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terça-feira, 27 de abril de 2010

Sucesso do Primeiro Congresso “Summorum Pontificum” em Madri

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Trad. e Adapt.: Cleiton Robson.

Como fora anunciado hoje, foi realizada em Madri, com notável sucesso de organização, o Primeiro Congresso sobre o Motu Próprio de Liturgia, "Summorum Pontificum", em honra do Papa Bento XVI, coincidindo com o quinto aniversário do início do exercício de Ministério Petrino, organizado pelo Instituto de Cristo Rei Sumo Sacerdote. Seu superior para a Espanha, o Cônego Raúl Olazábal, leu uma carta de saudação e felicitações pela iniciativa, enviada de Roma pelo Cardeal Cañizares, Prefeito da Congregação para o Culto Divino e Disciplina dos Sacramentos.


Ao longo dos trabalhos da manhã foram desenvolvidas as exposições do Monsenhor Ferrer e do Monsenhor Nicola Bux (ambos na foto com o Cônego Olazábal) e Pe. Diaz Patri, a partir do qual daremos mais detalhes sobre os novos lançamentos.



A sessão concluiu com a celebração de uma Missa Solene cantada em usus Antiquior, que atuou como padre celebrante Olazábal, um diácono, padre Frédéric Goupil, como subdiácono Pe. Patri Diaz.

É de se destacar a notável presença de clérigos e leigos presentes na reunião, entre os quais não houve escassez de tanto como os outros, adequada representação do Principado das Astúrias.

Disponível no original espanhol em:

O culto do Espírito Santo

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Aproxima-se a Solenidade de Pentecostes. Aproveitando o ensejo, transcrevemos neste post dois excelentes capítulos de um tratado sobre o Espírito Santo de autoria do Mons. Gaume, traduzido pelo Centro Permanência:


CAPÍTULO I

Corações ao alto: Sursum corda. Os sofrimentos do tempo presente nada são, se comparados à glória futura que se nos há de revelar. À consideração do fruto da vida eterna, caso ainda nos reste algum claro da luz verdadeira, algum sentimento de nobre ambição, diremos com o Apóstolo: Para ganhar o céu, de tudo fiz palha; candidatos à eternidade, imitemos o mercador de pérolas sobre que conta o Evangelho. Encontrara uma pérola que, por si só, era todo um tesouro. Em vez de gastar o tempo em perseguir, e o dinheiro em consumir outras pérolas, comprara aquela outra, vindo a ser o mais rico e feliz dos mercadores.

Mas como há de ser, tão grande recompensa para tão pouca labuta! O infinito pelo finito, qual o mistério? O Espírito Santo é amor infinito, e o céu, o reino deste amor. Esconde-se-nos a razão de tal proporção, mas o fato é inconteste. Afiança-nos a palavra divina, tornam-no sensível aos olhos as imagens presentes. Quem não presenciou a bondade, a grandeza, a prodigalidade de algumas árvores? Num instante meditado, fala-nos este espetáculo: para abrigar-se dos ardores soalheiros, aquecer o lar, cobrir a mesa de frutos suculentos, por anos a fio, ao homem basta-lhe o sacrifício dum só fruto, capaz quando muito da satisfação dum tênue apetite.

Aquele que multiplica, de tão espantoso modo, os frutos das árvores, prometeu-nos multiplicar, conforme a mesma lei, o fruto das obras: Centumplum accipiet. A quem cabe o direito de lhe duvidar da palavra, limitar-lhe o poder? Os milagres resplendentes da ordem material são pálida imagem dos milagres que se consumam na ordem moral. Quanto vai da diferença entre a humílima semente, plantada em terra, e a árvore magnífica, repleta de flores e frutos, segundo a estação, vai com usura da diferença que há entre o prazer fugaz, que sacrificamos ou cuja privação voluntária aceitamos, e as torrentes de deleites eternos com que seremos inundados.

Ora, nasce o fruto do fruto. Nasce o fruto da vida eterna dos frutos temporais, nossos conhecidos. Resta dizer o como cultivá-los. Há de se cultivá-los no cultivo da árvore que os carrega: esta árvore nada mais é que o próprio Espírito Santo (S. Agost., Enarrat, in ps. 145 n. 11, opp. t. IV p. 2333, edit. Noviss). Como cultivá-lo? Rendendo-lhe o merecido culto. Daí, duas perguntas: deve o mundo culto ao Espírito Santo? qual este culto?

Deve o mundo um culto ao Espírito Santo? Quando desejo obter a resposta a uma pergunta de história ou astronomia, interrogo os historiadores ou os astrônomos. Para saber se o mundo deve um culto ao Espírito Santo, dirijo-me aos mestres em ciência divina. São eles: o próprio Deus, Nosso Senhor, os Apóstolos, os Padres, a Igreja. Desde o começo do mundo, tais mestres ensinam em uníssono, de geração a geração, ao eterno soldado cujo nome é gênero humano: teus mais terríveis inimigos não são aqueles que vês, os homens de carne e sangue. Para ti, a verdadeira luta é contra o espírito do mal e suas hostes invisíveis. Quereis conhecer-lhes a natureza? é superior à tua. O caráter? são a própria maldade. O contingente? incalculável. Os artifícios? são os pais da mentira. O quartel? habitam o ar que respiras, investem contra ti mais ligeiros que a ave de rapina. Só, espírito luta contra espírito, Espírito do bem contra espírito do mal. Conservar-se escondido sob as asas do Espírito do bem, ou cair nas garras do espírito do mal, é a inevitável condição da tua existência. (Eph, VI; Corn. A Lap., ibid; 1Petr., V, 8). Assim em uníssono ensinam os mestres da ciência. Escutemos cada qual em particular.

Deus. A fim de tornar presença constante no homem a necessidade do culto ao Espírito Santo, escreveu Deus dois grandes livros: o mundo e a Bíblia. Com igual eloqüência, ambos os livros contam as glórias do Espírito Santo. O amor imperecível à humanidade, e a indispensável assistência sua. O céu e seus sóis, a terra e suas riquezas, o mar e suas leis, até o caos que ele ordena e fecunda, falam dele, assim como do Filho e do Pai. Mais de cinqüenta vezes, nomeia o Antigo Testamento, bendizendo-a, a terceira pessoa da Adorabilíssima Santíssima Trindade. Duzentas vezes prestam-lhe homenagem dentro do Novo Testamento.

Que revela a repetição tão freqüente, senão o papel soberano e eterno do Espírito Santo na obra da criação, do governo e da redenção do mundo? Que apregoa, senão o dever imposto aos homens e aos anjos de sempre tê-lo consigo, junto com o Pai e com o Filho, como objeto de seus pensamentos, orações e adorações? Adicionemos que se há de existir alguma preferência no culto incessante, esta recairá sobre o Espírito Santo, Amor substancial do Pai e do Filho. Ele só se revela nas mercês. Os dons da natureza e da graça vêm diretamente dele.

Nosso Senhor. Juntam-se a voz da Bíblia e das criaturas àquela da Verdade em pessoa, o Verbo encarnado. Nem exemplos nem palavras, nada omitiu o Salvador do gênero humano para nos instar ao amor do Espírito Santo e puséssemos Nele toda a confiança. O que era João Batista em relação ao Cristo, parecia Ele em relação ao Espírito Santo. O filho de Zacarias, o maior dentre os filhos de homens, foi escolhido precursor do Messias. O filho de Deus como que toma para si o papel de precursor do Espírito Santo, e parece não ter outro fim, senão o de preparar o mundo para recebê-lo.

Decidiu se fazer homem, mas quisera sua mãe esposa do Espírito Santo. Quisera seu corpo formado numa operação do Espírito Santo; que no dia do batismo o mesmo Espírito descesse sobre si visivelmente, e o conduzisse ao deserto, a fim de prepará-lo para sua missão. Durante o inteiro curso da vida mortal, mostra-se amiúde sob a dependência do Espírito Santo, que o conduz ao Calvário. Morto, é o Espírito Santo que o retira do sepulcro (Matth., IV, 1; XII, 18, 28; Hebr., IX, 15; Rom., VIII, 2).

Há mister de defender os direitos do Espírito Santo? Parece que se esquecem deles. Pronunciara o mesmo Cristo esta sentença: quem pecar contra o Filho do Homem, será perdoado; mas quem pecar contra o Espírito Santo, não será perdoado nem neste século, nem no vindouro (Matth., XII, 32). Deve-se reservar um lugar para ele dentro das almas? Jesus não hesita em separar-se de tudo quanto lhe era mais caro no mundo, de temor que tal presença constitua-se em obstáculo ao reinado absoluto do Espírito Santo (Joan., XVI, 7). Tais foram as palavras e condutas da segunda pessoa da Santíssima Trindade em face da terceira pessoa. Jamais céu e terra ouviram nem ouvirão nada tão eloqüente, acerca da excelência do Espírito Santo, do culto que lhe é devido e da necessidade de seu reinado.

Os Apóstolos. Instruídos na escola do Verbo e formados pelo Espírito Santo, contam os apóstolos a sua plenitude. Diante dos novos fiéis e dos perseguidores, em seus escritos e discursos, sempre trazem o Espírito Santo sobre os lábios. Aos diáconos o cuidado de alimentar os pobres; a eles, a missão de anunciar o Espírito Santo, de dá-lo a saber ao mundo e proclamar por toda parte a necessidade premente de submeter-se a seu império. Nada mais lógico. Qual sua vocação, e por que são eles apóstolos? A vocação é uma rija luta contra o espírito do mal, satã, deus e rei do mundo. Como apóstolos, está sua razão de ser na caça ao usurpador, fazendo reinar o Espírito do bem.

Qual nuvens salutares, soprados pelo Vento do Cenáculo, espalham-se para os quatro cantos do céu e fazem chover sobre todas as partes da terra – é neles em que o Espírito tem morada. Gigante desta imensa batalha, São Paulo o leva por durante trinta anos, de Oriente a Ocidente, e de Ocidente a Oriente. Em todo lugar, exalta as glórias do Espírito Santo, revela sua presença por meio de esclarecidos milagres, não cessa de rogar aos judeus e aos pagãos, aos gregos e aos bárbaros: “recebei o Espírito Santo; guardai-vos de entristecer o Espírito Santo; sobretudo, guardai-vos de expulsá-lo. Senão, permanecereis ou caireis no império do espírito infernal. Quem nega o espírito de Jesus Cristo, não tem parte com ele. Sem o Espírito Santo, nada podeis obrar para vossa salvação, sequer pronunciar o nome do autor da salvação e das graças” (Eph., I, 17; IV, 30; I Thess., V, 19; Galat., V, 16, 17; Rom., VIII, 9; I Cor., XII, 3).

O que Paulo ensina em Tessalônica, Efésio, Atenas e Corinto, ensina Pedro em Jerusalém, Antioquia, Roma; Bartolomeu na Armênia; Tomé nas Índias; André na Cítia; Tiago na Espanha. Mateus na Etiópia. Assim os apóstolos se nos deparam como homens do Espírito Santo. Pode-se definir o que eram suas pregações, viagens, milagres, sua vida sublime e sua morte não menos sublime: era o Espírito Santo anunciado, comunicado e apresentado para amor e obediência do mundo inteiro. Ora, a conservação dos seres nada mais é que continuação de sua criação. Caso o mundo cristão, formado pelo Espírito Santo, queira continuar a sê-lo, é imprescindível que permaneça fiel ao princípio de sua origem. Ótimo tema para reflexões em nossa época!

Os Padres. Aos apóstolos sucederam os padres da Igreja e os doutores. Eles viram com os olhos a mais espantosa das revoluções: satã expulso de seu império, e a humanidade, livre da escravidão, converter-se à liberdade, à luz e às virtudes do Evangelho. Nenhum deles ignora que o milagre da regeneração do mundo, maior que o da criação, não começou em Belém, mas no Cenáculo, por obra do Espírito Santo. Consumiam suas vidas na perpetuação e divulgação desta obra maravilhosa, como consumiram os apóstolos para estabelecê-la. Desde os primeiros séculos, a história mostra-nos os mais excelsos gênios de Oriente e Ocidente consagrando o saber e a eloqüência na explicação das prerrogativas do Espírito Santo, na justificação da divindade, na explicação das operações miraculosas, na demonstração da necessidade de seu reinado, na solicitação das adorações que lhe devem o gênero humano.

A exemplo do Apóstolo, São Crisóstomo, Santo Agostinho, São Jerônimo não se cansam de falar do Divino Paráclito. Dídimo, São Basílio, Santo Ambrósio consagram-lhe cada qual um tratado particular. As obras imortais de São Cipriano, Santo Atanásio, São Cirilo, São Gregório Nazianzeno, Santo Hilário, São Leão, São Gregório o Grande, Beda o Venerável, Ruperto, Santo Tomás de Aquino, São Boaventura, São Bernardo, Santo Antônio e duma multidão doutros são outros tantos canais por que corre abundante o ensinamento apostólico do Espírito Santo. A todos estes grandes homens, fundadores da sociedade cristã, nada lhes era tão caro como o inculcar no mundo o estado de permanente necessidade deste, que se há de viver ou sob o império do Espírito Santo ou sob o de satã.

Em nome de todos, ouçamos São Bernardo e São Crisóstomo. “Temos, diz o primeiro, duas prendas do amor de Deus por nós: a efusão do sangue de Jesus Cristo, e a efusão do Espírito Santo. Um de nada serve sem o outro. O Espírito Santo só se dá a quem acredite em Jesus crucificado. Mas a fé de nada serve, se não opera na caridade. Ora, a caridade é dom do Espírito Santo” (Epist. 107 ad Thom., Praeposit. de Beveria, opp. t. I, p. 294. n. 8 e 9, edit. Noviss).

São Crisóstomo: “Sem o Espírito Santo, nem os fiéis poderiam orar a Deus, nem chamá-lo de Pai. Sem ele, não haveria ciência, nem sabedoria na Igreja, nem pastores, nem doutores, nem santificadores. Em suma, sem ele não haveria Igreja” (In sanct. Pentecost., hom. I, n. 4, opp. t. II, p. 543; id., t. IX, p. 296, 297).

Caso não existissem Igreja, padres, doutores, nem possibilidade de orar, nem meio de lucrar do sangue do Calvário, como subtrair-se ao domínio do demônio? Ora, sem o Espírito Santo, nada disso existiria. As partes do mundo civilizadas pelo cristianismo seriam ainda como a China, as Índias, a África, o Japão, o Tibete, regiões sob o domínio do príncipe das trevas. Este é o ensinamento tradicional dos padres da Igreja. Existe razão mais poderosa acerca da necessidade de conhecer o Espírito Santo, de amá-lo, de adorá-lo e de submeter-se a seu império?

A Igreja. Para torná-lo indelével, tornando-o popular, a Igreja cuida de traduzir em atos esse ensinamento fundamental. Além do sinal da cruz, cujo uso freqüente, mui recomendado[1], repisa diversas vezes ao dia às crianças o nome e a influência necessária do celeste Consolador, emprega ela mil outros meios de mantê-lo sempre em face de seu pensamento.

Qual seja, junto com o Pai e o Filho, o objeto invariável da liturgia, deseja a Igreja que uma festa, soleníssima, a cada ano, de geração em geração, recorde o reconhecimento das nações batizadas, recorde aquele a quem o mundo tudo deve: luz, caridade, liberdade, civilização no tempo, glorificação na eternidade.

Apresenta-se ele na vida da Igreja, na vida dos povos, ou na de particulares, nas circunstâncias em que a sabedoria do alto se torna especialmente necessária? A Igreja nunca deixa de se dirigir ao Espírito Santo.

A metrópole do mundo católico, Roma, está de luto. A morte, que não respeita ninguém, abateu-se sobre seu pontífice e rei. A Pedro se deve um sucessor, ao Filho de Deus um vicário. O Sacro Colégio está em assembléia, profundo silêncio engolfa o santuário, onde se dará continuidade à seqüência dos pontífices. Por onde começará o ato decisivo, quem deve depositar nas mãos dum frágil mortal o destino do mundo civilizado? A primeira palavra que escapa dos lábios dos anciãos, prosternados diante de Deus, é a invocação do Espírito de sabedoria, hino diversas vezes secular: Veni, creator Spiritus.

Da mesma forma que se perpetua o pontificado, assim o sacerdócio. Contemplem a tropa de jovens levitas que avançam modestos e tímidos em direção ao bispo, cuja mão lhes deve consagrar padres, segundo a ordem de Melquisedeque. Arautos da fé, modelos dos povos, missionários nas margens distantes, talvez mártires caso se precise de grandes virtudes, o consagrante tem necessidade de muitas luzes. Para lograr aos primeiros heroísmo, aos segundos discernimento, a quem a Igreja irá dedicá-los? ao Espírito Santo. Na ordenação, como no conclave, o hino real eleva-se ao céu, consagrando a augusta cerimônia desde o início: Veni, creator Spiritus. Desta forma, desde o pontífice posto no cume da escada sagrada, até o levita assentado sobre o último degrau, a hierarquia da Igreja perpetua-se sob os influxos do adorável Espírito que a forma.

Na incompreensível ternura para com os filhos dos homens, Deus em pessoa digna-se habitar sobre a terra: permite que lhe erijam templos. Quem os tornará dignos, estes templos materiais? Quem fará novos céus? É o mesmo Espírito que das castas entranhas de Maria erigiu o santuário do Verbo eterno. Ao chamado da Igreja, descerá até às moradas terrestres, as purificará, as ungirá com sua sagrada presença, e para sempre as fará agradáveis a Deus e respeitáveis aos homens. A invocação solene é o começo da imponente dedicação, que vai pedir com instância por sobre o trono o Espírito santificante: Veni, creator Spiritus.

Consagrar-lhe-ão augustíssimos templos. Aos pobres, aos órfãos, aos doentes, dar-se-ão padres e madres, irmãos e irmãs que lhes esposam os sofrimentos, aliviam as necessidades, desde o berço até à tumba e mais além. Quem operara tal milagre, desconhecido do mundo até antes do Pentecostes cristão? A partir de então, invocar-se-á o Espírito de devoção. Como no dia do Cenáculo, ele descerá; novos corações surgirão da ação de seu poder, e o mundo terá, nos religiosos e religiosas, contínuas gerações redivivas de mártires e apóstolos da caridade: Veni, creator Spiritus.

Por obra de pérfidas inteligências no humano coração, o espírito do mal conseguira aos pouquinhos franquear as muralhas da cidade do bem. A cizânia foi semeada no campo do pai de família. À vista da defecção dalguns, da conivência e cobardia doutros, os chefes das tropas ficaram confundidos. Tornou-se necessária uma regeneração, parcial ou total. Então, recorre a Igreja aos excelentes instrumentos que se chamam concílios e missões.

Recolhida, como os apóstolos no Cenáculo, começa invariavelmente na invocação do Espírito Santo formador e que, no formar, renova de alto a baixo a face da terra. Em favor de suas orações e cânticos, conjura-o à iluminar as inteligências; em ditar pessoalmente as decisões de fé e as regras de costumes; em dar eficácia à palavra do Verbo, em purificar os corações e em lhes influir, junto com a vida sobrenatural, coragem para a luta. Sob a influência sempre antiga e sempre nova do Espírito criador, luzes viventes derramam-se por sobre o mundo, transformações miraculosas se dão nestes novos cenáculos: Veni, creator Spiritus.

Tanto quanto o homem cristão, o homem social precisa do Espírito Santo. Em todas as ocasiões solenes, toma a Igreja o cuidado de recordá-lo disso. A morte que se abate sobre os pontífices não poupa os reis. O trono está vacante, deve-se preenchê-lo. Dar um rei a uma nação é presenteá-la com bem precioso ou funestíssimo. Bispo dos leigos, protetor, modelo e pai dos povos são tudo nomes dos reis cristão. Nestes nomes, quais os deveres? quem se elevará à altura da dignidade? quem lhe ensinará que o poder é um jugo? quem os despojará de si mesmo para ser um homem de todos? Somente o Espírito Santo opera este difícil milagre.

Sabe-o a Igreja: a sagração dos reis nada mais é que a evocação perpétua do Espírito de força, luz, justiça e caridade. Nesta terrível consagração, declara aos reis da terra: sois vassalos do Rei dos céus, obrigando-os a ser dele a imagem viva; para ele, como para o último dos súditos seus, há de prestar contas da administração: são estas as garantias para a felicidade temporal e a salvação eterna das almas! Ainda para as dinastias, que regalo de duração! Meteoros passageiros ou torrentes sempre a correr, eis o que foram e para sempre serão, caso se não sustentem no Espírito de Deus: Veni, creator Spiritu.

Fazer leis e aplicá-las com discernimento, i. é, distinguir por sua vez o justo do injusto, punir o culpado com utilidade, absolver o inocente com coragem, é tão importante para a felicidade das nações quanto a consagração dos reis. A prosperidade pública, a paz interna, o respeito externo, a fortuna, a honra, a liberdade, a segurança, a vida mesma dos cidadãos estão nas mãos do legislador e do juiz. Que responsabilidade!

Nem o próprio Salomão conhecia nada de mais temível. Já o paganismo disso não se dava conta, ou não o tinha em conta. Seus códigos testemunham que só se valiam das regras vulgares de prudência humana, ou o dictamen vacilante da eqüidade natural: amiúde o único deus invocado era o interesse, o capricho ou a força. Nas mesmas fontes de direito se desalteram os povos não-cristãos e aqueles que pouco a pouco o deixaram de ser. Daí, o escândalo das legislações e a iniqüidade das jurisprudências.

Comportam-se assim as nações nascidas no Cenáculo? de forma alguma. Quer a Igreja que os legisladores e os magistrados cristãos busquem inspiração na fonte da vida, tomando por regra constante a lei imaculada, de que o Espírito Santo é ao mesmo tempo o autor e o intérprete[2]: Veni, creator Spiritu.

Durantes quantos anos a velha Europa não assistira assembléias políticas, estados gerais, parlamentos, tribunais abrirem suas sessões com a invocação compenetrada do Espírito de sabedoria e de luz, sem o quê toda legislação é defeituosa, toda justiça cega, toda ciência perigosa ou vã? (Prov., VIII, 15. – Sap., XIII, 1). Aquela piedade não fora estéril. Enquanto o Espírito Santo dirigia os trabalhos, os legisladores e os magistrados não macularam os códigos modernos de quaisquer leis anticristãs, nem os anais dos tribunais de enormidades jurídicas.

Não basta para a Igreja a invocação do Espírito Santo, quando dos grandes momentos em que se deve debater o proveito geral das sociedades cristãs. Recomenda a todos os seus filhos, pouco importa idade ou estado, recorrer a ela no começo de suas ocupações. Assim, diversas vezes ao dia, sobre todos os pontos do globo, a criança cristã, que estuda as ciências sagradas ou profanas, clama ao socorro de sua jovem inteligência o Espírito de luz, coragem e pureza.

Quer dizer isso, para as jovens gerações que entram no embate da vida, receber a terceira pessoa da Santíssima Trindade? é por isso que a Igreja multiplica os esforços de solicitude materna. Instruções prolongadas, orações públicas e particulares, purificação da alma pelos sacramentos, anúncio solene do pontífice: tudo é posto em ação para de cada paróquia fazer um novo cenáculo[3].

Junto com muitos outros, estes são os meios que sem cessar emprega a Igreja, para tornar o Espírito Santo sempre presente à memória e ao coração de seus filhos. Há como repetir com maior força a contínua necessidade que temos dele, enquanto homens e cristãos? É permitido afastar as recomendações tão instantes da mais sábia das mães? Não haveria ingratidão em esquecê-la? Qual dentre as criaturas possui todos seus dons? Não haveria perigo na pretensão de seguirmos sem ele, rodeados de inimigos que somos?

Não é o mesmo o perigo, tanto para os indivíduos como para as sociedades? Podem se imiscuir da alternativa imperiosa de viver sob o império do Espírito Santo ou sob a tirania do espírito do mal? Particularmente, nossa época goza dalguma imunidade neste jogo? Infelizmente, para ela, bem mais que para outra, o culto do Espírito Santo é, do ponto de vista apenas social, a mais premente necessidade do momento.

Esta época, tão confiada em ser mestra de si mesma, como se encontra? Interroguemos seus atos e tendências. O desarvorado luxo que a devora e convida a grandes brados a formidável reação do pobre contra o rico, o socialismo; o sacrifício perpétuo, e a cada dia mais comum, da consciência, da honra, da inteligência, da vida pública e privada ao culto da carne; a insurreição generalizada, inaudita, obstinada das nações contra Deus e contra seu Cristo; as torrentes de doutrinas envenenadas, noite e dia espalhadas pelo mundo, terríveis semeaduras, seguidas inevitavelmente por colheitas piores ainda: é o Espírito Santo que inspira e faz todas essas coisas? Se não é o Espírito de vida, é o de morte.

A qual dos dois pertencerá o amanhã? Quem quer sabê-lo desde agora, não interrogue a ciência e a diplomacia, basta olhar para qual lado se voltam as nações. Eis aí a questão. Para nós, se há algo evidente, é que o mundo atual, o infeliz suspenso por um fio sobre o abismo, deve ao Espírito Santo, seu único libertador, o mesmo culto, com isso querendo dizer as mesmas orações ardentes. Quem entenderá tal situação? Quem sentirá tal necessidade? Quem cumprirá tal dever? Ninguém ou quase; mas esta não é lá grande prova de que o que dizemos é a verdade. Terribilli et ei qui aufert Spiritum principium.


CAPÍTULO 2

Qual culto deve o mundo ao Espírito Santo? Como o Pai e o Filho, o Espírito Santo é Deus. Como o Pai e o Filho, tem direito ao culto de latria. O culto soberano é interior e exterior, público e privado. Todos estes aspectos, obrigatórios em relação ao Pai e ao Filho, se devem também guardar em relação ao Espírito Santo. Ousemos acrescentar que, em desagravo do longo esquecimento, cuja culpa recai na Europa moderna, e em razão da ameaçadora invasão do espírito do mal, a terceira pessoa da Santíssima Trindade há de ser atualmente objeto de culto preferencial, ardentíssimo como nenhum outro.

Consiste o culto interior na fé, na esperança e na caridade (S. Aug. Euchyrid., c. III). Crer que o Espírito Santo é Deus, como o Pai e o Filho; como eles, pessoa distinta; com eles, uma só natureza; neles, em tudo igual; como eles, eterno, todo-poderoso, infinitamente bom e perfeito. Deve-se crer que é tudo o Espírito Santo, como se crê que é o Pai e o Filho; e esperar no Espírito Santo, como se espera nas duas outras pessoas da Adorabilíssima Trindade; e amar o Espírito Santo com amor soberano, de complacência, de reconhecimento, de esperança, como se ama, pelos mesmos motivos, o Filho e o Pai – eis os três atos fundamentais do culto interior que deve o mundo ao Espírito Santo.

Dizemos: amor de complacência, por causa das infinitas amabilidades do Espírito Santo. Amor de reconhecimento, por suas mercês. Só para falar de algumas, deve-lhe o mundo a Santa Virgem, o Homem-Deus, a Igreja e o cristão. Amor de esperança, por suas magníficas promessas: o céu será o reino excelente do Espírito Santo, pois que há de ser o reino da caridade (Corn. a Lapid., in Luc., I, 35).

Como a claridade sai da fornalha, necessariamente o culto exterior sai do culto interior, não menos obrigatório. É ao homem impossível, composto de dupla substância, não manifestar por sinais exteriores os sentimentos que lhe agitam a alma. Melhor ainda: todos seus atos exteriores não passam da tradução dos pensamentos e sentimentos interiores. Além disso, deve violentar de contínuo sua natureza, para recalcar ao fundo d’alma o que imperiosa e constantemente teima em se manifestar. Deve o homem a Deus a homenagem dos sentidos, tanto quando lhe deve a do espírito. Assim, os atos exteriores de adoração, as orações, o sacrifício, a ação de graças devidas ao Pai e ao Filho, devem-nas ao Espírito Santo.

O homem não é um ser isolado, mas social. A este título, é obrigado a prestar a Deus um culto público. Deus, autor das famílias, dos povos e da sociedade, e também dos indivíduos, tem direito às homenagens deste ser coletivo, como tem direito às homenagens do ser individual. Enquanto pessoa pública, os seres coletivos só retribuem a Deus o tributo por meio de adorações coletivas. Um povo sem culto público seria um povo ateu; como jamais existisse um povo ateu, desde a origem do mundo e sobre todos os pontos do globo, houve um culto público.

Acrescentemos que este culto é todo benesses para as nações, que dele tem necessidade para viver. Um mero raciocínio é bastante para prová-lo: não há sociedade sem religião; não há religião sem culto interior; não há culto interior sem culto exterior. São tais proposições axiomas de geometria moral e também de leis sociais e políticas, que época alguma, nem nação, jamais dispensou impunemente.

Não menos necessário que o culto público, o culto privado se deve manifestar na lembrança do Espírito Santo, na oração, na imitação e no temor de ofendê-lo.

A lembrança é o pulso da amizade. Enquanto bata, existe amizade. Com que força ou freqüência não deve bater nosso coração pelo Espírito Santo? Amor consubstancial do Pai e do Filho, amor ativo de eternidade, fonte dos bens da natureza e da graça de que gozamos cá embaixo, é também rei do século futuro, quando santificará os eleitos na efusão, ilimitada e infinita, dos divinos deleites.

Enquanto espera, por quantos expedientes solicita nosso amor! O ar que se respira, a estrela que brilha no firmamento, as árvores carregadas de frutos, as ricas colheitas, as flores tão odoríferas, variadas e belas – todas as criaturas que só tem alento para nosso serviço, parecem gritar-nos com voz infatigável: Amai o Espírito de amor que nos criou como a vós, e que para vós nos criou. Se escutássemos esta voz, e quem não na escutaria! o amor do Espírito Santo extravasaria do coração nosso, como o ribeiro da nascente. Manifestando-se o Espírito, a ação de graças, a invocação, a adoração, as confidências íntimas, a oração em suas várias formas, tornar-se-iam um laço de comércio habitual entre o mundo e o Espírito Santo, em que todo lucro seria nosso.

Nas dúvidas, perplexidades, doenças d’alma ou do corpo, a quem nos dirigir com maiores oportunidades de êxito? Sobretudo, qual defensor invocar, ao considerar as catástrofes com que nos ameaça o espírito do mal? Somente o Espírito do bem lhe pode obstar o progresso. O mesmo é dizer que a devoção ao Espírito Santo deve ser a favorita dos cristãos atuais, e as orações íntimas, inspirada na fé dos avós, hão de exalar do coração, com freqüência semelhante a do alento que nos sai dos lábios: Veni, creator Spiritus Veni, sancte Spiritus, etc.

Aqui se apresenta uma questão: quando da necessidade de luzes, por que se dirigir ao Espírito Santo e não ao Filho, luz do mundo: Ego lux mundi? Tal prática não se opõe ao costume de atribuir ao Pai o poder, ao Filho a sabedoria e ao Espírito Santo a caridade?

É fácil responder: a luz é dom de Deus, e como ato de amor é natural pedi-lo ao Espírito Santo, o amor por essência e, por conseguinte, o princípio de todos os dons. Acrescente-se que, sendo Deus, o Espírito Santo é luz, como é o próprio Filho; e que o amor, principal atributo do Espírito Santo, é a luz verdadeira, por que são esclarecidos a alma e o coração. Donde vem que o melhor conselheiro, o causídico mais confiável, é o amor de Deus e do próximo, cuja fonte é o Espírito Santo.

Ademais, seguindo a prática secular, a Igreja limita-se a se conformar às intenções de Nosso Senhor. Não fora ele mesmo que ensinara a guardar o Espírito Santo como a morada da luz e oráculo da verdade? Na pessoa dos apóstolos, disse ele a sua esposa, duma vez por todas: “Quando vier o Espírito que vos enviarei, ele vos instruirá de toda a verdade” (Joan., XVI, 13). Assim, nada mudou: nem o papel que o Verbo feito carne toma em face do Espírito Santo, nem a missão excelente do Espírito Santo. Luz dos profetas do Antigo Testamento, locutos per prophetas, ele continua a inspirar a Igreja e todos seus filhos.

Entretanto, não bastam as orações e adorações para que haja o verdadeiro culto do Espírito Santo. O culto tem por fim aproximar o adorador do ser adorado. Essencialmente, consiste esta aproximação na imitação. Imitar o Espírito Santo é parte fundamental de seu culto.

Ora, a pureza e a caridade são atributos distintivos do Espírito Santo. Segue-se que imitá-los constitui a essência do culto. A pureza de afetos, i. é, o desapego do coração das paixões desordenadas, é tão almejada pelo Espírito Santo, que somente a sombra de tal imperfeição o impediria de descer ao coração dos apóstolos. Já que é assim, seria ilusão grosseira ter a pretensão de que ele escolheria por morada a alma escrava da carne. Santificar os afetos e pensamentos é o primeiro passo a se dar na imitação e no culto do Espírito Santo.

A caridade é o outro atributo da terceira pessoa da Santíssima Trindade. Por um lado, tende a caridade à união, união que faz a força; por outro, a caridade se manifesta nas obras. Esta segunda parte do culto do Espírito Santo é tão necessária quanto a primeira. Daí, nos séculos cristãos, as ordens militares do Espírito Santo, as numerosas associações de caridade espiritual e corporal, conhecidas sob o nome de Confrarias do Espírito Santo. Uma palavra acerca destas instituições, cuja só existência caracteriza o Espírito reinante sobre a velha Europa.

No século catorze, apesar da decadência dos costumes, era o Espírito Santo popular o bastante, até nas classes altas da sociedade, para permitir aos reis honrá-lo com cultos vistosos, com a participação da flor da nobreza. No dia de Pentecostes de 1352, Luís de Tarento instituiu, quando de sua coroação como rei de Jerusalém e de Sicília, em honra do Espírito Santo, a quem se considerava devedor deste insigne favor, a ordem militar do Espírito Santo da Reta Intenção.

Ele mesmo redigiu os estatutos, que começavam assim: “Estes são capítulos feitos e engendrados pelo excelentíssimo príncipe Senhor rei Luís, pela graça de Deus, rei de Jerusalém e de Sicília, em honra do Espírito Santo, provedor e fundador da nobilíssima companhia do Espírito Santo da Reta Intenção, começada no dia de Pentecostes do ano da graça de MCCCLII”.

“Nós, Luís, pela graça de Deus, rei de Jerusalém e de Sicília, em honra do Espírito Santo, no dito dia, por sua graça, fomos coroados de nossos reinos, e por alçamento e crescimento de sua honra, ordenamos se fizesse uma Companhia de cavaleiros que serão chamados os cavaleiros do Espírito Santo da Reta Intenção, e os ditos cavaleiros serão em número de trezentos; dos quais Nós, como provedor e fundador desta Companhia, seremos príncipe; e também o devem ser todos nossos sucessores reis de Jerusalém e de Sicília” (Ver Guisliniani Ist. di tui gli ordin. ozilit., et Hélyot, Hist. des ordres religieux T. VIII, p. 319, edit, in-4).

Ajudar e socorrer o rei, na guerra ou demais ocasiões, era o grande dever dos cavaleiros. A disposição constante ao sacrifício simbolizava-se em um nó ou um laço de amor, em fazenda colorida, pregado sobre o peito. Acima do nó, lia-se: Se Dieu plaist [Se praz a Deus]. Enquanto o cavaleiro não prouvesse a Deus com um assinalado e esclarecido feito de devotamento, o nó continuava atado.

Se combatesse o inimigo superior em número e recebesse honrosas feridas, ou levasse notável vantagem, desde este dia levava consigo o nó desatado, até que visitasse o Santo Sepulcro e rendesse preito a Nosso Senhor de sua vitória. Ao retorno, o nó estaria novamente atado, com este dístico: Ele prouve a Deus, acompanhados dum feixe de luz ardente, a representar uma língua de fogo, memória do símbolo sob que o Espírito Santo descera sobre os apóstolos.

Tais guerreiros, verdadeiros cristãos, jejuavam todas as quintas-feiras do ano, e neste dia davam de comer a três pobres em honra do Espírito Santo. A cada ano, compareciam em Nápoles no dia de Pentecostes. Encerrava-se a celebração por uma refeição, que o rei em pessoa presidia. No centro do salão, punham uma mesa chamada de “A Mesa Desejada”, onde comiam os cavaleiros que, durante o ano, desataram o nó. O que carregava o nó novamente atado com a flama recebia uma coroa de louros.

À morte dum cavaleiro, o rei celebrava um ofício solene pelo repouso de sua alma. Presentes, os cavaleiros ali assistiam; um parente próximo ou amigo do defunto pegava as espadas pela ponta e oferecia-as no altar, seguidos do rei e demais cavaleiros, que o acompanhavam até o altar. Em seguida, punham-se de joelhos, rogando pela alma do cavaleiro, e após o serviço fincavam a espada na amurada da capela. Recebida de Deus, empregada no servido de Deus, retornava ela a Deus. Se o cavaleiro trouxesse a flama presa ao nó, gravavam em seu sepulcro uma flama, donde saiam estas palavras: Ele cumpriu seu quinhão de Reta Intenção, estando cada cavaleiro obrigado a oferecer-lhe sete missas em intenção do repouso de sua alma (Helyot, ubi supra).

Dois séculos depois, a França teria também sua ordem do Espírito Santo. No dia de Pentecostes de 1573, Henrique III foi eleito rei da Polônia, e no mesmo dia, no ano seguinte de 1574, elevado ao trono francês. Com vontade de imortalizar o reconhecimento para com o Espírito Santo, dera este príncipe, em 1575, uma carta de privilégio para a instituição da ordem militar do Espírito Santo, de tantas glórias na história da Europa. Esta carta exprime sentimentos, dos quais nos regozijamos, tanto mais que estamos desacostumados em lhes encontrar na boca dum rei.

“Depositando, disse o monarca, toda a confiança na bondade de Deus, em quem reconhecemos a posse e o sustento de toda a felicidade desta vida, é razoável que relembrássemos quanto nos esforçamos de lhe prestar imortais ações de graças, e quanto testemunhamos à posteridade as grandes mercês que dele recebemos, particularmente em meio a tantas opiniões diferentes que se embatem sobre o assunto da religião, e que afligem a França. Ele a conservou no conhecimento de seu Santo Nome, na profissão da fé única e católica, e na união da única Igreja apostólica e romana.

“E por isso prouveram, por inspiração do Espírito Santo, no dia de Pentecostes, reunir-se os corações e as vontades da nobreza polonesa, o que levou todos os Estados desse reino e do ducado de Lituânia a nos eleger rei, e depois de tal dia elevar-nos ao governo do reino de França; por meio do qual, tanto para conservar a memória de todas as coisas, como para fortificar e manter doravante a religião católica, e bem assim para condecorar e honrar a nobreza do reino, Nós instituímos a ordem militar do Espírito Santo... a qual ordem criamos e instituímos em aquele reino, a fim de que o Espírito Santo faça-nos a graça de ver reunidos todos nossos súditos na fé e na religião católica, e de viver para o amanhã em boa amizade e concordância uns com os outros... que é o fim ao qual tendem nossos pensamentos e ações, e o cúmulo de nosso maior regozijo e contentamento” (Helyot., t. VIII, p. 406 e ss).

Satã é o espírito da divisão. O Espírito Santo é o Espírito de caridade. Se há um meio de unir novamente um reino, cruelmente cindido por guerras de religião e discórdias civis, suas inevitáveis conseqüências, é com certeza o restabelecimento do reino do Espírito Santo. O pensamento do príncipe é justíssimo: nada é tão apetecível quanto a finalidade desta instituição. A sua mera existência é já um imenso serviço. Exibindo a nobreza mais alta comprometida após o pavilhão do Espírito Santo, dá-lhe suma importância enquanto elemento social, retardando a época do funesto esquecimento no qual caiu a terceira pessoa da Adorabilíssima Trindade, sob os olhares dos governos modernos.

Os estatutos da ordem eram adequados à realização dos votos do monarca. Como guia supremo, o rei da França, no dia da sagração, prestava juramento sobre o Evangelho: “de viver e morrer na santa fé e religião católica, apostólica e romana, e antes morrer que dela sair; de conservar para sempre a ordem do Espírito Santo; de nunca poder dispensar os comandantes e oficiais recebidos na ordem da comunhão e do recebimento do precioso corpo de Nosso Senhor Jesus Cristo, nos dias ordenados, quais sejam, o primeiro dia do ano e o dia de Pentecostes.”

Instituída a ordem na propagação da fé católica, e na extirpação das heresias, o mesmo juramento de fidelidade prestavam a Deus, à Igreja, ao Espírito Santo, ao rei os cavaleiros, no dia da recepção. Os cavaleiros eram em número de cem, todos egressos de famílias nobres, de boa vida e costumes. Quando podiam, assistiam a missa diariamente, e mais os dias de festa, na celebração pública do ofício divino.

Estavam obrigados a recitar a cada dia um rosário de uma dezena, que deviam levar consigo, e após o ofício do Espírito Santo, com seus hinos e orações; ou então os sete salmos penitenciais ou, se não o recitassem, dar uma esmola ao pobres. Nos dias de comunhão, ordenados pelos estatutos, deviam carregar o colar da ordem durante a missa e a comunhão, em qualquer lugar em que se encontrassem.

No dia seguinte ao da recepção, iam escutar a missa vestidos com os trajos de cerimônia, e o rei, no ofertório, apresentava um círio engastado de tantos escudos d’ouro quantos eram seus anos de idade. Após a missa, almoçavam com sua majestade, e à tarde assistiam às vésperas dos mortos. No terceiro dia, assistiam ao serviço pelos cavaleiros falecidos. O rei e os cavaleiros ofereciam cada um, no ofertório, um círio de uma libra. Além disso, duas missas se celebravam a cada dia, no convento dos Agostinianos, de Paris: uma pela prosperidade da ordem e dos cavaleiros vivos, outra para os cavaleiros falecidos (Helyot., ubi supra).

Que diferença entre as ordens militares d’outrora e as ordens modernas!

Enquanto a alta nobreza praticava com tanta pompa e circunstância o culto do Espírito Santo, o povo, ainda mais fiel às tradições, conservava-o na sua ingênua, contudo patética e enérgica simplicidade. Parte da Europa estava coberta de associações ou Confrarias do Espírito Santo. A alma destas instituições preciosas, cuja origem se perde na noite dos tempos da barbárie, era a santificação de seus membros na união fraterna e na caridade: eis o Espírito Santo em ação. É de se notar que elas existiam na maioria das paróquias da Sabóia. Até hoje, a privilegiada diocese de Saint-Jean de Maurienne regozija por lhes conservar muitos belos vestígios.

As refeições públicas, de que tomavam parte os confrades (os confrades eram todos ou quase todos habitantes da mesma paróquia), nos fazem pensar que as associações do Espírito Santo têm sua origem nos ágapes. Tais refeições se realizavam sobre o gramado, em campo aberto. Matavam um boi para o festim. Até um tempo atrás, quando se abatiam as enormes nogueiras, encontravam-se nos flancos das árvores seculares o gancho de ferro que utilizavam para despedaçar o animal. Ainda existem, nalgumas paróquias, daqueles caldeirões imensos, em que se cozia o ensopado para o dia do ágape. Mudados os tempos, converteram-se os ágapes em esmolarias gerais, para conservar a memória da antiga disciplina e confortar com mais eficácia os pobres envergonhados.

Na qualidade de confrades, tinham os ricos parte nas esmolas, recebendo-as como os pobres. Assim usava o grande e amável santo da Sabóia. Sabe-se que Francisco de Sales carregava religiosamente, nas dobras da sotaina, as nozes que as criancinhas lhe davam, quando apareciam para a confissão. Eles as mandava servir à mesa, dizendo ao comer: é o trabalho de minhas mãos, estou feliz de comê-las: Labores manum tuarum quia mandicabis, beatus es et bene tibi erit.

Mas em desagravo ao que recebiam, e para tornar mais e mais generosas as porções dos pobres, os ricos diligenciavam em aumentar, seja por doação ou testamento, a aporte de fundos dos confrades. Graças à liberalidade, havia em cada paróquia, até cinco esmolarias gerais por ano.

Devido à época em que ocorriam e à natureza dos objetos distribuídos, vê-se que as esmolas tinham por fim proporcionar aos confrades algumas alegrias inocentes, dulcíssimas ao deserdados do mundo, ou socorros materiais necessários ao cumprimento das leis da Igreja. Deste modo, faziam a distribuição de azeite de noz no começo da quaresma, pois que se não podiam curtir os alimentos na manteiga. A distribuição de toucinho era aos sábados santos, para que os fiéis pudessem preparar a comida na gordura, durante o tempo pascal.

Mas era mui pouco ter parcos alimentos curtidos em gordura, na época em que a Igreja estava em alegria e os ermitões mais rígidos afrouxavam as austeridades. Assim, no sábado de Páscoa distribuíam-se pão e vinho. Quando da Ascensão, em que a geada vinha se precipitar por sobre as montanhas, distribuíam sal. Enfim, na segunda ou terça-feira de Pentecostes, festa do patrono da confraria, distribuíam cozido, vinho e toucinho, o que permitia aos mais pobres esquecer um instante as privações habituais. Atualmente, as distribuições ou esmolas apoucaram-se àquelas do início da Quaresma e do Sábado Santo.

É isto apenas a face material da confraria. Todas as obras de caridade espiritual possuem sua face moral. Em primeiro lugar, figura o cuidado das almas do purgatório. Por elas se oferecem missas numerosas e obras pias e sortidas. Derramando sobre os mortos o orvalho refrigerante e pacífico, estes testemunhos de caridade intencional buscam para os vivos poderosas intercessões aos pés de Deus, e imortalizam os laços da confraria. Onde se pode encontrar algo melhor?

Por que o espírito moderno andou perseguindo ou destruindo as admiráveis associações? Nós o sabemos; mas o que impede seu restabelecimento onde outrora existiam, e sua criação, onde não existiam então? Não o sabemos. Para que isso aconteça, que falta?

Vontade. Vontade e sabedoria, considerando as circunstâncias de tempo e lugar[4]. Vontade e perseverança, não temendo obstáculos, tendo-se em conta que o necessário há de se fazer sempre. Cada dia vê novas confrarias se estabelecerem. São poucas as paróquias que não possuam associação ou conferência em honra da Santa Virgem, de Sant’Ana e dos diversos santos do paraíso. Estará só e esquecida a terceira pessoa da Augustíssima Trindade, a quem devemos tudo, até a Santa Virgem? Qual é a desculpa, sobretudo hoje em dia, para nossa indiferença?

Satã não se limita em capitanear o grande exército do mal. Com atividade inaudita, alicia sob nossos olhos numerosos adeptos nas milhares de confrarias da iniqüidade. Sabe que para destruir, como para edificar, a união faz a força. Sozinho, o Espírito do bem vence o espírito do mal. Basta dizer, parece-nos, que a ordem do dia é, mais que nunca, favorecer o reino do Espírito Santo.

Em favor deste culto salutar, ainda há uma última consideração, que será objeto do capítulo vindouro.

(Retirado de O Tratado do Espírito Santo; tradução: Permanência)

Notas:

[1] Um decreto de Pio IX anexa 50 dias de indulgência à prática deste sinal venerável. Ver nossa obra: Le Signe de la Croix au XIX siècle.

[2] Nunca cessam de repetir, conforme Bossuet, que o direito romano é a razão por escrito. Nada mais falso. A verdadeira razão por escrito é o decálogo. Não houve nem haverá outra, jamais.

[3] É de lamentar ao infinito que as prudentes intenções da Igreja não se cumpram sempre, e que, segundo um dito vulgar, a confirmação seja escamoteada em proveito da primeira comunhão.

[4] Que impediria, por exemplo, aproveitar o tempo da confirmação para realizar o projeto?

Música litúrgica - a Seqüência

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Este texto é uma espécie de adendo, porque, embora pertença à série de artigos sobre o Próprio da Santa Missa, devota-se a um item ausente da lista de cinco que coloquei ao iniciá-la, em Fevereiro de 2010. A lista era:

-Introito
-Gradual/Salmo Responsorial
-Aclamação antes do Evangelho
-Ofertório
-Comunhão

Hoje falo da Seqüência, que ainda grafo com trema porque... sem trema não dá.

Textos anteriores da série:

Introito
Salmo Responsorial
Gradual
Aclamação antes do Evangelho

Se a Seqüência não está na lista do Próprio, por que tem que ser abordada? Porque podemos dizer que a seqüência faz, sim, parte do Próprio, e a lista poderia ter seis itens. Não a coloquei lá porque atualmente são pouquíssimas as seqüências da Liturgia, embora bem conhecidas.

Na Idade Média as seqüências nasceram como adições feitas ao Alleluia antes do Evangelho. Como o leitor viu no texto sobre a Aclamação antes do Evangelho, a vogal a do Alleluia, nas melodias gregorianas, é estendida por um melisma (muitas notas); esta extensão é chamada de jubilus e, às vezes, era chamada também de sequentia. Em certo momento, alguns começaram a escrever versos (em latim) para a sequentia.

Esta palavra passou a designar também hinos metrificados e rimados, e algumas seqüências são hoje nossas conhecidas, mas não como seqüências; é o caso de Ave maris stella (Ave, estrela do mar):

Ave maris stella
Dei mater alma
Atque semper Virgo
Felix caeli porta.

Uma tentativa de tradução: Ave, estrela do mar, cara Mãe de Deus, sempre Virgem, feliz porta do céu. Tentativa, porque traduções literais são um pouco difíceis de encontrar. Como o texto original é metrificado, é comum que se façam traduções também metrificadas, o que modifica um pouco o poema.

Ave maris stella, especificamente, é um conhecido hino de devoção mariana, prescrito também por ambas as formas do Ofício Divino (Ordinária e Extraordinária) como hino das Vésperas das comemorações da Santíssima Virgem. Composto no século VIII (isto é, tem mais de mil e duzentos anos de idade), este canto faz parte do patrimônio fabuloso que não temos o direito a desprezar.

O papa São Pio V, ao codificar em 1570 o Rito Romano, eliminou da Liturgia da Santa Missa um grande número de seqüências, mantendo somente quatro. No século XVIII, uma quinta foi introduzida (o Stabat Mater), e a lista passou a ser esta:

Victimae Paschali Laudes – na Páscoa da Ressurreição
Veni Sancte Spiritus – em Pentecostes
Lauda Sion Salvatorem – em Corpus Christi
Dies Irae – Missas dos defuntos
Stabat Mater – Nossa Senhora das Dores

A reforma litúrgica de 1969-1970 aboliu o uso do Dies Irae nas Missas dos Fiéis Defuntos e o prescreveu, dividido em partes, como hinos para as diversas horas do Ofício Divino durante a Trigésima-Quarta Semana do Tempo Comum (depois de Cristo Rei, logo antes do Advento). Suas vinte e uma estrofes foram distribuídas igualmente entre o Ofício das Leituras, Laudes e Vésperas.

Muitos de nós gostaríamos de ver o Dies Irae de volta às Missas dos Fiéis Defuntos na Forma Ordinária e, se não é mesmo pecado sugerir coisas específicas para a reforma da reforma, tenho certeza de não estar sozinho na defesa desta restauração.

Por enquanto, continuamos com quatro seqüências no Rito Novo. Porém, de acordo com a IGMR:

64. A seqüência que, exceto nos dias da Páscoa e de Pentecostes, é facultativa, é cantada antes do Aleluia.

- isto é, apenas duas delas são obrigatórias, a considerar a letra da lei.

Este número 64 da IGMR também nos informa quando a seqüência é cantada: antes da Aclamação antes do Evangelho. Trata-se de outra mudança da reforma litúrgica de 1969-1970; antes dela a seqüência era sempre cantada depois da Aclamação, e antes do Evangelho.

O Graduale Romanum, mesmo em sua edição para o Rito Novo, manda cantar a Seqüência depois da Aclamação. Debate-se de que instrução é a precedência (Gradual ou Missal?). A prática descrita pelo Graduale Romanum é a prática tradicional; por outro lado, se argumenta pela maior autoridade do Missal no que se refere a rubricas.

Deixo o leitor, finalmente, com os vídeos das cinco seqüências do Rito Romano, já que o Dies Irae é integrante do Forma Extraordinária.

Veni Sancte Spiritus (Seqüência de Pentecostes), com a Schola Gregoriana Mediolanensis e o professor Giovanni Vianini



Lauda Sion Salvatorem (Seqüência de Corpus Christi), com os seminaristas de Écône



Stabat Mater (Seqüência de Nossa Senhora das Dores), com o professor Giovanni Vianini



Victimae Paschali Laudes (Seqüência da Páscoa da Ressurreição) em Missa Tridentina em Łódź, Polônia, 2008



Dies Irae (Seqüência dos Fiéis Defuntos) com o professor Giovanni Vianini

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Elas querem salvar o catolicismo na Dinamarca

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Saiu na IstoÉ uma bela reportagem sobre a atividade missionária de beneditinas brasileiras na secularizada e protestantizada Dinamarca. Os mosteiros beneditinos são uma grande força para a preservação da liturgia decentemente celebrada e para a “reforma da reforma”.

Nesse sentido, temos que nos alegrar pela reportagem!

 

A história das monjas brasileiras que se mudaram para a Europa e impediram que o último mosteiro dinamarquês fosse fechado

Por Rodrigo Cardoso

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ORIGEM
A abadessa Myriam, do mosteiro de Campos do Jordão:
local de partida das monjas brasileiras

Às 15 horas já não havia mais claridade no horizonte e as luzes do mosteiro do vilarejo de Aasebakken (lê-se “ôzebáken”), situado no município de Birkerod, no norte da Dinamarca, tinham de ser acesas. A temperatura amena proporcionada pelo aquecimento interno do convento – que, até 1942, funcionou como residência de um embaixador – contrastava com o inverno rigoroso observado pela janela. Fazia 30 anos que não nevava tanto na Dinamarca. Em dezembro passado, o mês mais gelado, as monjas brasileiras Amábile Auxiliadora Dias, Maria Jacinta Ramos e Anna Maria Cabral se mudaram para o mosteiro. Nos quatro meses seguintes, os flocos brancos vindos do céu só não foram mais constantes na rotina das novas hóspedes do que as orações. Beneditinas, essas freiras entoam salmos em uníssono sete vezes por dia, em geral, entre 6h30 e 20h30.

O clima gélido do país, a luz natural que some no meio da tarde e a distância da terra natal, porém, não desviam as brasileiras da missão que as fizeram se estabelecer em Aasebakken: salvar o único mosteiro beneditino católico do país, que corre o risco de sumir do mapa. Isso estava prestes a acontecer por falta de novas monjas para ocupar o casarão de 50 cômodos do mosteiro, fundado há quase 70 anos por uma alemã.

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NA DINAMARCA
O grupo pioneiro que desembarcou no mosteiro,
em 2006 (apenas a primeira à dir. não é brasileira)

Madre Margarida Hertel, além de responder pela transformação do casarão dinamarquês em convento, estreitou os laços entre as religiosas do Brasil e da Dinamarca ao desembarcar no País e patrocinar a criação dos mosteiros de Nossa Senhora da Glória, em Uberaba (MG), e de São João, em Campos do Jordão (SP), em 1948 e 1964, respectivamente. “Por causa das irmãs de fora, as brasileiras conheciam toda a história da rainha Margarida, do príncipe Frederik, da princesa Alexandra da Dinamarca e por aí vai”, lembra a atual abadessa do mosteiro de São João, Myriam de Castro, 48 anos.

No 40º aniversário do convento de Campos do Jordão – onde as irmãs Amábile, Maria Jacinta e Anna Maria viviam antes de partir para o Hemisfério Norte –, a abadessa escreveu para as irmãs de Aasebakken convidando- as para os festejos. Rompeu-se aí um hiato de 40 anos sem informações entre as religiosas dos dois países. A resposta das estrangeiras as comoveu. “Elas escreveram que a comunidade
estava morrendo e que, por causa do número reduzido de vocações na Europa, a salvação seria o socorro das brasileiras”, conta a irmã Maria de Nazaré, 68 anos, que esteve na Dinamarca em 2006 acompanhando e traduzindo o idioma para o primeiro grupo de três brasileiras que lá desembarcaram.

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Todos os anos, no último domingo de maio, Aasebakken é tomada por duas mil pessoas. Depois de caminhar por uma floresta em companhia dos sacerdotes de suas paróquias, rezando o terço naquela que é conhecida como a maior romaria católica da Dinamarca, elas lotam o gramado ao redor do casarão. Quatro anos atrás, esse centro de peregrinação composto por 11 alqueires de terra – palco de uma missa celebrada por João Paulo II, em 1989, quando esteve em solo dinamarquês em visita oficial – era ocupado por apenas cinco freiras. Esse número já foi de 30 no século passado. “A Dinamarca possuía cerca de 50 mosteiros. Com a reforma luterana, os católicos passaram a sofrer grandes pressões, as monjas foram morrendo e só restou Aasebakken”, explica o biblista e cônego Celso Pedro da Silva, reitor do Centro Universitário Assunção (Unifai).

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Atualmente, residem no convento quatro brasileiras e uma dinamarquesa. “Estamos iniciando uma refundação. Por enquanto somos uma presença silenciosa orante”, conta a irmã Anna Maria, que se tornou a primeira brasileira com o título de superiora dentro da casa. No mês que vem, a abadessa Myriam desembarcará na Dinamarca acompanhada de uma quinta brasileira para Aasebakken. Com 27 anos, natural do Ceará, a irmã Rafaela da Silva está ansiosa para contribuir. “O que Deus criou nada vai destruir. É uma alegria, uma realização poder ajudar”, diz.

Pelo acordo feito entre as religiosas, a abadessa brasileira terá de visitar Aasebakken anualmente durante três anos para avaliar se a empreitada está valendo a pena. Os progressos, segundo Myriam, já são visíveis. “Houve a retomada do louvor divino. Elas conseguiram celebrar a Páscoa e já há uma candidata dinamarquesa a se tornar freira, o que é um sinal de que há uma esperança de vida religiosa lá”, conta ela.

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NA NEVE
“Estamos iniciando uma refundação”, diz a irmã Anna
Maria, superiora no convento

Três das quatro brasileiras fazem aulas de dinamarquês. São cinco horas de estudos, três vezes por semana. Por viver na Dinamarca desde 2006, a irmã Maria Vitória Nascimento está adiantada em relação ao idioma. Brincam suas colegas religiosas que, de tão adaptada ao país nórdico,  Maria Vitória, uma negra de 50 anos, só falta adquirir olhos azuis. O cônego Pedro da Silva lembra de uma passagem que viveu na Dinamarca, quando lá esteve visitando as monjas brasileiras. “Estávamos almoçando no refeitório dos hóspedes e a irmã Maria Vitória entrou carregando uma cerveja”, conta. “Aí, ela disse: ‘Quando são os padres delas (dinamarquesas) que nos visitam, elas põem cerveja na mesa. Então, para os nossos, também vai ter’.”

Além dos estudos, as monjas cuidam da limpeza dos cômodos da casa principal, da hospedaria dos visitantes e de outros trabalhos caseiros. E estão se adaptando à solidão do lugar. Em Campos do Jordão, elas tinham bastante contato  com a população da cidade. Em Birkerod, tudo é muito isolado, distante do contato com as pessoas. Nas estradas e parques não se encontra gente com frequência . Mais: não há muitos católicos. Com cinco milhões de habitantes, a Dinamarca é um país luterano: 90% da população segue essa doutrina. Os católicos somam 35 mil (0,7%), enquanto os muçulmanos, 150 mil (3%). “Muitos leigos, no entanto, têm nos procurado para desfrutar do silêncio do mosteiro”, conta a irmã Anna Maria.

E, assim, as portas do mosteiro de Aasebakken seguem abertas. Para leigos, religiosos, dinamarqueses ou brasileiros como a irmã Amábile, 32 anos, que, feliz na Dinamarca, enviou uma foto para as monjas que ficaram no Brasil com o seguinte título: “Minha primeira neve.”

Semana Santa no Brasil com dignidade, sacralidade e respeito às rubricas - XXVI (na forma ordinária em vernáculo, em Rondinha, PR)

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Os frades estudantes da Ordem dos Frades Menores (OFM), da Província Imaculada Conceição-SP, celebraram com real dignidade, simplicidade e beleza, o Tríduo Sacro. Aqui destacamos alguns aspectos, dentre eles, o uso dos paramentos: sobrepelizes sobre o hábito e as vestes próprias dos Sacerdotes. Excessão para a oração do "Ofício das Trevas", celebrado na Sexta-feira da Paixão do Senhor. Apenas ressaltamos a estética do espaço litúrgico, pois o hábito franciscano NÃO É uma veste litúrgica, mas penitencial e, portanto, sobre ele, devem ser usados os paramentos próprios.

Santa Missa "In coena Domini" - ato do Lava-pés


Para o "Ofício das Trevas"




Sexta-feira da Paixão do Senhor


Vigília Pascal

"Pulchirtudo tam antiqua et tam nova" (A beleza sempre antiga e sempre nova)

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Por Duncan G. Stroik, publicado em Sacred Architecture, Volume 16 (http://www.sacredarchitecture.org/articles/pulchritudo_tam_antiqua_et_tam_nova/)

Traduzido por Rafael Diehl

Parte da história da arte e arquitetura é recuperação de elementos encontrados no passado. Algumas vezes isso é uma questão de continuidade, enquanto em outras vezes os elementos são referenciados de forma a associar o novo trabalho com uma edificação ou um período histórico. O Movimento Litúrgico do século XX buscava um retorno à liturgia da antigüidade e via os desenvolvimentos datados do período medieval ou da Contra-Reforma como acréscimos desnecessários ou decadências. Por volta dos anos 1920, o desejo de despojar a liturgia desses acréscimos encontrou seu resultado arquitetônico na retirada dos santos e retábulos dos altares principais. Os teóricos do Movimento Litúrgico, por exemplo, queriam focar na natureza sacrificial da Missa, mas com a exclusão de toda a iconografia. O modelo desses teóricos, que foi adotado tanto nas igrejas novas quanto nas existentes, compunha um não-coberto altar de pedra com um tabernáculo de bronze no topo encimado por um crucifixo com um dossel ou baldaquino por cima. Isso possuía uma simplicidade clássica, inspirada na antigüidade, que continua a ressoar nos católicos de hoje. Teria esse enxugamento das igrejas góticas e clássicas em nome de uma era de ouro mais antiga conduzido à posterior adoção de arquitetura modernista para nossas igrejas? A remoção de tabernáculos, altares laterais, balaustrada dos altares e bancos que seguiu nos anos 1950 e 1960 conduziu à reinvenção da arquitetura da igreja como salão comunitário.







Em sua encílcia Mediator Dei, de 1947, Pio XII expressou preocupação a respeito do que chamou de arqueologismo: “A liturgia dos primeiros tempos é muito certamente digna de toda veneração. Mas o uso antigo não é, por motivo somente de sua antiguidade, o melhor, seja em si mesmo, seja em relação aos tempos posteriores e ás novas condições verificadas. Os ritos litúrgicos mais recentes da mesma forma merecem respeito e reverência. Estes, igualmente, recebem sua inspiração do Espírito Santo, que assiste a Igreja em todas as épocas até a consumação do mundo... não é certamente coisa tão sábia e louvável reduzir tudo e de qualquer modo ao antigo.”

Enquanto a defesa do retorno à antiguidade e à igreja doméstica é hoje menos forte, o arqueologismo a qual Pio XII se refere está, contudo, emergindo em novas formas. Os cristãos olham para os “bons e velhos tempos”, estejam nos anos 1950 ou 1250. Quanto mais longe a época, mais fácil é mascarar suas imperfeições para recuperá-la como uma era dourada onde as coisas eram melhores, mais puras. Contudo, conforme afirma a Sacrosanctum Concilium, “durante o curso dos séculos, ela [a Igreja] acumulou um tesouro de arte que deve ser muito cuidadosamente preservado.” A arte do passado é uma janela para a fé e prática de um tempo específico, mas pode também falar para todas as épocas. Rejeitar períodos, exceto nossos favoritos, quer como primitivos ou decadentes é se perder da rica tapeçaria de arte e arquitetura que a Igreja tem fomentado.

Um dos mais fascinantes precursores arquitetônicos do Movimento Litúrgico foi o Gothic revival [N.do T.: estilo neogótico] do século XIX. O líder católico dessa renovação, A. W. N. Pugin, acreditava que o gótico era a única arte verdadeiramente cristã. Ele era apoiado nessa crença pela Sociedade Eclesiológica na igreja Anglicana. Apesar de ser um arquiteto talentoso, Pugin rejeitava os primeiros novecentos anos de arquitetura como prólogo e os últimos quatrocentos anos como declínio. Sua idéia era uma teoria atrativa, apesar de simplista, que equiparava a arte e arquitetura gótica com a presumida pureza, cavalaria e piedade da Idade Média. Esta concepção romântica, juntamente com a rejeição de outros períodos da arquitetura como menos cristãos, tem curiosamente reaparecido nas recentes décadas.

Devemos aspirar recuperar uma era dourada da liturgia ou arquitetura, ou devemos buscar criar belos e atemporais trabalhos de arte e arquitetura sacra? Tanto a antiga igreja doméstica quanto a Catedral gótica devem ser vistas co mo parte de uma grande tradição, juntamente com o estilo Românico, Bizantino, Renascentista e Barroco. A história da arquitetura sacra é história de recuperação, mas também de desenvolvimento.


Isso não é para argumentar que é de algum modo antinatural para nós termos nossas músicas, pinturas ou igrejas favoritas. É também perfeitamente válido, inclusive benéfico, debater os relativos méritos de vários períodos da arquitetura. De qualquer forma, um entendimento católico da arte e arquitetura pode apreciar a Catedral gótica radiante bem como a modesta igreja de Missão, a antiga Basílica cristã e a capela barroca do Rosário adjunta a mesma. Embora pareça natural equiparar diferentes estilos arquitetônicos com as forças ou fraquezas de uma época, é algo na verdade baseado em uma abordagem historicista ou modernista da história. Buscar construir uma nova arquitetura porque isso conduziria novamente a uma era de ouro, quer seja a antiguidade, a Idade Média ou qualquer outra época é arqueologismo. A arquitetura sacra deve ser baseada em princípios e exemplos do passado, mas ela não pode recriar uma suposta era de ouro. Como disse o Papa Bento XVI por ocasião do aniversário de 500 anos dos Museus Vaticanos em Junho de 2006:

“Em todas as épocas os cristãos buscaram expressar a visão da fé acerca da beleza e ordem da Criação de Deus, a nobreza de nossa vocação como homens e mulheres feitos à Sua imagem e semelhança, e a promessa de um cosmo redimido e transfigurado pela Graça de Cristo. Os tesouros artísticos que nos cercam não são simplesmente impressionantes monumentos de um passado distante. Ao contrário,... eles permanecem como um perene testemunho para a imutável Fé da Igreja no Deus Triuno quem, na memorável frase de Santo Agostinho, é Ele mesmo ‘beleza sempre antiga, sempre nova’.”


domingo, 25 de abril de 2010

Semana Santa no Brasil com dignidade, sacralidade e respeito às rubricas - XXV (versus Deum, na forma ordinária em vernáculo, em Quevedos, RS)

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Celebrada, na forma ordinária, mas versus Deum, e em vernáculo, pelo Pe. Rodrigo da Rosa Cabrera, na Paróquia Nossa Senhora dos Remédios.









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