICAS DE LITURGIA ROMANA

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Atendendo a inúmeros pedidos, finalmente lancei o NOÇÕES BÁSICAS DE LITURGIA ROMANA, meu mais novo curso online. Fruto de mais de duas décadas de estudos sobre liturgia, que fizeram com que eu publicasse dois livros sobre o assunto, ministrado palestras pelo Brasil afora acerca do tema, dado workshops e formações, e dirigisse o Salvem a Liturgia, esse curso é dirigido a todos: fiéis, seminaristas, religiosos e clérigos, desejosos de conhecer mais sobre a liturgia.

Faz a tua matrícula ainda hoje!


A partir da matrícula, o aluno tem acesso às aulas já disponíveis e poderá assistir às novas que serão subidas aos poucos. Pode-se assistir cada aula quantas vezes for preciso, pelo período de tempo que o aluno desejar. Não há prazo para o término do curso.
Ah, e os padres, diáconos e seminaristas podem adquirir o curso por um valor bem abaixo do normal, bastando CLICAR AQUI.

sábado, 16 de dezembro de 2017

Sim, o Advento é um Tempo Penitencial

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Por Gregory DiPippo / New Liturgical Movement
Tradução e adaptação: Daniel Pereira Volpato / Salvem a Liturgia!

O começo de todo novo ano litúrgico traz pelo menos um artigo nas partes católicas da web “explicando” que o Advento não é um tempo penitencial. O Código de Direito Canônico é geralmente citado, uma vez que o Advento não é incluído na lista “oficial” de dias e tempos penitenciais, juntamente com a Instrução Geral sobre o Missal Romano, que o descreve como um período de “piedosa e alegre expectativa” (NdT: Normas Universais sobre o Ano Litúrgico e o Calendário, n. 39), sem menção à penitência.

A realidade desta matéria é mais complexa.  As tradições da Igreja não são determinadas compreensivamente ou resumidas em um Código de Direito Canônico, tampouco em um Missal ou outro livro litúrgico. É verdade que o Advento não é um tempo de jejum, e não tem sido assim no Ocidente há muito tempo. Por outro lado, na Quaresma, o jejum, o mais antigo e universal sinal da natureza penitencial daquele tempo, foi reduzido a risíveis dois dias, e as muitas referencias à “jejum” foram ou removidas ou alteradas para “abstinência” nas orações e hinos da Liturgia quaresmal. E, ainda assim, ninguém afirma que a Quaresma não é, portanto, um tempo penitencial.

Domingo Gaudete na Igreja de Nossa Senhora do Rosário, Blackfen, Inglaterra, 2013
Em sua história, Advento e Quaresma têm liturgicamente muita coisa em comum, e, na verdade, isso não mudou muito no rito pós-conciliar. As cores litúrgicas destes tempos, o roxo e o rosa, permanecem as mesmas. (Mais sobre isso abaixo.) Desde tempos muito antigos, as vestimentas que simbolizam a alegria de um dia festivo, a dalmática e a tunicela, eram substituídas em ambos os tempos por casulas plicadas, as quais foram (inexplicavelmente) abolidas tout court, não apenas no Advento. (Nas igrejas que não as possuíam, o diácono e o subdiácono usavam a alva, e o primeiro também a estola.) No novo rito, a dalmática pode ser dispensada “por necessidade ou em celebrações menos  solenes” (IGMR, n. 338). Como não há indicação do que constitui “celebrações menos solenes”, é-se perfeitamente livre para tratar os Domingos do Advento como menos solenes do que as festividades do Tempo do Natal, e deixar a dalmática de fora. (Esta rubrica é tão vaga que conduziu, infelizmente e inevitavelmente, em certos lugares, ao abuso de diáconos nunca utilizarem a dalmática, e sim o arranjo penitencial de alva e estola, mesmo nas grandes solenidades.)

Na Missa, o Gloria in excelsis é omitido aos Domingos em ambas as Formas do Rito Romano. Nos dias feriais do Advento, o Aleluia é tradicionalmente omitido antes do Evangelho; embora opcional no Novus Ordo, é um modo perfeitamente lícito de continuar a observância de um costume histórico da Igreja. Tradicionalmente, Advento e Quaresma também são ambos marcados pela remoção das flores do altar e pelo silêncio do órgão. Isso foi levemente modificado na liturgia pós-conciliar: flores e órgão são proibidos na Quaresma (não apenas desencorajados), mas podem ser usados no Advento “com moderação tal que convenha à índole desse tempo” (IGMR 305 e 313). Novamente, a imprecisão das rubricas permite que eles sejam deixados completamente de lado.

A exceção à regra tradicional da supressão das flores e música do órgão dá-se nos Domingos Gaudete e Laetare, quando seu uso é permitido da mesma forma que em outros domingos e festas juntamente com as características vestimentas rosa, criadas como uma mitigação do violeta penitencial. A permanência do Domingo Gaudete no meio do Advento é o sinal mais claro de que o caráter penitencial deste tempo persiste.

E Se Não Fosse, Deveria Ser

Deixando tudo isso de lado, quando chegar a hora da Reforma da Reforma (e ela certamente chegará, embora não saibamos nem o dia nem a hora), deve-se admitir que a “piedosa e alegre expectativa” tem sido um fracasso e deve ser reparada.  Não parece ter alcançado nada no tocante a refrear a orgia do consumismo que atravessa o Natal em boa parte do mundo. A restauração de algum grau de jejum e penitência no Advento, algo já praticado por muitos a nível pessoal, seria uma poderosa declaração católica das razões para este tempo.

Pessoalmente, acho triste como muitas árvores de Natal são desmontadas já na noite do dia 26. Este é um dos muitos sinais de que, ao invés de ser tido como um tempo de expectativa e alegria, o Advento tornou-se, em muitos lugares, uma versão ao contrário das oitavas do Natal e da Epifania. Pastoralmente, a Igreja deveria encorajar os fiéis a testemunhar a importância do nascimento de Cristo mantendo o todo do tempo do Natal, com as muito antigas e importantes festas litúrgicas que se seguem, como a grande e prolongada festa que tradicionalmente era; reestabelecer o caráter formalmente penitencial do Advento certamente ajudaria nisso, da mesma forma que a Quaresma faz para a Páscoa.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

Ebook "Salvemos a Liturgia" já à venda!

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Esgotado nas livrarias, e agora em versão ebook vendida diretamente por mim, autor da obra e diretor deste apostolado Salvem a Liturgia.

Ao preço de R$ 19,90 ou em até 2x no cartão, reúne estudos e artigos que ensinam a importância das normas litúrgicas e de como viver o seu espírito, de acordo com o Magistério da Igreja e a Tradição. Você pode adquirir esse ebook clicando AQUI ou clicando no botão abaixo.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Da conveniência de uma Liturgia Universal, por Jorge Ferraz

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Liturgia universal catolicismo inculturação simbolismo significado mistagogia mistério


Não é a primeira vez que recomendo algum artigo do Deus lo Vult! E, sinceramente, espero não ser a última. Desta vez, Jorge Ferraz nos brinda com uma excelente reflexão sobre a universalidade da Liturgia.

É um tema fora de moda, eu sei. Há uma certa tendência por aí de querer adaptar a Liturgia aos gostos particulares de cada comunidade dizendo se tratar de inculturação. Esta infeliz tendência - muito em voga no Brasil, infelizmente - é fruto de uma concepção errônea de inculturação e, pior ainda, do que é a Liturgia em si.

Veja o que Jorge diz:
Eu entendo o argumento de que o Evangelho não é uma cultura pronta e acabada mas, ao contrário, uma força capaz de orientar para Cristo tudo aquilo que é verdadeiramente humano — e, portanto, tem em Si próprio a força de elevar a Deus qualquer cultura. Mas disso não me parece decorrer que o culto a Deus deva reproduzir as particularidades de cada povo, de cada grupo social, de cada costume local (ainda que legítimo). Ao contrário: penso que, no que diz respeito à Sagrada Liturgia, a catolicidade da Igreja deve se sobrepôr à legítima particularidade dos fiéis que do culto divino tomam parte em um momento histórico específico e em um lugar determinado do globo terrestre.
A seguir ele enumera três razões que fundamentam este seu pensamento, que resumo da seguinte forma:
  1. O simbolismo contido na Liturgia e o significado que ela carrega. A Liturgia em todos os seus aspectos deve ser mistagógica, deve comunicar o Mistério de um Deus que entregou Seu Filho por tamanho amor a cada um dos homens (Jo 3,16). Este ato sublime de amor torna-se presente através da Liturgia da Missa que, por isso, deve comunicar este caráter sagrado, extraordinário.
  2. A passividade da cultura no processo de inculturação. Ou seja, é o Evangelho o agente transformador aqui, e este age modificando uma determinada cultura humana presente num determinado momento histórico. Embora as culturas possam contribuir para o ethos católico, uma dita Cultura Católica, por assim dizer, esta influência sempre será muito menor do que a influência que o Evangelho e a Igreja devem exercer numa cultura.
  3. A universalidade da Liturgia, que não deve se contrapor ao seu caráter sagrado. Dito de outro modo: embora a Liturgia deva nos comunicar o Mistério, a sua forma e a execução do rito não nos devem causar estranhamento.
O texto na íntegra, cuja leitura recomendo fortemente, pode ser encontrado em "Da conveniência de uma Liturgia Universal".

terça-feira, 3 de novembro de 2015

Reforma da reforma e Semana Santa

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Introdução

Continuando nossa série sobre uma futura unificação do rito romano, teço breves linhas sobre a unificação do rito romano quanto à Semana Santa, falando das cerimônias da Semana Santa pré-1955, aa reforma de Pio XII e do Novus Ordo.

Quero propor aqui um brainstorming, mencionando os três usos de Semana Santa no rito romano: pré-1955, reforma de Pio XII em 1955 continuada pelo Beato João XXIII em 1962 (hoje, rito tridentino/forma extraordinária) e reforma de Paulo VI em 1969 (hoje rito moderno/forma ordinária), salientando aspectos positivos e negativos de cada etapa, e o que poderia compor, de modo natural e orgânico, uma eventual e futura unificação litúrgica em nosso rito.

O que era positivo pré-1955 e deveria ter sido mantido e não foi? O que era negativo e, graças a Deus, foi reformado em 1955, permanecendo no rito de 1962? E o que era negativo em 1955-1962 que foi reformado em 1969 e o que era positivo e não poderia ter sido recusado?

Muito das cerimônias anteriores à reforma de Pio XII, em 1955, era duplicação desnecessária, barroquismo demasiado, e o próprio deslocamento dos horários naturais era um absurdo (Vigília Pascal na manhã do Santo Santo, Missa In Coena Domini na manhã de Quinta-feira Santa… “CEIA” de manhã? “VIGÍLIA” de manhã?). Todavia, muito do que foi reformado em Pio XII, até mais do que em Paulo VI, talvez, também foi fruto de exageros.

Vou usar as siglas OHS 1955/MR 1962 para a Semana Santa reformada por Pio XII em 1955 e mantida no Missal de João XXIII de 1962; MR 1952 para a Semana Santa pré-1955, constante no Missal de 1952; e MR 1969 para o Missal reformado por Paulo VI.

Irei nos basear em diversas fontes, sobretudo nas memórias do Cardeal Ferdinando Antonelli, OFM, da comissão responsável pela reforma da Semana Santa e, após o Vaticano II, do Consilium ad exsequendam Constitucionem de Sacra Liturgia.

Bibliografia indicada:

ANTONELLI, Ferdinando. Il ripristino della solenne Veglia Pasquale. Lezioni di Liturgia, in ALV, pp. 1-20
___. Progetto per la revisione dei riti del Sabato Santo nella eventualità di un ripristino della vigilia di Pasqua, 1951, SRC Sect. Hist., in SCCS, pp. 1-30
___. Questioni intorno alla Veglia Pasquale, 1953, in SCCS, pp. 1-4
___. Annotazioni intorno alla riforma della Domenica delle Palme, 1954, in SCCS, pp. 1-20
___. Intorno alla Settimana Santa, 1954, in SCCS, pp. 1-2
___. Storia dei Riti del Triduo Sacro, RAI, 1965, in SCCS, pp. 1-9
___. Promemoria sulla revisione dei libri liturgici in esecuzione della Costituzione Conc. della S. Liturgia, 1963, in SCCS, pp. 1-9
SAGRADA CONGREGAÇÃO DOS RITOS. De Sollemni Vigilia Paschali Instauranda. Decretum et Rubricae si Vigilia Paschalis Instaurata Peragitur, 1951
___. Memoria sulla riforma liturgica, 1951
___. Ordo Sabbati Sancti, 1951
___. De Instaurationi Liturgica Maioris Hebdomadae, 1955
___. Maxima Redemptionis Nostrae Mysteria, 1955
GIAMPIETRO, Nicola. The development of the liturgical reforma. As seen by Cardinal Ferdinando Antonelli  from 1948 to 1970, Fort Collins, 2009: Roman Catholic Books
GODDARD, Philip. Festa Paschalia: A history of the Holy Week liturgy in the Roman Rite, Leominster, 2011: Gracewing

Domingo de Ramos da Paixão do Senhor

Comecemos com o Domingo de Ramos. O que havia no rito pré-1955? Deste rito, o que foi mudado em 1955? Das mudanças, o que foi positivo e o que foi negativo? Noutras palavras, o que Pio XII fez de bom ao reformar o Domingo de Ramos e o que, em minha opinião, não deveria ter sido reformado?

O OHS 1955 (mantido pelo MR 1962) introduziu o pluvial vermelho para a procissão, mantendo o roxo para a casula da Missa. O MR 1969 fez tudo ficar vermelho. Penso que o vermelho para a casula, como em 1969, rompe com todos os séculos de tradição litúrgica romana que viram no Domingo de Ramos também uma comemoração da Paixão. De fato, é a preparação próxima para a Paixão, inauguração da Semana Santa. O roxo é mais adequado para a Missa e não o vermelho. Surge, entretanto, a pergunta: é certo que o MR 1969 foi longe demais em prescrever vermelho para a Missa de Ramos, e o roxo deveria continuar como sempre, mas a procissão também deveria ser com pluvial roxo, como no MR 1952 (ou seja, pré-1955), ou foi uma inovação positiva e um desenvolvimento sadio a adoção do vermelho para o pluvial da procissão no OHS 1955/MR 1962?

Conforme comentário do leitor Marcio Braga, em conversa nas redes sociais:

"Eu considero interessante a mudança das cores dos paramentos no Domingo de Ramos em nome da catequese visual. No início da Missa o sacerdote usa vermelho, cor que normalmente é vista pelo povo nas celebrações de memórias dos Mártires e Apóstolos, além de Pentecostes. Ou seja, em ocasiões festivas. Aqui o povo canta hosanas na procissão vendo o sacerdote trazer uma cor das comemorações. Ao entrar na Igreja (vale lembrar o antigo costume do acólito que traz a cruz bater três vezes com ela na porta da Igreja, simbolizando o acesso que temos por meio da Cruz, que aliás será lembrado na Proclamação da Paixão), o sacerdote passa a usar roxo e o povo é surpreendido com essa cor penitencial. Vale lembrar que não é comum a troca de cores durante a Missa, exceto nas celebrações deste Tempo Santo da Paixão. Logo da troca das cores é colocado na boca do povo o doloroso "Crucifica-o", que dizemos com aperto no peito. Isso tudo motiva a reflexão das vezes em que o aclamamos Rei e Senhor de nossas vidas e o entregamos ao sofrimento na sequência, por meio de nossos pecados."

Um pastor anglicano High Church usando pluvial roxo na procissão de ramos,
conforme o uso mais tradicional, pré-1955.

O vermelho foi utilizado, a partir da OHS 1955/MR 1962, como símbolo de realeza, como a "púrpura real", e por isso só para a procissão de Ramos (em que se honrava Cristo Rei). Ocorre que essa não é a simbologia do vermelho no rito romano. A cor das festas cristológicas é o branco ou, mais propriamente, o dourado. O vermelho não indica realeza em toda a história do rito romano, e se constituiu em uma novidade. De qualquer modo, penso que até se poderia conceder que a procissão fosse vermelha e que a cor tivesse esse caráter, mas a troca do roxo até da Missa, em 1969, me parece abusiva demais. Quanto às cores de Ramos no rito novo, tenho opinião formada: sou contra. Quanto às cores de Ramos entre 1955 e 1969, ainda estou na dúvida. Até 1955, a cor exclusiva do Domingo de Ramos era o roxo penitencial, e da Sexta-feira Santa o preto em luto. Entre 1955 e 1969, o Domingo de Ramos passou a ter duas cores: vermelho na procissão e roxo na Missa, e a Sexta Santa continuou com o preto. Só em 1969, adotou-se o vermelho para ambas. O vermelho para a Missa de Ramos e para a Sexta-feira Santa é completamente destoante da tradição romana. Para mim, é fora de questão que o arranjo de 1955/1962 é melhor do que o de 1969. Mas estou em dúvidas se o arranjo de 1955/1962 é melhor ou pior, no quesito cor litúrgica, do que o de 1952 (e anterior).

Seguindo o rito de 1955/1962, o sacerdote usa o pluvial vermelho na procissão de ramos, exatamente como no rito reformado por Paulo VI em 1969.

Outro ponto, ainda sobre Ramos: a abolição, para os diáconos e subdiáconos, na Missa Solene, da casula plicada ou dobrada e dos estolões, no OHS 1955/MR 1962, a meu ver foi um desnecessário simplismo e um jogar fora toda uma rica tradição. E uma tradição nada estéril. Tinha significado. O uso da casula dobrada pelo diácono e pelo subdiácono (ao invés da dalmática e da túnica) e do estolão pelo diácono lembravam a profunda tristeza da Igreja na Semana Santa, que se refletia até mesmo nas vestes "rasgadas", além de ser um dos costumes mais antigos, pré-medievais. Nisso, tenho posição convicta: nem 1969 nem 1955/1962, mas a forma pré-1955 era melhor. Em uma eventual reforma da reforma que contemple a unificação do rito romano, não basta retornar a 1955/1962: é preciso retroceder mais e resgatar o uso tradicional e milenar, tal qual no MR 1952.

Aqui se vê, ao centro, o celebrante (anglicano, aliás) 
com uma casula romana comum, e nos lados, o diácono e o subdiácono 
com as casulas romanas dobradas.

Aqui um subdiácono com casula gótica dobrada.


O estolão, que o diácono colocava, ao tirar a casula dobrada, 
para ler o Evangelho e para suas funções mais ativas, 
na Missa Solene em tempos penitenciais.

Outra foto de um diácono (anglicano) com estolão.


Já um terceiro ponto acho que foi positivo na reforma de Pio XII (OHS 1955/MR 1962): a simplificação do rito da bênção dos ramos. No MR 1952, pré-1955, portanto, havia uma Missa Seca, com Epístola, Gradual, Evangelho, Prefácio e até Sanctus, tudo no altar e versus Deum. Isso tornava o conjunto Procissão-Missa excessivamente longo. Que a Vigília Pascal seja longa se entende, pois é a noite das noites e a mãe de todas as vigílias, a festa cristã por excelência. Mas Ramos?

Com uma "Missa" dentro da Missa, há uma multiplicação de símbolos que deixam o fiel até perdido, além de demorar demais. Lembremos que a ausência de sinais é um erro, mas o excesso deles também: tanto a ausência quanto o excesso nos deixam perdidos e sem referência. A eliminação pelo OHS 1955/MR 1962 dessa cerimônia demasiado complexa e sua troca por um rito mais simples, com a leitura do Evangelho da Entrada Triunfal, e uma mera bênção das palmas, versus populum, é positiva, a meu ver. Um único detalhe poderia ser mantido dos ritos pré-1955: ao menos uma parte do prefácio que falava da realeza de Cristo, dado que ela é a tônica da procissão. Poder-se-ia, então, para uma unificação do rito, no futuro, adotar o modo simples e reformado em 1955/1962 - não muito diferente da forma ordinária em 1969 -, acrescentando-se o prefácio da bênção do MR 1952 ou parte dele. Com a simplificação do rito da bênção dos ramos, ademais, deu-se ênfase à procissão em honra a Cristo Rei, com uma maior realidade do evento que se celebra, a entrada triunfal de Cristo em Jerusalém. Essa ênfase na procissão pelo Reinado de Cristo foi positiva, e é ainda mais forte pela inserção da rubrica que manda cantar na procissão, além do Gloria Laus, o Christus Vincit - um hino tipicamente relacionado à realeza do Senhor.

Outro ponto positivo é a supressão das orações "de exorcismo" das palmas. Não que tenhamos que negar seu poder sacramental, seu símbolo contra o mal. Nada disso. Mas a tônica de Ramos NÃO é a guerra espiritual. As palmas abençoadas como sacramentais são consequência, são acidentais, não a essência das cerimônias desse dia. É bem verdade, contudo, que nem só de essência vive a liturgia e muitos acidentes são importantes. Não julgo, entretanto, que esse acidente das orações imprecatórias seja um deles. Andou bem Pio XII, o OHS 1955, João XXIII e o MR 1962, pois.

Interessante notar que o costume do acólito bater com a cruz por três vezes na porta, embora feito pelos que usam a forma extraordinária (OHS 1955/MR 1962) NÃO consta da reforma de Pio XII/João XXIII. Ela constava antes, nos ritos pré-1955, i.e., no MR 1952. Mas mesmo a reforma piana não conseguiu apagar o antigo costume: ainda que não constasse nas rubricas, se continuou a proceder assim. Acho interessantíssimo esse bater na porta com a cruz, que simboliza a resistência do povo judeu a Cristo, e a abertura não só de Jerusalém para a entrada triunfal, mas da Jerusalém Celeste, o Céu: e o céu foi aberto justamente pela cruz! Aliás, o próprio João XXIII não estava de todo contente com o OHS 1955, ainda que o tenha preservado no MR 1962, pois celebrou suas Semanas Santas com alguns costumes e mesmo hinos e observância de rubricas advindas dos ritos pré-1955. Enfim, o costume de bater com a cruz na porta, embora ausente no OHS 1955/MR 1962 e no subsequente MR 1969, continua a ser feito amplamente em todas as Semanas Santas celebradas de acordo com o Proprium de 1962 e até mesmo em alguns lugares que usam o Proprium de 1969.

Mesmo não constando nas rubricas do OHS 1955/MR 1962, o padre, ao utilizar a forma extraordinária, mantém o costume de bater na porta da igreja com a cruz.

Após a procissão e a entrada na igreja, o OHS 1955/MR 1962 introduziu uma oração conclusiva, para encerrar as cerimônias e dar início à Missa. Embora bela e piedosa, alguns admitem que foi uma introdução desnecessária e que cria uma ruptura, uma solução de continuidade entre a procissão e a Missa. Além disso, não consta em toda a tradição anterior. O próprio Pe. Carlos Braga, um dos responsáveis pela reforma de Pio XII e colaborador estreito do Mons. Bugnini, admitiu, anos mais tardes, que a criação e introdução dessa oração foi uma escolha infeliz: "O elemento que está fora de lugar no novo Ordo é o discurso de encerramento da procissão, que interrompe o unidade da celebração." (BRAGA, Carlos. Maxima Redemptionis Nostrae Mysteria: 50 anni dopo (1955-2005), in Ecclesia Orans, n. 23, 2006, p. 25) Todavia, ser algo novo não parece ser um argumento absolutamente convincente. Do contrário, ainda estaríamos celebrando como na Jerusalém do séc. I, sem nenhum desenvolvimento. A pergunta não deve ser feita quanto à novidade de uma cerimônia, mas sim se essa novidade se constitui um desenvolvimento HARMÔNICO ou artificial. Não sou perito e não saberia responder. Agradeço aos leitores se puderem comentar a respeito.

Enfim, pelas rubricas pré-1955, ao terminar a procissão e entrar na igreja, começando propriamente a Missa, o sacerdote deveria recitar as orações ao pé do altar. Com o OHS 1955, houve a supressão dessas orações para a Missa de Ramos que segue a procissão, inovação mantida no MR 1962 (nem se fale no MR 1969, onde as orações ao pé do altar foram suprimidas de todas as Missas). Ora, parece que o desejo de simplificação, justo em alguns pontos, não encontra freio. Aqui não há nenhuma razão plausível de ordem pastoral ou teológica para omitir as orações ao pé do altar, bem como fere toda a tradição do rito romano. A Missa, antecedida ou não por uma procissão, não deve ter justamente a preparação ao sacrifício que são as orações ao pé do altar, suprimidas. Nem o Asperges dominical faz as orações ao pé do altar desaparecem, por que a procissão de Ramos o faria?

Também no Missal pré-1955, portanto MR 1952, o canto da Paixão não substitui o Evangelho. São duas coisas distintas, ainda que as cerimônias sejam uma subsequente à outra. Primeiro, com três diáconos, como até hoje, no OHS 1955/MR 1962 e no MR 1969, se canta a Paixão. Imediatamente ao término da Paixão, o diácono da Missa apenas segue cantando o Evangelho, em outro tom, auxiliado pelo subdiácono e pelo acólito, como em qualquer Proclamação do Evangelho nas Missas normais. Havia uma pequena pausa entre a Paixão e o Evangelho, e o silêncio para a troca de cerimônias representava o luto de toda a Criação e da Igreja pela morte do Senhor. O incenso se usava no Evangelho, mas não na Paixão. Com o OHS 1955/MR 1962, Paixão e Evangelho se tornam uma coisa só, com as três vozes seguindo no trecho que antes era do Evangelho, e no mesmo tom. Alguns criticam tal decisão da Comissão, afirmando que a Missa se viu privada do Evangelho, além do rito anterior à reforma de 1955 ser mais representativo - e, obviamente, mais tradicional e de acordo com o legítimo costume ancestral romano.

Aliás, antes da Paixão, que é antes do Evangelho, no MR 1952, havia a leitura de um segundo trecho do Evangelho (terceiro, se contarmos a Procissão), que narra a Instituição da Eucaristia na Última Ceia. O sentido era claro: ligar a Ceia à Cruz, a Eucaristia à Paixão, pois Ceia, Cruz e Missa são uma coisa só. A Missa é a renovação da Cruz e a Ceia sua antecipação. Ao eliminar esse trecho evangélico no OHS 1955/MR 1962, não só uma importante cerimônia tradicional foi retirada, como se perdeu algo de catequético e profundamente espiritual. O MR 1969 manteve a retirada do OHS 1955/MR 1962.

Segunda-feira Santa, Terça-feira Santa e Quarta-feira Santa

No MR 1952, a Missa de Segunda-feira Santa continha uma oração Contra Persecutores Ecclesiae e uma Oração pelo Papa. O OHS 1955/MR 1962 a removeu, e o MR 1969 não a fez retornar. Além de ser uma supressão de uma cerimônia tradicional no rito romano, o que não se pode fazer sem graves razões, penso que essa omissão a partir de 1955 representa a adoção de uma mentalidade irenista, que não quer explicitar que a Igreja tem perseguidores e inimigos. Isso é lamentável. Na Grande Semana, onde os poderes das trevas tentam destruir a obra do Senhor, mais clara deve se manifestar a doutrina da guerra espiritual que movemos contra os inimigos espirituais e materiais da Igreja de Cristo.

Na Terça-feira Santa e na Quarta-feira Santa, as Missas tinham as leituras da Paixão, conforme São Marcos e São Lucas. O OHS 1955/MR 1962 manteve essas leituras da Paixão, mas as encurtou, o que não faz sentido algum. Já a reforma de Paulo VI, com o MR 1969, foi além e desfigurou completamente a Liturgia da Palavra dessas Missas, trazendo prejuízos até mesmo para comentários espirituais de santos e de padres sobre a Semana Santa que, refletindo nas perícopes das Missas do dia, alimentaram centenas de gerações ao longo dos anos.

Um ponto positivo da reforma de Paulo VI, em 1969, foi a recomendação de que, na Semana Santa, especialmente na Segunda-feira Santa, Terça-feira Santa e Quarta-feira Santa se fizessem comemorar nas igrejas e oratórios  as chamadas Celebrações da Penitência, que constam do Ritual Romano ou da separata Ritual da Penitência, preparando o povo para a confissão auricular.

Missa Chrismatis e Quinta-feira Santa In Coena Domini

O arranjo de 1955 para a Quinta-feira Santa, continuado em 1962, com o Missal do Beato João XXIII, consistiu em mudanças de menor envergadura. Uma delas foi a observância do princípio da veritas horarium, com a restauração do horário da Missa In Coena Domini ao para a tardinha, seu horário natural. Esse era o horário original desta Missa, para melhor simbolizar que se tratava da comemoração da Última Ceia, feita por Cristo e os Apóstolos justamente ao cair da noite. Primitivamente, havia essa Missa em todas as paróquias, à tardinha ou começo da noite, e uma outra Missa, a Missa Chrismatis, presidida pelo Bispo na Catedral com a presença do seu clero, na manhã da mesma Quinta-feira Santa. Com o tempo, multiplicou-se o costume de se celebrar a Missa In Coena Domini na própria manhã, e isso resultou na perda de uma melhor observância do sentido da Última Ceia, bem como a eliminação da Missa Chrismatis - e a consagração dos óleos passou a ser feita na Missa In Coena Domini catedralícia.

 Missa Chrismatis pelo rito de 1962, em Campos, RJ

A restauração do horário natural melhor acomodou a Missa In Coena Domini e permitiu o reaparecimento da Missa Chrismatis. Ambas foram consequências positivas, e mantidas não só no Missal de 1962 como no oriundo da reforma de Paulo VI, em 1969.

Todavia, a Missa Crismal não era celebrada há séculos. Teve a comissão litúrgica da Santa Sé, encarregada da reforma da Semana Santa, que buscar os ritos da Idade Média, conforme os sacramentários e missais mais antigos, para compor o Próprio dessa Missa. A Missa Chrismatis já era celebrada no séc. IV, presidida pelo Bispo, com todo o seu presbitério em concelebração sacramental, e com a consagração dos óleos, o que sempre foi observado por outros ritos, como o armênio. Havia uma outra Missa, de caráter penitencial, preparando os fiéis à Páscoa. Essa Missa penitencial desapareceu, e só se unificou a Crismal com a Missa In Coena Domini quando o costume tornou todas as Missas obrigatórias no período da manhã. Também a concelebração sacramental se tornou uma mera concelebração ritual ou cerimonial, com os padres de casula, mas não consagrando, quando a concelebração não foi mais permitida no rito romano.

Outra mudança de 1955 foi o deslocamento do Mandatum (o rito do lava-pés) do fim da Missa para depois da homilia, antes do Ofertório. O que nos causa estranheza foi que o princípio da veritas horarium, invocado para que a In Coena Domini passasse a ser celebradas à tardinha, não foi observado aqui. Ora, o horário natural para o lava-pés é depois da Missa, pois Nosso Senhor lavou os pés dos Apóstolos depois de haver ceado, ou seja, depois de celebrar a Eucaristia. A ordem cronológica Missa-Mandatum que era observada e estava correta pelo veritas horarium, é violada. Mas não foi a veritas horarium que deslocou a Missa da manhã para a tardinha? Por que no caso do Mandatum o princípio não vale? Além disso, o lava-pés depois da homilia interrompe a Missa, o que poderia ser justificado na sábia decisão de 1967 de assim fazer quando o Batismo, o Matrimônio ou a Confirmação fossem celebrados com Missa, dado que são sacramentos e não ficaria mau que se os celebrassem dentro do próprio Santo Sacrifício. Porém, um rito bonito, simbólico, mas que não é sacramento, interromper a Missa poderia parecer demais.

Procurou-se justificar o lava-pés após a homilia pois como era feito antes, depois do desnudamento dos altares, o luto tomaria conta da igreja e se passaria à adoração eucarística no monumento ou altar da reposição. Ora, então que se o deslocasse para o período compreendido entre a transladação do Santíssimo Sacramento e o desnudamento dos altares, e não para dentro da celebração eucarística.

Outra justificativa do lava-pés após a homilia, segundo o Cardeal Antonelli, um dos responsáveis pela reforma da Semana Santa, seria tornar a cerimônia mais conhecida pelos fiéis, de vez que feita na própria Missa, em um lugar central. Ademais, o Evangelho da Missa fala justamente do lava-pés e é bem simbólico que, após sua leitura, se proceda a esse ato narrado nas santas páginas. Por outro lado, não se trataria de uma interrupção da Missa, pois a cerimônia faz parte do Próprio do dia, afastando-se, então, o argumento de uma ruptura. O argumento do nobre Purpurado, sem embargo, não enfrenta o problema de não ser mais observado o veritas horarium que orientou as decisões de reforma - exceto neste ponto.

Aliás, o Mandatum, em 1955, passou a ser feito no coro ou no presbitério, e isso prejudica a sacralidade, permitindo que, mais uma vez, leigos ingressem no santuário. É certo que há ocasiões em que eles já adentravam a tão sagrado recinto, mas não vejo com bons olhos criar mais uma situação para isso. Fazer, como no MR 1952, o rito na nave é o mais adequado, como sempre se fez.

Já a supressão de um terceiro Confiteor, antes da Comunhão do diácono, foi positiva, a meu ver. Simplificação correta, pois se tratava de um acréscimo sem fundamento claro. Se for por conta de manifestar a própria indignidade antes de Comungar, o Confiteor já recitado é suficiente, e se um ou dois não o são, não será o terceiro que o será, e nunca bastarão recitações de Confiteor.

O Agnus Dei, com o OHS 1955/MR 1962, passa a não ter na terceira resposta o Dona nobis pacem, mudada pelo Miserere nobis, uma vez que a paz (simbolizada pelo beijo da paz logo após o Agnus) não é dada em função da traição de Judas (também com um beijo). Trata-se de uma novidade, mas plenamente justificada e com muito sentido. Infelizmente, o MR 1969 não manteve essa novidade - logo ele, que abraçou tudo o que era novo na OHS 1955/MR 1962, rechaçando muito do que era antigo. A opção do MR 1969, pelo retorno ao MR 1952 foi infeliz. A nosso ver, a escolha do OHS 1955/MR 1962 é a mais correta em um futuro rito unificado.

Enfim, uma outra mudança é a retirada também da cruz e dos castiçais do altar quando do seu desnudamento. Ainda que a cruz seja um elemento próprio da Sexta-feira Santa que em breve começa, sua retirada do altar, com os respectivos castiçais, dá mais visibilidade ao desnudamento dos altares. Não apenas as flores e alfaias são retirados, conforme era no MR 1952, mas, segundo o OHS 1955/MR 1962, tudo o que está sobre o altar. O altar fica realmente nu, e isso demonstra com mais dramaticidade e compreensão plástica, uma catequese bem visível, a realidade do luto da Igreja. Se o aleluia e o Glória cessam na Septuagésima, se o comer mais fartamente é impedido e as flores são retiradas na Quaresma, se as cruzes e as imagens são veladas no I Domingo da Paixão (chamado de V Domingo da Quaresma no MR 1969), nada mais terrível e, por isso, tremendamente simbólico, do que haver um desnudamento do altar de forma radical. Nem mesmo a cruz é deixada, em sinal de luto extremo. Isso dá margem, igualmente, à cerimônia do retorno da cruz em forma triunfal da sacristia, na Sexta-feira Santa, tema do qual nos ocuparemos abaixo, mostrando que a Cruz de Cristo é morte do Senhor, mas é triunfo da graça sobre o pecado. Penso, então, ser positivo esse avanço no desnudamento do altar, agora de modo total.

O altar completamente nu após a Missa In Coena Domini.

Sabemos, enfim, que liturgia não é apenas a Missa. A Liturgia das Horas, ou Ofício Divino, condensada no livro denominado tradicionalmente breviário, é parte das ações litúrgicas da Santa Igreja. Pois bem, no Triduum, a recitação das Matinas (hoje denominadas estranha e totalmente contra a tradição litúrgica como Ofício de Leituras, na forma ordinária) e das Laudes, adquirem um colorido todo especial. De tal sorte, ambas as horas canônicas são unidas no que se chama de Ofício de Trevas, ou Tenebrae. Há o Tenebrae de Quinta-feira Santa, o de Sexta-feira Santa e o do Sábado Santo. Como são Matinas e Laudes, são ofícios próprios para a manhã de quinta, sexta e sábado. Tradicionalmente, porém, o de Quinta-feira Santa era celebrado na noite de Quarta-feira Santa, uma vez que a manhã da quinta era dedicada à Missa In Coena Domini, visto que antes de 1955, não tinha esta retornado ao seu horário natural à tardinha.

Com a reforma de Pio XII, acomodando a Missa da Ceia do Senhor segundo o veritas horarium, a manhã de Quinta-feira Santa pôde, então, ter seu Tenebrae celebrado no próprio dia, sem antecipar para o dia anterior. Corrigiu-se, pois, uma outra imperfeição lógica dos ritos de Semana Santa pré-1955, voltando à natureza das coisas, tal qual era séculos antes.O Ofício de Trevas da Quinta-feira Santa é, pois, celebrado na manhã da própria Quinta-feira Santa e não na noite da quarta. Uma exceção foi permitida pelas rubricas: nas Catedrais, como há, na manhã da quinta a Missa Chrismatis, o Tenebrae é celebrado na noite da quarta, exatamente como antes. Isso porque o motivo que autorizava, antes de 1955, o Ofício de Trevas da quinta ser celebrado na noite de Quarta-feira Santa, permanece, qual seja a Missa na manhã da quinta-feira.

Alguns argumentam contra esse tema do Tenebrae que celebrar à noite dá mais profundidade espiritual ao drama narrado no ofício, por conta das trevas, das luzes que se apagam. Ora, mas se fossem para ser celebrados à noite ou tardinha anterior seriam Completas ou, no mínimo, Vésperas. E são Matinas - oração da madrugada - e Laudes - oração da manhã. Ademais, o período para celebrar o Tenebrae não é necessariamente o dia claro, como se Laudes ou até Tércia fosse: é possível fazê-lo de manhã bem cedo, madrugada, sem o sol ter nascido, e até mesmo após a meia-noite, pois o dia litúrgico começa e termina nesse horário. Meia-noite já não é mais Quarta-feira Santa, mas Quinta-feira Santa, e a escuridão própria para o Tenebrae é a mesma da noite de quarta. Pode-se, pois, mesmo com o OHS 1955/MR 1962, celebrar-se o Ofício de Trevas "no escuro": não na noite de Quarta-feira Santa, e sim após a meia-noite, sendo já Quinta-feira Santa.

Obviamente, estamos falando do Ofício de Trevas litúrgico, não de celebrações para-litúrgicas inspiradas no Tenebrae. Assim, se um grupo de pessoas, um convento, ou uma igreja que não seja catedral, desejam celebrar o Tenebrae de Quinta-feira Santa, devem fazê-lo no próprio dia de quinta (ou seja, após a meia-noite, seja na madrugada, seja na manhã), não podendo antecipar para a quarta. Só o Tenebrae de quinta da Catedral pode ser celebrado na Quarta-feira Santa à noite. Isso na forma ordinária, de 1969, ou na forma extraordinária, de 1962. Já as ações devocionais inspiradas no Tenebrae, e que só levam esse nome por conta da inspiração mesma, podem ser celebrados em qualquer dia da Semana Santa.

Sexta-feira Santa da Paixão do Senhor, ou Parasceve

A primeira mudança do MR 1952 para o OHS 1955/MR 1962 é a do nome oficial que consta do Missal. Anteriormente à reforma de 1955, o culto litúrgico principal de Sexta-feira Santa se chamava "Missa dos Pré-santificados", enquanto depois passou a se chamar "Solene Ação Litúrgica", termo mantido no MR 1969.

Realmente, não se trata de uma Missa, de modo que Ação Litúrgica é teologicamente mais adequado. Isso ajudaria, em tese, a desfazer no povo a impressão de que se trata de um sacrifício, o que não é. Sexta-feira Santa não tem sacrifício, não tem Missa.

Várias outras mudanças do OHS 1955/MR 1962 na liturgia da Sexta-feira Santa da Paixão do Senhor tiveram por motivação exatamente desfazer qualquer equívoco no povo de que pudesse ser essa ação solene uma Missa. Aliás, as primeiras versões da liturgia de Sexta-feira Santa no rito romano, ao menos até o séc. XII, não traziam elementos sacrificais. O MR 1952 chega a mandar que se reze o Orate Fratres, o que não guarda nenhum sentido de vez que não há sacrifício sendo oferecido. Nesse sentido, o OHS 1955/MR 1962 é melhor: "purifica" o rito e ainda retorna ao cerimonial medieval, sem prejuízo e sem radicalismos. Foi, a meu ver, uma mudança oportuna a supressão de elementos claramente sacrificais em uma liturgia que não é sacrifical. Já o nome "Missa dos Pré-santificados" poderia ter sido mantido, de vez que, embora tradicionalmente associemos "Missa" com o sacrifício eucarístico, a palavra, por si só, não é sacrifical. No Oriente, é comum que, quando não há Missa, haja uma Divina Liturgia (i.e., Missa) chamada também de "dos Pré-santificados". Embora "Missa" possa se prestar a confusões de que é um sacrifício, a expressão completa, com o "dos Pré-santificados", indicando que as espécies foram consagradas em Missa anterior, já desfaz eventuais equívocos.

No rito pré-1955, o padre vestia a casula preta desde o início da celebração, como se fosse uma Missa. Após 1955, passou a usar alva, cíngulo, amito e estola preta durante a Liturgia dos Catecúmenos, envergando o manípulo e a casula apenas após o sermão, na Liturgia dos Fiéis. Em 1969, Paulo VI, retoma o antigo dispositivo de o padre iniciar toda a Ação Litúrgica já de casula - todavia, troca a cor preta pela vermelha, lamentavelmente.

Também até 1955, a celebração iniciava com uma única toalha - e não três - sobre o altar, que era colocada pelos acólitos enquanto o padre se prostrava. Já em no OHS 1955/MR 1962, o altar permanecia nu até que, na Liturgia dos Fiéis, fosse coberto com as três toalhas. Penso que, nesse sentido andou bem a reforma de Paulo VI, com o MR 1969, mandando que o altar permanecesse nu, como no OHS 1955/MR 1962, mas mandando que se colocasse um único pano, como a tradição litúrgica romana, guardada até o MR 1952, dispunha, e não três.

As preces da Oração Universal pouco mudaram do MR 1952 para o OHS 1955/MR 1962, embora o título da oração pela conversão dos hereges e cismáticos tenha se convertido em Pro Unitate Ecclesiae, o que não é mau e cuja alteração é meramente circunstancial.

Já vimos que a cruz permanece no altar, pelas rubricas do MR 1952, mesmo depois do seu desnudamento na Quinta-feira Santa, e isso foi sabiamente mudado no OHS 1955/MR 1962. Então, como no OHS 1955/MR 1962 o altar está realmente nu, sem nem mesmo a cruz, nesse ponto os reformadores, para a adoração ao Senhor Crucificado, reintroduziram uma Procissão com a Cruz que vem triunfalmente da sacristia. Isso foi inspirado no relato famoso da peregrina Egéria que narra os ritos da Semana Santa na Jerusalém dos primeiros séculos. O MR 1969 mantém essa procissão, e a mim parece uma "novidade" boa, que se insere no sadio desenvolvimento litúrgico de modo harmônico.

Outra procissão teve mudança. No MR 1952, assim como o Santíssimo Sacramento saiu solenemente do altar-mor para o monumento onde foi adorado após a Missa de Quinta-feira Santa, ou seja, na noite anterior, Ele deve voltar, com a mesma solenidade para o altar-mor antes de ser feita a Comunhão do celebrante, diáconos e subdiácono, e distribuída aos acólitos e ao povo. O OHS 1955/MR 1962 minimizou essa procissão, fazendo apenas uma procissão simples com o Santíssimo sendo trazido pelo subdiácono como nas Missas solenes comuns em que o Cristo, eventualmente, não esteja no tabernáculo do altar-mor. Em 1969, o disposto em 55/62 foi mantido. Uma futura reforma da reforma poderia recuperar o rito anterior a 1955. Se é perfeitamente possível criar a procissão da Cruz é perfeitamente possível também manter a procissão solene do Sacramento, para mostrar os dois movimentos: o de sumida do Senhor na Quinta-feira Santa, e Sua volta na Sexta-feira Santa, o que, aliás, vem de séculos anteriores. A supressão da incensação à hóstia consagrada, no OHS 1955/MR 1962, foi também, a meu ver, uma perda: pode-se e deve-se fazer luto na Sexta-feira Santa, mas não a ponto de deixar de prestar as devidas honras ao Senhor realmente presente no Sacramento da Eucaristia.

Também o OHS 1955/MR 1962 foi pioneiro em deixar que, na Sexta-feira Santa, o Pater Noster pudesse ser recitado pelo povo junto com o padre, o que não é nada errado, e andou bem a Comissão nesse sentido.

Sábado Santo

De vez que na manhã do Sábado Santo não mais se celebra a Solene Vigília Pascal, transferida para seu horário normal, à noite, para que entre Páscoa adentro, o dia todo do sábado pôde ser consagrado ao silêncio junto ao Cristo que desceu aos infernos. É uma espécie de santo velório o clima desse dia, não mais um "Sábado de Aleluia", mas um sábado de espera.

O breviário do Sábado Santo era recitado na Sexta-feira Santa (outro ponto obtuso) em razão de o sábado, em si, estar dedicado na manhã à Vigília, e o dia de sexta estar livre, uma vez que a Cerimônia da Paixão era feita pela manhã. Com a transferência da Vigília, então, se recuperou plenamente não só os horários naturais, como o sentido do Sábado Santo, com seu Ofício sendo recitado no dia próprio. A tarde de sexta, sem obrigação do Ofício de Sábado Santo antecipado, pôde ser consagrada às devoções populares tão caras às almas do fiéis, como a Via Sacra, a Procissão do Senhor dos Passos etc. A liturgia observante do veritas horarium, longe de instaurar o pernicioso liturgicismo, deu mais força à espiritualidade privada também.

Um ponto que aparentemente é negativo, mas que foi necessário e, portanto, se revela na verdade positivo, é a criação das Vésperas do Sábado Santo, com a consequente supressão das I Vésperas da Páscoa. Poderia soar negativamente que a solenidade mais importante da Cristandade seja a única a não ter I Vésperas. Todavia, pensemos: se o dia litúrgico começa com as I Vésperas, então, ao manter esse ofício, a Páscoa começaria antes da Solene Vigília Pascal. Isso porque, lembremos, a Vigília foi deslocada para seu horário natural, em atenção ao princípio do veritas horarium. Nos missais anteriores à reforma de Pio XII, a Solene Vigília Pascal é celebrada na manhã do Sábado Santo - daí ser conhecido como Sábado de Aleluia, até em um contrassenso com a Páscoa da Ressurreição que só ocorre no Domingo. Ora, se é celebrada pela manhã, então o Sábado Santo já é pascal e nada mais justo do que as Vésperas celebradas no sábado à tarde sejam as I Vésperas do Domingo da Páscoa. Ocorre que com a restauração piana da Vigília Pascal para a noite do Sábado Santo, manter as Vésperas do sábado como I Vésperas da Páscoa implicaria em começar a celebração pascal antes da própria Páscoa (que inicia na Vigília), diminuindo até mesmo o sentido da Vigília Pascal.

Assim, andou bem e de modo coerente o reformador de 1955, pois tal era consequência obrigatória da fixação da Solene Vigília Pascal à noite.

Domingo de Páscoa

A mudança do horário da Solene Vigília Pascal entrou antes do OHS 1955. Começou em 1951 com sua vigência em caráter experimental, culminando com a reforma de toda a Semana Santa em 1955. De toda a forma, a Vigília Pascal passa a ser o primeiro ato do Domingo de Páscoa e não mais um rito do Sábado Santo. A menção a "santa noite", "noite abençoada", "esplendor da  noite", expressão constantes no rito da Vigília Pascal, soava absurdamente descompassada em uma celebração diurna. Voltar à tradição medieval de se celebrar à noite era imperativo. Ademais, muitos trabalhavam no sábado pela manhã, visto que nem todos os países o adotam como feriado: a participação dos fiéis nessa Vigília tão importante seria facilitada com a transferência. Razões de ordem histórica, litúrgico-teológicas e mesmo pastorais moveram Pio XII a transferir a Vigília Pascal para seu horário original e mais adequado: a noite.

Bênção do fogo novo no rito tradicional

Até a reforma do Sábado Santo, em 1951, o canto Exsultet era usado para a bênção do Círio Pascal. Isso a partir da Idade Moderna. Nos missais, ele era realmente intitulado Benedictio Cerei. Entretanto, a oração específica para essa bênção, analisando-se o seu conteúdo e compulsando os sacramentários mais antigos, deveria ser o Veniat, o qual, por sua vez, ainda nos ritos pré-reforma de Pio XII, era usado, todavia, como bênção dos grãos de incenso a serem colocados no Círio, a Benedictio Granorum. Facilmente se constata que o tempo trouxe uma confusão das cerimônias: o texto da Proclamação da Páscoa, o Exsultet, se tornou, equivocadamente, de uso para a bênção do Círio Pascal, e a bênção do Círio - o Veniat - se tornou a bênção dos grãos de incenso. Além da nítida inobservância do significado dos textos e da irrealidade das cerimônias, notemos que os grãos de incenso são sempre os mesmos, todos os anos, o que nos leva a indagar da necessidade de anualmente os abençoar (ainda mais com um texto que, de fato, abençoa o Círio). Andou bem Pio XII, portanto.

Urge, sem embargo, recuperar a opção do uso do trikirion, como nos ritos pré-1955, abolido por Pio XII. Uma notável influência bizantina que se acomodou tranquilamente à liturgia romana. A abolição do trikirion foi feita para que não este e sim o Círio fosse levado em procissão. No uso do MR 1952, era o trikirion que se carregava em procissão e com ele o Círio, que permanecia junto ao presbitério, era aceso. Pio XII quis dar destaque ao Círio. Contudo, isso tornou obsoleta uma tradição secular e aposentou os triplos candelabros, que tinham até relação com o triplo canto do Lumen Christi... Uma boa saída na reforma da reforma seria um uso ad libitum pelo celebrante de quais velas levar na procissão, o Círio ou o trikirion.

Trikirion romano segundo o uso anterior à reforma de Pio XII, usado em procissão para acender o Círio

Quanto às leituras, antes de 1951, havia doze profecias na Vigília, e a Epístola e o Evangelho na Missa, totalizando quatorze lições. Em 1951 ad experimentum, mantido em 1955 por Pio XII e em 1952 pelo Beato João XXIII, mudou-se para quatro profecias, mantendo-se também a Epístola e o Evangelho, com seis leituras no total. Um visível retrocesso. A boa intenção da simplificação dos ritos não pode anular o sentido profundo que cada uma das profecias indicava. A Vigília pretende contar a história da salvação, apontando-a para Cristo Ressuscitado. A diminuição das leituras no OHS 1955/MR 1962, foi uma mutilação. Já em 1969, Paulo VI, vendo que isso era negativo, trouxe algumas profecias de volta, e de seis leituras da forma extraordinária ficamos com nove na forma ordinária (sete profecias, a Epístola e o Evangelho). O rito de 1969 é, pois, mais completo e tradicional, nesse ponto, do que o rito de Pio XII e João XXIII. Porém, não suficiente. Em uma reforma da reforma, com tendência à unificação do rito romano, faz-se necessário retomar o esquema antigo, das doze profecias: ou seja, aumenta-se o que já temos hoje no rito moderno, e não se retrocede ao rito tridentino de 1962, mas ao pré-1955.

Depois das profecias, ainda na Vigília, e antes da Missa em sentido estrito, havia, pré-1951, uma bênção da água batismal, eventuais batismos e o canto da ladainha de todos os santos. O Batismo e a bênção da água são tradicionais na Páscoa, data em que, desde os tempos mais antigos, se celebrava esse sacramento para os catecúmenos admitidos na Quaresma (ritos, aliás, perdidos com o tempo e sabiamente revigorados pela reforma de Paulo VI, MR 1969, com seu Rito da Iniciação Cristã de Adultos). Mudou-se o esquema dessas cerimônias com Pio XII e novamente com Paulo VI. Para melhor entendimento de nossa proposta, vejamos como era a ordem em cada um dos ritos:

ANTES DA REFORMA DE PIO XII EM 1951
- Bênção da água batismal
- Batismo
- Ladainha, durante a qual o padre, o diácono e o subdiácono vão à sacristia mudar os paramentos de roxos para brancos

REFORMA DO SÁBADO SANTO EM 1951 (OHS 1955/MR 1962)
- 1ª parte da Ladainha
- Bênção da água batismal
- Batismo
- Renovação das promessas do Batismo
- 2ª parte da Ladainha, durante a qual o padre, o diácono e o subdiácono vão à sacristia mudar os paramentos de roxos para brancos

REFORMA LITÚRGICA DE PAULO VI (MR 1969)
- Ladainha
- Bênção da água batismal
- Batismo
- Renovação das promessas do Batismo

Não há motivo algum para que, no na reforma da Vigília em 1951, portanto na OHS 1955/MR 1962, a ladainha seja abruptamente cortada em duas partes. Muito menos para, no MR 1969, ela ser deslocada para antes da bênção da água batismal e do Batismo. O lugar tradicional era depois dessa bênção e desse Batismo, como súplica pelos recém-batizados e por toda a Igreja. Antonelli informa que, em tempos imemoriais, os Batismos na Vigília eram acompanhados pela ladainha que iniciava antes do sacramento, era interrompida, e continuava após o Batismo. Todavia, pensamos que a unificação da ladainha é algo mais natural e essa unificação processou-se pelo princípio do desenvolvimento harmônico da liturgia. Uma eventual e futura reforma da reforma deve restaurar o uso antigo, pré-1951, nesse aspecto: ladainha como última cerimônia, e durante a qual se mudam os paramentos.

A introdução da Renovação das Promessas do Batismo, embora novidade, parece ser um desenvolvimento harmônico, de vez que não conflita com o espírito da celebração e não se trata de algo artificial. A Páscoa é a festa do Batismo. Nela se benzem a água lustral, se fazem batismos, se lembra a Ressurreição de Cristo - e o Batismo de cada um é uma participação nessa Páscoa do Senhor. Nada mais justo do que renovar nossos votos batismais exatamente na Páscoa. Foi bem o OHS 1955/MR 1962 que criou a cerimônia, e o MR 1969 que a manteve.

Para que, visualmente, tenhamos bem clara a nossa proposta, compare o leitor os esquemas acima com o que pensamos:

REFORMA DA REFORMA
- Bênção da água batismal
- Batismo
- Renovação das promessas do Batismo
- Ladainha, durante a qual o padre, o diácono e o subdiácono vão à sacristia mudar os paramentos de roxos para brancos

Na prática, é o rito anterior a 1951 com a introdução da Renovação das Promessas do Batismo, entre o próprio Batismo e a ladainha.

A Bênção da Pia Batismal, antes de 1951/1955/1952, era feita no batistério, onde fica a própria pia. O OHS 1955/MR 1962 moveu o local para a presbitério. Já o MR 1969 restaurou a bênção no batistério, ao menos como opção. Não faz sentido benzer a pia sem pia - trocando-a por um balde, jarra ou outro recipiente. Faz-se necessário retornar aos ritos pré-1951.

Até 1951, como vimos, a Solene Vigília Pascal era celebrada na manhã do Sábado Santo. Assim, após a Vigília em sentido estrito, havia a Missa, e, por fim, antes do Ite Missa Est, as I Vésperas da Páscoa, reduzidas (salmo com sua antífona, e Magnificat com sua antífona). Isso porque Vésperas são rezadas à tarde, sendo pois a primeira hora maior após a Missa da Solene Vigília Pascal. Com a mudança desta para seu veritas horarium, tornou-se inconcebível que após a Missa se rezassem Vésperas. A hora maior correspondente ao fim da Missa no novo horário seria Laudes. Assim, à ordem anterior - Vigília, Missa, Vésperas -, substituiu-se um novo esquema: Vigília, Missa, Laudes. E Laudes reduzidas, como Vésperas anteriormente: salmo com sua antífona, e Benedictus com sua antífona: o salmo, aliás, foi mantido, e as antífonas também, só sendo mudado o Cântico Evangélico, que é específico de cada hora. O texto, então, é o mesmo, apenas com mudança do Cântico. As Matinas se tornaram dispensadas por quem celebra ou assiste a Solene Vigília Pascal, pois ocupa seu mesmo horário.

A crítica à falta de I Vésperas justamente na Páscoa, a festa das festas, já foi por nós enfrentada acima. Resta a crítica à falta do Te Deum, ocasionada pela não celebração das Matinas por quem assiste ou celebra a Vigília Pascal. O Te Deum ou Hino Ambrosiano é cantado ou recitado em todos os Domingos, exceto da Quaresma e em todas as festas e solenidades (antigamente, festas de segundo e primeiro grau). Ora, se a Páscoa é a solenidade das solenidades e além disso é dominical, acabar com o Te Deum nela é terrível! Até porque o Te Deum permanece para aqueles que, não tendo celebrado ou assistido a Solene Vigília Pascal, rezam as Matinas no breviário. Todavia, o alegado impasse é fácil de resolver: introduza-se o Te Deum ao fim da Missa, seja antes ou depois das Laudes.

Assim, nossa proposta para um rito romano unificado no tocante à Solene Vigília Pascal seria: horário como no atualmente em qualquer das duas formas, ordinária ou extraordinária (visto que o OHS 1955/MR 1962 e o MR 1969 coincidem nisso); paramentos e suas cores como no rito tradicional (ou seja, os mesmos tanto no MR 1952, quando na reforma ad experimentum de 1951 e mantida na OHS 1955/MR 1962); doze profecias como no MR 1952 (melhor do que as seis do MR 1969 e bem melhor do que as quatro do OHS 1955/MR 1962); esquema batismal do rito do MR 1952, com a introdução da Renovação das Promessas do Batismo do OHS 1955/MR 1962 e MR 1969 (resultando em Bênção da Água Batismal, Batismo, Renovação das Promessas do Batismo, Ladainha, durante a qual o padre, o diácono e o subdiácono vão à sacristia mudar os paramentos de roxos para brancos); introdução do Te Deum no fim da Missa; Laudes.

São meras sugestões, mas servem para iniciarmos um diálogo acerca dessa semana tão importante no calendário cristão e remodelá-la com a preservação das reformas de Pio XII e Paulo VI resgatando o uso anterior de séculos.

quinta-feira, 4 de junho de 2015

O Pentecostes. Festa restaurada ou cortada? - Pe. Jean-Pierre Herman

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Publicamos um artigo sobre a Vigília de Pentecostes que nos foi encaminhado pelo Pe. Jean-Pierre Herman. Infelizmente não consegui publicá-lo ainda durante a Oitava de Pentecostes, contudo, tenho certeza que será do agrado de nossos leitores.

O Pentecostes: Festa restaurada ou cortada? 

Por Pe. Jean-Pierre Herman
Originalmente publicado em Schola Sainte Cécile 
Tradução: Pe. Jean-Pierre Herman / Daniel Pereira Volpato


O Missal promulgado por Paulo VI em 03 de abril de 1969 praticamente eliminou as antigas vigílias e oitavas para as principais festas.

As oitavas são agora limitadas à Páscoa e ao Natal. Quanto às vigílias, permanece, para algumas festas, uma "Missa à noite anterior", que muitas vezes passa despercebida nas paróquias. É uma antecipação da festa e não mais um dia de jejum e preparação para a ela.

A Missa da Vigília de Pentecostes é um caso especial. Ela oferece a opção de quatro textos para a primeira leitura. São textos do Antigo Testamento que preparam para o dom do Espírito Santo. Isso é tudo o que resta da antiga e rica liturgia da vigília de Pentecostes. 

A "desmontagem" da liturgia de Pentecostes foi feita em duas etapas. A vigília caiu durante a reforma dos anos 50, e a oitava foi abolida durante a promulgação do novo missal.

A antiga Vigília de Pentecostes e seu carácter batismal

Monsenhor Gromier, em uma palestra famosa em ambientes tradicionais sobre a liturgia dita "restaurada" da Semana [Santa] por  Pio XII em 1955 [1], afirma:
A vigília de Pentecostes não possui mais nada de batismal, se transformou em um dia como qualquer outro, e fazendo mentir o missal no cânon. Esta vigília era um vizinho chato, um rival formidável! A posteridade educada será provavelmente mais severa do que a visão atual com relação à pastoral. [2]
Ele está se referindo aqui à recuperação próxima da vigília batismal de Páscoa pelos cristãos, praticada desde os tempos antigos na véspera de Pentecostes.

Os cristãos primitivos celebravam primeiramente todo o Mistério Pascal: morte, ressurreição, ascensão e o dom do Espírito Santo durante a grande noite da Páscoa. No entanto, muito rapidamente, o ensinamento da Igreja destacou os diferentes aspectos dela, quebrando as celebrações de acordo com a cronologia dos evangelhos.

Por outro lado, sabemos que os sacramentos da iniciação cristã: batismo, confirmação e Eucaristia, eram anteriormente atribuídos aos candidatos durante a mesma celebração, uma prática mantida pelas igrejas orientais. Cito o cardeal Schuster sobre a ligação intrínseca e ao mesmo tempo distinta entre Batismo e Confirmação:
Embora o sacramento do Batismo seja distinto do da Confirmação, ele recebe esse nome porque a descida do Espírito Santo na alma do fiel completa a obra de sua regeneração sobrenatural. Através do caráter sacramental, é conferido ao neófito uma mais perfeita semelhança com Jesus Cristo, que imprime o último selo ou confirmação à sua união com o divino Redentor. A palavra confirmação era também utilizada na Espanha para indicar a oração invocatória do Espirito Santo durante a missa: Confirmatio sacramenti; também a analogia existente entre a epíclese (que na missa, pede ao Paráclito a plenitude de seus dons sobre aqueles que se aproximam da Santa Comunhão) e a Confirmação, que os antigos administravam imediatamente após o batismo, esclarece o profundo significado teológico que está escondido sob o vocábulo “Confirmação” atribuído ao segundo sacramento. [3]
Tertuliano já fala da celebração dos batismos, não só na grande vigília de Páscoa, mas também para o Pentecostes:
Outro dia solene do batismo é Pentecostes, quando acontece um longo intervalo de tempo para dispor e educar aqueles que devem ser batizados.
A escolha não é inocente, porque no batismo, o bispo coloca sua mão direita sobre a cabeça do neófito, chamando o Espírito Santo por meio de uma bênção. [4]

Temos também uma carta do Papa Siricius (384-399) [5] ao bispo de Tarragona Himera atestando essa prática. Além disso, em uma carta aos bispos da Sicília, o Papa São Leão Magno (440-461) exorta-os a imitar São Pedro, que batizou três mil pessoas no dia do primeiro Pentecostes. [6]

Os livros litúrgicos posteriores nos dão um diagrama de uma celebração do mesmo tipo da Vigília Pascal, que encontramos em todos os missais que precederam a reforma de Trento e no Missal de São Pio V até a reforma da década de 1950.

Vamos deixar a Dom Guéranger o cuidado de descrever essa prática:
Nos tempos antigos, esse dia se assemelhava a véspera da Páscoa. Na noite os fiéis iam para a igreja para participar nas solenidades da administração do batismo. Na noite que se seguia, o sacramento da regeneração era conferido aos catecúmenos cuja ausência ou alguma doença os tinham impedido de se juntar aos outros na noite de Páscoa. Aqueles que ainda não tinham sido considerados suficientemente aprovados, ou cuja educação não parecia completa, tendo satisfeito as justas exigências da Igreja, também ajudavam a formar o grupo de aspirantes ao novo nascimento que se recebe a partir da fonte sagrada. Em vez das doze profecias que se liam à noite de Páscoa, enquanto os sacerdotes executavam os ritos preparatórios aos catecúmenos para o batismo, eles costumavam ler seis; Isto leva à conclusão de que o número de batizados na noite de Pentecostes era menos considerável. [7] 
O círio pascal reaparecia durante esta noite de graça, para educar o novo recruta o que fazia a Igreja, respeito e amor pelo Filho de Deus que se fez homem para ser "a luz do mundo”. Todos os rituais que temos descrito e explicado no Sábado Santo se realizavam nesta nova oportunidade, onde aparecia a fecundidade da Igreja, e o Divino Sacrifício do qual tomaram parte os felizes neófitos começava ainda antes do amanhecer. [8]

Nos tempos antigos, como relata Schuster, a celebração, junto com a Vigília Pascal, se fazia no Latrão durante a noite de sábado para domingo. No século XII foi antecipada para o início da tarde. Pelo fim do dia, o Papa então ia para São Pedro, para o canto das Vésperas e Matinas solenes. A extensão da celebração do batismo a outros dias e a prática do batismo infantil quam primum removeram a exclusividade destas celebrações na véspera de Pentecostes, reduzindo esse dia ao grau de preparação para a festa, mesmo grau das demais vigílias, mas mantendo na celebração um caráter claramente batismal.

Como apresentou Pio Parsch:
“Hoje é uma vigília solene e, portanto, de penitência completa, com jejum e abstinência (em algumas dioceses, no entanto, esta obrigação não se impõe mais com a pena do pecado; isso não é mais do que um simples conselho). A vigília é sempre um dia de preparação. A casa da alma deve ser limpa e preparada para a grande festa. Dois pensamentos ocupam o cristão que vive com a Igreja: a) ele se lembra de seu batismo; b) ele se prepara para Pentecostes.” [9]

Tempo e Estrutura da Vigília

Depois das nonas, lemos as profecias sem título, com as velas apagadas, assim como no Sábado Santo.

Esta é a rubrica que antecede a celebração da Vigília de Pentecostes nos missais. O seu tempo é o mesmo que o da vigília pascal. Anteriormente celebrada na noite de sábado para domingo, em seguida, no início da tarde, ele caiu dentro do âmbito do decreto de São Pio V, que impôs a antecipação dos ofícios ao amanhecer. A Vigília de Pentecostes, portanto, é celebrada na manhã de sábado.

Sua estrutura é semelhante ao do Sábado Santo, com a exceção da bênção do fogo e do Círio Pascal. Pius Parsch chama-lhe uma imitação abreviada do Sábado Santo. Ela começa pelas leituras das profecias, cada qual seguida de uma resposta e uma oração pelo celebrante, que é precedido por um convite do diácono: Oremus. Flectamus genua.

Depois, partimos em procissão até o batistério com a bênção da água, cantando versos do Salmo 41 (Sicut Cervus ad fontes aquarum). Depois de uma oração, o celebrante diz a oração de bênção da água, como na Vigília Pascal. Em seguida, retornamos para o altar em procissão cantando a Ladainha dos Santos, enquanto os celebrantes vão para a sacristia, a fim de revestir os paramentos para a Missa. [10]

A cor da vigília é o roxo. É especificado que o sacerdote utilize a capa de asperges para a procissão para o fonte batismal. O diácono e subdiácono levam a casula plicada (dobrada). A missa é em vermelho, a cor de Pentecostes.

No final das ladainhas, acendem-se as velas, os ministros vão para o altar enquanto o coro canta o Kyrie, eles recitam as orações ao pé do altar e o sacerdote incensa e entoa o Glória, durante o qual se tocam os sinos. [11]


Plano Da Vigília de Pentecostes

Proclamação das seis profecias:
Leitura + resposta + Flectamus genua + Oração
Procissão a pia batismal
Salmo 41
Bênção da Água
Procissão até o altar
Ladainha dos Santos
Missa


As Profecias

No rito primitivo havia doze leituras, como na Páscoa. Este número foi reduzido para seis por São Gregório Magno, e foi assim mantida até o século VIII, quando, sob a influência do Sacramentário Gelasiano, devolvemos à Vigília Pascal suas leituras originais.

As leituras de Pentecostes são tiradas da Páscoa, mas em uma ordem diferente.

Leitura
Pentecostes
Páscoa
1
Gn. 22 Sacrifício de Abraão
3
2
Ex 14 e 15 A passagem do Mar Vermelho
4
3
Dt 31 O Testamento de Moisés, o cumprimento da Lei
11
4
Is 4 A libertação de Jerusalém
8
5
Bar 3 O retorno à Terra Prometida
6
6
Ez 37 ossos secos
 7

A cada leitura se segue um responso.  Três desses são os mesmos que na Vigília pascal. As orações que se seguem, no entanto, são diferentes, retiradas do Sacramentário Gregoriano [12].

Elas reforçam, a sua própria maneira, a continuidade entre os dois Testamentos, e entre a passagem do Israel do Antigo Testamento, liberto da escravidão, ao novo Israel, de pessoas batizadas, libertas do pecado. Citamos aqui apenas aqueles que seguem a segunda e a quarta leitura, que são admiráveis:
“Deus, Vós revelastes pela luz da Nova Aliança o significado dos milagres realizados nos primeiros tempos: o Mar Vermelho tornou-se a figura da fonte sagrada do batismo, e as pessoas libertados da escravidão no Egito expressam os mistérios do povo cristão: fazei com que todas as nações que receberam pelo mérito da fé o privilégio de Israel sejam regeneradas através da participação em seu Espírito”. 
“Deus eterno e Todo-Poderoso, Vós tendes mostrado através de seu Filho unigênito que Vós sois o jardineiro de sua Igreja, misericordiosamente cuidador de todos os ramos frutificados em seu Cristo, que é a videira verdadeira, para que produzam mais frutos: fazei que os espinhos do pecado não sobrepujem vossos fiéis, que libertastes do Egito como uma vinha pela fonte do batismo; e que, fortalecidos pela santificação do Vosso Espírito, sejam enriquecidos por uma colheita sem fim”.
A descida para a pia batismal e a bênção da água, após a oração da sexta profecia, reutiliza todos os textos da Vigília Pascal, com exceção da coleta que precede a bênção da água, a qual fala da festa do dia:
“Concedei, nós vos rogamos, Deus Todo-Poderoso: nós, que celebramos a solenidade dos dons do Espírito Santo, que inflamados dos desejos celestes, tenhamos sede da fonte da vida.”
Vemos claramente, através destes textos, a íntima conexão entre o batismo, o dom do Espírito Santo e vida cristã.

Missa

Como vimos, a missa segue imediatamente a Ladainha. Como à Páscoa, não há Introito.  Só mais tarde, quando se espalhou o uso de missas privadas, que se acrescentou o Intróito "Cum sanctificatus”, emprestado da quarta-feira da quarta semana da Quaresma.

É o ápice da Vigília e reitera de uma maneira muito concisa a conexão entre o batismo e o dom do Espírito Santo em sua coleta:
Fazei, nós vos rogamos Deus Todo-Poderoso, que o esplendor de Vossa luz brilhe sobre nós; e o brilho de Vossa luz confirme, pela iluminação do Espírito Santo, os corações daqueles que Vossa graça tem revivido. Por Nosso Senhor...
Esta ligação é enfatizada ainda mais na carta dos Atos dos Apóstolos [13]. Trata-se do encontro de Paulo com os discípulos de João Batista.  Eles sequer tinham ouvido falar que há um Espírito Santo, depois do que Paulo batiza-os em nome de Jesus Cristo.

O resto da Missa é inteiramente centrada em Pentecostes, com o Evangelho [14] em que Jesus prometeu a seus discípulos que não os deixaria órfãos, mas que deviam orar ao Pai para que Ele enviasse o Consolador.

A Secreta e a Pós-comunhão pedem a purificação dos corações por meio do derramamento do Espírito Santo.

A oração do Canon contém duas partes próprias.  No Communicantes menciona-se a festa do dia:
“Unidos em uma comunhão e celebrando o santo dia de Pentecostes, quando o Espírito Santo apareceu aos Apóstolos sob a forma de múltiplas línguas de fogo, e venerando primeiro a memória da gloriosa Virgem Maria, Mãe de Jesus Cristo nosso Deus e Senhor (...)”
Enquanto o Hanc igitur, como na Páscoa, reza pelos batizados da noite:
“Então, Senhor, este sacrifício que nós oferecemos, e com todos os seus filhos, hoje especialmente para aqueles que vós vos dignastes a regenerar pela água e pelo Espírito Santo, concedendo-lhes a remissão de todos os seus pecados...”

A reforma de 1955

Nos missais após 1955, a Vigília de Pentecostes é agora reduzida a missa, como descrito acima, com o seu Intróito "Cum sanctificatus”. As profecias, a procissão e a bênção da água foram simplesmente abolidos.

O caráter batismal da vigília foi apagado e a liturgia é inteiramente direcionada para a vinda do Espírito Santo.

Mantivemos a letra, que faz a conexão entre os dois sacramentos. Mas pode-se perguntar por que mantivemos o Hanc igitur que intercede pelos batizados da noite. E isto para a Vigília, dia e Oitava de Pentecostes, como era feito na Páscoa.

Esta oração já era simbólica antes da reforma, já que quase nunca havia batismos durante a celebração. No entanto, ela alargava o caráter batismal da vigília e [por isso] manteve seu lugar. Sua conservação aqui [após 1955], isola-a do resto da celebração e a reduz, mais do que antes, a um simples vestígio.

O missal de 1969

O Missal de 1969 inclui, como já dissemos acima, uma "Missa da noite." É uma missa de antecipação de Pentecostes que, apesar de uma ou outra oração mantida, está longe de ser a antiga vigília.

A antífona de abertura não é mais o velho Intróito "Cum sanctificatus", mas uma citação de Romanos 5.5: O amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Seu Espírito que habita em nós, aleluia.

O aspecto batismal não é mais explicitamente mencionado e a ênfase é sobre a vinda do Espírito Santo e o encerramento do Tempo Pascal.

A antiga coleta foi mantida, mas é uma alternativa a outra, que está listada em primeiro lugar. Isto é, aparentemente, uma nova composição:
“Deus Todo-Poderoso e eterno, Vós quisestes que a celebração do mistério pascal crescesse durante estes 50 dias de alegria; fazei que as nações e os povos espalhados se reúnam apesar da divisão linguística para confessar juntos o teu nome. Jesus ...”
Esta é uma alusão a Babel, à divisão de linguagem, e à leitura Do dia seguinte, dos Atos, onde todos entendem na sua própria língua a pregação dos Apóstolos.

A peculiaridade desta Missa, única no missal, é uma escolha entre quatro textos como primeira leitura:
  • Gênesis 11, 1-9: A torre de Babel 
  • Êxodo 19, 3-20: Deus se manifestou no fogo, no meio de seu povo 
  • Ezequiel 37, 1-14: Os ossos secos 
  • Joel 3, 1-5: O Espírito vem habitar em todos os homens

À parte do texto de Ezequiel, todos os outros são diferentes das profecias da antiga vigília.
A continuação da Liturgia da Palavra é fixa: 
  • Salmo 104, 1: Senhor envie o seu Espírito e renovai a face da terra! 
  • Romanos 8, 22-27: O Espírito nos ajuda em nossa fraqueza 
Quanto ao evangelho, manteve-se Jo 7, 37-39: Jesus promete o Espírito aos crentes

O communicantes próprio da Oração Eucarística I é o do antigo missal:
“Na comunhão de toda a Igreja, celebramos o santo dia de Pentecostes, quando o Espírito Santo se manifestou aos Apóstolos em inúmeras línguas de fogo; e nós queremos mencionar primeiro a bem-aventurada sempre Virgem Maria, Mãe de Deus e nosso Senhor Jesus Cristo ...”
A mesma fórmula, adaptada, também é transferida para as outras orações eucarísticas e, portanto, à Oração III:
“É por isso que estamos aqui reunidos na vossa presença e na comunhão de toda a Igreja, celebramos o santo dia  Pentecostes, quando o Espírito Santo se manifestou aos Apóstolos em inúmeras línguas de fogo. Deus Todo-Poderoso, nós vos imploramos consagrar as ofertas que trazemos ...”
Há logicamente mais menções de batizados no Hanc igitur ou seu correspondente nas novas orações.

A Oração sobre as Oferendas e a Oração Após a Comunhão referem-se frequentemente ao Espírito:
“Nós oramos, Senhor, derramai a bênção de Vosso Espírito em nossas ofertas; que Vossa igreja receba essa caridade que fará brilhar no mundo a verdade de sua salvação.”
E
“Senhor, que esta comunhão nos seja aproveitável, fazendo-nos viver do fervor do Espírito Santo com o qual Vós preenchestes vossos apóstolos maravilhosamente.”

Quanto à Antífona da Comunhão, ela é tirada do Evangelho:
“O último dia da festa, Jesus levantou-se e gritou: ‘Se alguém tiver sede, venha a mim e beba’ Aleluia.”
É de se perguntar por que a seqüência da frase, " Quem crê em mim", não foi adicionada.

Continuidade ou ruptura?

"A obrigação de rever e enriquecer as fórmulas Missal Romano foi sentida. O primeiro passo dessa reforma foi o trabalho de nosso predecessor Pio XII, com a reforma da Vigília Pascal e do rito da Semana Santa. Esta é a reforma que deu o primeiro passo para a adaptação do Missal Romano à mentalidade contemporânea”. Assim se expressa Paulo VI na Constituição Apostólica Missale Romanum [15].
Nós sempre voltamos para a mesma pergunta: as alterações desde os anos 50, e então durante a reforma litúrgica, são elas continuidade lógica e histórica do antigo rito romano-franco ou elas marcam uma ruptura?

Aqui vemos uma prática antiga completamente abolida. Esta eliminação, assim diz Mons. Gromier, remove todo o caráter batismal deste dia e centra-o na vinda do Espírito Santo.  Provavelmente era o objetivo dos membros da Comissão insistir sobre o batismo na Páscoa e sobre a confirmação em Pentecostes, através do dom do Espírito Santo.

No entanto, a Missa foi conservada, ainda que contenha elementos que lembram a vigília. Isto é, no mínimo, uma inconsistência. A "restauração" dos anos 50, aqui, nada restaurou. Não há necessidade de grande erudição para se perceber que esta reforma foi realizada às pressas e descobrir nela muitas inconsistências.

Quanto à forma de 1969, ela é, como já mencionado, uma nova criação. Atualmente a maioria das dioceses organizam uma "Vigília de Pentecostes”, às vezes com a Missa da Vigília, frequentemente com o sacramento da Confirmação, mas com largo espaço para "criação" e "criatividade" devido à falta de orientações suficientes da parte do Missal.

Longe do “desenvolvimento orgânico” [16] querido pelo Padre Reid, devemos, mais uma vez, ver a falta de lógica e continuidade nos trabalhos das comissões. Neste caso, muita coisa foi removida, deixando um vácuo e criando um amplo espaço para a improvisação. Talvez mais do que em qualquer outro dia do ano litúrgico, as práticas da Vigília de Pentecostes nos diferentes lugares – dioceses e paróquias -, mostram uma diversidade que é uma lembrança de uma das leituras oferecida a escolha dos celebrantes: a de Babel.

Bibliografia

  • SCHUSTER, I., Liber Sacramentorum. Notes historiques et liturgiques sur le Missel romain. Tome IV : Le baptême dans l’Esprit et dans le feu (la Sainte liturgie durant le cycle pascal). Bruxelles, 1939.
  • GUERANGER P., L’année liturgique, Tome ii: Le Temps pascal, Mame & Fils, Paris, 1920,
  • PARSCH, P., The Church’s Year of Grace, Liturgical Press, Collegeville, 1953.
  • REID A., The Organic Development of the Liturgy, St Michael’s Abbey Press, Farnborough 2004

Notas



[3] Schuster, I., Liber Sacramentorum. Notes historiques et liturgiques sur le Missel romain. Tome IV : Le baptême dans l’Esprit et dans le feu (la Sainte liturgie durant le cycle pascal). Bruxelles, 1939.

[4] Tertuliano, De Baptismo 8, 1.

[5] Epist. ad Himerium cap. 2 : Patrologia Latina vol. XIII, col. 1131B-1148A

[6] Epist. XVI ad universos episcopos per Siciliam constitutos : P.L. LIV col. 695B-704A

[7] Durante a leitura das profecias do Sábado Santo, os sacerdotes terminavam os ritos de preparação dos catecúmenos ao Batismo, o que tomava um certo tempo.  Daí o comentário de Dom Guéranger sobre a relativa brevidade das profecias.

[8] GUERANGER P., L’année liturgique, Tome ii: Le Temps pascal, Mame & Fils, Paris, 1920, p. 260

[9] PARSCH, P., The Church’s Year of Grace, Liturgical Press, Collegeville, 1953.

[10] A rubrica especifica: nos lugares onde não há pia batismal, depois da sexta profecia com sua oração, o celebrante tira a casula e se prosterna com os ministros diante do altar.  E, estando ajoelhados todos os outros, cantam-se as ladainhas.  São cantadas por dois cantores no meio do santuário, as dois coros respondem juntos.  Ao verso Peccatores, te rogamus o padre e os ministros levantam-se e vão à sacristia, e vestem paramentos vermelhos.

[11] Citamos novamente a rubrica: Ao fim das ladainhas, canta-se o Kyrie Eleison para a missa, repetindo-o conforme o costume.  Durante esse tempo o celebrante e os ministros vão para o altar e fazem a confissão. Ao fim do Kyrie Eleison se entoa o Gloria in excelsis Deo e tocam-se os sinos.

[12] Esse documento, catalogado Codex Regina 337, foi recentemente publicado pela Biblioteca Vaticana. É um manuscrito do século VIII que descreve a liturgia papal em Latrão, depois da organização da liturgia pelo Papa São Gregório Magno e seus sucessores, até o tempo do papa Adriano I (+795), que enviou o manuscrito ao imperador Carlo Magno a fim de estabelecer a liturgia romana em todo o seu império. O Codex Regina 337 foi analisado por H.A. Wilson no livro The Gregorian sacramentary under Charles the Great, publicado pela Henry Bradshaw Society em Londres em 1915.

[13] Atos 19, 1-8.

[14] João, 14, 15-21.

[15] 03 de abril de 1969.

[16] Alcuin Reid OSB, The Organic Development of the Liturgy, St Michael’s Abbey Press, Farnborough 2004.

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