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segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

A vestição dos paramentos litúrgicos e as respectivas orações

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Artigo de autoria de Dom Mauro Gagliardi



ROMA, domingo, 13 de dezembro de 2009 (ZENIT.org).- O artigo que apresentamos hoje pretende recordar o antigo costume de acompanhar a vestidura dos paramentos litúrgicos com orações próprias, breves, mas muito ricas em termos bíblicos, teológicos e espirituais. Tal prática tradicional deve ser mantida e não abandonada.



1. Breve revisão histórica



As roupas utilizadas pelos ministros sagrados nas celebrações litúrgicas são derivadas das vestimentas gregas e romanas. Nos primeiros séculos, a forma de vestir das pessoas de uma determinada classe social (os honestiores) foi também adotada para o culto cristão, e esta prática foi mantida na Igreja, mesmo após a paz de Constantino. Como contado por alguns escritores eclesiásticos, os ministros sagrados usavam suas melhores roupas, provavelmente reservadas para a ocasião [1].



Enquanto que na antiguidade cristã as vestimentas litúrgicas diferiam das de uso cotidiano não pela forma particular, mas apenas pela qualidade dos tecidos e decoração particular, no curso das invasões bárbaras, os costumes, e com eles também a forma de vestir dos novos povos, foram introduzidos no Ocidente, levando a mudanças na moda profana. A Igreja, ao contrário, manteve essencialmente inalteradas as roupas usadas pelos sacerdotes nos cultos públicos; foi assim que as vestimentas de uso cotidiano acabaram por se diferenciar das de uso litúrgico. Na época carolíngia, finalmente, os paramentos próprios de cada grau do sacramento da ordem foram definitivamente definidos, assumindo a aparência que conhecemos hoje.



2. Função e significado espiritual



Além das circunstâncias históricas, os paramentos sacros têm uma função importante nas celebrações litúrgicas: primeiramente, o fato deles não serem usados no cotidiano, tendo assim um caráter cultual, ajuda-nos a romper com o cotidiano e suas preocupações, no momento da celebração do culto divino. Além disso, as formas largas das vestimentas, como por exemplo da casula, põem em segundo plano a individualidade de quem as veste, enfatizando seu papel litúrgico. Pode-se dizer que a “ocultação” do corpo do ministro sob as vestes, em certo sentido, despersonaliza-o, removendo o ministro celebrante do centro, para revelar o verdadeiro Protagonista da ação litúrgica: Cristo. A forma das vestes, portanto, lembra-nos que a liturgia é celebrada in persona Christi, e não em próprio nome.



Aquele que exerce uma função de culto não atua como indivíduo por si mesmo, mas como ministro da Igreja e como instrumento nas mãos de Jesus Cristo. O caráter sagrado dos paramentos provém também do fato de que são vestidos conforme prescreve o Ritual Romano.



Na forma extraordinária do Rito Romano (de São Pio V), a vestidura dos paramentos litúrgicos é acompanhada por orações relativas a cada veste, orações cujo texto ainda pode ser encontrado em muitas sacristias. Ainda que estas orações não sejam mais prescritas (mas nem tampouco proibidas) da forma ordinária do Missal emitido por Paulo VI, seu uso é aconselhável, uma vez que ajudam nas preparações e no recolhimento do sacerdote antes da celebração do Sacrifício Eucarístico.



Para confirmar a utilidade destas orações, note-se que elas foram incluídas no Compendium Eucharisticum, recentemente publicado pela Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos [2]. Além disso, pode ser útil lembrar que Pio XII, por decreto de 14 de janeiro de 1940, concedeu uma indulgência de cem dias para cada oração.



3. As vestimentas litúrgicas individuais e as orações que acompanham sua vestidura



1) No início da preparação, o sacerdote lava as mãos, recitando uma oração especial; além da questão de higiene, este ato tem também um significado simbólico profundo, representando a passagem do profano ao sagrado, do mundo do pecado para o puro Santuário do Altíssimo. Lavar as mãos equivale, de certa forma, a retirar as sandálias diante da sarça ardente (Êxodo 3:5). A oração se refere a esta dimensão espiritual:



Da, Domine, virtutem manibus meis ad abstergendam omnem maculam; ut sine pollutione mentis et corporis valeam tibi servire.



(Dai às minhas mãos, Senhor, o poder de apagar toda mácula: para que eu vos possa servir sem mácula do corpo e da alma) – (Da’, o Signore, alle mie mani la virtù che ne cancelli ogni macchia: perché io ti possa servire senza macchia dell’anima e del corpo) [3].



À lavagem das mãos se segue a vestidura propriamente dita.



2) Inicia-se com o amito, um pano retangular de linho dotado de duas fitas, que repousa sobre os ombros junto ao pescoço. O amito destina-se a cobrir, ao redor do pescoço, a vestimenta utilizada diariamente, ainda que se trate do hábito do sacerdote. Nesse sentido, é preciso lembrar que o amito também é usado quando se está vestido com roupas de estilo moderno, que muitas vezes não apresentam uma grande abertura em torno do pescoço. De qualquer forma, portanto, as roupas comuns permanecem visíveis e por isso é preciso cobri-las também, nestes casos, com o amito [4].



No Rito Romano, o amito é vestido antes da alva (túnica). Ao vesti-lo, o sacerdote recita a seguinte oração:



Impone, Domine, capiti meo galeam salutis, ad expugnandos diabolicos incursus.



(Colocai, Senhor, na minha cabeça o elmo da salvação para que possa repelir os golpes de Satanás) – (Imponi, Signore, sul mio capo l’elmo della salvezza, per sconfiggere gli assalti diabolici).



Com referência à carta de São Paulo aos Efésios 6.17, o amito é interpretado como “o elmo da salvação”, que deve proteger o portador das tentações do demônio, em especial de pensamentos e desejos malévolos durante a celebração litúrgica. Este simbolismo é ainda mais evidente no costume seguido desde a Idade Média pelos monges beneditinos, franciscanos e dominicanos, entre os quais o amito era posicionado sobre a cabeça e deixado recair sobre a casula ou a dalmática.



3) A alva consiste na veste longa e branca utilizada por todos os ministros sagrados, e que representa a nova veste imaculada que todo cristão recebe mediante o batismo. A alva é portanto um símbolo da graça santificante recebida no primeiro sacramento, e é considerada também um símbolo da pureza de coração necessária para o ingresso na graça eterna da contemplação de Deus no céu (cf. Mateus 5:8). Isso é expresso na oração recitada pelo sacerdote enquanto veste a peça, oração que se refere ao Apocalipse 7,14:



Dealba me, Domine, et munda cor meum; ut, in sanguine Agni dealbatus, gaudiis perfruar sempiternis.



(Revesti-me, Senhor, com a túnica de pureza, e limpai o meu coração, para que, banhado no Sangue do Cordeiro, mereça gozar das alegrias eternas) – (Purificami, Signore, e monda il mio cuore, perché purificato nel Sangue dell’Agnello, io goda degli eterni gaudi).



4) Sobre as vestes, na altura da cintura, é colocado o cíngulo, um cordão de lã ou outro material apropriado, que é usado como cinto.



Todos os oficiantes que portam a alva devem também portar o cíngulo (esta prática tradicional é hoje frequentemente ignorada) [5].



Para diáconos, sacerdotes e bispos, o cíngulo pode ser de cores diferentes, de acordo com o tempo litúrgico ou a memória do dia. No simbolismo das vestes litúrgicas, o cíngulo representa a virtude do auto-controle, que São Paulo enumera entre os frutos do Espírito (cf. Gálatas 5:22). A oração correspondente, como na Primeira Carta de Pedro 1,13, diz:



Praecinge me, Domine, cingulo puritatis, et exstingue in lumbis meis humorem libidinis; ut maneat in me virtus continentiae et castitatis.



(Cingi-me, Senhor, com o cíngulo da pureza, e extingui nos meus rins o fogo da paixão, para que resida em mim a virtude da continência e da castidade) – (Cingimi, Signore, con il cingolo della purezza e prosciuga nel mio corpo la linfa della dissolutezza, affinché rimanga in me la virtù della continenza e della castità).



5) O manípulo é um paramento litúrgico usado nas celebrações da Santa Missa segundo a forma extraordinária do Rito Romano; caiu em desuso nos anos da reforma litúrgica, embora não tenha sido abolido. É semelhante à estola, mas de menor comprimento, inferior a um metro, e é fixado por meio de presilhas ou fitas como as da casula. Durante a Santa Missa em sua forma extraordinária, o celebrante, o diácono e subdiácono o portam sobre o antebraço esquerdo. É possível que este paramento derive de um lenço (mappula) utilizado pelos romanos amarrado ao braço esquerdo. Uma vez que era utilizado para enxugar as lágrimas e o suor da face, escritores eclesiásticos medievais atribuíram ao manípulo um simbolismo associado às fadigas do sacerdócio. Esta leitura também está presente na oração de sua vestidura:



Merear, Domine, portare manipulum fletus et doloris; ut cum exsultatione recipiam mercedem laboris.



(Fazei, Senhor, que mereça trazer o manípulo do pranto e da dor, para que receba com alegria a recompensa do meu trabalho) – (O Signore, che io meriti di portare il manipolo del pianto e del dolore, affinché riceva con gioia il compenso del mio lavoro).



Como se vê, no início da oração mencionam-se as lágrimas e a dor que acompanham o ministério sacerdotal, mas a segunda parte do texto refere-se aos frutos do próprio trabalho. Não será fora de propósito recordar a passagem de um salmo que pode ter inspirado esta segunda simbologia referente ao manípulo, visto que a Vulgata assim apresentava o Salmo 125,5-6: ” Qui seminant in lacrimis inexultatione metent; euntes ibant et flebant portantes semina sua, venientes autem venient inexultatione portantes manipulos suos” (grifo nosso).



6) A estola é o elemento distintivo de um ministro ordenado e é sempre usada na celebração dos sacramentos e sacramentais. É uma faixa de tecido, em geral bordado, cuja cor varia de acordo com o tempo litúrgico ou o dia santo. Ao vesti-la, o sacerdote recita a seguinte oração:



Redde mihi, Domine, stolam immortalitatis, quam perdidi in praevaricatione primi parentis; et, quamvis indignus accedo ad tuum sacrum mysterium, merear tamen gaudium sempiternum.



(Restitui-me, Senhor, a estola da imortalidade, que perdi na prevaricação do primeiro pai, e, ainda que não seja digno de me abeirar dos Vossos sagrados mistérios, fazei que mereça alcançar as alegrias eternas) – (Restituiscimi, o Signore, la stola dell’immortalità, che persi a causa del peccato del primo padre; e per quanto accedo indegno al tuo sacro mistero, che io raggiunga ugualmente la gioia senza fine).



Dado que a estola é um paramento de suma importância, indicando mais do que qualquer outro a condição de ministro ordenado, não se pode deixar de lamentar o abuso, já largamente difundido, por parte de alguns sacerdotes, que não a usam em conjunto com a casula [6].



7) Finalmente, veste-se a casula ou planeta, a vestimenta característica daqueles que celebram a Santa Missa. Os livros litúrgicos usavam as duas palavras, em latim casula e planeta, como sinônimos. Enquanto o nome planeta foi usado em particular em Roma e acabou por permanecer na Itália, o nome casula deriva da forma típica da vestimenta, que originalmente circundava todo o corpo do ministro sagrado que a portava. O uso da palavra “casula” também é encontrado em outros idiomas: “Casulla”, em espanhol, “Chasuble” em francês e em Inglês, “Kasel” em alemão. Oração para vestidura da casula remete ao convite de Colossenses 3:14: “Sobretudo, revesti-vos do amor, que une a todos na perfeição”. E, de fato, a oração com a qual se veste a casula cita as palavras do Senhor contidas em Mateus 11,30:



Domine, qui dixisti: Iugum meum suave est, et onus meum leve: fac, ut istud portare sic valeam, quod consequar tuam gratiam. Amen.



(Senhor, que dissestes: O meu jugo é suave e o meu peso é leve, fazei que o suporte de maneira a alcançar a Vossa graça. Amém) – (O Signore, che hai detto: Il mio gioco è soave e il mio carico è leggero: fa’ che io possa portare questo [indumento sacerdotale] in modo da conseguire la tua grazia. Amen).



Em conclusão, espera-se que a redescoberta do simbolismo associado aos paramentos e suas orações incentive os sacerdotes a retomar a prática da oração durante a vestição, de modo a se preparar com o devido recolhimento à celebração litúrgica. Se é verdade que é possível rezar com diferentes orações, ou ainda simplesmente elevando a mente a Deus, por outro lado, os textos da oração de vestição trazem a brevidade, a precisão de linguagem, a inspiração da espiritualidade bíblica e o fato de que são rezados pelos séculos por um número incontável de ministros sagrados. Estas orações são recomendadas ainda hoje, para a preparação da celebração litúrgica, e também realizadas de acordo com a forma ordinária do Rito Romano.



Notas [originais em italiano]



[1] Cf. ad esempio san Girolamo, Adversus Pelagianos, I, 30.



[2] Edito dalla LEV, Città del Vaticano 2009, pp. 385-386.



[3] Riprendiamo il testo delle preghiere dall’edizione del Missale Romanum emanato nel 1962 dal beato Giovanni XXIII, Roman Catholics Books, Harrison (NY) 1996, p. lx. La traduzione in italiano delle preghiere è nostra.



[4] La Institutio Generalis Missalis Romani (2008) al n. 336 permette di non assumere l’amitto quando il camice è confezionato in maniera tale da coprire completamente il collo, nascondendo la vista dell’abito comune. Di fatto, però, avviene di rado che l’abito non sia visibile, anche solo parzialmente; di qui la raccomandazione ad utilizzare comunque l’amitto.



[5] Lo stesso n. 336 della Institutio del 2008 prevede la possibilità di omettere il cingolo, se il camice è confezionato in maniera tale da aderire al corpo senza di esso. Nonostante questa concessione, bisogna riconoscere: a) il valore tradizionale e simbolico dell’uso del cingolo; b) il fatto che difficilmente il camice – sia in foggia più tradizionale, che soprattutto nei tagli più moderni – aderisce da sé al corpo. Se la norma prevede la possibilità, essa dovrebbe però restare piuttosto ipotetica in via di fatto: in concreto, il cingolo risulta sempre necessario. A volte si trovano oggi dei camici che hanno il cingolo incorporato: una fettuccia di stoffa unita al camice per mezzo di una cucitura all’altezza della vita e che si annoda al momento della vestizione: in questi casi la preghiera sul cingolo può essere recitata mentre si annoda. Resta però di gran lunga preferibile la forma tradizionale.



[6] «Il Sacerdote che porta la casula secondo le rubriche non tralasci di indossare la stola. Tutti gli Ordinari provvedano che ogni uso contrario sia eliminato»: Congregazione per il Culto Divino e la Disciplina dei Sacramenti, Redemptionis Sacramentum, 25 marzo 2004, n. 123.



domingo, 14 de fevereiro de 2010

Música Litúrgica - o Introito

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A música litúrgica é assunto com o qual me preocupo obsessivamente. Que eu seja católico talvez explique grande parte disto; que eu seja músico explica outro tanto. Mas existe ainda outra medida em que a coisa se explica pelo deplorável estado da música litúrgica nos nossos dias.

Claro: o mau estado da música litúrgica faz parte do mau estado da própria Liturgia que, sublime nos livros, nem sempre é realizada sublimemente na prática. Ademais, problemas litúrgicos (em geral, mas também os problemas litúrgicos musicais) não são novidade dos nossos dias.

Quando falamos de música litúrgica inadequada, pensamos sem dúvida nas paróquias, pensamos numa maioria. Nunca deixou de haver lugares em que as celebrações foram sempre digníssimas e, a música, incrível. Estes lugares mantiveram a tradição católica e a obediência às leis litúrgicas da Igreja. Não podemos, entretanto, nos contentar, nunca, com que a ortodoxia litúrgica se restrinja a umas poucas casas religiosas e a umas pouquíssimas paróquias ou a algumas catedrais europeias que se podem contar nos dedos de uma mão. Não podemos, porque as leis da Igreja valem para toda ela (não existem “realidades” locais que permitam ignorar as normas, e mesmo adaptações lícitas precisam ser estudadas e autorizadas), e todos os fiéis do mundo têm direito à Liturgia decente, da qual é parte integrante e crucial a música litúrgica decente. Os fiéis têm este direito; por outro lado, os mesmos fiéis não têm direito a desobedecer nem forçar a desobediência às normas. Os fiéis não podem tomar os sacerdotes como reféns obrigados a fazer concessões litúrgicas sob a pena de se esvaziarem os bancos do templo (embora, claro, nem todo abuso litúrgico nasça do desejo de agradar fiéis).

*

O chamado Novus Ordo, ou “Missa de Paulo VI”, traz em suas instruções algumas flexibilidades que não podem, a meu ver, ser interpretadas como deixa para a solução mais cômoda. Em outras palavras, a licitude não é suficiente para a beleza e a riqueza da Liturgia (ainda que indispensável).

Neste texto eu gostaria de falar a respeito do Próprio da Santa Missa, em cuja regulamentação existe a flexibilidade a que me refiro. Infelizmente, mesmo esta flexibilidade sendo grande, tem sido com enorme freqüência forçada até a quebra pela interpretação errônea das instruções do Missal e do Concílio Vaticano II.

Para esclarecer o que é o Próprio, valho-me agora do Ordinário. Na Missa, o Ordinário se compõe do Kyrie (Senhor, tende piedade - parte essencial do Ato Penitencial, embora não seja, sozinho, o Ato Penitencial inteiro), do Gloria, do Credo, do Sanctus (Santo, Santo, Santo) e do Agnus Dei (Cordeiro de Deus). Dependendo da Missa, pode ocorrer de se omitir uma dessas partes. Mas o que importa para nós, agora, é que elas são sempre iguais. Em qualquer Missa o Gloria é sempre igual, como são sempre iguais as outras quatro partes.

O Próprio, por sua vez, muda sempre; é diferente para cada Missa. Por esta razão é que ele se chama assim: cada Missa tem seu “próprio Próprio”. As partes do Próprio também são cinco: Introito (Entrada), Salmo Responsorial (ou Gradual), Alleluia (com o seu versículo), Ofertório e Comunhão. Mas o Alleluia é mesmo do Próprio? Ele não é sempre igual, sempre “Alleluia”? Bem, a parte “Alleluia” é sempre igual; mas o seu versículo é próprio, é diferente a cada Missa. Porém, em muitos lugares ele não é usado, fazendo com que muitos sequer saibam que ele existe. Mas ele existe e deve ser usado.

Neste texto falarei apenas da primeira das partes do Próprio, o Introito ou Entrada. Que o leitor não se assuste com isto; o fato de eu falar apenas dele não significa que o assunto seja muito complexo, e sim que não quero alongar demais este texto cuja introdução já ocupa bom espaço.

Como muitos sabem ou, se não sabem, imaginarão, o Introito ou Entrada é o momento em que o sacerdote entra para iniciar a celebração da Santa Missa; não só ele mas também possíveis acólitos, diácono etc. Na grande maioria das igrejas a música utilizada neste momento é designada como “canto de entrada”, o que não está errado. Entretanto, a música costuma ser escolhida com base simplesmente no gosto dos fiéis dessa igreja específica, ou no gosto do músico ou dos músicos da Liturgia. Para esclarecer isto, vamos a fonte: o que a Igreja prescreve para este momento? Vejamos os números 47 e 48 da IGMR. Os grifos são meus.

47. Reunido o povo, enquanto o sacerdote entra com o diácono e os ministros, começa o canto da entrada. A finalidade desse canto é abrir a celebração, promover a união da assembléia, introduzir no mistério do tempo litúrgico ou da festa, e acompanhar a procissão do sacerdote e dos ministros.

48. O canto é executado alternadamente pelo grupo de cantores e pelo povo, ou pelo cantor e pelo povo, ou só pelo grupo de cantores. Pode-se usar a antífona com seu salmo, do Gradual romano ou do Gradual simples, ou então outro canto condizente com a ação sagrada e com a índole do dia ou do tempo, cujo texto tenha sido aprovado pela Conferência dos Bispos.
Não havendo canto à entrada, a antífona proposta no Missal é recitada pelos fiéis, ou por alguns deles, ou pelo leitor; ou então, pelo próprio sacerdote, que também pode adaptá-la a modo de exortação inicial (cf. n. 31).
Numerosas questões devem ser comentadas aqui. Julgo importante reorganizar algumas informações do texto para melhor compreensão do leitor.

Primeiramente, no número 48, a IGMR diz quem executa o canto de entrada. São três opções:

1 – grupo de cantores e povo

2 – cantor e povo

3 – só o grupo de cantores.

Fica bastante claro que não existe nenhuma obrigação ao canto da assembleia, ainda que ela figure nas duas primeiras opções. Por que esta preocupação? Porque uma objeção comum à utilização de certos tipos de música é que o povo fique impedido de “participar”, por não saber “cantar junto”. Já se explicou muito, porém, que a participação também inclui a audição atenta e o silêncio sagrado. Além disto, a lógica nos faz concluir ser impossível usar na Liturgia somente música que a assembleia conheça (o que a Igreja não pede, a propósito).

Outro aspecto que vemos é a distinção entre “grupo de cantores” e “cantor”. Certamente o uso do plural e do singular deixa claro a que o texto se refere; a meu ver, porém, em igrejas nas quais o “grupo de cantores” seja composto por uma única pessoa, esta voz solitária pode assumir os papéis atribuídos ao grupo de cantores. A IGMR não deixa de pensar nas igrejas mais modestas ao dizer “grupo de cantores” e não “coro”. Especialmente no Brasil, por motivos culturais, é freqüentemente difícil instituir um coro de igreja.

Adiante a IGMR diz o que se deve cantar como “canto de Entrada”. Listemos:

1 – Antífona com seu salmo, do Gradual Romano ou do Gradual Simples

2 – outro canto condizente com a ação sagrada e com a índole do dia ou do tempo, cujo texto tenha sido aprovado pela Conferência dos Bispos (a CNBB, no caso do Brasil).

Quantas pessoas conhecem a opção número 1? Muitas não a conhecem, e obviamente não são culpadas disso já que nunca aprenderam nem ouviram falar dessa possibilidade, para muitos, até mesmo incompreensível: o que é uma “antífona”? O que é “Gradual Romano”, o que é “Gradual Simples”?

A primeira pergunta vemos depois. Responder à segunda é fácil: são livros de canto gregoriano. Isto é: a Igreja prescreve para o Introito (o canto de Entrada) nada menos do que canto gregoriano.

Mas e a segunda opção? Muitos poderão dizer sobre ela: “aí, sim!”, porque ela é a mais praticada, por muitos a única conhecida. Alguns poderão interpretar que a primeira opção se aplica só a casas religiosas, só a monges e, mesmo assim só alguns deles. Um hábito que chega a ser uma mera curiosidade, de certa forma, e por tantas pessoas apenas conhecido por meio de filmes.

Esta interpretação é completamente equivocada. A IGMR não se preocupa em estabelecer normas para casas religiosas e normas para paróquias, mas tão somente normas litúrgicas. O canto gregoriano é posto pela Igreja em primeiro lugar no que concerne à Liturgia Romana: Em igualdade de condições, o canto gregoriano ocupa o primeiro lugar, como próprio da Liturgia romana. (IGMR, 41)

É também o caso de pensarmos por que a Igreja se expressa desta maneira na IGMR; resumidamente, o que Ela nos diz é: “no canto de entrada você pode usar a melodia gregoriana ou outro canto condizente”. Talvez fosse mais simples dizer apenas “use um canto condizente”; ou não?

O fato é que a Igreja está nos orientando, aqui, a respeito do texto. Tanto que, na segunda opção, ela coloca como condição o aval dos bispos locais. Além disto, pense o leitor comigo: se a Igreja permite que a Missa seja no idioma do lugar, e o gregoriano é sempre em latim, isto significa que qualquer canto no idioma do lugar (que chamamos de “vernáculo”) se encaixará na segunda opção.

Não se trata exatamente disto. A Igreja, de fato, indica os livros: o Gradual Romano e o Gradual Simples. Porém, pode-se utilizar o texto lá indicado, traduzido à língua do lugar, para compor uma outra música a se utilizar neste momento da Liturgia (e em outros que seguem as mesmas regras).

Tomemos um exemplo. Suponha o leitor que teremos uma Missa do Sexto Domingo do Tempo Comum, e vamos providenciar a música para o Introito. Vamos ao Gradual Romano. Lá encontramos, para o Sexto Domingo do Tempo Comum, uma melodia gregoriana que utiliza o texto, em latim, dos versículos 3 e 4 do Salmo 30:

Esto mihi Deum protectorem, et in locum refugii, ut salvum me facias: quoniam firmamentum meum, et refugium meum est tu: et proper nomen tuum dux mihi eris, et enutries me.
Em português:

Sede para mim um Deus protetor e um lugar de refúgio, para me salvar; pois sois meu apoio e meu refúgio; e pelo vosso nome haveis de me conduzir e me alimentar.
Este texto é parte integrante da Liturgia da Missa do Sexto Domingo do Tempo Comum. É seu Introito. Foi assinalado pela Igreja para fazer parte da celebração do sacrifício nesta data litúrgica específica. Ainda que a mesma Igreja permita o uso de música com um outro texto (e mesmo que aprovado pela conferência episcopal), quanto não perdemos ao simplesmente ignorar este tesouro litúrgico, colocando em seu lugar textos sem tradição nenhuma e, na maioria das vezes, de gosto duvidoso, ou até mesmo com problemas doutrinários e sentimentalismo?

Pessoalmente, interpreto como uma espécie de gesto de enorme tolerância da Santa Igreja o fato de permitir aquilo se ficou conhecido como alius cantus aptus – o famoso “outro canto apto”, “outro canto adequado” – que substitua o texto mais propriamente litúrgico. E utilizo aqui a palavra tolerância no seu sentido de aceitação sem muito gosto, sem a chancela, por assim dizer, de autenticidade e propriedade.

O fato de que o Introito (e o Próprio inteiro) muda a cada Missa faz com que a cada Domingo seja usada uma música diferente. Isto impede que o “povo cante junto”? Talvez impeça. Entretanto, já não devemos mais estar presos à ideia errônea de que a “participação” ou mesmo a “participação ativa” implique necessariamente em fazer coisas (seja canto, recitação etc.), ou, para ser mais exato, fazer coisas perceptíveis a todos. Ouvir atentamente o Introito cantado é participação ativa. Meditar seu texto é participação ativa. Não me parece errado, tampouco, que o fiel recite o mesmo texto em voz baixa. Lembre-se ainda o piedoso costume de acompanhar visualmente a procissão de entrada: a cruz, o incenso, os ministros sagrados e seus paramentos.

Como o leitor talvez tenha percebido, não defendo que se cante o Introito sem informar aos fiéis que texto está sendo cantado. Evidentemente é a Deus que se dirige a Liturgia; e se o fiel sabe o que está sendo cantando ele se pode unir mais perfeitamente a ela. Considero importante que os fiéis tenham em mãos o texto que está sendo cantado pelo cantor ou grupo de cantores, mesmo que a música utilize o texto na língua do país. Imprescindível? Não; mas, sendo possível, acredito que auxilie bastante. Pode-se imprimir o Próprio do dia para distribuir aos presentes, caso não exista algum outro tipo de guia publicado. Por misericórdia, abstenhamo-nos de retroprojetores ou datashow...

Neste momento, um parêntese. Vimos que a IGMR nos indica o Gradual Romano como fonte do texto para o Introito. Ocorre que o Missal também provê uma antífona de Entrada. Em muitos casos, o texto do Gradual e o texto do Missal são o mesmo, mas isto não é a regra. Se um compositor desejar servir-se do texto do Missal para escrever a música, pode fazê-lo. Em textos futuros abordarei mais detalhadamente este “problema”. Fechemos o parêntese.

Alguém poderá argumentar que é rara, ou mesmo raríssima, uma assembleia capaz de cantar o Introito junto com o cantor ou cantores. Não discordo; volto a insistir em que é desnecessário, em certas partes da Liturgia, o canto da assembleia inteira, e que justamente por a música cantada por todos precisar ser mais acessível, é enriquecedor para a Liturgia que o Próprio possa dispensar os fiéis, possibilitando o uso de composições mais elaboradas. Não se pode admitir o empobrecimento da Liturgia como preço a pagar por uma ilusória “participação ativa” de todos os presentes à Missa.

Este é o início do Introito gregoriano Esto mihi, do Sexto Domingo do Tempo Comum. Note-se que a escrita do canto gregoriano usa uma pauta de quatro linhas, enquanto a notação musical moderna utiliza cinco. A notação gregoriana continua sendo usada para o canto gregoriano, e os livros são publicados neste sistema.


Esta melodia, como as outras utilizadas no Próprio, são chamadas de antífonas. Eu havia adiado, alguns parágrafos atrás, a explicação do que significa esta palavra. Mesmo assim não a explicarei inteiramente, deixando isto para um outro texto. Por enquanto, apenas digo que é um nome utilizado para designar as melodias do Próprio (e algumas outras).

Encorajo todos aqueles que desejem aprender a ler este tipo de notação a procurar informações ou quem lhes possa ensinar. Garanto-lhes que a dificuldade é muito menor do que parece à primeira vista. Se o caro leitor não sabe ler a partitura acima, olhe para ela como, quando criança, antes de ser alfabetizado, olhava jornais, livros e placas: coisas desconhecidas que em pouco tempo se transformam em coisas totalmente claras.

Como afirmei anteriormente, podemos tomar este texto, originalmente em latim, e musicá-lo na língua do país. O próximo exemplo é esse mesmo Introito, mas em inglês, retirado de um livro para o uso anglicano (católicos oriundos do anglicanismo). A melodia utilizada nesta adaptação, feita por C. David Burt, é mais simples do que a do gregoriano acima.


Por sua vez, o americano Richard Rice escreveu música para o Próprio da Missa, também em inglês, destinada a coros. Suas composições são simples (seu trabalho se chama Simple Choral Gradual, isto é, “gradual coral simples”) e muito boas para a Liturgia, além de muito acessíveis para coros. Copio aqui o início do seu Introito Esto mihi. Não estranhe o leitor a diferença de texto: Rice usa uma tradução diferente daquela usada no exemplo anterior.

Precisamos de música em português para o Próprio. Não de composições com textos novos, nem de paráfrases de salmos, nem salmos metrificados. Estas opções são lícitas? São lícitas, mas, uma vez mais, convido o leitor a ir além da mera licitude.

A Igreja chama os compositores a escrever nova música litúrgica para enriquecer o repertório, de maneira que cultivemos o tesouro já existente e que floresçam novas composições, escritas tanto para grandes coros de nível profissional como para pequenos grupos de cantores amadores (mas de bom nível e que cultivem o estudo da música) ou mesmo para o cantor único ao qual alguma igrejas se veem forçadas a restringir-se.

Eu, pessoalmente, me encaixo nesta última categoria; embora minha formação seja precisamente a de músico, não sou cantor, mas na Liturgia tenho exercido esta função, além da de instrumentista. E, tendo em vista esta necessidade, procuro compor o Próprio de cada Missa dentro das minhas possibilidades.

Enquanto escrevo este texto, ocupo-me precisamente da composição do Próprio para o Sexto Domingo do Tempo Comum. “Meu” Introito começa assim:


A assembleia não cantará isto – e, como já mostrei, nem precisa que seja assim. Este Introito poderia cobrir toda a ação litúrgica até a chegada do sacerdote ao altar. No caso específico, o sacerdote da igreja em que toco pede que eu não exclua a entrada cantada pelos fiéis. Da minha parte, eu nunca quis omitir o Próprio. Concordando com a minha preocupação, o sacerdote propôs que a sua entrada seja realmente acompanhada por música cantada pelos fiéis, até que ele chegue ao altar. Assim que esta termine, canto o Introito. Não é inconveniente que o padre “espere” o Introito ser cantado: ele é litúrgico. Além disto, a IGMR especifica no número 48 que se o Introito não for cantado, ele é lido. Repito o trecho que fala disso:

(...)Não havendo canto à entrada, a antífona proposta no Missal é recitada pelos fiéis, ou por alguns deles, ou pelo leitor; ou então, pelo próprio sacerdote, que também pode adaptá-la a modo de exortação inicial (cf. n. 31).
Este trecho nos mostra também que é perfeitamente possível uma Missa sem música. Certamente que a sua ausência faz falta no que se trata de beleza. Mas a falta de música não é motivo para não se realizar a Missa. No meu entendimento isto é um forte indicativo de que não se pode usar qualquer música na celebração do sacrifício: se a única música disponível é qualquer uma, fora da Liturgia e inadequada a ela, que seja deixada de lado. Convido todos aqueles envolvidos com a Liturgia a não terem medo de ter a Santa Missa sem música, se for o caso.

Há ainda diversas coisas que eu gostaria de dizer, mas prefiro deixá-las para os próximos textos. Como se recordam, o Introito é apenas o primeiro item do Próprio. Possivelmente, no entanto, eu venha a tratar deles com o uso de menos espaço e, por conseguinte, tomando menos tempo ao leitor.

Deixo, como ilustração final deste post, um vídeo. Claro, trata-se de música litúrgica executada com excelência espantosa e fineza incrível. Pessoalmente também aprecio um pouco de rusticidade moderada. Mas sei que o leitor apreciará o que deixo agora. Trata-se da Missa de Natal na Catedral de Westminster, na Inglaterra, em 2009. O vídeo mostra precisamente o Introito. Trata-se do versículo 7 do Salmo 2: o Senhor me disse: tu és meu Filho, eu hoje te gerei – em latim: Dominus dixit ad me: Filius meus es tu, ego hodie genui te.

Ninguém argumente que é assim por ser na Europa. Nós também podemos fazer assim no Brasil. É o que a Igreja quer que façamos. Comparemos com as coisas que temos visto, e compreendamos o que é melhor. Está nas nossas mãos.

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Lectionarium Editio iuxta typicam alteram

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A editora americana Midwest Theological Forum, apostolado de membros do Opus Dei, que já publica uma das mais belas versões do Missale Romanum em latim na forma ordinária, i.e., no rito romano moderno, pós-conciliar, e também uma edição mais barata do mesmo, lançou, a algum tempo, um pacote com os três volumes do Lecionário para o rito atual, igualmente no idioma latino.

Mais detalhes podem ser vistos aqui, onde se compra o referido Lecionário por U$ 900,00. Um belo presente para sua paróquia que já celebra ou quer celebrar em latim também no rito novo, não?

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

A riqueza da liturgia beneditina

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Leiam aqui. Artigo muito interessante.

Missa em latim, versus Deum, mas no rito novo em Montes Claros, MG

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Em dezembro do ano passado, esteve em Montes Claros-MG, o Pe. Demétrio Gomes, de Niterói-RJ. O padre celebrou no Carmelo uma belíssima Missa no rito moderno, (Novus Ordo, forma ordinária) em latim e vernáculo, "versus Deum". A música (gregoriano, polifônico e cânticos populares) ficou por conta do coro das monjas carmelitas.

As sacras para esse rito - sim, podem-se usar sacras no rito novo - foram confeccionadas por mim e enviadas por e-mail ao padre.

Abaixo, algumas fotos:























segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Ione Buyst e sua “Doutrina da Confusão dos Sacerdócios”: uma doutrina exótica

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A Irmã Ione Buyst, OSB [na foto abaixo, a religiosa sem hábito], é definida no site da Editora Paulinas como atuante “na formação litúrgica, tanto no campo acadêmico como no campo pastoral e popular”, “professora universitária, assessora treinamentos, encontros e cursos de teologia e pastoral litúrgicas a pedido de institutos de teologia, dioceses e regiões pastorais, congregações religiosas, movimentos interclesiais de comunidades de base”, com “vários livros e artigos publicados, tanto na área acadêmica quanto na pastoral”, além de ser fundadora de algumas “redes de animação litúrgica” e criadora de uma tal técnica de formação litúrgica chamada “Laboratório Litúrgico”.
Segundo um outro site, o portal “LPA – Liturgia por Amor” , este tal Laboratório Litúrgico “constitui-se numa técnica que assumia elementos de duas fontes básicas: a pedagogia religiosa de Hélène Lubienska de Lenval e os métodos psicodramáticos de Jacob Levy Moreno. Aos poucos, ao longo do tempo, com o uso da técnica, o Laboratório Litúrgico foi exigindo um trabalho de sistematização que esclarece a influência de cada uma das fontes. Buscou um caminho novo para a aprendizagem na liturgia”; no mesmo portal diz-se que “foram buscar a inspiração [para o Laboratório Litúrgico] no teatro, no qual os atores, muito antes de entrarem no palco, exercitam o corpo, a fala, a expressão; incorporam e criam personagens em uma série de exercícios e trabalhos, chamados ‘Laboratórios’. Foi-se aprendendo também, ao longo dos anos, com técnicas corporais e de meditação de várias correntes terapêuticas, filosóficas e espirituais”. Isto quer dizer precisamente que, na técnica do Laboratório Litúrgico – da qual a Ir. Ione Buyst é uma das criadoras – a liturgia se degenera num espetáculo de teatro, com “métodos psicodramáticos”, onde a igreja é um “palco” para “exercitar-se o corpo, a fala e a expressão”, “incorporar e criar personagens”. Ou seja, a Liturgia deixa de ser o culto de Deus, Nosso Senhor, para ser um espetáculo teatral meramente humano. Mais que isso, no tal Laboratório Litúrgico, a Liturgia é utilizada para desenvolver-se nas “técnicas corporais e de meditação de várias correntes terapêuticas, filosóficas e espirituais”; isto é, não se trata mais de um culto de adoração a Deus, de pedido de perdão, de ação de graças e impetração de graças, mas um conjunto de “técnicas de meditação”, que nem precisam ser necessariamente católicas – apesar de que “a lei da Fé é a lei da oração” – mas podem vir de “diversas correntes terapêuticas, filosóficas e espirituais” – até pagãs, talvez. Imagine-se o que diria o Profeta Ezequial ao contemplar um Laboratório Litúrgico transformando o culto a Deus numa reunião de auto-ajuda baseado em técnicas de meditação de “várias correntes terapêuticas, filosóficas e espirituais”? Talvez sua reação fosse a mesma de quando o Senhor lhe revelou a idolatria que obscuramente era praticada pelos chefes dos anciãos no interior de Templo, idolatria que o Senhor chamou de “abominações graves” e “ritos abomináveis” (cf. Ezequiel 8,1-18); que diria destas “várias correntes terapêuticas, filosóficas e espirituais” que são exaltadas na técnica do Laboratório Litúrgico?
Ora, a Ir. Ione Buyst foi uma das criadoras desta técnica estranha e mais propriamente “anti-litúrgica” do que “litúrgica”. Mais a Ir. Ione Buyst cria mais do que exóticas técnicas litúrgicas: cria também exóticas “doutrinas litúrgicas”, distantes do ensinamento da Igreja ao longo destes dois milênios de Magistério e que poderíamos classificar com certeza maior como heresias litúrgicas. Apesar disso, as obras da Ir. Ione Buyst são utilizadas em muitos seminários para formação dos futuros padres. Muitas Missas podem estar sendo inválidas porque os sacerdotes que as celebram não crêem na presença real de Cristo na Eucaristia e no sacerdócio ministerial e assim não têm a intenção da Igreja na celebração dos mais altos mistérios, graças às doutrinas esquisitas da Ir. Ione Buyst que lhes foram ensinadas nos Seminários. E que prejuízo isto deverá estar causando à Igreja Católica do Brasil e à vida espiritual do povo católico, que sem os Sacramentos é árido como um deserto!
Este é o primeiro de uma série de artigos cujo objetivo será refutar as estranhas e não-católicas doutrinas [anti-]litúrgicas da Ir. Ione Buyst. Mais que isso: doutrinas particulares, criadas pela mente fértil de uma religiosa desejosa de renegar dois milênios de Magistério da Santa Madre Igreja para criar o seu próprio “magistério”.
Começaremos esta nossa série pela refutação da “Doutrina da Confusão dos Sacerdócios” da Ir. Ione Buyst. Refutaremos esta esquisita doutrina a partir da obra “A Missa - Memória de Jesus no Coração da Vida” (São Paulo: Paulinas, 2004), de autoria da referida religiosa “liturgista”.

1. A “Doutrina da Confusão dos Sacerdócios”, por Ione Buyst

Consiste esta esquisita e particular doutrina da Ir. Ione Buyst – que nomeamos “Doutrina da Confusão dos Sacerdócios” – na afirmação de que o sacerdócio do Padre e o sacerdócio dos fiéis, iniciado com o Batismo, são iguais em natureza e ministério. Para Ione Buyst, muitos leigos há que recebem direto do Espírito santo o “dom da coordenação” e deveriam ser como ministros ordenados:
Acabamos dando mais importância à ordenação em si, como poder sagrado, do que ao dom que a pessoa recebe do Espírito Santo para o serviço a ser prestado à comunidade. Limitamos o acesso à ordenação: na Igreja Católica somente homens não-casados, com longe preparação intelectual, são admitidos à ordenação. Resultado: seguramente mais de 70% das comunidades existentes no Brasil dependem de um ministro ordenado que vem de fora e que atende [...] De outro lado, sabe lá Deus quantas pessoas (homens e mulheres, casados e solteiros, leigos ou religiosos), atuantes pelo Brasil e fora, recebem do Espírito Santo o dom da coordenação e não estão sendo reconhecidas pela Igreja, conferindo-lhes a ordenação!” (p. 102-103, grifos nossos).
Assim, pois, segundo Ione Buyst, o importante não é a Ordem e o caráter que ela imprime na pessoa que a recebe, mas sim o “dom da coordenação” que algumas pessoas recebem direto do Espírito Santo “para o serviço a ser prestado à comunidade”. Não se deveria dar importância “à ordenação em si, como poder sagrado”, mas a este “dom que a pessoa recebe do Espírito Santo”. E assim, “homens e mulheres, casados e solteiros, leigos ou religiosos”, “atuantes pelo Brasil e fora”, “não estão sendo reconhecidas pela Igreja”, que deveria conferir-lhe a ordenação ou tratar a estes leigos que receberam o “dom da coordenação” de maneira igual aos sacerdotes ordenados [um exemplo prático disto na foto abaixo: mulheres leigas juntos do padre no presbitério "oferecendo" o Sacrifício, o que é um abuso litúrgico].
Para a Ir. Ione Buyst, os sacerdócios do Padre e do leigo são a mesma coisa, não há diferença alguma de grau entre um ou outro. Por isto, para resolver o problema da falta de padres, a Ir. Ione Buyst propõe que a Igreja reconheça as “lideranças da comunidade” (seja elas homens ou mulheres, casados ou solteiros) e as confira a ordenação; se os sacerdócios de todos são iguais e confundem-se entre si, basta que se confira a ordenação às “lideranças”, às personalidades mais proeminentes, aos dirigentes da comunidade, como uma mera formalidade para que eles “presidam” a Missa:
Não estaria na hora de reconhecer com urgência esse problema e ordenar, em cada comunidade organizada, as lideranças já existentes, possibilitando assim que se celebre a eucaristia a cada domingo?” (p. 15, grifos nossos), indaga Ione Buyst à Igreja.
Esta importância em demasia que se acabou dando ao sacerdócio ministerial do Padre em detrimento do sacerdócio comum dos fiéis – que, para Ione Buyst, são a mesma coisa – se reflete na Missa, que é “centralizada” no Padre (e, na verdade, o centro de toda Missa não é nem o Padre nem o povo, mas Cristo, Deus). Mas estaria errado: a Missa, para a religiosa “liturgista”, deveria ser "centralizada” no povo, “na comunidade” – afinal, povo e Padre, são todos iguais, todos a mesma coisa, uns são tão sacerdotes quanto o outro – e a celebração eucarística deveria refletir esta “igualdade” dos sacerdócios do Padre e “da comunidade”:
A missa é realizada de maneira muito formal e centralizada no padre. [...] É como se a missa não pertencesse à comunidade, mas ao padre... Não deveria ser o inverso? Não deveria ser o padre que pergunta: ‘Como será a celebração? O que vocês prepararam? O que vocês querem que eu faça?’ As comunidades deveriam preparar normalmente a celebração da missa a partir da sua realidade e com seu modo de celebrar...” (p. 29, grifos nossos).
Quem fará o gesto da fração do pão, enquanto se canta o Cordeiro de Deus ou outro canto adequado? É muito significativo o presidente não fazê-lo sozinho, mas justamente com as pessoas que irão distribuir a comunhão. É mais uma maneira de expressar que somos uma Igreja toda ela ministerial” (p. 137, grifos nossos).
E, como um sinal bastante claro de que o Padre não é mais, por ser sacerdócio, do que “a comunidade”, do que “o povo”, Ione Buyst propõe que seja abolida a primazia da Comunhão do Sacerdote – na Missa, como se sabe, o sacerdote comunga ainda no altar, antes dos fiéis, o que já é o suficiente para que a Missa seja válida – e que se dê a Comunhão primeiramente ao povo – afinal, se a Missa “pertence à comunidade”, como disse antes, e se “somos uma Igreja toda ela ministerial”, deveria ser mais do que natural que o povo, tão sacerdote quanto o Padre e estando em maioria na Missa, comungasse primeiro que o celebrante:
Quem deve comungar primeiro: o padre e os ministros? Ou o povo? Qualquer dona ou dono de casa serve primeiro a família toda antes de se servir, não é mesmo? É um sinal de educação. Não parece estranho, então, que na missa façamos o inverso?” (p. 142).
A “Doutrina da Confusão dos Sacerdócios” de Ione Buyst é, portanto, isso: o sacerdócio do Padre e o sacerdócio comum dos batizados se “confundem”, são a mesma coisa, são iguais entre si; não é o sacerdote que celebra a Missa, não é o Padre que oferece o Sacrifício de Cristo, mas todo o povo, “a comunidade”, pois “a Missa pertence à comunidade” e “somos uma Igreja toda ela ministerial”, isto é, Padres e fiéis são todos sacerdotes da mesma maneira, numa “Igreja toda ministerial”. Não havendo diferença entres os sacerdócios do Padre e dos batizados, isso deveria refletir-se na Missa, que deixaria de ser “centralizada no Padre” para “pertencer à comunidade” – e por isso o povo deve comungar primeiro que o Padre. Ademais, as comunidades - não só tão sacerdotes quanto o Padre, mas também tão competentes em termos de liturgia quanto o Papa - “deveriam preparar normalmente a celebração da missa a partir da sua realidade e com seu modo de celebrar”, segundo Ione Buyst.
Trata-se de uma confusão completa entre o sacerdócio ministerial do Padre, que lhe é conferido pelo Sacramento da Ordem, e o sacerdócio comum dos fiéis, conferido a todos os membros da Igreja pelo Batismo.
Estes sacerdócios, contudo, são completamente diferentes, distintos em natureza e em grau. Não podem ser tratados com tamanho igualitarismo, como se fossem a mesma coisa: um não pode ser confundido com o outro, como faz a Ir. Ione Buyst em sua exótica “Doutrina da Confusão dos Sacerdócios”.
Demonstraremos a falácia destas afirmações da religiosa “liturgista” a seguir, amparados no ensino bimilenar do Magistério da Igreja.

2. Refutação da “Doutrina da Confusão dos Sacerdócios”

Mas esta doutrina que a Ir. Ione Buyst prega em suas obras não tem respaldo algum na Doutrina Católica à qual Ir. Ione Buyst deveria ser fiel, mas não é.
A Ir. Ione Buyst ignorou por completo o documento mais básico da Fé Cristã: o Catecismo. O que não é de admirar, porque se a Ir. Ione Buyst ignora o Missal Romano nos seus “Laboratórios Litúrgicos”, cedendo o lugar do Missal às invencionices de mentes criativas, quanto mais não ignorará o Catecismo em seus livros, cedendo o lugar da Doutrina Cristã a seus próprios desvarios doutrinários!
A saber, antes de tudo: o sacerdócio comum dos batizados difere substancialmente do sacerdócio ministerial. Os fiéis cristãos participam do sacerdócio de Cristo pelo Batismo na medida em que buscam a santidade de suas próprias vidas, rendem culto a Deus com elas e oferecem cada obra e sacrifício próprio ao Altíssimo. Os padres, contudo, são tirados do meio dos fiéis para o serviço dos fiéis; exercem um ministério diverso, cujo sentido é ajudar os fiéis cristãos comuns a encontrarem a santidade em suas vidas, por meio dos Sacramentos – que o sacerdote dispensa –, especialmente na Santa Missa, culto mais excelso de Deus, e na Confissão, o perdão sublime dos pecados; no desempenho deste ministério, deste serviço, o próprio sacerdote encontra sua santidade. São dois sacerdócios completamente distintos que não se confundem: o dos fiéis rende culto a Deus com suas vidas e sacrifícios cotidianos; o dos sacerdotes rende culto a Deus na celebração e dispensa dos sacramentos, onde os padres representam a Cristo, e no serviço do povo cristão. Não há confusão entre estes sacerdócios: são duas coisas distintas.
Uma consulta rápida ao Catecismo demonstra que a “Doutrina da Confusão dos Sacerdócios” da Ir. Ione Buyst está errada.
O Catecismo Romano ensina, diferenciando os sacerdócios em interno (aquele que é comum a todos os batizados) e externo (aquele que pertence apenas aos ministros ordenados):
Relativamente ao sacerdócio interno, todos os fiéis são considerados sacerdotes, a partir do momento em que receberam a regeneração do Batismo; mas, de primazia, os justos que possuem o Espírito de Deus, e pela graça de Deus se tornaram membros vivos de Jesus Cristo, o Sumo Sacerdote. São eles que, no altar de seus corações, oferecem a Deus sacrifícios espirituais, naquela fé que se abrasa na caridade. A tais sacrifícios pertencem todas as obras boas e virtuosas que se praticam, na intenção de glorificar a Deus. Por isso, lemos no Apocalipse: ‘Em Seu Sangue, Cristo lavou-nos de nossos pecados, e fez de nós um Reino, e instituiu-nos sacerdotes para Deus, Seu Pai’. [...] O sacerdócio externo, porém, não pertence à coletividade de todos os fiéis, mas só a certos indivíduos, ordenados e consagrados a Deus, pela legítima imposição das mãos, segundo o solene cerimonial da Santa Igreja, e que se destinam de modo particular ao sagrado ministério. Esta distinção, entre dois sacerdócios, também se verificava no Antigo Testamento. [...] David falou do sacerdócio Interno. De outro lado, todos sabem perfeitamente que o Senhor havia dado muitas prescrições a Aarão e Moisés acerca do sacerdócio externo. Além do mais, reservou toda a tribo de Levi, para o serviço do Templo, e assentou por lei que ninguém de outra tribo ousasse ingerir-se nesse ministério. E, de fato, o rei Ozias foi ferido de lepra pelo Senhor, porque havia usurpado o ministério sacerdotal, e assim expiou durissimamente a sua sacrílega arrogância” (Parte II, Cap. VII, §§ 23-24, grifos nossos).
O Catecismo da Igreja Católica ensina o mesmo:
O sacerdócio ministerial ou hierárquico dos bispos e dos presbíteros e o sacerdócio comum de todos os fiéis, embora ‘ambos participem, cada qual a seu modo, do único sacerdócio de Cristo’, diferem, entretanto, essencialmente, mesmo sendo ‘ordenados um ao outro’. Em que sentido? Enquanto o sacerdócio comum dos fiéis se realiza no desenvolvimento da graça batismal, vida de fé, de esperança e de caridade, vida segundo o Espírito o sacerdócio ministerial está a serviço do sacerdócio comum, refere-se ao desenvolvimento da graça batismal de todos os cristãos. É um dos meios pelos quais Cristo não cessa de construir e de conduzir sua Igreja. Por isso, é transmitido por um sacramento próprio, o sacramento da Ordem” (§ 1547, grifos nossos).
O sacerdócio ministerial difere essencialmente do sacerdócio comum dos fiéis porque confere um poder sagrado para o serviço dos fiéis. Os ministros ordenados exercem seu serviço com o povo de Deus por meio ensinamento (munus docendi: ‘encargo de ensinar’), do culto divino (munus liturgicum: ‘encargo litúrgico’) e do governo pastoral (munus regendi: ‘encargo de governar)” (§ 1592, grifos nossos).
Também o Concílio Vaticano II – que a Ir. Ione Buyst gosta de mencionar, mas parece nunca ter lido – na Constituição Dogmática Lumen Gentium, sobre a Igreja, ensina:
Cristo Nosso Senhor, Pontífice escolhido de entre os homens (cfr. Hebr. 5, 1-5), fez do novo povo um ‘reino sacerdotal para seu Deus e Pai’ (Apor. 1,6; cfr. 5, 9-10). Na verdade, os batizados, pela regeneração e pela unção do Espírito Santo, são consagrados para serem casa espiritual, sacerdócio santo, para que, por meio de todas as obras próprias do cristão, ofereçam oblações espirituais e anunciem os louvores daquele que das trevas os chamou à sua admirável luz (cfr. 1 Ped. 2, 4-10). Por isso, todos os discípulos de Cristo, perseverando na oração e louvando a Deus (cfr. Act., 2, 42-47), ofereçam-se a si mesmos como hóstias vivas, santas, agradáveis a Deus (cfr. Rom. 12,1), dêem testemunho de Cristo em toda a parte e àqueles que lha pedirem dêem razão da esperança da vida eterna que neles habita (cfr. 1 Ped. 3,15). O sacerdócio comum dos fiéis e o sacerdócio ministerial ou hierárquico, embora se diferenciem essencialmente e não apenas em grau, ordenam-se mutuamente um ao outro; pois um e outro participam, a seu modo, do único sacerdócio de Cristo. Com efeito, o sacerdote ministerial, pelo seu poder sagrado, forma e conduz o povo sacerdotal, realiza o sacrifício eucarístico fazendo as vezes de Cristo e oferece-o a Deus em nome de todo o povo; os fiéis, por sua parte, concorrem para a oblação da Eucaristia em virtude do seu sacerdócio real, que eles exercem na recepção dos sacramentos, na oração e ação de graças, no testemunho da santidade de vida, na abnegação e na caridade operosa” (§ 10, grifos nossos).
Igualmente, o Venerável Papa João Paulo II, na Exortação Apostólica Christifidelis Laici, sobre os leigos, esclareceu que o sacerdócio comum dos batizados – aquele do qual participam os fiéis cristãos comuns – significa a “oferta de si mesmos e de todas as suas atividades” a Cristo, a “aceitação, na fé, do Evangelho e o seu anúncio com a palavra e com as obras, sem medo de denunciar corajosamente o mal” e “sobretudo, o combate espiritual para vencerem dentro de si o reino do pecado (cf. Rom 6, 12), e depois, mediante o dom de si, para servirem, na caridade e na justiça, o próprio Jesus presente em todos os seus irmãos” (§ 14).
Estas características do sacerdócio interno, enumeradas pelo Papa João Paulo II, distinguem este do sacerdócio externo dos ministros ordenados. O sacerdócio ordenado – ou externo – segundo o mesmo Papa João Paulo II, na Exortação Apostólica Pastores Dabo Vobis, sobre a formação dos sacerdotes, difere essencialmente do outro por estar a seu serviço e por lhe ser conferido um poder sagrado na dispensa dos sacramentos a todo o povo cristão:
Finalmente os presbíteros, dado que a sua figura e o seu papel na Igreja não substitui, mas antes promovem o sacerdócio batismal de todo o Povo de Deus, conduzindo-o à sua plena atuação eclesial, encontram-se numa relação positiva e promotora com os leigos. Eles estão ao serviço da fé, esperança e caridade destes. Reconhecem e sustentam a sua dignidade de filhos de Deus como amigos e irmãos, ajudando-os a exercitar em plenitude o seu papel específico no âmbito da missão da Igreja. O sacerdócio ministerial conferido pelo sacramento da Ordem e o comum ou ‘real’ dos fiéis, que diferem entre si essencialmente e não apenas em grau, estão coordenados entre si, ambos derivando - em forma diversa - do único sacerdócio de Cristo. O sacerdócio ministerial, de fato, não significa, de per si, um maior grau de santidade relativamente ao sacerdócio comum dos fiéis; mas, através dele, é outorgado aos presbíteros, por Cristo no Espírito, um dom particular para que possam ajudar o Povo de Deus a exercitar com fidelidade e plenitude o sacerdócio comum que lhes é conferido” (§ 17).
Na Encíclica Ecclesia de Eucharistia o Papa João Paulo II criticou como uma “sombra” o “obscurecimento da necessidade do sacerdócio ministerial, que assenta na sucessão apostólica” por estes que apregoam a confusão entre os sacerdócios – como a Ir. Ione Buyst – dando azo, assim, a terríveis abusos litúrgicos, como leigos no altar consagrando as espécies junto do padre sem ter poder algum para isto, um abuso fundamentado na confusão dos sacerdócios interno e externo, que diferem essencialmente entre si. “Como não manifestar profunda mágoa por tudo isto? A Eucaristia é um dom demasiado grande para suportar ambigüidades e reduções”, lamentou o Papa (§ 10), e ensinou:
De fato, como ensina o Concílio Vaticano II, ‘os fiéis por sua parte concorrem para a oblação da Eucaristia, em virtude do seu sacerdócio real’, mas é o sacerdote ministerial que ‘realiza o sacrifício eucarístico fazendo as vezes de Cristo e oferece-o a Deus em nome de todo o povo’. Por isso se prescreve no Missal Romano que seja unicamente o sacerdote a recitar a oração eucarística, enquanto o povo se lhe associa com fé e em silêncio. A afirmação, várias vezes feita no Concílio Vaticano II, de que ‘o sacerdote ministerial realiza o sacrifício eucarístico fazendo as vezes de Cristo (in persona Christi)’, estava já bem radicada no magistério pontifício. Como já tive oportunidade de esclarecer noutras ocasiões, a expressão in persona Christi ‘quer dizer algo mais do que ‘em nome’, ou então ‘nas vezes’ de Cristo. In persona, isto é, na específica e sacramental identificação com o Sumo e Eterno Sacerdote, que é o Autor e o principal Sujeito deste seu próprio sacrifício, no que verdadeiramente não pode ser substituído por ninguém’. Na economia de salvação escolhida por Cristo, o ministério dos sacerdotes que receberam o sacramento da Ordem manifesta que a Eucaristia, por eles celebrada, é um dom que supera radicalmente o poder da assembléia e, em todo o caso, é insubstituível para ligar validamente a consagração eucarística ao sacrifício da cruz e à Última Ceia. A assembléia que se reúne para a celebração da Eucaristia necessita absolutamente de um sacerdote ordenado que a ela presida, para poder ser verdadeiramente uma assembléia eucarística. Por outro lado, a comunidade não é capaz de dotar-se por si só do ministro ordenado. Este é um dom que ela recebe através da sucessão episcopal que remonta aos Apóstolos. É o Bispo que constitui, pelo sacramento da Ordem, um novo presbítero, conferindo-lhe o poder de consagrar a Eucaristia. Por isso, ‘o mistério eucarístico não pode ser celebrado em nenhuma comunidade a não ser por um sacerdote ordenado, como ensinou expressamente o Concílio Ecumênico Lateranense IV’” (§§ 28-29).
Estas palavras do Papa João Paulo II são fulminantes contra as heresias da Ir. Ione Buyst, pregando a confusão e o igualitarismo entre os sacerdócios de fiéis e ministros ordenados. Contra a Ir. Ione Buyst, temos a palavra do Papa declarando explicitamente que o poder sagrado dos sacerdotes “é um dom que supera radicalmente o poder da assembléia” e que “a assembléia necessita absolutamente de um sacerdote ordenado” pois “a comunidade não é capaz de dotar-se por si só do ministro ordenado”. Onde fica, então, a idéia esdrúxula da Ir. Ione Buyst de que é a comunidade que deve ditar a Missa para o padre? Onde fica a idéia da Ir. Ione Buyst de que celebram a Missa padre e povo juntos, quando o Papa e a Doutrina da Igreja afirmam que é o ministro ordenado que recebeu o poder sagrado de dispensar os sacramentos? Ao contrário, o Papa João Paulo II ensina que “o único a quem compete oferecer a Eucaristia in persona Christi” (idem, § 32).
E, contra a sugestão de Ione Buyst de que, para resolver os problemas das comunidades sem padres dever-se-ia ordenar as “lideranças” que receberam “o dom da coordenação” – numa inteira ignorância do que é, realmente, a vocação ao sacerdócio, que não se resume a “liderança” ou “coordenação” –, o Papa João Paulo II diz coisa diversa: a comunidade deve, isto sim, rezar por vocações ao sacerdócio, “rezar mais fervorosamente ao Senhor para que mande trabalhadores para a sua messe [...] sem ceder à tentação de procurar soluções que passem pela atenuação das qualidades morais e formativas requeridas nos candidatos ao sacerdócio” (idem).

Conclusão

Do exposto, fica claríssimo que a doutrina da religiosa “liturgista” Ione Buyst não tem qualquer respaldo na Doutrina Católica e nem deve ser ensinada como se fosse doutrina certa. Ione Buyst confunde o sacerdócio comum dos batizados com o sacerdócio ministerial dos ordenados e, com isso, dá azo a abusos litúrgicos e problemas gravíssimos em termos de Fé.
Como ensina o Concílio Vaticano II, “o sacerdote ministerial, pelo seu poder sagrado, forma e conduz o povo sacerdotal, realiza o sacrifício eucarístico fazendo as vezes de Cristo e oferece-o a Deus em nome de todo o povo; os fiéis, por sua parte, concorrem para a oblação da Eucaristia em virtude do seu sacerdócio real, que eles exercem na recepção dos sacramentos, na oração e ação de graças, no testemunho da santidade de vida, na abnegação e na caridade operosa” (loc. cit.). São duas coisas essencialmente diversas, que não podem ser vítimas de confusão, como faz a Ir. Ione Buyst.
Contra tais desvarios doutrinários, cabe unicamente exaltar a doutrina dos Concílios e dos Papas, que com tanta exatidão ensinaram a doutrina cristã e louvaram a Cristo, louvando a Verdade.
Mas quem louva o erro, louva o pai de todo erro.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Três Missas

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Quando se fala sem muito cuidado no assunto da liturgia, somos tentados, talvez, a imaginar um cenário onde só existam duas possibilidades, principalmente no Brasil: a Missa no rito antigo, bem celebrada, em latim, com canto gregoriano, com o padre versus Deum, os fiéis em atitude de piedade e sacralidade; e a Missa no rito novo, bagunçada, irreverente, com música pop ou violões folk e rimas terminadas em “ão”, padre sem casula, palminhas ritmadas, banho de água benta com balde, vários leigos no presbitério posando de clérigos etc.

O cenário, entretanto, é por demais simplista. Nem mesmo entro na possibilidade – que só é remota hoje, circunstancialmente – de haver avacalhação também na Missa antiga. O ponto é outro: a Missa nova NÃO é isso descrito acima.

Trata-se, então, não de “duas Missas”, mas de três: a Missa antiga, a Missa nova mal-celebrada, e a Missa nova bem-celebrada. Não se pode colocar, como fazem alguns radicais tradicionalistas, lado a lado a Missa antiga observante das rubricas e a Missa nova desobediente. Não é questão de, para fugirmos de “Missas-show”, “Missas-circo”, “Missas-discoteca”, “Missas-halloween”, “Missas de cura e libertação”, “Missas afro”, “Missas do padre sem casula”, “Missas do Missal rasgado” etc, levantarmos exclusivamente a bandeira da Missa antiga.

Por acaso o Papa celebra mal a Missa? No entanto, ele celebra a Missa nova. Todo aquele esplendor, aquele fausto, aquele gregoriano, aquele latim, aquele versus Deum, aqueles paramentos, aquela obediência às rubricas, não são atributos da Missa antiga apenas.

A comparação, em termos externos, para sermos justos, não deve se dar entre a Missa antiga bem-celebrada a nova mal-celebrada, mas entre a Missa mal-celebrada (atualmente apenas a nova, já que os que procuram a antiga o fazem movidos justamente por amor ao sagrado) e a Missa bem-celebrada, seja a nova, seja a antiga.

Claro, a discussão sobre eventuais problemas na reforma levada a cabo pelo Papa Paulo VI, ou sobre o que poderia ter sido melhorado, ou quanto ao modo como se o fez, sem atentar para o princípio do desenvolvimento harmônico, ou mesmo sem o rito antigo expressa ou não de modo mais sublime o dogma eucarístico, pode ser feita, com respeito, caridade e submissão. Mas esse tema escapa ao fim do presente artigo.

Enfim, daí se pode (e deve) incentivar, ao lado da Missa antiga, ou tridentina, ou tradicional ou forma extraordinária, também a Missa nova, forma ordinária, só que bem celebrada, de acordo com as rubricas. Sim, pois o que está aí, na maioria de nossas aróquias brasileiras, não é a Missa nova, não é a forma ordinária, não é o mesmo rito celebrado pelo Papa no Vaticano. É qualquer coisa, menos isso. É uma distorção do que prevê o Missal – e queremos a Missa do Missal!

Excelências da Batina

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Eis aqui um texto do Padre Jaime Tovar Patrón, traduzido por Luiz Augusto Rodrigues Domingues, da Associação Redemptionis Sacramentum:

Esta breve coleção de textos nos recorda a importância do uniforme sacerdotal, a batina ou hábito talar. Valha outro tanto para o hábito religioso próprio das ordens e congregações. Em um mundo secularizado, da parte dos consagrados não há melhor testemunho cristão que a vestimenta sagrada nos sacerdotes e religiosos.

“SETE EXCELÊNCIAS DA BATINA.”

“Atente-se como o impacto da batina é grande ante a sociedade, que muitos regimes anticristãos a têm proibido expressamente. Isto nos deve dizer algo. Como é possível que agora, homens que se dizem de Igreja desprezem seu significado e se neguem a usá-la?”

Hoje em dia são poucas as ocasiões em que podemos admirar um sacerdote vestindo sua batina. O uso da batina, uma tradição que remonta a tempos antiqüíssimos, tem sido esquecido e às vezes até desprezado na Igreja pós-conciliar. Porém isto não quer dizer que a batina perdeu sua utilidade, se não que a indisciplina e o relaxamento dos costumes entre o clero em geral é uma triste realidade.

A batina foi instituída pela Igreja pelo fim do século V com o propósito de dar aos seus sacerdotes um modo de vestir sério, simples e austero. Recolhendo, guardando esta tradição, o Código de Direito Canônico impõe o hábito eclesiástico a todos os sacerdotes.

Contra o ensinamento perene da Igreja está a opinião de círculos inimigos da Tradição que tratam de nos fazer acreditar que o hábito não faz o monge, que o sacerdócio se leva dentro, que o vestir é o de menos e que o sacerdote é o mesmo de batina ou à paisana.

Sem dúvida a experiência mostra o contrário, porque quando há mais de 1500 anos a Igreja decidiu legislar sobre este assunto foi porque era e continua sendo importante, já que ela não se preocupa com ninharias.

Em seguida expomos sete excelências da batina condensadas de um escrito do ilustre Padre Jaime Tovar Patrón

1ª RECORDAÇÃO CONSTANTE DO SACERDOTE

Certamente que, uma vez recebida a ordem sacerdotal, não se esquece facilmente. Porém um lembrete nunca faz mal: algo visível, um símbolo constante, um despertador sem ruído, um sinal ou bandeira. O que vai à paisana é um entre muitos, o que vai de batina, não. É um sacerdote e ele é o primeiro persuadido. Não pode permanecer neutro, o traje o denuncia. Ou se faz um mártir ou um traidor, se chega a tal ocasião. O que não pode é ficar no anonimato, como um qualquer. E logo quando tanto se fala de compromisso! Não há compromisso quando exteriormente nada diz do que se é. Quando se despreza o uniforme, se despreza a categoria ou classe que este representa.

2ª PRESENÇA DO SOBRENATURAL NO MUNDO

Não resta dúvida de que os símbolos nos rodeiam por todas as partes: sinais, bandeiras, insígnias, uniformes… Um dos que mais influencia é o uniforme. Um policial, um guardião, é necessário que atue, detenha, dê multas, etc. Sua simples presença influi nos demais: conforta, dá segurança, irrita ou deixa nervoso, segundo sejam as intenções e conduta dos cidadãos.

Uma batina sempre suscita algo nos que nos rodeiam. Desperta o sentido do sobrenatural. Não faz falta pregar, nem sequer abrir os lábios. Ao que está de bem com Deus dá ânimo, ao que tem a consciência pesada avisa, ao que vive longe de Deus produz arrependimento.

As relações da alma com Deus não são exclusivas do templo. Muita, muitíssima gente não pisa na Igreja. Para estas pessoas, que melhor maneira de lhes levar a mensagem de Cristo do que deixar-lhes ver um sacerdote consagrado vestindo sua batina? Os fiéis tem lamentado a dessacralização e seus devastadores efeitos. Os modernistas clamam contra o suposto triunfalismo, tiram os hábitos, rechaçam a coroa pontifícia, as tradições de sempre e depois se queixam de seminários vazios; de falta de vocações. Apagam o fogo e se queixam de frio. Não há dúvidas: o “desbatinamento” ou “desembatinação” leva à dessacralização.

3ª É DE GRANDE UTILIDADE PARA OS FIÉIS

O sacerdote o é não só quando está no templo administrando os sacramentos, mas nas vinte e quatro horas do dia. O sacerdócio não é uma profissão, com um horário marcado; é uma vida, uma entrega total e sem reservas a Deus. O povo de Deus tem direito a que o auxilie o sacerdote. Isto se facilita se podem reconhecer o sacerdote entre as demais pessoas, se este leva um sinal externo. Aquele que deseja trabalhar como sacerdote de Cristo deve poder ser identificado como tal para o benefício dos fiéis e melhor desempenho de sua missão.

4ª SERVE PARA PRESERVAR DE MUITOS PERIGOS

A quantas coisas se atreveriam os clérigos e religiosos se não fosse pelo hábito! Esta advertência, que era somente teórica quando a escrevia o exemplar religioso Pe. Eduardo F. Regatillo, S.I., é hoje uma terrível realidade.

Primeiro, foram coisas de pouca monta: entrar em bares, lugares de recreio, diversão, conviver com os seculares, porém pouco a pouco se tem ido cada vez a mais.

Os modernistas querem nos fazer crer que a batina é um obstáculo para que a mensagem de Cristo entre no mundo. Porém, suprimindo-a, desapareceram as credenciais e a mesma mensagem. De tal modo, que já muitos pensam que o primeiro que se deve salvar é o mesmo sacerdote que se despojou da batina supostamente para salvar os outros.

Deve-se reconhecer que a batina fortalece a vocação e diminui as ocasiões de pecar para aquele que a veste e para os que o rodeiam. Dos milhares que abandonaram o sacerdócio depois do Concílio Vaticano II, praticamente nenhum abandonou a batina no dia anterior ao de ir embora: tinham-no feito muito antes.

5ª AJUDA DESINTERESSADA AOS DEMAIS

O povo cristão vê no sacerdote o homem de Deus, que não busca seu bem particular se não o de seus paroquianos. O povo escancara as portas do coração para escutar o padre que é o mesmo para o pobre e para o poderoso. As portas das repartições, dos departamentos, dos escritórios, por mais altas que sejam, se abrem diante das batinas e dos hábitos religiosos. Quem nega a uma monja o pão que pede para seus pobres ou idosos? Tudo isto está tradicionalmente ligado a alguns hábitos. Este prestígio da batina se tem acumulado à base de tempo, de sacrifícios, de abnegação. E agora, se desprendem dela como se se tratasse de um estorvo?

6ª IMPÕE A MODERAÇÃO NO VESTIR

A Igreja preservou sempre seus sacerdotes do vício de aparentar mais do que se é e da ostentação dando-lhes um hábito singelo em que não cabem os luxos. A batina é de uma peça (desde o pescoço até os pés), de uma cor (preta) e de uma forma (saco). Os arminhos e ornamentos ricos se deixam para o templo, pois essas distinções não adornam a pessoa se não o ministro de Deus para que dê realce às cerimônias sagradas da Igreja.

Porém, vestindo-se à paisana, a vaidade persegue o sacerdote como a qualquer mortal: as marcas, qualidades do pano, dos tecidos, cores, etc. Já não está todo coberto e justificado pelo humilde hábito religioso. Ao se colocar no nível do mundo, este o sacudirá, à mercê de seus gostos e caprichos. Haverá de ir com a moda e sua voz já não se deixará ouvir como a do que clamava no deserto coberto pela veste do profeta vestido com pêlos de camelo.

7ª EXEMPLO DE OBEDIÊNCIA AO ESPÍRITO E LEGISLAÇÃO

Como alguém que tem parte no Santo Sacerdócio de Cristo, o sacerdote deve ser exemplo da humildade, da obediência e da abnegação do Salvador. A batina o ajuda a praticar a pobreza, a humildade no vestiário, a obediência à disciplina da Igreja e o desprezo das coisas do mundo. Vestindo a batina, dificilmente se esquecerá o sacerdote de seu importante papel e sua missão sagrada ou confundirá seu traje e sua vida com a do mundo.

Estas sete excelências da batina poderão ser aumentadas com outras que venham à tua mente, leitor. Porém, sejam quais forem, a batina sempre será o símbolo inconfundível do sacerdócio, porque assim a Igreja, em sua imensa sabedoria, o dispôs e têm dado maravilhosos frutos através dos séculos.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Grupo de Coroinhas: uma tarefa complicada?

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Fonte: blog La Buhardilla de Jerônimo, do original “What Does The Prayer Really Say?”

Tradução: Wagner Marchiori

“O blog do Padre Z relata um programa destinado a aumentar a participação de meninos e jovens na Missa como coroinhas.”

A participação dos coroinhas teve um aumento de 500% ao adotar regras mais exigentes

Voltando a adotar práticas mais exigentes para os coroinhas, dois homens foram capazes de aumentar a participação em sua paróquia de 10 para 60 rapazes.

“Servir no altar na paróquia Sagrada Família permite aos jovens estarem mais plenamente integrados na Missa e lhes dá oportunidade de experimentar mais de perto o Sacrifício de Cristo. Sagrada Família propicia um ambiente que os fazem sentir bem-vindos e necessários e é uma excelente experiência”, explica Carson Lind, de 19 anos, um “veterano coroinha com 7 anos de atividade”.

Resposta a uma necessidade

Bob e Mark, membros da paróquia Sagrada Família em St. Louis Park, Minnesota, queriam ver mais garotos envolvidos na Missa. Parecia-lhes que a função de coroinha poderia ajudar aos jovens a participarem mais plenamente e, possivelmente, chegar a discernir uma vocação sacerdotal. Bob e Mark aproximaram-se de seu pároco, o padre Dufner, e compartilharam com ele esta visão.

De onde surgiu a idéia

Ambos haviam servido, quando jovens, em grupos de coroinhas reservados somente a meninos e lembravam da experiência com carinho.

Como funciona

Em primeiro lugar propuseram fazer o programa somente para rapazes. Acreditavam que isso aumentaria o desejo dos jovens em participar do programa. O padre Dufner concordou. Depois trataram de criar uma atmosfera mais reverente usando batinas e sobrepelizes e comprando calçados iguais. Finalmente treinaram os rapazes nas funções tradicionais de coroinhas, instituindo um sistema de cargos “hierárquicos” com nomenclatura própria que tornou mais acessível e atraente para os jovens a atividade. Com estas regras mais rigorosas o programa experimentou um enorme crescimento.

Os resultados

O grupo cresceu, nos últimos sete anos, de 10 para 60 participantes. Há rapazes de várias idades, o que permite que os mais velhos instruam os mais novos.

Elementos chaves

Bob e Mark crêem que há alguns elementos chaves que ajudaram no sucesso do programa. Os jovens da paróquia responderam bem à atmosfera reservada para rapazes e, especialmente, o tempo extra que lhes permitiram passar com o padre Dufner, tanto durante os treinamentos como fora da Missa em diversas atividades como jogar bola ou pescar. Também ajudou a motivação a hierarquia de funções, junto com o alto padrão de ordem e disciplina do programa.

Como implementar

Uma boa maneira de implementar esse programa é encontrar homens com espírito de liderança que tenham o desejo de ver uma maior participação de rapazes na Missa e animar-lhes a começar um programa de coroinhas. Ajudar a estes líderes a criar um ambiente divertido e competitivo instituindo um sistema de faixas hierárquicas com distintas nomenclaturas, colocando em vigor um rígido código de vestimenta e organizando atividades esportivas complementares somente para os coroinhas. Isto ajudará a estimular os rapazes a servir a Deus e à sua Igreja.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Vídeo de uma Missa Solene Pontifical, na forma extraordinária, na Festa do Preciosíssimo Sangue, em 2009

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Celebrada no rito antigo por Sua Excelência Reverendíssima, D. Joseph N. Perry, Bispo Auxiliar de Chicago, auxiliado por Cônegos Regulares de São João Câncio, em 1º de julho de 2009, no Santuário do Santíssimo Sacramento, em Hanceville, Alabama, sede da EWTN e moradia da Madre Angélica e das Pobres Clarissas da Adoração Perpétua.

Vejam aqui.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

O Silêncio e o Canto

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A participação dos fiéis no autêntico espírito da liturgia.

Guido Marini

“Introdução ao espírito da liturgia” é o tema da conferência que o Mestre das celebrações litúrgicas pontifícias pronunciou no dia 14 de Novembro, em Gênova (Itália), a um grupo diocesano de animadores musicais da liturgia. Publicamos alguns trechos da intervenção.

******************

É urgente reafirmar o autêntico espírito da liturgia, do modo como está presente na ininterrupta tradição da Igreja e tem sido testemunhado, em continuidade com o passado, no magistério mais recente: a partir do Concílio Vaticano II até Bento XVI. Usei a palavra “continuidade”. É um termo querido ao actual Pontífice, que fez dele competentemente o critério para a única interpretação correcta da vida da Igreja e, em particular, dos documentos conciliares, assim como dos propósitos de reforma a todos os níveis neles contidos. E como poderia ser diferente? Porventura, podemos imaginar uma Igreja antes e outra depois, como se tivesse sido produzida uma suspensão na história do corpo eclesial? Ou então, podemos afirmar que a Esposa de Cristo entrou, no passado, num tempo histórico no qual o Espírito não a tenha assistido, de modo que este tempo deva ser quase esquecido ou apagado?

E no entanto, às vezes, algumas pessoas dão a impressão de que aderem àquela que é justo definir como uma verdadeira ideologia, ou seja, uma idéia preconcebida, aplicada à história da Igreja e que nada tem a ver com a fé autêntica.

É fruto dessa ideologia, desviante, por exemplo, a repetida distinção entre Igreja pré-conciliar e Igreja pós-conciliar. Tal linguagem pode até ser legítima, contanto que não se compreendam deste modo duas Igrejas: uma – a pré-conciliar – que nada teria a dizer ou dar porque está irremediavelmente superada; e a outra – a pós-conciliar – que seria uma realidade nova nascida do Concílio e de um seu presumível espírito, em ruptura com o seu passado.

O que se afirmou até agora acerca da “continuidade” tem algo a ver com o tema que fomos chamados a enfrentar? Sim, de maneira absoluta. Porque não pode existir o autêntico espírito da liturgia se não nos aproximarmos dela com ânimo sereno, não polémico acerca do passado, quer remoto quer próximo. A liturgia não pode nem deve ser terreno de conflito entre quem encontra o bem só naquilo que estava antes de nós e quem, ao contrário, no que estava antes encontra quase sempre o mal. Só a disposição para olhar o presente e o passado da liturgia da Igreja como um património único e em desenvolvimento homogéneo pode conduzir-nos a haurir com júbilo e gosto espiritual o autêntico espírito da liturgia. Por conseguinte, é um espírito que devemos receber da Igreja e que não é fruto das nossas invenções. Um espírito, acrescento, que nos leva ao essencial da liturgia, ou melhor, à oração inspirada e guiada pelo Espírito Santo, na qual Cristo continua a vir até nós contemporâneo, a fazer irrupção na nossa vida. Deveras o espírito da liturgia é a liturgia do Espírito.

Na medida em que nos assemelhamos ao autêntico espírito da liturgia, tornamo-nos também capazes de entender quando uma música ou um canto podem pertencer ao património da música litúrgica ou sacra. Noutras palavras, capazes de reconhecer a única música que tem direito de cidadania no rito litúrgico, porque é coerente com o seu espírito autêntico. Então, se no início deste curso falámos sobre o espírito da liturgia, fizemo-lo porque só a partir dele é possível identificar quais são a música e o canto litúrgico.

Em relação ao tema proposto não pretendo ser cabal. Nem tratar todos os temas que seria útil enfrentar para um panorama completo da questão. Limito-me a considerar alguns aspectos da liturgia com referência específica à celebração eucarística, assim como a Igreja os apresenta e do modo como aprendi a aprofundá-los nestes dois anos de serviço ao lado de Bento XVI: um verdadeiro mestre de espírito litúrgico, quer através do seu ensinamento, quer do exemplo da sua celebração.

A participação activa

Os santos celebraram e viveram o acto litúrgico participando concretamente nele. A santidade, como êxito da sua vida, é o testemunho mais bonito de uma participação deveras viva na liturgia da Igreja. Portanto, de modo justo e providencial, o Concílio Vaticano II insistiu muito sobre a necessidade de favorecer uma participação autêntica dos fiéis na celebração dos santos mistérios, no momento em que recordou a chamada universal à santidade. Esta indicação competente encontrou confirmação e relançamento pontuais nos inúmeros documentos sucessivos do magistério até aos nossos dias.

Contudo, nem sempre houve uma compreensão correcta da “participação activa”, da maneira como a Igreja ensina e exorta a vivê-la. Certamente, participa-se activamente inclusive quando se realiza, dentro da celebração litúrgica, o serviço que é próprio a cada um; quando se tem uma compreensão melhor da Palavra de Deus ouvida e da oração recitada; quando se une a própria voz à dos outros no canto coral… Entretanto, tudo isto não significaria participação verdadeiramente activa se não conduzisse à adoração do mistério de salvação em Jesus Cristo morto e ressuscitado por nós: porque só quem adora o mistério, acolhendo-o na própria vida, demonstra ter compreendido o que se está a celebrar e, por conseguinte, ser autenticamente partícipe da graça do acto litúrgico.

A verdadeira acção que se realiza na liturgia é a acção do próprio Deus, a sua obra salvífica em Cristo a nós participada. Esta, entre outras, é a verdadeira novidade da liturgia cristã em relação às outras acções cultuais: o próprio Deus age e realiza o que é essencial, enquanto o homem é chamado a abrir-se à acção de Deus, com a finalidade de permanecer transformado nela. O ponto essencial da participação activa, consequentemente, é que a diferença entre o agir de Deus e o nosso seja superada, que nos possamos tornar um só em Cristo. Eis porque não é possível participar sem adorar. Escutemos ainda um trecho da Sacrosanctum concilium: “É por isso que a Igreja procura, solícita a cuidadosa, que os cristãos não assistam a este mistério de fé como estranhos ou espectadores mudos, mas participem na acção sagrada, consciente, piedosa e activamente, por meio de uma boa compreensão dos ritos e orações; sejam instruídos na Palavra de Deus; se alimentem na mesa do Corpo do Senhor; dêem graças a Deus; aprendam a oferecer-se a si mesmos, ao oferecer juntamente com o sacerdote, que não só pelas mãos dele, a hóstia imaculada; que dias após dia, por Cristo Mediador, progridam na unidade com Deus e entre si, para que finalmente Deus seja tudo em todos” (n. 48).

Em relação a isto, o restante é secundário. Em particular, refiro-me às acções exteriores, não obstante importantes e necessárias, previstas sobretudo durante a Liturgia da Palavra. Cito-as porque se se tornarem o essencial da liturgia e forem reduzidas a um agir genérico, então o autêntico espírito da liturgia ficará subentendido. Consequentemente, a verdadeira educação litúrgica não pode consistir simplesmente na aprendizagem e no exercício de actividades exteriores, mas na introdução à acção essencial, à obra de Deus, ao mistério pascal de Cristo pelo qual se deixar alcançar, envolver e transformar. E não se confunda a realização de gestos externos com o justo envolvimento da corporeidade no acto litúrgico. Sem nada subtrair ao significado e importância do gesto externo que acompanha o acto interior, a Liturgia exige muito mais do corpo humano. De facto, requer o seu total e renovado empenho na quotidianidade da vida. É o que Bento XVI chama “coerência eucarística”. Justamente o exercício pontual e fiel dessa coerência é a expressão mais autêntica da participação inclusive corpórea no acto litúrgico, na acção salvífica de Cristo.

Acrescento ainda. Estamos certos de que a promoção da participação activa consiste em tornar tudo o mais possível e imediatamente compreensível? Será que o ingresso no mistério de Deus às vezes pode ser acompanhado melhor pelo que senibiliza as razões do coração? Em alguns casos, não acontece que se dá um espaço desproporcionado à palavra, maçadora e banalizada, esquecendo que à liturgia pertencem palavra e silêncio, canto e música, imagens, símbolos e gestos? E, porventura, a língua latina, o canto gregoriano e a polifonia sacra não pertencem a esta múltipla linguagem que introduz no centro do mistério e, portanto, na verdadeira participação?

Qual música para a liturgia

Não compete a mim aprofundar o que concerne à música sacra ou litúrgica. Outros, com mais competência, tratarão o temo no decurso dos próximos encontros.

Entretanto, oq eu gostaria de realçar é que a questão da música litúrgica não pode ser considerada independentemente do autêntico espírito da liturgia e, por conseguinte, da teologia litúrgica e da espiritualidade que deriva dela. Então, o que se afirmou – ou seja que a liturgia é um dom de Deus que a Ele nos orienta e que, mediante a adoração, nos permite sair de nós mesmos para nos unir a Ele e aos outros – não só procura fornecer alguns elementos úteis para a compreensão do espírito litúrgico, mas também elementos necessários ao reconhecimento do que música e canto verdadeiramente podem dizer à liturgia da Igreja.

A propósito, permito-me uma breve reflexão orientativa. Poder-se-ia perguntar o motivo pelo qual a Igreja nos seus documentos, mais ou menos recentes, insiste em indicar um determinado tipo de música e de canto como especialmente conformes com a celebração litúrgica. Já o Concílio de Trento inteviera no conflito cultural então em acto, restabelecendo a norma pela qual na música a aderência à Palavra é prioritária, limitando o uso dos instrumentos e indicando uma clara diferença entre música profana e música sacra. Com efeito, a música sacra nunca pode ser entendida como expressão de pura subjectividade. Ela está ancorada nos textos bíblicos ou da tradição, e deve ser celebrada na forma de canto. Em época mais recente, o Papa São Pio X interveio de modo análogo, procurando afastar a música operística da liturgia e indicando o canto gregoriano e a polifonia da época da renovação católica como critério da música litúrgica, para que fosse diferenciada da música religiosa em geral. O Concílio Vaticano II afirmou as mesmas indicações, assim como as intervenções magisteriais mais recentes.

Por que, então, a insistência da Igreja em apresentar as características típicas da música e do canto litúrgico, de tal modo que permaneçam distintos de todas as outras formas musicais? E por que o canto gregoriano como a polifonia sacra clássica resultam ser formas musicais exemplares, à luz das quais continuar hoje a produzir música litúrgica, inclusive popular?

A resposta a esta pergunta está exactamente naquilo que procuramos afirmar a propósito do espírito da liturgia. São precisamente aquelas formas musicais – na sua santidade, bondade e universalidade – que traduzem em notas, melodia e canto o autêntico espírito litúrgico: orientando para a adoração do mistério celebrado, favorecendo uma participação autêntica e integral, ajudando a compreender o sagrado e, portanto, a primazia essencial da acção de Deus em Cristo, permitindo um desenvolvimento musical não desligado da vida da Igreja e da contemplação do seu mistério.

Permiti-me uma última citação de Joseph Ratzinger: “Gandhi evidencia três espaços de vida dos cosmos e mostra como cada um destes três espaços vitais comunica também um modo próprio de ser. No mar vivem os peixes, que se calam. Os animais sobre a terra gritam, mas os pássaros, cujo espaço vital é o céu, cantam. Calar é próprio do mar; gritar, da terra; cantar, do céu. Contudo, o homem participa nos três: ele traz em si a profundidade do mar, o peso da terra e a elevação do céu; por isso são suas também as três propriedades: calar, gritar e cantar. Hoje (…) vemos que ao homem sem transcendência permanece apenas o gritar, porque quer ser só terra e procura fazer tornar-se terra inclusive o céu e a profundidade do mar. A verdadeira liturgia, a liturgia da comunhão dos santos, restitui-lhe a própria totalidade. Ensina-lhe de novo o calar e o cantar, abrindo-lhe a profundidade do mar e ensinando-lhe a voar, a essência do anjo; ao elevar seu coração, faz ressoar de novo nele aquele canto que se tinha quase adormecido. Aliás, podemos dizer até que a verdadeira liturgia se reconhece exactamente pelo facto que nos liberta do agir comum e nos restitui a profundidade e a elevação, o silêncio e o canto. A verdadeira liturgia reconhece-se pelo facto que é cósmica, não sob medida para um grupo. Ela canta com os anjos. Cala-se com a profundidade do universo em expectativa. E assim, redime a terra” (Cantate al Signore um canto nuovo, PP. 153-154)

Concluo. Já há alguns anos, na Igreja fala-se sobre a necessidade de uma renovação litúrgica. De um movimento, de qualquer modo semelhante ao que lançou as bases para a reforma promovida pelo Concílio Vaticano II, que seja capaz de actuar uma reforma da reforma, ou melhor ainda, um passo em frente na compreensão do autêntico espírito litúrgico e da sua celebração: levando a cabo dessa maneira a reforma providencial da liturgia que os Padres conciliares começaram, mas que nem sempre, na actuação prática, encontrou uma realização pontual e satisfatória.


Fonte: L’Osservatore Romano


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