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quarta-feira, 23 de junho de 2010

Música litúrgica - Introdução ao Ordinário

Quando me coloquei a tarefa de explicar o Próprio da Missa, uma das primeiras coisas que fiz foi compará-lo ao seu companheiro, o Ordinário, para poder contrastar os dois e dizer, explicando o que o Próprio não é, o que ele é. Ao começar um esboço sobre o Ordinário, não me parece tão despropositado utilizar o mesmo método; tanto que começo dizendo, neste momento, que o Ordinário é ordinário precisamente porque não é Próprio.

O leitor pode ter certeza de que estou falando sério, mesmo que agora eu invoque uma particularidade um pouco cômica da língua portuguesa: o adjetivo “ordinário” tem neste idioma, entre outros significados, um aspecto negativo do qual às vezes nos valemos para ofender uma pessoa. “Homem ordinário” está entre as qualificações que homens não gostariam de ouvir a seu respeito, normalmente... Este adjetivo, imbuído agora de um ar depreciativo a nossos ouvidos, tem origem menos malvada: homem ordinário é homem que não tem nada de esplêndido, impressionante ou... extraordinário (claro). É o homem comum e simples. A palavra “medíocre”, igualmente nada elogiosa, a rigor também não chega a ser uma ofensa, significando algo ou alguém que não passa da média.

Assim, “ordinário” é algo comum, que aparece sempre. O Ordinário da Missa se encaixa nisto: sendo invariável, aparece sempre, é comum. Em termos litúrgicos mais específicos, o Ordinário é o conjunto das partes que não variam de acordo com a Liturgia, sendo sempre as mesmas. O máximo de variação que pode acontecer em relação ao Ordinário é alguma parte sua ser omitida. A omissão, sim, varia conforme a Liturgia; mas, por exemplo, se o Gloria é parte do Ordinário, todas as vezes em que ele for usado o texto será o mesmo (seja Domingo de Páscoa, Natal ou qualquer Domingo do Tempo Comum). Há Missas em que o Gloria não aparece. Porém, não existem Missas em que o Gloria possa ou deva ser substituído por alguma outra coisa. E, mesmo que houvesse, seria uma exceção, algo de caráter tão “extraordinário”, que apareceria simplesmente como a exceção que confirma a regra; o Gloria é tão consistentemente o mesmo texto ao longo do ano litúrgico, que não pode ser considerado Próprio.

Já tínhamos visto que o Próprio se compõe de cinco partes (às vezes seis, se houver a Seqüência); no primeiro texto a seu respeito havíamos visto que também o Ordinário se compõe de cinco partes. Estas cinco partes estão presentes em um grande número de Missas: Domingos do Tempo Comum, do Tempo Pascal, do Tempo do Natal... Conforme a Liturgia, uma ou duas se omitem (não quaisquer partes, mas partes específicas, a vermos nos próximos textos).

Vejamos abaixo um diagrama que mostra o Ordinário e o Próprio de acordo com sua ordem durante a Missa. Não incluí a Seqüência, mas caso um leitor não tenha visto o texto a respeito dela e tampouco saiba do que se trata, saiba que ela vem logo antes do Alleluia ou Tractus (ou logo depois); que somente cinco existem na Forma Extraordinária (Rito Tridentino), e apenas quatro na Forma Ordinária (Rito Novo).

Em vermelho está o Próprio; em azul está o Ordinário.



Convido o leitor a perceber que escrevi os nomes das partes do Próprio em português, e as do Ordinário em latim (exceto o Kyrie, em grego). Isto porque, já que o Ordinário nunca varia, podemos dar a cada parte, como nome, a primeira ou primeiras palavras de seu texto. Isto acontece com todas elas:

Kyrie, em grego, é Senhor; esta palavra também dá nome ao “Senhor, tende piedade” recitado ou cantado durante o Ato Penitencial. Quando se utiliza a língua própria do Rito Romano, o latim, esta parte permanece em grego.

Gloria é a palavra latina que dá nome ao hino que nomeamos, em português, com palavra similar, vinda do latim para o português sem sofrer alterações.

Credo, “creio”, é a primeira palavra da profissão de fé.

Sanctus, “santo”, é a primeira palavra do jubiloso hino cantado na Liturgia Eucarística: Santo, Santo, Santo, Senhor Deus do Universo (...).

Agnus Dei, “Cordeiro de Deus”.

Por enquanto, oferecemos este pequeno esboço do Ordinário da Missa. É uma introdução necessária, mesmo que tantos leitores nossos tenham conhecimento de cada uma das informações aqui colocadas (e, sem dúvida, bem além delas), para que depois possamos nos deter em cada uma das partes.

4 comentários:

  1. Olá mais uma vez, Alfredo!

    Eu acompanhei com profundo interesse seus artigos sobre o Próprio da Missa e não nego que estou bastante ansioso pelos seus artigos a serem publicados sobre o Ordinário da Missa.

    Tal ansiedade me impulsiona a já tecer alguns comentários que eu estava aguardando para postar à medida que os seus artigos viessem a público. Mas como minhas indagações, na verdade, são comuns a todos os cantos do Ordinário, achei melhor escrever agora.

    Hoje, muitos vivemos numa realidade musical litúrgica fortemente influenciada pelo canto popular contemporâneo, na qual os principais subsídios que temos à mão são o Hinário Litúrgico da CNBB e o livro de cantos "Louvemos o Senhor" --- diga-se de passagem, não tenho nada contra o "Louvemos", desde que se escolha cuidadosamente os cantos, seja para a Missa, seja para um grupo de oração. É muito difícil encontrar composições contemporâneas para os cantos do Ordinário que não exijam uma alteração da estrutura do seu texto. É o velho problema de tentar encaixar a peça quadrada no buraco redondo: sempre que se tenta adequar um texto em prosa, como as orações do Ordinário, a uma melodia moderna com métricas rígidas, adaptações ao texto quase sempre se fazem necessárias. Obviamente, tal dificuldade não existe no canto gregoriano, pois este possui uma métrica livre.

    Tais adaptações aos textos do Ordinário, para que "encaixem" em uma melodia moderna, variam entre uma simples repetição de alguma palavra ou frase (por exemplo, em um canto hipotético para o "Sanctus", canta-se "Hosana! Hosana! Hosana nas alturas!" em vez de simplesmente "Hosana nas alturas!"), a substituição de uma ou mais palavras do texto original por sinônimos e a inserção de palavras ou frases alheias ao texto original.

    Há ainda a questão de alguns cantos que, embora destoem do texto oficial do Missal traduzido para o Brasil, estão mais próximos do texto original do Missal em latim (por exemplo, no "Sanctus", cantar algo como "Céus e terra cheios estão de Vossa glória!" em vez de "O céu e a terra proclamam a Vossa glória!").

    Até que ponto --- ou melhor, a partir de que ponto --- estas adaptações tornam-se prejudiciais à liturgia bem celebrada? Que outras soluções eu poderia buscar para evitar este tipo de "problema"?

    Deus abençoe a todos!

    ResponderExcluir
  2. Olá mais uma vez, Alfredo!

    Eu acompanhei com profundo interesse seus artigos sobre o Próprio da Missa e não nego que estou bastante ansioso pelos seus artigos a serem publicados sobre o Ordinário da Missa.

    Tal ansiedade me impulsiona a já tecer alguns comentários que eu estava aguardando para postar à medida que os seus artigos viessem a público. Mas como minhas indagações, na verdade, são comuns a todos os cantos do Ordinário, achei melhor escrever agora.

    Hoje, muitos vivemos numa realidade musical litúrgica fortemente influenciada pelo canto popular contemporâneo, na qual os principais subsídios que temos à mão são o Hinário Litúrgico da CNBB e o livro de cantos "Louvemos o Senhor" --- diga-se de passagem, não tenho nada contra o "Louvemos", desde que se escolha cuidadosamente os cantos, seja para a Missa, seja para um grupo de oração. É muito difícil encontrar composições contemporâneas para os cantos do Ordinário que não exijam uma alteração da estrutura do seu texto. É o velho problema de tentar encaixar a peça quadrada no buraco redondo: sempre que se tenta adequar um texto em prosa, como as orações do Ordinário, a uma melodia moderna com métricas rígidas, adaptações ao texto quase sempre se fazem necessárias. Obviamente, tal dificuldade não existe no canto gregoriano, pois este possui uma métrica livre.

    Tais adaptações aos textos do Ordinário, para que "encaixem" em uma melodia moderna, variam entre uma simples repetição de alguma palavra ou frase (por exemplo, em um canto hipotético para o "Sanctus", canta-se "Hosana! Hosana! Hosana nas alturas!" em vez de simplesmente "Hosana nas alturas!"), a substituição de uma ou mais palavras do texto original por sinônimos e a inserção de palavras ou frases alheias ao texto original.

    Há ainda a questão de alguns cantos que, embora destoem do texto oficial do Missal traduzido para o Brasil, estão mais próximos do texto original do Missal em latim (por exemplo, no "Sanctus", cantar algo como "Céus e terra cheios estão de Vossa glória!" em vez de "O céu e a terra proclamam a Vossa glória!").

    Até que ponto --- ou melhor, a partir de que ponto --- estas adaptações tornam-se prejudiciais à liturgia bem celebrada? Que outras soluções eu poderia buscar para evitar este tipo de "problema"?

    Deus abençoe a todos!
    Laércio

    P.S.: Estou meio confuso com o novo sistema de comentários do SL. Caso este comentário esteja duplicado, queiram gentilmente desconsiderar este.

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  3. Laércio, fico muito feliz com seu interesse. Peço desculpas por estar tão atrasado nessa série sobre o Ordinário, meu plano sempre foi publicar com mais freqüência, sem intervalos tão longos entre um artigo e outro. Embora a atividade do Salvem a Liturgia seja intensa e sempre haja um grande número de artigos programados, de modo que a próxima data livre sempre está algumas semanas à frente, realmente não é esta a razão do meu atraso, e sim minha própria demora em seguir a série.

    Esses assuntos citados por você eu os comentarei em cada texto. Mas, por ora, digo que não vejo bem o uso de sinônimos, nem a inversão de ordem de palavras. Tradicionalmente estes recursos nunca foram usados e, a meu ver, trazem certa instabilidade à Liturgia, mesmo que se utilize um sinônimo muito fiel ou uma inversão quase imperceptível.

    A métrica irregular é que se coloca como problema, se fato; entretanto, ela é característica muito importante do canto gregoriano, e auxilia bastante na composição de música litúrgica boa. Grande parte da beleza do gregoriano está na métrica livre, e quando compomos com métrica mais regular, sempre procuramos, por algum outro meio, manter a fluência e a liberdade que o canto gregoriano é capaz de manter com sua métrica livre.

    Os músicos precisam aprender e se adaptar à métrica livre (ganharão muito com isso, tenho certeza), e a ideia de assembleia que canta tudo não pode manter o status de quase dogma de que goza atualmente em inúmeros lugares. As assembleias com certa freqüência tem alguma dificuldade até mesmo de aprender música com métrica regular que não seja bem quadrada. Influência, claro, da música pop, da música de dança etc. - cujo gosto não precisa ser deixado de lado; mas a consciência de que a música litúrgica é "outra coisa" precisa voltar a estar presente com mais força.

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  4. Oi Alfredo

    Em primeiro lugar, obrigado por dividir esses conhecimentos, estão sendo de grande valia.

    Na verdade a pergunta é mais sobre o Kyrie, porém não achei o campo de comentários na respectiva página.

    1) No caso da terceira opção (Kyrie + tropos), o Kyrie é cantado antes ou depois da absolvição?

    2) Nesse mesmo caso (sem Confiteor nem o outro diálogo), pode-se cantar o Kyrie sem tropos?

    3) Existe disponível para baixar o missal em portugues ou outro documento que informe os tropos já existentes e as antífonas do Próprio, talvez até mesmo os textos, apenas, do Gradual? Isso para auxiliar na escolha dos cantos para cada data.

    Obrigado!

    Ramon

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