Uma das coisas oferecidas pela Liturgia ao fiel é a
constante companhia do Senhor por meio da constante companhia da Igreja. Gosto
de olhar o Missal (ou a Liturgia Diária, com freqüência na internet...) e
especialmente a Liturgia das Horas e de constatar a inexistência de dias sem
Liturgia; pode haver dia sem Missa, e ainda assim é um só, a Sexta-feira da
Paixão do Senhor; nela, porém, tem lugar a Solene Ação Litúrgica em que se
adora Jesus crucificado, com a riqueza dos Improperia, do Trisagion, do Ecce lignum Crucis, do simples
e impressionante silêncio com que o sacerdote acede ao altar e dele se retira;
não há, entretanto, um único dia sem Liturgia. Pelo contrário, tanto na Missa
quanto no Ofício Divino, há datas nas quais se faz necessário consultar uma
tabela específica para se decidir qual celebração deve ser realizada, porque coincidem duas ou mais. Por
exemplo, a Solenidade da Anunciação do Senhor, normalmente em 25 de Março, no ano de 2013
cedeu seu lugar à Segunda-feira Santa. Sendo uma Solenidade, porém, não pode
simplesmente ser omitida, sendo celebrada no dia livre mais próximo. Passada
toda a Semana Santa, chega a Oitava da Páscoa, também soleníssima, e somente na
Segunda-feira da Segunda Semana da Páscoa, em 8 de Abril, é que a Anunciação do
Senhor se celebra liturgicamente em 2013.
A Igreja oferece a companhia do Senhor na Santa Missa e
também no Ofício Divino, todos os dias, e no caso deste último o faz várias
vezes ao longo do dia. O fiel não está sozinho. À hora de dormir, o católico
abre seu breviário e vê as Completas, isto é: a Igreja não permite que durma
sem poder ouvir a voz de sua Mãe. Não falo em obrigação de rezar o Ofício
Divino (existente para os clérigos, mas não para os leigos), mas no fato de que
Deus espera o homem a todas as horas, de diversos modos, e um deles é litúrgico
e é na hora de se recolher, nas Completas; é na hora em que se levanta, nas
Laudes; e em todas as outras horas canônicas. E sozinho também não está, este
mesmo fiel, porque uma vez que recite um ofício, está em comunhão com a Igreja
e com numerosos fiéis que recitam aquele mesmo ofício. Incluindo um católico do
outro lado do mundo que já recitou o mesmo ofício doze horas antes.
Outro modo pelo qual a companhia do Senhor se faz presente é
na adorável extensão das celebrações mais importantes. A Páscoa se comemora no
Domingo de Páscoa. Porém, ensinam-nos, é apenas o primeiro de sete dias, e em
todos eles se comemora a mesma Páscoa. Na Missa, o Gloria está extraordinariamente
presente em todos esses dias; também em todos eles se pode cantar a seqüência Victimae
Paschali Laudes (obrigatória no Domingo); o verso principal do Gradual,
durante a semana toda, é Hoje é o dia que o Senhor fez para nós (o Haec dies). Mas que dia?
O Domingo? A Segunda? Mas se canto assim em todos eles! Esse dia é maior que os
outros, é um dia sem fim. Um dos modos de mostrar a ausência de fim desse dia é
estendê-lo por sete. E que maneira maravilhosa de estender os sete dias
prolongando-os até cinqüenta, para mostrar quão gloriosa é a Páscoa, e fazendo
desse tempo o Tempo Pascal da Liturgia da Igreja. Há um dia de Páscoa, há sete dias
de Páscoa, há cinqüenta dias de Páscoa, para tentar nos fazer entender um pouco
melhor, dentro das nossas limitações, a imensidão desse acontecimento. Temos
quarenta dias para o recolhimento quaresmal, temos cinqüenta dias para um outro
tipo de “recolhimento” pascal.
Embora, depois de Pentecostes, esteja terminado o Tempo Pascal
da Liturgia, não creio ser muito exato dizer que “volta” o Tempo Comum. Que
bom seria não entrar no Tempo Comum como mero retorno dentro de um ciclo, mas como
uma espiral se abrindo a cada ano, à luz da Quaresma e da Páscoa passadas.