Hoje, no calendário romano extraordinário é a festa do Preciosíssimo Sangue de Cristo. Trago abaixo, um retábulo encomendado pelo rei Dom Manuel I de Portugal (o mesmo dos tempos do Descobrimento do Brasil) no qual o rei, sua família, o Arcebispo de Lisboa e pessoas ligadas à Santa Casa de Misericórdia para qual o retáublo fora encomendado circundam uma fonte de sangue que escorre do lado do Cristo Crucificado. Na fonte a inscrição Fons vitae - "Fonte da vida", lembrando que o sangue do Redentor é a fonte da Vida Eterna.
Oficina de BAREND VAN ORLEY (?). Fons Vitae. Cerca de 1520. Óleo em madeira de carvalho 267x210. Igreja das Misericórdias do Porto, Portugal.
“(…)Um dos maiores tesouros da pintura flamenga que o Porto possui é o conhecido painel Fons Vitae que se encontra na Santa Casa da Misericórdia daquela cidade. Datada de 1518-1521 e atribuída, pelos estudos mais recentes, ao círculo de Barend Van Orley. A obra, cujo historial permanece desconhecido até Agosto de 1824, altura em que é referido no inventário da Santa Casa da Misericórdia do Porto, foi analisada, sob diversas vertentes, por Pedro Dias. A pintura representa Cristo crucificado, já morto, com o lado direito ferido pela lança do soldado, do qual jorra abundantemente o sangue redentor. É este sangue de Cristo, derramado pela remissão dos pecados da humanidade, que dá nome à pintura: Fonte da Vida. De facto, Cristo afirmara: «quem beber do meu sangue terá a vida eterna» (Jo 6, 54). Representando literalmente esta alusão eucarística, mediante uma iconografia invulgar, o pintor faz com que o precioso sangue do «Cordeiro de Deus» imolado seja recolhido numa taça de enormes proporções no bordo exterior da qual é possível ler as inscrições latinas: Fons Misericordie, Fons Vite, Fons Pietatis (sic). A composição assenta numa rigorosa simetria tendo como eixo central a cruz que emerge do centro da taça. Cristo é ladeado pela sua Mãe e pelo apóstolo São João, presentes no Calvário no momento da sua morte. Ambos expressam dor e comoção pelo fim trágico do Filho de Deus. O drama do acontecimento é reforçado pelas tonalidades sombrias das nuvens que, no momento da morte de Cristo, «envolveram de trevas toda a terra» (Mt 27, 45). Na paisagem longínqua, tratada de forma miniatural à maneira flamenga, vislumbra-se a cidade de Jerusalém palco dos acontecimentos daquela memorável Sexta-feira Santa. Em redor da Fonte da Vida, de joelhos, em atitude de contemplação e adoração, dispõem-se, em círculo, mais de trinta personagens que os historiadores têm vindo a identificar. Assim estão presentes, no primeiro plano, o monarca D. Manuel I e sua mulher, ladeados pelas princesas D. Isabel e D. Beatriz, no lado direito da rainha, enquanto do lado esquerdo de D. Manuel, se encontram os seis infantes. Seguem-se, de ambos os lados, uma série de personagens religiosas e laicas que têm originado alguns ensaios de interpretações e identificações. Todavia o facto de estarem presentes figuras da corte portuguesa, bem como as alterações detectadas no processo construtivo por exames recentes, leva a crer ter existido um acabamento em duas fases, a última das quais já em Portugal altura em que foram concluídas as diversas fisionomias.” (Luis Alberto Casimiro. Pintura e Escultura do Renascimento no Norte de Portugal. In: Revista da Faculdade de Letras CIÊNCIAS E TÉCNICAS DO PATRIMÓNIO. Porto 2006-2007 I Série vol. V-VI, pp. 87-114. Citado em: http://doportoenaoso.blogspot.com.br/2010/07/uma-visita-ao-porto-com-d-pedro-ii.html )
Para uma análise mais detalhada das personalidades retratadas na obra, vide: http://doportoenaoso.blogspot.com.br/2010/07/uma-visita-ao-porto-com-d-pedro-ii.html